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CARTA ABERTA AO JUIZ FEDERAL GABRIEL MENNA BARRETO VON GEHLEN REFERENTE A AÇÃO CIVIL PÚBLICA Nº

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Academic year: 2021

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CARTA ABERTA AO JUIZ FEDERAL GABRIEL MENNA BARRETO VON GEHLEN REFERENTE A AÇÃO CIVIL PÚBLICA Nº 5025635-85.2020.4.04.7100/RS

SOBRE O DESCASO DO PODER PÚBLICO PROLONGANDO A INSEGURANÇA ALIMENTAR APÓS 61 DIAS DE DEMORA EM AÇÕES DE RESPOSTA NA COVID-19 AO DIREITO HUMANO À ALIMENTAÇÃO SAUDÁVEL E ADEQUADA

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ÚCLEO RIO GRANDE DO SUL DA REDE NACIONAL DE ADVOGADAS E ADVOGADOS POPULARES

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ÚCLEO RIO GRANDE DO SUL DA ALIANÇA PELA ALIMENTAÇÃO SAUDÁVEL E ADEQUADA

OS POVOS TRADICIONAIS DE MATRIZ AFRICANA, com seus apoiadores, novamente sendo tratados de uma forma desrespeitosa por um Estado que não nos reconhece como o povo que construiu juntamente com os imigrantes este que hoje vem a ser o Estado do Rio Grande do Sul, vem declarar o verdadeiro descaso do Poder Público concretizado em reais omissões de atendimento à população em insegurança alimentar.

Um Estado que nega materialmente a existência de um povo colaborador com sua construção, que desde a sua chegada nesta terra como homens e mulheres que haviam sido sequestrados de sua Terra Mãe a África e aqui foram escravizados pelos colonizadores. Apesar disso, a nossa contribuição é inegável quanto a estruturação desta terra, que hoje é reconhecida como um estado exemplar neste País, mas também – sem nenhum equívoco – o país mais racista e preconceituoso.

Desconhecer os Povos Tradicionais de Mariz Africana é desconhecer a própria história. É não prestar assistência digna a estes homens e mulheres que se dividem em grande número em idosos e crianças. É desrespeitar o Estatuto Estadual da Igualdade Racial que reconhecia o

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dever de valorização da herança cultural e da participação da população negra na história do Estado do Rio Grande do Sul (art. 22 da Lei Estadual nº 13.694, de 19 de janeiro de 2011). É entender que nós somos invisíveis aos olhos dos Poderes Executivo, Legislativo e Judiciário no todo.

O Poder Judiciário em questão deve reconhecer as lutas que tivemos para garantir os nossos direitos de nossa tradição de mantermos a forma de nos alimentar e principalmente, o direito à territorialidade, compondo princípios permanentes da nossa soberania alimentar. Diferentemente das comunidades remanescentes quilombolas, para muitos de nós foi retirado direito de termos a terra para que pudéssemos nela ter uma forma de sobrevivência a partir do plantio e, com isso, nos negaram o direito de existir.

Na história recente, em 30 de abril de 2008, foi divulgado o conteúdo de uma carta datada de 11 de agosto de 1889 encontrada no Memorial Visconde de Mauá no Rio de Janeiro. A carta foi escrita pela Princesa Isabel para o sócio de Mauá, Visconde de Santa Victória, com conteúdo que revela suas intenções e do imperador D. Pedro II em prover condições dignas de sobrevivência e inserção da população ex-escravizada na sociedade brasileira, defendendo a indenização ao povo, a constituição de um fundo para a compra e doação de terras que lhes permitissem sobreviver e se inserir socialmente pela exploração agrária e pecuniária sustentada, além do sufrágio feminino. A carta daquela autoridade imperial foi escrita sob a égide da Constituição Política do Império do Brasil de 25.03.1824, vigente até a Constituição da República dos Estados Unidos do Brasil, decretada e promulgada pelo Congresso Nacional Constituinte, em 24.02.1891. Sobre essa carta, Sueli Carneiro (2008), no Portal Geledés, avalia a declaração da “necessidade de formação de um fundo para sustentar o projeto político da princesa e os esforços empreendidos pelo imperador para viabilizá-lo aparecem assim descritos”1:

