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A Efetividade da Lei Maria da Penha e o Combate à Violência Doméstica

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Academic year: 2021

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UNIVERSIDADE DO SUL DE SANTA CATARINA SANDRA MARA PEGORARO TOSCAN

A EFETIVIDADE DA LEI MARIA DA PENHA E O COMBATE À VIOLÊNCIA DOMÉSTICA

Herval d’Oeste 2017

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SANDRA MARA PEGORARO TOSCAN

A EFETIVIDADE DA LEI MARIA DA PENHA E O COMBATE À VIOLÊNCIA DOMÉSTICA

Monografia apresentada ao Curso de Direito da Universidade do Sul de Santa Catarina, como requisito parcial para a obtenção do título de Bacharel em Direito.

Orientador: Prof.João Batista da Silva, Msc,

Herval d’Oeste 2017.

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SANDRA MARA PEGORARO TOSCAN

A EFETIVIDADE DA LEI MARIA DA PENHA E O COMBATE À VIOLÊNCIA DOMÉSTICA

Este Trabalho de Conclusão de Curso foi julgado adequado à obtenção do título de bacharel em Direito e aprovado em sua forma final pelo Curso de Direito da Universidade do Sul de Santa Catarina.

Herval d’ Oeste, 19 de junho de 2017.

__________________________________________ Profº João Batista da Silva , Msc.

Universidade do Sul de Santa Catarina

_________________________________________ Profa. Cristiane Goulart Cherem, Msc. Universidade do Sul de Santa Catarina

_________________________________________ Profª. Andreia Carine Cosme, Msc.

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TERMO DE ISENÇÃO DE RESPONSABILIDADE

A EFETIVIDADE DA LEI MARIA DA PENHA E O COMBATE À VIOLÊNCIA DOMÉSTICA

Declaro, para todos os fins de direito, que assumo total responsabilidade pelo aporte ideológico e referencial conferido ao presente trabalho, isentando a Universidade do Sul de Santa Catarina, a Coordenação do Curso de Direito, a Banca Examinadora e o Orientador de todo e qualquer reflexo acerca desta monografia.

Estou ciente de que poderei responder administrativa, civil e criminalmente em caso de plágio comprovado do trabalho monográfico.

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SANDRA MARA PEGORARO TOSCAN

AGRADECIMENTOS

Primeiramente agradecer a Deus, por ter concedido sabedoria, saúde, persistência e determinação na realização deste sonho.

Agradecer ao meu marido Claudimar Toscan, companheiro que esteve sempre do meu lado e me apoiando incondicionalmente.

Aos meus pais Domingos e Antonieta Pegoraro pelo apoio na realização deste objetivo e às minhas filhas Naiara Cristina e Nicoli Sofia, por acompanharem e fazerem parte desta caminhada e que por muitas vezes ficaram sem a presença de sua mãe.

Agradecer também a uma grande amiga Rosangela Zarpelon que me indicou o curso em virtude de já estudar nesta instituição e no mesmo curso.

Agradecer ao Professor orientador, João Batista da Silva pela orientação, acompanhamento e incentivo nesta jornada e a todos os professores desta Universidade que acreditaram neste processo de ensino à distância e que muito contribuíram para o crescimento intelectual, pessoal e profissional de todos nós.

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RESUMO

Esta monografia tem como objeto o estudo da efetividade da Lei Maria da Penha, Lei nº 11.340 de 07 de agosto de 2006, como instrumento de demonstrar as formas de combate à violência doméstica contra a mulher. Através da demonstração de dados oficiais governamentais, pretende-se averiguar a violência doméstica praticada contra a mulher, como se dá e os mecanismos desenvolvidos pelo Estado no combate a este tipo de violência. A criação dessa legislação reflete um fenômeno de violência contra a mulher que vem sendo traçado historicamente desde a antiguidade até os dias atuais, destacando nesse processo as diferentes formas de violência impostas evidenciando tais desigualdades. Além disso, procura demonstrar o desenvolvimento significativo de ações na busca da igualdade entre homens e mulheres no contexto dos Direitos Humanos e da Constituição Federal de 1988. Enfatiza também, a função do Estado, da análise de dados realizados por órgãos oficiais, na busca de atender as vítimas por meio das políticas públicas implantadas. A técnica utilizada foi a pesquisa bibliográfica, sendo realizadas leituras, análises em artigos, dados e doutrinas que se expressam sobre o tema. E pretende-se concluir que a aplicação da LMP e seus mecanismos legais devam atender as milhares de mulheres que necessitam desse amparo para tornar suas vidas mais dignas e que tais ações sejam efetivadas e traduzidas em respeito e observação a seus direitos.

Palavras-chave: Mulher. Violência Doméstica. Dignidade Humana. Lei Maria da Penha.

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LISTA DE SIGLAS

CRFB/88 – Constituição da República Federativa do Brasil de 1988 LMP - Lei Maria da Penha

ONU - Organização das Nações Unidas

CEDAW - Convenção para a Eliminação de todas as Formas de Discriminação contra a Mulher

