PERSPECTIVAS NO CÁLCULO DA
RENDA FAMILIAR NOS
BENEFÍCIOS ASSISTENCIAIS
Jéssica C. de Jesus Gregoli
Representante Regional do IAPE no Litoral Norte de SP Especialista em Direito Previdenciário e Direito Tributário Responsável Regional de SP da G&P Soluções Fiscais Empresariais
DO BENEFÍCIO DE PRESTAÇÃO CONTINUADA DE
ASSISTÊNCIA SOCIAL
Previsão Legal – Base Fundamental
O art. 203, V, da CFRB/88:
"a garantia de um salário mínimo de benefício mensal à pessoa portadora de deficiência e ao idoso que comprovem não possuir
meios de prover a própria manutenção ou de tê-la provida por sua família, conforme dispuser a lei".
DO BENEFÍCIO DE PRESTAÇÃO CONTINUADA DE
ASSISTÊNCIA SOCIAL
Previsão Legal – Base Fundamental
A Lei nº 8.742/93 – Lei Orgânica da Assistência Social (LOAS)
regulamenta o referido dispositivo constitucional, estabelecendo o
enquadramento em uma condição - dentre duas possíveis - e
dois pressupostos para a obtenção do referido benefício.
DO REQUISITO SÓCIO-ECONÔMICO/RENDA
Art. 20, caput c/c §3º da Lei nº 8.742/93:
A LOAS prevê que o BPC é devido àquele que comprovar:
"não possuir meios de prover a própria manutenção nem de tê-la
provida por sua família", sendo que "considera-se incapaz de prover a
manutenção da pessoa com deficiência ou idosa a família cuja renda
mensal per capita seja inferior a 1/4 (um quarto) do salário-mínimo“.
DO BENEFÍCIO DE PRESTAÇÃO CONTINUADA DE
ASSISTÊNCIA SOCIAL
Previsão Legal – Base Fundamental
CONDIÇÃO Pessoa com deficiência
ou Idosa
PRESSUPOSTO COMUM requisito sócio-econômico
DO BENEFÍCIO DE PRESTAÇÃO CONTINUADA DE
ASSISTÊNCIA SOCIAL
BPC é gênero
Tendo suas espécies:
PcD
não há idade mínima;
Renda per capita
Idosa
65 anos ou mais;
Renda per capita
DO REQUISITO SÓCIO-ECONÔMICO/RENDA
1. Análise objetiva da miserabilidade da renda familiar per capita
inferior a ¼ do salário mínimo: presunção absoluta de miserabilidade
Renda como requisito enquadramento inferior Presunção
OBJETIVO de miserabilidade a ¼ do s.m per capita ABSOLUTA
Ou seja, tanto o INSS quanto o Judiciário devem considerar o cumprimento deste requisito de plano.
(TRF4, 5010175-57.2017.4.04.7102, TERCEIRA SEÇÃO,
DO REQUISITO SÓCIO-ECONÔMICO/RENDA
Nesse sentido, o TRF4ª Região fixou, no IRDR 12, a seguinte tese:
PROCESSUAL CIVIL. PREVIDENCIÁRIO. TRF4. IRDR 12. [...] ART. 20, § 3º, DA LEI 8.742/93. PRESUNÇÃO ABSOLUTA DE MISERABILIDADE.
3. Tese jurídica: o limite mínimo previsto no art. 20, § 3º, da Lei 8.742/93
("considera-se incapaz de prover a manutenção da pessoa com deficiência ou idosa a família cuja renda mensal per capita seja inferior a 1/4 (um quarto) do
salário-mínimo") gera, para a concessão do benefício assistencial, uma presunção absoluta de miserabilidade.
(TRF4 5013036-79.2017.4.04.0000, TERCEIRA SEÇÃO, Relator PAULO AFONSO BRUM VAZ, juntado aos autos em 22/02/2018)
DO REQUISITO SÓCIO-ECONÔMICO/RENDA
MAS.. e se a renda estiver entre
¼
a
½
s.m per capita?
Renda como requisito enquadramento entre Presunção SUBJETIVO de miserabilidade ¼ a ½ s.m per capita RELATIVA
DO REQUISITO SÓCIO-ECONÔMICO/RENDA
Fundamento legal: STF – REPERCUSSÃO GERAL – TEMA 27:
“É inconstitucional o §3º, do art. 20, da Lei 8.742/93, que
estabelece a renda familiar mensal per capita inferior a um quarto
de salário mínimo como requisito obrigatório para concessão do
benefício assistencial de prestação continuada previsto no art.
203, V, da Constituição”
(leanding case: RE 567985, Tribunal Pleno, Dje 03.10.2013)
HOJE é pacífico que a renda para fins de BPC poderá ser de até
½ salário mínimo per capita.