“11 de agosto de 1889 Paço Isabel

Corte midi

Caro Snr. Visconde de santa Victória

Fui informada por papai que me collocou a par da intenção e do envio dos fundos de seo Banco em forma de doação como indenização aos ex-escravos libertos em 13 de Maio do anno passado, e o sigilo que o Snr. pidio ao prezidente do gabinete para não provocar maior reacção violenta dos escravocratas. Deus nos proteja si os escravocratas e os militares saibam deste nosso negócio

1 CARNEIRO, Sueli. A carta da Princesa por Sueli Carneiro. Publicado em 07/10/2008, Portal Geledes. Disponível em: <https://www.geledes.org.br/carta-da-princesa-por-sueli-carneiro/?utm_source=pushnews&utm_medium=pushnotification>. Acesso em 18 de maio de 2020.

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pois seria o fim do actual governo e mesmo do Império e da caza de Bragança no Brazil. (…) Com os fundos doados pelo Snr. teremos oportunidade de collocar estes ex-escravos, agora livres, em terras suas proprias trabalhando na agricultura e na pecuária e dellas tirando seos proprios proventos. Fiquei mais sentida ao saber por papai que esta doação significou mais de 2/3 da venda dos seos bens, o que demonstra o amor devotado do Snr. pelo Brazil. Deus proteja o Snr. e todo a sua família para sempre! (...) Mas não fiquemos mais no passado, pois o futuro nos será promissor, se os republicanos e escravocratas nos permitirem sonhar mais hum pouco. Pois as mudanças que tenho em mente como o senhor já sabe, vão além da libertação dos captivos. Quero agora dedicar-me a libertar as mulheres dos grilhões do captiveiro dodedicar-mestico, e isto será possível atravez do Sufrágio Feminino! Si a mulher pode reinar também pode votar!”

Desde a elaboração dessa carta, passaram-se 130 anos até que fomos julgados pelo Supremo Tribunal Federal em 2019 (RE 494.601), que reconheceu o direito de mantermos uma alimentação tradicional às nossas comunidades por reconhecer que somos povos originários, por entender a necessidade de preservar as nossas especificidades, a nossa cultura e, assim, a nossa existência. Também tivemos no Decreto Federal 6.040/2007 o reconhecimento formal do direito dos povos e comunidades tradicionais a acessar, de forma regular e permanente, alimentos de qualidade, em quantidade suficiente, sem comprometer o acesso a outras necessidades essenciais, tendo como base práticas alimentares promotoras de saúde, que respeitem a diversidade cultural e que sejam ambiental, cultural, econômica e socialmente sustentáveis (art. 1º, III).

Esse mesmo Decreto Federal nº 6.040/2007 tem por objetivo garantir, nos programas e ações de inclusão social, recortes diferenciados voltados especificamente para os povos e comunidades tradicionais, apoio à inclusão produtiva e promoção de tecnologias sustentáveis, respeitando os sistemas próprios de organização social, valorizando os recursos naturais locais e práticas, saberes e tecnologias tradicionais conforme previsto em seu art. 3º, incisos XI e XVII.

AGORA, SOMOS CIDADÃOS DESTE ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL QUE ESTAMOS – HÁ MAIS DE 61 DIAS – AGUARDANDO POR UMA DECISÃO DO PODER PÚBLICO (JUDICIÁRIO, EXECUTIVO E LEGISLATIVO), QUE DECIDIRÁ SE VAMOS COMER OU NÃO, SE TEREMOS O DIREITO DE RECEBER ALIMENTOS PARA SUPORTARMOS ESSA CRISE MUNDIAL QUE AVASSALA O MUNDO TRAZENDO A MORTE PARA DENTRO DE NOSSAS FAMÍLIAS E QUE SÓ VAI PERMANECER FORA DO PERIGO DE CONTÁGIO AQUELE QUE SE MANTER HIGIENIZADO E COM UMA ALIMENTAÇÃO SAUDÁVEL.

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A nossa pergunta é: DE QUE FORMA PODEMOS NOS MANTER COMO A ORGANIZAÇÃO MUNDIAL DE SAÚDE PEDE, SE NÃO TEMOS O ACESSO AOS ALIMENTOS PARA NOS ALIMENTAR?