OPAS - Organização Pan-Americana de Saúde CF - Constituição Federal

DDM - Delegacia de Defesa da Mulher

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SUMÁRIO

1 INTRODUÇÃO ... 9

2 VIOLÊNCIA DOMÉSTICA CONTRA A MULHER ... 11

2.1 A VIOLÊNCIA DOMÉSTICA NO BRASIL... 15

2.2 OS TIPOS DE VIOLÊNCIA CONTRA A MULHER ... 21

2.2.1 Violência Física ... 21

2.2.2 Violência Psicológica ... 22

2.2.3 Violência Sexual ... 23

2.2.4 Violência Patrimonial ... 24

2.2.5 Violência Moral ... 26

2.3 CONSEQUÊNCIAS DA VIOLÊNCIA DOMÉSTICA ... 27

3 DIGNIDADE HUMANA E OS MECANISMOS DE PROTEÇÃO ÀS MULHERES . 29 3.1 DIREITOS HUMANOS ... 29

3.2 VIOLÊNCIA DOMÉSTICA E A CONSTITUIÇÃO DE 1998 ... 32

3.3 DIREITOS FUNDAMENTAIS NA CRFB/1988 ... 35

4 A EFETIVIDADE DA LEI MARIA DA PENHA ... 40

4.1 A ORIGEM DA LEI ... 40

4.2 FEMINICÍDIO E OBJETIVOS DA LEI MARIA DA PENHA ... 44

4.3 DADOS OFICIAIS GOVERNAMENTAIS SOBRE A LMP E INOVAÇÕES TRAZIDAS PELA LEI 11.340/2006 ... 47

4.4 ALTERAÇÕES OCORRIDAS NA LEGISLAÇÃO BRASILEIRA ... 53

4.5 COMPETÊNCIAS PARA PROCESSAR E JULGAR A VIOLÊNCIA DOMÉSTICA ... 56

4.6 MEDIDAS CAUTELARES ... 59

5 CONCLUSÃO ... 64

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1 INTRODUÇÃO

A violência contra a mulher é um problema grave mundial e se confunde com a própria história da instituição chamada família, reconhecido desde tempos remotos da Antiguidade até os dias atuais. A mulher inserida neste contexto desempenhou um papel limitado e na maioria das vezes é colocada em situação inferior ao do sexo oposto. As recorrentes notícias de agressões contra a mulher e inúmeros casos divulgados nos meios de comunicação, despertaram o interesse pelo tema, além das indagações surgidas com relação aos altos índices de violência contra a mulher que vêm ocorrendo de forma discriminatória, situação apresentada independente de classes sociais e afetando profundamente a estrutura familiar pelas relações impostas.

Nesse processo é preciso reconhecer os direitos de proteção garantidos por lei às vítimas de agressões e demonstrar à sociedade, dentre as demais alternativas, a efetividade da aplicação e proteção proporcionada pela Lei Maria da Penha – Lei nº 11.340/2006 (LMP) – esta que representa um marco em defesa da mulher, da família e do resgate de sua dignidade, visto que a violência sofrida pelas mulheres ocorre em suas diferentes manifestações e formas: física, psicológica, moral, equiparando-se à violação dos direitos humanos.

Sendo assim, no decorrer da realização do trabalho procurar-se-á demonstrar que a violência doméstica contra a mulher pode ser considerada uma questão histórica, cultural e um fenômeno que revela a desigualdade entre homem e mulher e que faz parte da realidade de muitos lares brasileiros. Para tanto se busca responder à seguinte questão: Com a entrada em vigor da LMP, criaram-se mecanismos para coibir e prevenir a violência doméstica contra as mulheres no Brasil e, portanto, pergunta-se: essa garantia legalmente instituída vem sendo efetivada com plenitude pelos órgãos competentes e responsáveis pela sua aplicação e execução?

O objetivo geral desta pesquisa é analisar os mecanismos de proteção criados pela Lei Maria da Penha para o enfrentamento desse tipo de violência sofrido pela mulher, tais como o aumento das penas aplicadas ao agressor e a ampliação dos canais de denúncias o que possibilita à Justiça a ampliação dos mecanismos legais.

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Quanto aos objetivos específicos estes visarão: investigar os tipos reconhecidos de violência doméstica e suas características principais, bem como os antecedentes históricos e o contexto cultural do fenômeno da violência doméstica contra mulher; evidenciar o que resultou na LMP e as características gerais da referida lei e ainda detalhar os mecanismos de proteção criados pela LMP e sua efetividade no enfrentamento da violência doméstica contra a mulher.

Com base no método dedutivo e na técnica de pesquisa bibliográfica por meio da análise de leis, doutrinas, artigos científicos, jurisprudências e dados oficiais disponibilizados, esta pesquisa virá estruturada em três capítulos centrais assim estabelecidos: o primeiro capítulo do presente trabalho terá a pretensão de apresentar o contexto histórico que determinou a violência doméstica contra a mulher, analisando conceitos e apresentando suas diferentes formas de manifestações.

No segundo capítulo a violência doméstica contra a mulher será evidenciada no contexto dos direitos fundamentais explícitos na Constituição Federal de 1988, bem como a violação dos direitos humanos e o direito à sua dignidade.

Já no terceiro capítulo, que constitui parte central da pesquisa, verificar-se-á a efetividade desse mecanismo legal de prevenção e repressão da violência doméstica contra a mulher, analisando alterações e conquistas com o objetivo de esclarecer tais questões. Buscará ainda destacar aspectos legais relevantes para a compreensão, prevenção e conscientização tanto de mulheres que sofrem com a violência doméstica como também de alerta àqueles responsáveis por elevarem esses índices, sejam eles maridos, companheiros ou namorados. E de modo geral a todos que se identificam com esta problemática social.

Por tratar-se de tema atual e relevante para a Academia e para a sociedade em geral pretende-se com a presente pesquisa contribuir de forma significativa para amenizar a violência doméstica contra a mulher, sem, contudo, esgotar este importante tema.

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2 VIOLÊNCIA DOMÉSTICA CONTRA A MULHER

A violência é uma constante na natureza humana. Desde o início da civilização este atributo parece acompanhar a humanidade. Nos tempos remotos, o homem era fortemente ameaçado pela violência dos grupos rivais em que predominava a “guerra de todos contra todos”, sentindo-se coagido a engendrar um sistema de regras e punições aplicáveis, geralmente pelo líder capaz de por fim à insegurança. “A violência é uma constante na natureza humana. Desde a aurora do homem e, possivelmente, até o crepúsculo da civilização, este triste atributo parece acompanhar passo a passo a humanidade, como lembrar, a cada ato em que reemerge no cotidiano, nossa paradoxal condição, tão selvagem quanto humana” (PORTO, 2007, p. 13).