DO REQUISITO SÓCIO-ECONÔMICO/RENDA
2. Composição da renda familiar
2.1 - Aplicação analógica do disposto no parág. único do art. 34 do
Estatuto do Idoso (Lei nº 10.741/2003)
“Aplica-se analogicamente o disposto no parágrafo único do art. 34 do Estatuto do Idoso (Lei nº 10.741/2003) a
todos os benefícios de valor mínimo
(igual a um salário mínimo)
, de natureza assistencial ouprevidenciária, recebidos por idoso (maior de 65 anos) e também por deficientes, conforme uniformizado pelo STJ e pelo STF, de
forma que tais
benefícios e o respectivo titular ficam excluídos da
composição da renda e do grupo familiar
para fins de percepção do benefício assistencial de que trata a Lei nº 8.742/1993.” [...]DO REQUISITO SÓCIO-ECONÔMICO/RENDA
Exempl
Grupo familiar: Para fins de cálculo da renda per capita:
-> recebe BPC IDOSO
-> não tem renda -> não tem renda
-> tem renda 1 s.m -> tem renda de 1 s.m
DO REQUISITO SÓCIO-ECONÔMICO/RENDA
Decidido em sede de Recurso Repetitivo pelo STJ:
"em respeito aos princípios da igualdade e da razoabilidade,
deve ser
excluído do cálculo da renda familiar per capita qualquer
benefício de valor mínimo recebido por maior de 65 anos,
independentemente se assistencial ou previdenciário
,aplicando-se, analogicamente, o disposto no parágrafo único do art. 34 do Estatuto do Idoso", tendo em vista que "o entendimento de que somente o benefício assistencial não é considerado no cômputo da renda mensal per capita
desprestigia o segurado que contribuiu para a Previdência Social e, por isso, faz jus a uma aposentadoria de valor mínimo, na medida em que este tem de compartilhar esse valor com seu grupo familiar." [...]
DO REQUISITO SÓCIO-ECONÔMICO/RENDA
Exemplo
Grupo familiar: Para fins de cálculo da renda per capita:
-> recebe AP IDADE/ TC de 1 s.m
-> não tem renda -> não tem renda
-> tem renda 1 s. -> tem renda 1 s.m
DO REQUISITO SÓCIO-ECONÔMICO/RENDA
Decidido também em sede de Recurso Repetitivo pelo STJ:
“ao deficiente deve ser dado tratamento isonômico com o idoso, de modo que, para fins de recebimento do benefício de prestação continuada de que trata a Lei nº 8.742/1993, também deve ser excluído do cálculo da renda
da família o benefício de valor mínimo recebido por membro do grupo familiar deficiente.
Caso Prático 1
“Relativamente à renda familiar, no caso em tela, vê-se que a renda do grupo familiar do agravante, composto apenas por ele e por sua genitora, advém da
aposentadoria por idade rural que esta, de 82 anos de idade, recebe.
Ocorre que deve ser excluído do cálculo da renda familiar per capita o valor auferido por idoso com 65 anos ou mais a título de benefício assistencial ou benefício previdenciário de renda mínima, conforme o decidido pelo STF, no julgamento do Recurso Extraordinário 580.963/PR, em 17/04/2013, com repercussão geral.
Destarte, a renda da genitora do agravante, no valor de um salário
mínimo, deve ser excluída do cálculo da renda familiar.
[...] à época a Autarquia Previdenciária negou o benefício ao requerente tão
somente em razão da renda per capita ser superior ao limite de 1/4 do salário mínimo.”
Caso Prático 2
EMENTA: AGRAVO DE INSTRUMENTO. BENEFÍCIO ASSISTENCIAL. IMPLANTAÇÃO DO BENEFÍCIO. IRREVERSIBILIDADE. MISERABILIDADE CONFIGURADA. EXCLUSÃO DO
CÁLCULO DA RENDA FAMILIAR PER CAPITA. [...]
O STJ relativizou o critério econômico previsto na legislação, admitindo a aferição da miserabilidade da pessoa deficiente ou idosa por outros meios de prova que não a renda per capita, consagrando os princípios da dignidade da pessoa humana e do livre convencimento do juiz. [...]
Deve ser desconsiderado o benefício previdenciário de valor superior ao mínimo, até o limite de um salário mínimo, bem como o valor auferido a título de benefício previdenciário por incapacidade ou assistencial em razão de deficiência, independentemente de idade.