Estamos solicitando a este Magistrado os direitos que o Estado tem por responsabilidade para com seus cidadãos, que é o direito a preservar suas vidas e manter uma sociedade com igualdade. Direitos que a Declaração de Durban afirma como o respeito aos direitos humanos e que são fruto da contribuição de diferentes atores da sociedade civil incluindo as organizações não governamentais que lutam pelo combate ao racismo, discriminação racial, xenofobia e intolerância correlata.

Por isso, estamos há 61 dias buscando os recursos no formato de alimentos e de produtos de higiene para atender esta parte da população que já se encontram em situação de vulnerabilidade social severa. Desde o dia 05 de maio era o prazo de entrega que o Estado do Rio Grande do Sul prometeu cumprir com disponibilização de 332 cestas para as famílias cadastradas como Povos Tradicionais de Matriz Africana no cadastramento único do Governo Federal e também 310 cestas básicas para famílias de Povos Tradicionais de Matriz Africana nas Unidades Territoriais Tradicionais.

Até agora entregaram apenas justificativas que a burocracia do Estado usa para respaldar dificuldades de atender o direito humano à alimentação saudável e adequada, constrangendo representantes de povos em fome para negociar quem iria comer e quem não iria, tudo por conta da inépcia do Poder Público. O verdadeiro problema é não ter sido até agora entregue para distribuição as cestas básicas saudáveis pela Secretaria de Justiça e Direitos Humanos e pela Secretaria de Trabalho e Assistência Social, ambas do Estado do Rio Grande do Sul, promessas que haviam sido feitas para entrega dia 05 de maio de modo tardio desde a Declaração de Estado de Emergência Sanitária em 18 de março de 2020.

Passamos 61 dias de agrura e descaso com a prioridade às pessoas: estamos com mais de 780 famílias conhecidas aguardando em fome, tivemos que interromper o autocadastramento nosso da FONSANPOTMA/RS por não haver alimentos para atender

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as pessoas. Os relatos abaixo falam mais diretamente a crueldade desse descaso organizado pelo Poder Público de forma irresponsável:

“Meu nome é Lúcia, eu sou conhecida como Lúcia de Ogum, eu sou presidente da SOMARI e estou fazendo esse áudio para falar um pouco da nossa necessidade, da nossa urgência. Nós inscrevemos muitas casas ligadas a nós, a SOMARI né, a sociedade de matriz africana, para receberem as cestas básicas, essas que estavam num link no qual nós cadastramos as famílias e não vieram. As famílias eu digo, para deixar bem claro, as das casas, das UTTs, das Casas Tradicionais. E que a gente esperava, a expectativa que esse alimento vinha lá dia 05 de abril e ainda não chegou. Passou dia 10, passou dia 15 e esse alimento não veio. Muitas das nossas casas estão passando necessidade e a necessidade não é pouca, ela é real, ela é verdadeira e existe. Então nós precisamos saber de uma resposta tanto do FONSAPOTMA como do CONSEA como do GOVERNO sobre a questão das cestas básicas para as casas de matriz africana para as casas tradicionais. Nós queremos um retorno urgente sobre isso, nós queremos dar resposta para nossas pessoas, para nosso pessoal que nos cobra todos os dias esse cadastro e essa cesta básica que não chega. A FOME ESTÁ LÁ! ESTÁ BEM PRESENTE NO DIA-A-DIA DAS PESSOAS DESDE QUE INICIOU ESSE PROCESSO DA PANDEMIA E ELES FICARAM AGUARDANDO QUE CHEGASSE ESSA CESTA BÁSICA PARA APOIAR E ESSE APOIO NÃO VEIO! ENTÃO NÓS CONTAMOS COM ISSO, COM UMA RESPOSTA URGENTE, COM UMA RESPOSTA QUE DÊ CONTA DAS NECESSIDADES QUE AS PESSOAS ESTÃO PRECISANDO, ENTÃO ESTAMOS NO AGUARDO PORQUE NÃO DÁ MAIS PARA ESPERAR E OUVIR TANTAS COISAS E A GENTE VENDO QUE AS PESSOAS ESTÃO PASSANDO NECESSIDADE, ESTÃO PASSANDO FOME. NÓS QUEREMOS UM RETORNO, UMA RESPOSTA URGENTE!”

Lúcia de Ogum, Presidente da Sociedade de Matriz Africana RioGrandense (SOMARI), Porto Alegre-RS, gravado em 18 de maio de 2020.