Neste contexto também se identifica a desigualdade de gênero. Esta desigualdade de gênero que se apresenta desde os primórdios é perceptível ao longo dos tempos, principalmente daquela parte da história ocidental que conhecemos, onde a criação das formas estatais e jurídicas pouco ou nada melhorou a condição feminina. Conforme citada pelo artigo, Simone de Beauvoir, em seu discurso feminista, endossa a tolerância dessa cultura ao refletir sobre a submissão do feminino ao masculino nas relações humanas ao longo dos tempos (PINAFI, 2000).

A mulher sempre foi relegada ao segundo plano, discriminada e oprimida. Ao homem sempre coube o espaço público. A mulher foi confinada nos limites da família e do lar, o que ensejou a formação de dois mundos: um da dominação, externo e produtor. Outro da submissão, interno e reprodutor. Ambos os universos, ativo e passivo, criam polos de dominação e submissão. (VIANA Karoline & ANDRADE Luciana, 13) As sociedades primitivas sobreviveram e defendiam-se de ataques baseados na força física, sendo que as atitudes relacionadas à sobrevivência eram mais compatíveis com a força corporal do homem. Porém cabemos evidenciar que “o patriarcado é uma forma de organização social na qual as relações são regidas por dois princípios básicos: 1) as mulheres estão hierarquicamente subordinadas aos homens e, 2) os jovens estão hierarquicamente subordinados aos homens mais velhos. A supremacia masculina ditada pelos valores do patriarcado atribuiu um maior valor às atividades masculinas em detrimento das atividades femininas; legitimou o controle da sexualidade, dos corpos

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e da autonomia femininas; e, estabeleceu papéis sexuais e sociais nos quais o masculino tem vantagens e prerrogativas (Millet, 1970; Scott, 1995).

Para melhor compreender a violência aqui tratada, devemos fazer um breve estudo acerca da mulher inserida na cultura ocidental. Se para os gregos antigos e, igualmente, para Aristóteles o homem estava num nível de perfeição superior ao da mulher devido a sua maior capacidade intelectual, física e, deste modo, “espiritual”, nas sociedades modernas há tendências ou, melhor dizendo, sintomas decorrentes de tal concepção: a inversão de valores e/ou a ideologia feminina. Encontramos, não raro, tal ideologia e inversão de valores atrelados ao senso comum. Se, por um lado, sob a visão machista que herdamos de outrora, a mulher se apresenta como um ser frágil, intuitivo, sensível e, então, seria por natureza designada à maternidade e às atividades domésticas, sendo que assim ela deveria permanecer sob os cuidados de seu marido e de sua família, exercendo o “papel da mulher”; por outro, o próprio senso comum propõe, ainda, ideologicamente a inversão de valores ou a troca de papéis (ideologia feminina). (FRIAS, Daniel)

Essa concepção de inferioridade da mulher em relação ao homem teve como respaldo grandes pensadores da época, como o filósofo Aristóteles. Segundo ele, no que diz respeito à sexualidade dos indivíduos a diferença é indelével, pois, independente da idade da mulher, o homem sempre deverá conservar a sua superioridade (ARISTOTELES, 1998, p 33). Tal percepção do filósofo se embasou na noção de “ordem natural”, quer dizer, ele hierarquizou a natureza da alma, colocando o homem livre num plano superior ao da mulher que sofreria de uma carência e maturidade de espírito, sendo ela, portanto, incapaz de exercer qualquer outra função que não fosse a de obedecer ao seu marido, este o qual seria responsável por governar a família.

É possível perceber, então, que a mulher dessa época se comparada à atual era subjulgada em comparação aos homens daquele período, em diferentes aspectos: físicos, intelectuais, até mesmo aspectos biológicos eram desconhecidos. E é somente a partir do século XVIII que começaram a considerar diferenças anatômicas.

Num complexo e incluso processo iniciado há séculos, as mulheres têm sido submetidas a condições de dependência, subordinação, exclusão e discriminação, tanto na vida cotidiana e nas crenças sobre sua natureza inferior quanto nas leis e na estrutura da organização social (CASÉS, 1999).

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Ao restante dos homens, às mulheres, crianças e escravos, eram vetados os direitos civis e políticos, o que implicava na negação de decisão e interferência nos rumos da sociedade. (ALBERTO, LEITE & GOUVEIA, 2014).

É difícil reconhecer a mulher no período medieval, até mesmo pela inexistência de literatura, prestigiando-se a governança e a presença exclusiva do homem na sociedade. A política de disciplinação da mulher foi sendo imposta pela igreja, pela família e por outras instituições sociais, buscando definir o seu comportamento e espaços de atuação por meio de uma pretensa “natureza feminina” (SILVA, 2002).

E, portanto, nos discursos históricos dos períodos da idade clássica, da antiguidade e da idade media, fica evidenciado o desprestigio da mulher nos diversos campos e processos sociais, incluindo-se as relações jurídicas, como o direito das sucessões, obrigacionais e de família, e mais enfaticamente os direitos políticos (CAVALCANTI, 2007).

E foi através da Revolução Francesa (1789-1799) que se acendeu a esperança de igualdade pelos anúncios e promessas de que todos os indivíduos seriam “considerados os mesmos para os propósitos de participação política e representação legal” (SCOTT, 2015, p.15).

Na realidade tal direito não foi concebido a todas as pessoas e em síntese, a cidadania era negada a todos aqueles que, por diferença de classe social, raça e gênero não se identificassem como o homem branco de determinada classe social (GUIMARRÃES; ALVES, 2010).