(TRF4, AG 5005102-02.2019.4.04.0000, TURMA REGIONAL SUPLEMENTAR DO PR, Relator LUIZ FERNANDO WOWK PENTEADO, juntado aos autos
Não cabe por aplicação analógica do art. 34 do Estatuto do Idoso, se pretender excluir o valor
de um salário mínimo de benefício que não seja de valor mínimo,
conforme já
uniformizado pela TRU da 4ª Região:
"INCIDENTE DE UNIFORMIZAÇÃO DE JURISPRUDÊNCIA. BENEFÍCIO ASSISTENCIAL.
BENEFÍCIO PREVIDENCIÁRIO DE IDOSO. VALOR SUPERIOR AO SALÁRIO-MÍNIMO. NÃO EXCLUSÃO. [...]
1. Não se conhece de pedido de uniformização quando o acórdão recorrido é no mesmo sentido do entendimento já fixado pela TRU: Para o fim de concessão de benefício assistencial, o
disposto no parágrafo único do art. 34 do Estatuto do Idoso (Lei nº 10.741/2003) NÃO é
analogicamente aplicável a benefício previdenciário de valor superior ao mínimo, NÃO AUTORIZANDO A EXCLUSÃO DO VALOR DE UM SALÁRIO MÍNIMO DE BENEFÍCIO QUE NÃO SEJA DE VALOR MÍNIMO [...]
(TRU da 4ª Região, IUJEF nº 5006824-64.2012.404.7001, Rel. Juiz Federal Daniel Machado da Rocha, juntado
DO REQUISITO SÓCIO-ECONÔMICO/RENDA
A TRU da 4ª Região UNIFORMIZOU que:
“a aplicação analógica do disposto no parágrafo único do art.
34 do Estatuto do Idoso não impede a exclusão de mais de
um benefício assistencial ou previdenciário de valor mínimo
recebido por diferentes integrantes idoso(s) e/ou deficiente(s)
do grupo familiar.”
(TRU da 4ª Região, IUJEF nº 0001030- 84.2009.404.7056, Rel. Juiz Federal José Antonio Savaris, D.E. 30.03.2011; e IUJEF nº 0001021-78.2007.404.7061/PR, Rel. Juíza Federal Luísa Hickel Gamba, D.E. 29.02.2012).
CASO PRÁTICO 2
“O grupo familiar é composto por 5 pessoas:
i) o recorrente, Mário de 66 anos de idade;
ii) Maria Ignês de 62 anos de idade a qual recebe benefício previdenciário por idade urbana no valor de um salário mínimo;
iii) Joseilton de 41 anos de idade o qual recebe benefício assistencial ao deficiente por possuir doenças psiquiátricas e neurológicas (epilepsia), também no valor de um salário mínimo.
iv) Joelene, filha do requerente que permanece em casa cuidando dos familiares e v) Carlos de 8 anos de idade, neto do requerente.
A renda da esposa do recorrente e do seu filho, ambos no valor de um salário mínimo, devem ser excluídos do cálculo da renda familiar, juntamente com a exclusão dos dois componentes familiares.
DO REQUISITO SÓCIO-ECONÔMICO/RENDA
2.2 - Grupo Familiar: composição
A partir da alteração introduzida em 07/07/2011, a LOAS deixou de utilizar a noção de
família prevista no art. 16 da Lei nº 8.213/91, passando a trazer no §1º do art. 20 da Lei
8.742/93 a sua própria definição de família:
Art. 20. § 1º Para os efeitos do disposto no caput, a família é composta pelo requerente, o cônjuge ou companheiro, os pais e, na ausência de um deles, a
madrasta ou o padrasto, os irmãos solteiros, os filhos e enteados solteiros e os menores tutelados, desde que vivam sob o mesmo teto. (Redação dada pela Lei nº 12.435, de 2011)
Ou seja, depreende-se que:
filho ou filha casado(a), genro/nora e filhos havidos desta união formam grupo familiar DISTINTO, mesmo que morando sob o mesmo teto!
DO REQUISITO SÓCIO-ECONÔMICO/RENDA
2.3 - Verbas que não integram a composição da renda familiar
Conforme Jurisprudências do TRF da 4ª Região:Os gastos que podem ser DEDUZIDOS da renda mensal familiar são aqueles que envolvem a compra de medicamentos de uso contínuo,
fraldas e/ou outros acessórios de uso contínuo não fornecidos pelo SUS, alimentação especial, fisioterapeuta, cuidador, despesas com tratamento necessário de saúde não realizado pelo SUS (exceto os
de cunho eletivo), tudo devidamente comprovado, inclusive
comprovando-se a falta de acesso à medicação pela Farmácia Popular.