“Eu passo o tempo inteiro perneando na rua, tentando achar uma solução que às vezes eu passo até sem dormir de preocupada. Não tanto a vergonha, mas o processo religioso aqui em Uruguaiana, por ser uma cidade que muito foi escravocrata, por mais que teje vários vários terreiros de matriz africana, tu sempre fica visado como preto, macumbeiro, macumbeiro pobre que não tem dinheiro nem pra comida, né. Que Deus me perdoe mas é assim que pensam assim porque ouço: tá lá, é o macumbeiro que não tem pra comer, que faz maldade, que faz macumba, que não é de Deus, que vem pedir comida, que não tem nem comida em casa. Então o que as pessoas pensam, elas preferem passar fome do que se prestar a ouvir vários tipos desse racismo institucional principalmente de...por religião né. Então eu to dizendo isso porque é uma coisa muito certa que eu ouvi, não falam diretamente mas ouço e as pessoas me contam e também as indiretas são muito grande. Então a coisa é bem complicada. Então por isso que eu digo é uma ideia de ter um ponto X onde viesse a distribuição dessas cestas básicas onde as pessoas não pudessem se expor por esse tipo de coisa, seria muito melhor. Até dentro de uma própria terreira, porque ela se sente melhor dentro daquele âmbito que ela vive do que ficar indo no CRAS ali. Querendo ou não, Uruguaiana também é uma cidade que tem muito evangélico, todo mundo sempre aponta o dedo: ‘Ó ciclano, batuqueiro, não tem nem pra comer, mas tem dinheiro pra fazer macumba, é porque faz macumba pro outro que tá passando fome, tá aí nesse estado agora’. Então qual é a pessoa que vai ficar, que vai num lugar para receber uma cesta básica para ouvir esse tipo de coisa. Então por isso que tive a preocupação de arrecadar nas partes privada, levar. A comunidade árabe e palestina aqui são os que me ajuda bastante e olha que eu sai com o Seu ‘Viagem’, porque é uma pessoa muito humanitária, muito humana, independente da religião. Então isso é uma colocação que não importa, por mim pode passar para quem tu quiser. Mas a realidade é esta, não adianta eu fantasiar e tapar o sol com a peneira, então por isso o povo de matriz africana quando tá passando por toda essa necessidade né, fora a comida, é luz, é água né, leite para as criança. Em Uruguaiana assim ó tem muitas coisas que aqui é muito difícil de tu enxergar qualquer tipo de situação entendeu? E realmente, assim, o povo de matriz africana é muito, tem muito pobre aqui, a maioria é muito pobre.”

Cláudia Maciel, ex-coordenadora da Igualdade Racial em Uruguaiana-RS, Clube Social Negros do Brasil Sociedade Beneficiente Filhos do Trabalhador. Gravado em 17 de maio de 2020.

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Mais informações podem ser consultadas na “Nota informativa do cadastro de Povos Tradicionais de Matriz Africana em situação de fome na Região Metropolitana(28/03/2020 a 07/05/2020)”, de 08 de maio de 2020 e entregue oficialmente a próprio punho para a Secretária Estadual de Trabalho e Assistência Social em reunião presencial no mesmo dia 08 (sexta-feira) de maio. Como já dissemos, interrompemos o nosso cadastramento autogestionado diante

do descaso do Poder Público e da carência de alimentos arrecadados. No nosso cadastramento autogestionado, possuímos os endereços e o número de famílias em cada local, porém não levantamos no questionário a situação de estar incluído ou não no cadastro único pois a fome não depende disso.

É fundamental que a unidade recebedora das cestas básicas sejam as Unidades Territoriais Tradicionais dos Povos Tradicionais de Matriz Africana para proteção contra racismo, promoção da segurança e soberania alimentar e respeito aos direitos dos povos tradicionais reconhecidos na Constituição Federal e Estadual, Leis, Tratados e Convenções Internacionais e Declarações – todas legislações devidamente respaldadas na Proposta de Protocolo de Intenções entregue em 23/04/2020, 5 dias após reunião do dia 17 de abril com a Secretaria Estadual de Trabalho e Assistência Social do RS, sem manifestação de mérito até então nas reuniões posteriormente realizadas.