Nos tempos subsequentes a realidade em relação à mulher não mudou muito. O capitalismo e o industrialismo não mudou muito a relação de subordinação da mulher em relação ao homem. No capitalismo, com o trabalho desenvolvido fora de casa, aos homens ficou dada esta função, e a desvalorização do trabalho doméstico, feito pela mulher, se intensificou. Ademais, foram as ideias propagadas a partir dos ideais revolucionários inspirados nas revoluções burguesas que começaram a despertar a luta por direitos de propriedade, de reforma do casamento e a liberdade sexual. Acreditava-se que quando a mulher pudesse votar, o faria a favor da correção das injustiças sofridas por ela (NYE, 1995).

E é durante o século XIX até o século XX que se iniciam uma série de ideias feministas na busca da igualdade de tratamento para homens e mulheres, bem

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como direitos e privilégios. Destacam-se dois grandes escritores desse movimento: Jonh Stuart Mill e Harriet Taylor – a base dos movimentos feministas (NYE, 1995).

Mas é no século XX que notamos uma verdadeira mudança quanto ao levantamento e estudos sobre a situação da mulher e suas relações neste contexto. Em meados de 1970, incluem-se inúmeros debates sobre o combate à violência contra a mulher e as diferentes formas de violência por elas sofridas, entre elas: a doméstica, a política e a social, até mesmo a praticada contra as prostitutas e por questões de raça, eram temas abordados por esses grupos. (SANTOS, 2010).

A partir dos anos oitenta, a violência doméstica em especial a conjugal, passou a ser discutida pelos movimentos principalmente pelos julgamentos judiciais de absolvição de maridos que violentavam suas esposas, pelo argumento de legitima defesa à honra ( SANTOS, 2010).

Posteriormente, iniciam-se inúmeros debates acerca das diferenças e desigualdades de gênero. (SCOTT, 1995, p.11), destaca que, na década de 80, partindo da análise das várias concepções relativas a gênero, propõe uma nova definição de gênero que se apresenta: uma de que o “gênero é um elemento constitutivo de relações sociais baseado nas diferenças percebidas entre os sexos” e outra que o “gênero é uma forma primeira de significar as relações de poder”.

Segundo a historiadora Joan Scott (1995), as feministas americanas começaram a usar o conceito de gênero para se referir à organização social entre os sexos e só mais tarde passaram a usá-lo para enfatizar o caráter fundamentalmente social das distinções fundadas sobre sexo e rejeitar o determinismo biológico implícito nos termos "sexo" ou "diferença sexual". O termo "gênero" torna-se, antes, uma maneira de indicar "construções culturais" - a criação inteiramente social de ideias sobre papéis adequados aos homens e às mulheres. Trata-se de uma forma de se referir às origens exclusivamente sociais das identidades subjetivas de homens e de mulheres. "Gênero" é, segundo essa definição, uma categoria social imposta sobre um corpo sexuado. Com a proliferação dos estudos sobre sexo e sexualidade, "gênero" tornou-se uma palavra particularmente útil, pois oferece um meio de distinguir a prática sexual dos papéis sexuais atribuídos às mulheres e aos homens (Scott, 1995: 75).

O patriarcado indica o predomínio de valores masculinos, fundamentados em relações de poder. O poder se exerce através de complexos mecanismos de controle social que oprimem e marginalizam as mulheres. A

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dominação do gênero feminino pelo masculino costuma ser marcada (e garantida) pela violência física e/ou psíquica em uma situação na qual as mulheres encontram-se na posição mais fraca, encontram-sendo desprovidas de meios de reação efetivos. (SABADELL, 2005, p. 233).

Podemos identificar, portanto, que o sexo está associado à realidade biológica, enquanto que o gênero é toda construção social e histórica.

Segundo Grossi (2000), a discussão de gênero determina tudo que é social, cultural e historicamente definido e está em constante processo de ressignificação, em virtude das interações concretas entre indivíduos do sexo feminino e masculino. Nesse sentido, “a sexualidade é apenas uma das variáveis que configura a identidade de gênero, como os papéis de gênero e o significado social da reprodução” (GROSSI, 2000, p. 27).

Ao instituir o patriarcado (elemento inerente à dominação masculina, agregado ao domínio econômico do homem sobre a mulher), estudos passam a não mais designar as determinações e diferenças biológicas como elementos únicos e definidores da dominação do homem sobre a mulher, mas explicar a dominação como um fator social, histórico e cultural, reproduzido pelas gerações e apreendido desde a infância (SAFFIOTI, 2006).

Portanto, é a partir da mudança de ideias, desenvolvida pelas Revoluções Sociais que temos referenciado a grande mudança de pensamento onde o corpo deixa de ser objeto de poder para ser visto como direito do indivíduo e passa a ser determinante na busca de igualdades e direitos considerados essenciais tanto para homens como para as mulheres.

2.1 A VIOLÊNCIA DOMÉSTICA NO BRASIL

A Constituição Federal consagra o princípio da igualdade, e explicitamente ressalta a igualdade entre homens e mulheres (CF, art. 5º, I), inclusive no âmbito das relações familiares (CF, art. 226, §5º). E impõe ao Estado o dever de assegurar assistência à família e criar mecanismos de coibir a violência no âmbito de suas relações (CF, art.226, § 8º).

Para tanto se inicia uma verdadeira busca de direitos de igualdade e de proteção que deverão ser implantados no intuito de amenizar as desigualdades

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entre homens e mulheres e de forma que sejam desenvolvidos mecanismos de proteção eficazes.