DO REQUISITO SÓCIO-ECONÔMICO/RENDA
“Nesse sentido, os cuidados necessários com a parte autora, em
decorrência de sua deficiência, incapacidade ou avançada idade,
que acarretarem gastos - notadamente com medicamentos,
alimentação especial, fraldas descartáveis, tratamento médico,
psicológico e fisioterápico, entre outros -, configuram despesas
que podem ser consideradas na análise da condição de risco
social da família do demandante.”
(APELREEX nº 0001612-04-2017.404.9999, TRF/4ª Região, 6ª Turma, Rel. Des. Federal Salise Monteiro Sanchotene, D.E. de 9-6-2017).
CASO PRÁTICO 3
II – COMPOSIÇÃO FAMILIAR: Autora: Rafaela, 9 anos de idade. Mãe: 41 anos, faz bicos como faxineira diarista, recebendo cerca de R$ 400,00 por mês. Pai: Paulo, 44 anos, Trabalha com salário líquido de R$ 1.100,00 por mês. Irmão: Lucas, 3 anos de idade.
III – HISTÓRICO E CONTEXTUALIZAÇÃO: Rafaela, [...] Diagnosticada com Transtorno de espectro do autismo de grau leve/moderado com bom prognóstico evolutivo (CID F84), [...]
VI – RENDA PER CAPTA : RECEITAS: R$ 1.800,00 (salário do pai - comprovado) e R$ 400,00 (mãe
– declarado).
Total: R$ 2.200,00.
Despesas DEDUTÍVEIS: Medicamentos: R$ 70,00 + os fornecidos pela rede. Van escolar: R$ 200,00.
Transporte de tratamento: R$ 272,00. Gasto com tratamento (objetos de T.O): R$ 70,00. Total R$
612,00.
Renda per capita familiar: R$ 395,00.
VII – CONSIDERAÇÕES E CONCLUSÕES: Através da visita domiciliar foi possível observar que a família passa por
dificuldade econômica, uma vez que a renda familiar é pequena, e com dois filhos pequenos, os gastos são grandes no tratamento, o que a torna vulnerável economicamente.
Posto isso, julgo PROCEDENTE [...]
CASO PRÁTICO 4
a – grupo familiar: autora Margarete, 33 anos, sérios problemas de saúde; esposo Sr. Elizeu, 35 anos, motorista, renda mensal líquida R$1.800,00; filho Elizandro, 17 anos, empacotador junior, renda mensal líquida R$ 588,40; filha Daniele, 10 anos, estudante.
Total renda liquida mensal R$ 2.388,40.
d – despesas dedutíveis: medicamentos conseguem no SUS, mesmo assim
gastam aproximadamente – R$ 96,00; transporte de tratamento – R$ 150,00; tratamento odontológico Margarete – R$ 50,00; alimentação especial – R$ 140,00. Total: R$ 436,00;
Renda per capita R$ 488,10. (inferior a ½ salário mínimo)
A propósito, a eventual percepção de recursos do Programa Bolsa Família [...] não só não impede a percepção do benefício assistencial do art. 203, V, da Constituição Federal, como constitui prova indiciária acima de qualquer dúvida razoável de que a unidade familiar se encontra em situação de grave risco social. [...]
Portanto, deve ser reconhecido o direito ao benefício assistencial [...]
3. Considerações Finais
A desconsideração de outros fatores (de tratamento), comprovará a não observância dos princípios constitucionais diretrizes da Assistência Social e direitos à dignidade. Há de se observar a dignidade PREVÊ a busca por tratamento de saúde adequado à deficiência, limitação, necessidade individual.
Fica LATENTE A VIOLAÇÃO CONSTITUCIONAL tanto pela Autarquia (INSS) quanto pelo Judiciário no caso de considerar para fins de abatimento apenas os gastos com medicamentos e desconsiderar os demais gastos com o tratamento de saúde (fisioterapia, psicólogo, psicopedagoga, cuidador, etc) no momento de realizar o cálculo da renda per capita.
3. Considerações Finais
Assim, é cristalino a necessidade de flexibilizar o critério de
miserabilidade, pois tal exigência de limite objetivo de renda NEGA
E NEUTRALIZA a materialização dos direitos fundamentais e
sociais protegidos constitucionalmente à grande parcela da
população que se encontra logo acima do limite exigido, mas possui
situações específicas de vulnerabilidade.
Grande parte dos requerentes de BPC ao realizar o abatimento
correto e equânime de todas as despesas com tratamento (e não
apenas medicamentos), passarão a se enquadrar no requisito
“No atual contexto social e político em que estamos,
há a extrema necessidade de nós, juristas,
buscarmos a garantia e efetivação dos direitos e
garantias sociais à camada mais vulnerável e que
continua em situação de nítida desigualdade:
os deficientes e os idosos.”
MUITO OBRIGADA!
@advocacialegitima