Esse silêncio, esse mecanismo de demora, são resultados dos danos intergeracionais dos processos narrados nessa carta conforme bem defendido na Justificativa da Proposta de Protocolo de Intenções:

“a descendentes de sequestradores, a normalização dos privilégios nos espaços de poder e a banalização do sofrimento de pessoas por mecanismos institucionais de distanciamento da humanidade; a descendentes de sequestrados, o ocultamento das matrizes e princípios civilizatórios tidos como inexistentes. Manifestam-se nas ausências de monitoramento da desigualdade de acesso a políticas públicas conforme quesitos específicos de Povos Tradicionais de Matriz Africana, População Negra, Mulheres Negras da Agricultura Urbana e Periurbana, População Negra LGBTI+, Famílias Negras da Agricultura Familiar, Comunidades Rurais Negras; na necessidade de distribuição do poder de decisão sobre execução de políticas públicas a serem outorgados a lideranças comunitárias atuantes nos territórios; no dever descumprido de tornar reais as condições de possibilidade do direito à informação em um contexto no qual o acesso à internet é condição de exercício efetivo da cidadania ao mesmo tempo que a soberania alimentar foi severamente impactada pelas medidas sanitárias, atuando como seleção social negativa agravando o mínimo existencial de povos tradicionais de matriz africana”.

A proposta entregue ao Governo Estadual e informada à Defensoria Pública da União sugeriu a formalização de protocolo de intenções entre órgãos governamentais e entidades da

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sociedade civil organizada atendendo também orientação normativa da legislação do Sistema de Defesa Civil a confiar na participação de Núcleos de Defesa Civil Comunitária como estratégia de resposta a desastres de grandes proporções como a atual pandemia e atendimento de ajuda humanitária a famílias em situação de vulnerabilidade socioeconômica (art. 4º, VII da Lei Federal nº 12.608, de 10 de abril de 2012 c/c art. 25, §3º o Decreto Estadual nº 51.547, de 3 de junho de 2014).

A Constituição Estadual do Rio Grande do Sul, de 03 de outubro de 1989, é explícita ao dispor que “O Estado fará estoque de segurança que garanta à população alimentos da cesta básica” (art. 185, § 2º), e também alça a promoção da segurança alimentar como princípio (157, XII) e o combate à fome como objetivo da ordem econômica (159, X).

De modo imediato, o Poder Judiciário deve atender o abastecimento alimentar com aquisição, logística de transporte e distribuição de 1000 cestas básicas saudáveis e culturalmente adequadas para famílias compostas por grupos de seis em média, das quais 800 serão destinadas para atender as mais de 780 famílias que já haviam se cadastrado no nosso levantamento na Região Metropolitana e circunvizinhos (Porto Alegre, Canoas,

Alvorada, Viamão, Cidreira, Esteio, Gravataí, Guaíba, São Leopoldo, Novo Hamburgo e Capão da Canoa) e 200 cestas para atender as 200 famílias em Uruguaiana informadas no

áudio. A aquisição judicial de cestas básicas saudáveis e culturalmente adequadas é a única forma de impedir o resultado caótico dessa omissão irresponsavelmente organizada pelo Poder Público em negação da nossa existência. A entrega precisa ser feita pelas Unidades Territoriais Tradicionais para evitar a repetição de fatos como os narrados em Uruguaiana, que são comuns em todo o território estadual, atendendo a orientação da Recomendação do Conselho Nacional de Saúde nº 034, de 07 de maio de 2020, item Governos Estaduais e Municipais, alínea 3. Com esse atendimento aos nossos direitos, em especial ao direito humano à alimentação saudável e adequada, poderemos dar prosseguimento à atualização do cadastramento autogestionado pelo FONSANPOTMA de modo permanente e contínuo enquanto durar os efeitos da pandemia para efetivamente atender a população de Povos Tradicionais de Matriz Africana no Estado do Rio Grande do Sul.