A ONU traz garantias de proteção à mulher. Realiza no México, a I Conferência Mundial sobre a Mulher, e proclama no ano de 1975 o Ano Internacional da Mulher. Da Conferência resultou a CEDAW - A Convenção para a Eliminação de Todas As Formas de Discriminação contra a Mulher, em 1979. Tal Convenção visou a promover os direitos da mulher na busca da igualdade de gênero, bem como reprimir quaisquer discriminações contra ela. (PIMENTEL, p.58)

A II Conferência Mundial sobre a Mulher foi realizada em 1980, na Dinamarca, que avaliou o Plano elaborado pela I Conferência e incorporando outras preocupações como a questão do emprego, saúde, educação das mulheres. E a III Conferência Mundial, realizada em Nairóbi, no Quênia, em 1985 com o objetivo de avaliar os resultados da Década das Nações Unidas para a Mulher.( DIAS, Maria Berenise,2015 p. 39).

Mas foi a Conferência de Direitos Humanos das Nações Unidas, realizada em Viena, Áustria, em 1993, que definiu a violência contra a mulher como violação dos direitos humanos.( DIAS, Maria Berenise,2015 p. 39).

A Convenção Interamericana para Prevenir, Punir, Erradicar a Violência Doméstica – conhecida como Convenção de Belém do Pará foi adotada pela Assembleia Geral da Organização dos Estados Americanos OEA, em 1994. Neste documento conceitua a violência contra a mulher como: “Art. 1º - qualquer ação ou conduta baseada, no gênero, que cause morte, dano ou sofrimento físico, sexual ou psicológico à mulher, tanto no âmbito público como no privado”. A Convenção foi ratificada no Brasil em novembro de 1995 (DIAS, p. 39).

Da IV Conferência Mundial sobre a Mulher, realizada em Pequim, no ano de 1995, resultou a Plataforma de Ações que afirma a necessidade de se adotar um modelo de desenvolvimento centrado nas pessoas e não nos bens. Mas apesar de muitos esforços, somente em 1984, o Brasil subescreveu a Convenção sobre a Eliminação de Todas as Formas de Violência contra as Mulheres. Como sinaliza Flávia Piovesan, foi a partir do processo de democratização que o país revelou “a consciência ética contemporânea, compartilhada pelos Estados, na medida em que traduzem o consenso internacional acerca de parâmetros protetivos mínimos relativos aos direitos humanos: o mínimo ético irredutível”. (PIOVESAN, Flavia, p. 8).

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No Brasil as primeiras manifestações a favor das mulheres se iniciaram em 1972 surgiu na cidade de São Paulo um grupo organizado de feministas. Pouco a pouco temas do feminino e do feminismo ocuparam fóruns nacionais de debate, como por exemplo, o realizado em Belo Horizonte em 1975. No mesmo ano, surgiu no Rio de Janeiro o Centro da Mulher Brasileira, e em São Paulo, realizou-se o encontro para Diagnostico da Mulher Paulista; surgiu o Movimento Feminino pela Anistia e foi lançado o Jornal Brasil Mulher, que circulou de 1975 a março de 1980. Entre 1976 e 1978, circulou o Nós Mulheres, e em março de 1981 é lançado o Mulherio, que foi leitura obrigatória das feministas, por mais de cinco anos. (RODRIGUES, Valeria Leoni, p. 7)

A primeira legislação autorizando a abertura de escolas públicas destinadas às mulheres foi na data de 1827, até então as opções eram os conventos, raras escolas particulares nas casas de professoras, ou ensino individualizado, todos se ocupando apenas com as habilidades domésticas. (DUARTE, 2009.).

Desse modo as mulheres do século XIX romperam um ciclo de submissão e ignorância imposta pelos homens, e através da educação, tomaram para si, a empreitada de estender o conhecimento as demais companheiras, alcançando o direito à leitura e escrita mas também ao acesso a vida pública, como professoras. (MOREIRA, 2003.p.267).

As manifestações começam a surgir em forma de passeatas no Rio de Janeiro e São Paulo. Como era esperado, o movimento encontrou resistência pela sociedade, a obtenção de garantias com base na lei, a conquista dos novos direitos de participação, não implicaram em reformulação no âmbito das obrigações familiares. A estrutura hierárquica da família continuou não sendo questionada e os direitos políticos haviam sido reclamados em nome de um melhor desempenho dos papeis de esposa e mãe. E o direito ao voto não havia penetrado nas classes trabalhadoras. (COSTA, p. 47-52).

E é somente em 1932 que as mulheres alcançam o direito ao voto na conjuntura nacional. Paralelamente a luta pelo voto, a onda feminismo destaca também a luta operária feminista através de reivindicações no âmbito trabalhista como a diminuição da jornada de trabalho, fim do trabalho noturno para mulheres e crianças e a equiparação salarial para trabalhos iguais, o que levou às primeiras greves encabeçadas por mulheres costureiras e tecelãs. (TELES, 2003. p.55).

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A partir de 1945, no período pós-guerra, o país entrava num processo de redemocratização. Surgem aí movimentos de mulheres que se mobilizavam pela anistia e pela democracia, cuja proposta principal era que a mulher participasse da consolidação da democracia no Brasil e se esforçasse pela conquista de igualdade de direitos em todos os ramos da atividade profissional, administrativa, cultural e política. Houve mobilizações em prol dos direitos da mulher, a proteção à infância, a defesa pela paz. A partir de 1953, as lutas femininas no Brasil passaram a usar a Declaração de Direitos da Mulher, como base. Tinha como alicerce o cumprimento das leis trabalhistas e sua extensão às trabalhadoras do campo bem como a igualdade de direitos civis e políticos para a mulher. (TABAK, 1983. P.121-122).

Mas alguns retrocessos iriam iniciar. Com a implantação da ditadura militar no Brasil, as principais associações femininas desapareceram. E ao longo de todo o regime militar, sem oposição a ele, várias mulheres acabaram se mobilizando em manifestações e organizações clandestinas muitas vezes na condição de mães, esposas ou irmãs de prisioneiros políticos ou de desaparecidos. (COLLINS, 1997).

É a partir dos anos 70 que temos, por influência das feministas americanas e europeias, movimentos liberais invocando ideias de liberdade e igualdade. E a busca se intensifica entre os anos de 1976 a 1980 com uma questão de grande repercussão envolvendo direitos feminista, encabeçado pelo promotor Roberto Lyra denominado “Quem ama não mata”. Considerado grande avanço na questão sobre homicídio passional, sendo tratado como homicídio privilegiado, derrubando a tese até então utilizado de legitima defesa da honra. Tendo como estopim a morte de Angela Diniz em 1976, por seu companheiro Doca Street que em 1979 foi absolvido, porém, através de mobilização social, Street foi submetido a novo júri e ao final condenado. (COSTA, 1998).

A Convenção Interamericana para Prevenir, Punir e Erradicar a Violência Doméstica foi adotada pela Assembleia Geral da Organização dos Estados Americanos – OEA, em 1994, e neste documento a violência doméstica é tratada como grave problema de saúde pública. E tal Convenção teve sua ratificação no Brasil em 27 de novembro de 1995, promulgada pelo presidente da república no ano seguinte (Decreto 1.973/96- (Assembleia Geral da Organização dos Estados Americanos em 06 de junho de 1994 - ratificada pelo Brasil em 27.11.1995).

Apesar de todo o esforço, movimentos sociais e a adesão a inúmeras formas de combate a violência doméstica contra a mulher, a lei propriamente dita e

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regulamentada só chega ao Brasil em 2006, resultado dos compromissos assumidos pelo país mediante acordos internacionais. Até porque a Lei Maria da Penha vem para regulamentar os direitos humanos assegurados a nível internacional, incorporados pelo Brasil através de seus decretos, de natureza constitucional, tornando-se o alicerce dos direitos principalmente àqueles estendidos às mulheres.

A Constituição Federal Brasileira de 1988incorpora aos direitos e garantias do seu texto original, os estabelecidos em decorrência de acordos e tratados internacionais.Desta forma, as Resoluções da Convenção de Belém do Pará e da CEDAW são também garantias constitucionais, como expressa o artigo 5º parágrafo 2º, da Constituição Federal: ‘Os direitos e garantias expressos nesta Constituição não excluem outros decorrentes do regime e dos princípios por ela adotados, ou dos tratados internacionais em que a República Federativa do Brasil seja parte’. (BRASIL, 2006, p. 15-16).

E em 2006 foi regulamentado o dispositivo constitucional contra a violência doméstica e familiar, em extinguir ou amenizar a violência doméstica contra a mulher, foi publicada a Lei Maria da Penha (Lei nº 11.340/06), E a partir da aplicação de determinadas leis é fundamental construir novas possibilidades. Nesse sentido, o conceito de violência doméstica adotado pela Lei ultrapassa a limitada noção dos crimes de lesão corporal de natureza leve ou ameaça prevista no Código Penal. Inscrevem-se outras categorias que ampliam o conceito de crime e essas passam a ser questionadas como ‘não jurídicas’. Igualmente, a ruptura dogmática entre as esferas civil e penal, com a criação de um juizado híbrido, sofre resistências, tanto de natureza teórica quanto prática. No primeiro caso, pelo questionamento dessa ruptura através do argumento da inconstitucionalidade e, no segundo, ao inscrever com razão e sensibilidade a nova lei de violência doméstica, o feminismo brasileiro demonstra que não está preso à dicotomia que fundou o pensamento moderno. Avançar no aperfeiçoamento da Lei significa continuar trilhando um caminho que possibilite a sujeitos de direitos cada vez mais complexos uma nova cidadania política. Sabe-se que isso não é uma tarefa fácil e que nem sempre temos soluções prontas para a complexa realidade em que vivemos. Reconhecer esse desconforto teórico já é um bom começo na difícil tarefa de aliar razão e sensibilidade. (Campos, 2006).

No Brasil, a existência de organizações e movimentos de mulheres possibilitou a constituição de um sujeito coletivo que alargou o campo democrático.

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Esse novo sujeito tem sido capaz de advogar pelo acesso e inovação na constituição de direitos; articular-se com outros movimentos sociais, na construção da cidadania cada vez mais inclusiva e respeitadora das diferenças; de imprimir novos paradigmas políticos e culturais e de monitorar o Estado e a sociedade no que diz respeito à compatibilidade entre as declarações de direitos e sua efetividade.O feminismo brasileiro constituiu-se, assim, desde seu início, em ator político, desenhando e lutando por uma agenda de políticas públicas voltadas para a inclusão das mulheres nos direitos de cidadania. Teve clareza de que políticas públicas implicam a existência de atores sociais capazes de mobilizar o Estado na geração de um conjunto de medidas que pressupõem certa permanência, coerência e articulação dos distintos poderes e esferas institucionais. A conquista e o avanço dessas ações envolvem pressão social e vontade política (BARSTED, 1994).

Depreende-se, assim, que os movimentos em defesa da mulher são considerados marcos na luta pela igualdade de direitos, que vem sendo detalhado por longas décadas no Brasil. E é através da participação ativa de mulheres na luta em defesa de seus direitos que mais adiante veremos os avanços sociais por elas conquistados. No processo de luta por direitos, as organizações e os movimentos de mulheres constituíram um campo de poder que tem sido decisivo para a manutenção dos direitos conquistados e para a possibilidade de conquista de novos direitos. Esse processo de luta por direitos, voltado para a eliminação de todas as formas de discriminação, incluindo a dominação masculina, apresentou nas últimas três décadas, um conjunto de avanços legislativos.