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Solicitamos uma audiência de urgência para subsidiar o fluxo do abastecimento alimentar via aquisição judicial, descrição dos itens da cesta básica saudável e culturalmente adaptada e narrar o processo de criação do cadastro único do governo federal que participamos ativamente. Não temos tempo para prolongar a fome e condicionar o atendimento desse direito a um processo de inclusão tardia no cadastramento único durante a pandemia e sem possibilidade de aplicar as diretrizes do nosso protocolo reconhecido no “Guia Orientador Para Mapeamentos Junto Aos Povos E Comunidades Tradicionais de Matriz Africana” do Ministério da Justiça e Cidadania (2016). Esse mesmo cadastramento que agora é etapa meramente formal e não significa de modo algum o atendimento material da necessidade de segurança alimentar para a própria imunidade do ser humano. Entendemos também a necessidade de realização de uma audiência pública tão logo a situação famérica esteja temporariamente resolvida.

Esse não é um tribunal para decidir quem come e quem não come. Quem está em fome tem pressa!

Territórios Tradicionais de Matriz Africana no Estado do Rio Grande do Sul 19 de maio de 2020. Atualizado em 20 de maio de 2020 às 19h18min.

Kota Mulanji Mona Kelembeketa

Autoridade do Povo Tradicional de Matriz Africana Bantu

Coordenadora Nacional do Fórum Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional dos Povos de Matriz Africana

FONSANPOTMA

Médica Pediatra Intensivista

Tata Nganga Dilê (Edson Nogueira)

Autoridade do Povo Tradicional de Matriz Africana do Povo Bantu

Articulador Político Nacional do Fórum Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional dos Povos Tradicionais de Matriz Africana

FONSANPOTMA

Iyalorixá Vera Soares

Autoridade do Povo Tradicional de Matriz Africana do Povo Yorubá

Coordenadora Executiva Estadual do Fórum Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional dos Povos de Matriz Africana do Estado do Rio Grande do Sul

FONSANPOTMA/RS

Iyalorixá Mãe Rejane de Obá

Autoridade de povo tradicional de Matriz Africana da Nação Jeje Ijexá Coordenação de Mulheres Estadual do Fórum Nacional de Segurança Alimentar e

Nutricional dos Povos de Matriz Africana no Rio Grande do Sul

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Iyalorixá Itanajara de Oxum

Autoridade do Povo Tradicional de Matriz Africana do Povo Bantu

Coordenadora Executiva Municipal do Fórum Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional dos Povos de Matriz Africana de Porto Alegre

FONSANPOTMA/RS

Medusa T'Ogun

Autoridade do Povo Tradicional Matriz Africana da Nação Oyo do Povo Yourubá Coordenador Executivo Estadual de Finanças do Fórum Estadual de Segurança Alimentar

Nutricional de Segurança Alimentar dos Povos Tradicional de Matriz Africana/RS

FONSANPOTMA/RS

Alessandra Folyver

Coordenadora de Comunicação Estadual e Municipal do Fórum Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional dos Povos de Matriz Africana de Porto Alegre

FONSANPOTMA/RS

Jornalista (005468 SP)

Babalorixá Phil de Xangô Aganjú Ibeji

Autoridade do Povo Tradicional de Matriz Africana do Povo Jeje Coordenador Executivo Municipal do Fórum Nacional de Segurança

Alimentar e Nutricional dos Povos de Matriz Africana de Viamão

FONSANPOTMA/RS

Paulo Rogério Leites de Oxóssi

Vice-Presidente da Federação RioGrandense de Associações Comunitárias e de Moradores de Bairros

FRACAB

Iyalorixá Lúcia de Ogum

Autoridade do Povo Tradicional de Matriz Africana do Povo Cabinda Presidente da Sociedade de Matriz Africana Riograndense

SOMARI

Leonardo Ferreira Pillon

Assistente Técnico da Articulação Política Estadual do Fórum Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional dos Povos Tradicionais de Matriz Africana/RS

FONSANPOTMA/RS

Advogado (OAB/RS nº 104.022)

Karla Regina Meura da Silva

Presidenta da Comissão Especial de Igualdade Racial da OAB/RS

CEIR/OAB-RS

Advogada (OAB/RS nº 82.234)

Jair Lima Krischke

Presidente do Movimento de Justiça e Direitos Humanos

MJDH

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Roque Soares Reckziegeloab

Coordenador da Comissão de Direitos Humanos Sobral Pinto

CDH-OAB/RS

Advogado (OAB/RS nº 21.160)

Rodrigo Tönniges Puggina

Coordenador da Comissão de Direitos Humanos Sobral Pinto

CDH-OAB/RS

Advogado (OAB/RS 65.295)