Tais justificativas estão fundamentadas nos costumes referentes à instituição familiar que sempre variaram através dos tempos. Acredita-se, no Brasil, que do ponto de vista histórico, a violência conjugal tem suas origens em uma sociedade escravocrata, constituída a partir da colonização portuguesa (SANTIAGO & COELHO, 2007)

E ainda seguindo os apontamentos, acredita-se que a violência é, então, o reflexo de um comportamento social aceito, porque embora atualmente existam normas jurídicas de proteção à mulher com severas medidas disponíveis, ainda se percebe que em muitos segmentos encontra-se legitimada a violência contra a mulher. Fato que continua se reproduzindo ao longo do tempo, repetindo a história de desrespeito e humilhação do qual a mulher vem sendo vítima desde o passado (CARNEIRO, 2009)

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Para tanto veremos adiante que o processo de violência doméstica contra a mulher permanece e desenvolve-se de diferentes formas.

2.2 OS TIPOS DE VIOLÊNCIA CONTRA A MULHER

A violência contra a mulher se apresenta de várias formas e indistintamente atingem todas as classes sociais, religiões, etnias. A violência doméstica pode ser entendida como um processo que faz parte da formação humana, variando suas formas, bem como relacionado à sociedade que se apresenta. O que para alguns é considerado violento, agressivo, para outros não se apresenta da mesma forma.

Para efeitos da Lei Maria da Penha, Lei n.11.340/2006, segundo o art. 5º, configura violência doméstica e familiar contra a mulher qualquer ação ou omissão baseada no gênero que lhe cause morte, lesão, sofrimento físico, sexual ou psicológico e dano moral ou patrimonial. I- No âmbito da unidade doméstica compreendida como espaço de convívio permanente de pessoas; II- No âmbito da família, compreendida como comunidade formada por indivíduos que não se consideram aparentados, unidos por laços naturais; III- Em qualquer relação intima de afeto, na qual o agressor conviva ou tenha convívio com o ofendido, independente de coabitação. Parágrafo único: As relações pessoais enunciadas nesse artigo independem de orientação sexual. Também segundo o art. 7º da Lei 11.340/2006 são formas de violência doméstica contra a mulher, entre outras, vejamos:

2.2.1 Violência Física

A violência física é o uso da força mediante socos, tapas, pontapés, empurrões, arremesso de objetos, queimaduras, etc, visando desse modo, ofender a integridade ou a saúde corporal da vítima, deixando ou não marcas aparentes, configurando os crimes de lesão corporal e feminicídio (art. 129 e 121 § 2º, VI) e mesmo na Lei das Contravenções Penais, como as vias de fato (art. 21). E conforme prevê o inciso I da referida lei - a violência física, entendida como qualquer conduta que ofenda sua integridade ou saúde corporal;

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Como lembram Maria de Melo e Maria Amélia de Almeida Teles, (2003, p.24), importante destacar que “a prática de violência do gênero é transmitida de geração a geração tanto por homens como por mulheres”. Basicamente, tem sido o primeiro tipo de violência em que o ser humano é colocado em contato direto. Torna-se arraigada de certa forma no âmbito das relações humanas, que é vista como Torna-se fosse natural, como se fizesse parte da natureza humana. Dificultando dessa forma a denúncia e a implantação de processos preventivos que poderão desarraigar por fim a prática da violência (CUNHA, p. 79). Sendo assim, a erradicação da violência social e política passam necessariamente pelo fim da violência de gênero, que, sem dúvida, dá origem aos demais tipos de violência (CUNHA, 2003.p.24).

2.2.2 Violência Psicológica

A violência psicológica foi incorporada ao conceito de violência contra a mulher na Convenção Interamericana para Prevenir, Punir e Erradicar a Violência Doméstica.

Quanto à violência psicológica, descrita no inciso II da LMP é a forma mais frequente e mais subjetiva de todas as violências. Entende-se por agressão emocional o comportamento que se dá quando o agente ameaça, rejeita, humilha ou dissemina a vítima, demonstrando prazer quando vê o outro se sentir amedrontado. E como esclarece Jones Figueiredo Alves (2014) é de ver que a cláusula quando outro meio implica em referir situações não previstas, uma delas podendo ser a própria dependência econômica da mulher, outra determinante de dominação que se submete a mulher por insegurança quanto à manutenção de sua própria subsistência. Nesse contexto, a violência aparece, “culturalmente”, como que “legitimada”, ou “causa de desculpação”, pelo feudo do “senhor chefe de família”. Vai daí que a ameaça do cônjuge pelo não provimento alimentar, em caso de separação, se reveste, por igual, de notável violência da espécie. ( ALVES, 2016)

Muitas vezes, a vítima não se dá conta que agressões verbais, silêncios prolongados, manipulação de atos são violência e devem ser denunciadas, pois tal violência é a ação ou omissão destinada a degradar ou controlar as ações, comportamentos, crenças de outra pessoa por meio de intimidação, manipulação e ameaça.

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A violência psicológica deixa profundas marcas e sua justificativa encontra-se alicerçada na negativa ou impedimento à mulher de exercer sua liberdade e condição de alteridade em relação ao agressor. E tal violência tem seu alicerce nas relações desiguais de poder entre os sexos. E talvez seja a violência menos denunciada, em muitos casos a vítima não se dá conta dos xingamentos, agressões verbais etc. E para reconhecimento do dano psicológico não é necessária a elaboração de laudo técnico ou realização de pericia. E ainda cabe lembrar que qualquer delito praticado, mediante violência psicológica impõe a majoração da pena. (CP art. 6º II f) Feix, Virginia, 205, Viana, Karoline e Andrade, Luciana, 12). Vejamos o que prevê a LMP em seu inciso II - a violência psicológica, entendida como qualquer conduta que lhe cause dano emocional e diminuição da autoestima ou que lhe prejudique e perturbe o pleno desenvolvimento ou que vise degradar ou controlar suas ações, comportamentos, crenças e decisões, mediante ameaça, constrangimento, humilhação, manipulação, isolamento, vigilância constante, perseguição contumaz, insulto, chantagem, ridicularização, exploração e limitação do direito de ir e vir ou qualquer outro meio que lhe cause prejuízo à saúde psicológica e à autodeterminação.