Rodrigo de Medeiros Silva

Membro do Núcleo Rio Grande do Sul da Rede Nacional de Advogadas e Advogados Populares

RENAP/RS

Advogado (OAB/RS nº 102.235A)

Eliane Maria Teixeira Leite Flores

Doutora em Educação em Ciências (UFRGS)

Membra do Comitê Gestor do Núcleo Rio Grande do Sul da Aliança Pela Alimentação Saudável e Adequada

Aliança Pela Alimentação Saudável e Adequada/RS

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QUADRO-NORMATIVO SOBRE SEGURANÇA E SOBERANIA ALIMENTAR

Década Internacional de Afrodescendentes proclamada pela Assembleia Geral da ONU (Resolução 68/237)

Convenção de Durban na África do Sul (2001)

Convenção nº 169 da Organização Internacional do Trabalho

Declaração de Nyéléni sobre a Soberania Alimentar Mundial (2007) Declaração de Roma sobre a Segurança Alimentar Mundial (2005) Declaração da Crimeia Mundial sobre a Alimentação (1996)

Pacto Internacional de Direitos Econômicos, Sociais e Culturais (1966)

Protocolo Adicional À Convenção Americana Sobre Direitos Humanos Em Matéria De Direitos Econômicos, Sociais E Culturais (Protocolo De São Salvador) (1988)

Pacto de Milão sobre Política de Alimentação Urbana (2015)

Constituição Federal da República Federativa do Brasil (art. 3º, 5º, 6º, 215, 216) Constituição do Rio Grande do Sul (art. 157, XII; 159, X; 185, §2º; 190; 198) Lei Orgânica da Segurança Alimentar e Nutricional (Lei Federal nº 11.346/2006)

Política Nacional de Desenvolvimento Sustentável dos Povos e Comunidades Tradicionais (Decreto Federal nº 6.040/2007)

Política Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional (Decreto Federal nº 7.272/2010) Pacto Nacional para Alimentação Saudável (Decreto Federal nº 8.553/2015)

Política Nacional de Alimentação e Nutrição Estatuto da Igualdade Racial (Lei nº 12.288/2012) Estatuto Estadual da Igualdade Racial (Lei 13.694/2011)

Lei do Conselho de Segurança Alimentar e Nutricional Sustentável do Estado do Rio Grande do Sul (Lei nº 11.914/2003)

Sistema Estadual de Segurança Alimentar e Nutricional Sustentável do Rio Grande do Sul (Lei Estadual nº 12.861/2007)

Programa Estadual de Contratações Públicas Sustentáveis no âmbito da Administração Pública Estadual (Decreto Estadual nº 51.771/2014)

Lei da Oferta de Alimentação Saudável e Adequada para Todos os Usuários de Serviços de Alimentação Públicos (Lei Estadual 13.845/2011)

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ANEXOS

ANEXO 1 – Justificativa da Proposta de Protocolo de Intenções (23.04.2020);

ANEXO 2 – Proposta de Protocolo de Intenções (23.04.2020);

ANEXO 3 – Documentos do CONSEA-RS – Relatório nº 02/2020 da Câmara Técnica de

Povos e Comunidades Tradicionais (03.04.2020), Nota Técnica sobre PAA Estadual (08.04.2020) e Recomendação CONSEA-RS nº 03 (15.04.2020);

ANEXO 4 – Documentos do FONSANPOTMA – Memória da 1ª Reunião entre

FONSANPOTMA, SOMARI, FRACAB e Secretaria de Trabalho e Assistência Social (STAS) (17.04.2020); Memória da 2ª Reunião entre entidades representantes de Povos Tradicionais de Matriz Africana, Comunidades Remanescentes Quilombolas e STAS e Secretaria de Justiça Social e Direitos Humanos (08.05.2020) e fotos da reunião;

ANEXO 5 – Nota informativa do cadastro de Povos Tradicionais de Matriz Africana em

situação de fome na Região Metropolitana no período entre 28/03/2020 a 07/05/2020 (08.05.2020);

ANEXO 6 – Ofícios solicitando doações de cestas básicas;

ANEXO 7 – Recomendação do Conselho Nacional de Saúde nº 034 sobre medidas para

garantir uma produção sustentável, distribuição e doação de alimentos, com respeito à natureza e aos direitos dos agricultores familiares, povos indígenas e povos e comunidades tradicionais (Item Governos Estaduais e Municipais, alínea 3) (07.05.2020);

ANEXO 8 – Carta da antiga autoridade pública do governo central, datada de 1889 declarando

as finalidades e objetivos do processo de inclusão social, indenização e acesso à terra;

ANEXO 9 – Guia para Mapeamento dos Povos Tradicionais de Matriz Africana publicado

pelo Ministério da Justiça e Cidadania, Secretaria Especial de Políticas de Promoção da Igualdade Racial (2016);

ANEXO 10 – Guia alimentar para a população brasileira, 2. ed. atualizada [versão eletrônica]

Brasília: Ministério da Saúde (2019);

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NOTÍCIAS

BRASIL DE FATO. Consea-RS propõe ações de combate à fome durante pandemia do coronavírus. Ampliação de políticas públicas essenciais e manutenção de espaços de obtenção de

alimentos estão entre as sugestões. Por Stela Pastore, Porto Alegre, 26 de Março de 2020 às 11:15.

https://www.brasildefators.com.br/2020/03/26/consea-rs-propoe-acoes-de-combate-a-fome-durante-pandemia-do-coronavirus

BRASIL DE FATO. A fome em meio à pandemia chega nas comunidades de matriz africana do RS. Enquanto o presidente da República propaga o jejum religioso para combater o coronavírus,

comunidades sofrem a fome real. Por Fabiana Reinholz, Porto Alegre, 05 de Abril de 2020 às 17:24.

https://www.brasildefators.com.br/2020/04/05/a-fome-em-meio-a-pandemia-chega-nas-comunidades-de-matriz-africana-do-rs

O SUL. “O desafio é ter recursos e competência para evitar a fome”, diz prefeito de Porto Alegre. Por Redação O Sul | 9 de abril de 2020. https://www.osul.com.br/o-desafio-e-ter-recursos-e-competencia-para-evitar-a-fome-diz-o-prefeito-de-porto-alegre/

UFRGS. “Ou morre pelo vírus ou morre de fome”, afirma catador sobre desamparo em Porto Alegre. Por Fernanda da Costa, 16 de abril de 2020. https://www.ufrgs.br/jornal/ou-morre-pelo-virus-ou-morre-de-fome-afirma-catador-sobre-desamparo-em-porto-alegre/

BRASIL DE FATO. Defensoria ajuíza ação para garantir alimentos a comunidades quilombolas no RS. Ação civil pública com tutela de urgência foi protocolada no domingo (19) pelo defensor

público Gabriel Saad Travassos. Por Redação, Porto Alegre, 23 de Abril de 2020 às 14:09.

https://www.brasildefators.com.br/2020/04/23/defensoria-ajuiza-acao-para-garantir-alimentos-a-comunidades-quilombolas-no-rs

GAÚCHA ZH. "Tem morador vivendo de maracujá e copo de água para enganar a fome", conta líder comunitária do Morro da Polícia. Nesta quinta-feira, 120 cestas básicas foram entregues à associação de mulheres da região. https://gauchazh.clicrbs.com.br/porto-alegre/noticia/2020/04/tem- morador-vivendo-de-maracuja-e-copo-de-agua-para-enganar-a-fome-conta-lider-comunitaria-do-morro-da-policia-ck9d0zzeq00et017njzlgedgl.html

BRASIL DE FATO. “É preciso garantir a soberania alimentar dos povos originários e tradicionais”. Afirmação é da coordenadora do FONSANPOTMA em documento ao governo gaúcho

para cooperação por segurança alimentar. Fabiana Reinholz, Porto Alegre, 30 de Abril de 2020 às

19:20. https://www.brasildefators.com.br/2020/04/30/e-preciso-garantir-a-soberania-alimentar-dos-povos-originarios-e-tradicionais

CANAL RURAL. ABATE EMERGENCIAL: Descarte de 100 mil aves da BRF em Lajeado (RS) acontece nesta segunda. Após paralisação no frigorífico, empresa afirma que a medida acontece

devido ao peso atingido pelos animais, que impossibilita procedimento na indústria. 18 de maio de

2020 às 10h30 Por Canal Rural.

Referências

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