Para Marcelo Yukio Misaka (2007, p 86): “[...] todo crime gera dano emocional à vítima, e aplicar um tratamento diferenciado apenas pelo fato de a vítima ser mulher seria discriminação injustificada de gêneros. Se esta realidade não for reconhecida, o agente estará infringindo o princípio da igualdade”.

Esta é a forma de violência mais frequente e menos denunciada, muitas vezes as vítimas nem se dão conta que estão sendo vítimas das agressões verbais, ou que estão sendo violentadas verbalmente.

2.2.3 Violência Sexual

Segundo o artigo 7º da Lei nº 11.340/2006 são formas de violência doméstica e familiar contra a mulher inciso III da LMP na forma ampla entende por violência sexual qualquer conduta que constranja a mulher a presenciar, a manter ou participar de relação sexual não desejada, mediante intimidação, ameaça, coação ou uso da força, que induza a comercializar ou utilizar, de qualquer modo, a sua

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sexualidade, que a impeça de usar qualquer método contraceptivo ou que a force ao matrimônio. Vejamos:

III - a violência sexual, entendida como qualquer conduta que a constranja a presenciar, a manter ou a participar de relação sexual não desejada, mediante intimidação, ameaça, coação ou uso da força; que a induza a comercializar ou a utilizar, de qualquer modo, a sua sexualidade, que a impeça de usar qualquer método contraceptivo ou que a force ao matrimônio, à gravidez, ao aborto ou à prostituição, mediante coação, chantagem, suborno ou manipulação; ou que limite ou anule o exercício de seus direitos sexuais e reprodutivos. (Conselho Nacional de Justiça)

A Convenção Interamericana para Prevenir, Punir e Erradicar a Violência Doméstica também reconheceu a violência sexual no âmbito dos vínculos afetivos. Através da evolução da doutrina os crimes que equivocadamente eram denominados contra os costumes, em boa hora passaram ser chamados de crimes contra a dignidade sexual. Quem obriga alguém – homem ou mulher a manter relação sexual não desejada pratica crime de estupro (CP art. 213). Também outros crimes contra a liberdade sexual configuram violência sexual ( CP. Art. 216-A), violação sexual mediante fraude (CP, art. 215); assédio sexual (CP art. 216-A); crime sexual contra vulneráveis (CP art. 217-A) e satisfação de lascívia (CP art. 218-A).

A lei nº 12.845 de 1º de agosto de 2013, detalhou todo o procedimento a ser observado no atendimento à vítima de violência sexual e encaminhamentos, atendimento emergencial, integral e multidisciplinar, visando o controle e tratamento dos agravos físicos e psicológicos decorrentes da violência sexual.

A segunda parte do inciso III do art. 7º da Lei Maria da Penha, invoca a sexualidade sobre o aspecto dos direitos sexuais e reprodutivos. Trata-se de violência que traz diversas consequências à saúde da mulher. Assegura à vitima o acesso a serviços de contracepção de emergência, profilaxia das DSTs, da AIDS e outros procedimentos cabíveis (Art. 9º; § 3º).

2.2.4 Violência Patrimonial

A Violência Patrimonial está demonstrada pelo art. 7º, IV da LMP: sendo violência patrimonial entendida como qualquer conduta que configure retenção,

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subtração, destruição parcial ou total de seus objetos, instrumentos de trabalho, documentos pessoais, bens, valores e direitos ou recursos econômicos, incluindo destinados a satisfazer suas necessidades. (LEI MARIA DA PENHA, 2006).

A violência patrimonial encontra definição no Código Penal entre os delitos contra o patrimônio como furto (C.P art. 155), dano (C.P, art.163) apropriação indébita (C.P, art. 168). (DIAS. 2015.p. 76).

A partir da LMP a violência patrimonial é definida como violência doméstica. A lei tratou de prever garantias de ordem patrimonial, levando em consideração, inclusive, que, tanto no casamento em regime de comunhão parcial de bens quanto na união estável, os bens adquiridos na constância do relacionamento, salvo exceções previstas pela legislação, pertencem a ambos os participantes. Assim sendo, como assevera Maria Berenice Dias (1996:116), a possibilidade de restituição dos bens diz respeito tanto àqueles pertencentes ao acervo comum quanto aos particulares da mulher. Este é o entendimento de Maria Berenice Dias ao asseverar que a partir da vigência da Lei Maria da Penha, o varão que ‘subtrair’ objetos da sua mulher prática violência patrimonial (art. 7º., IV). Diante da nova definição de violência doméstica, que compreende a violência patrimonial, quando a vítima é mulher e mantém com o autor da infração vínculo de natureza familiar, não se aplicam as imunidades absoluta ou relativa dos arts. 181 e 182 do Código Penal. Não mais chancelando o furto nas relações afetivas, cabe o processo e a condenação, sujeitando-se o réu ao agravamento da pena (CP, art. 61, II, f)".

Reconhecida como violência patrimonial o ato de subtrair objetos da mulher, tal nada mais é que furtar. Assim se subtrair para si coisa alheia móvel configura o delito de furto. O mesmo acontece com relação à apropriação indébita e ao delito de dano. Apropriar e destruir, verbos utilizados pela lei penal para configurar tais crimes. Deixar o alimentante de atender a obrigação alimentar quando dispõe de condições econômicas, além da violência patrimonial, a omissão tipifica o delito de abandono material (C.P, art. 244).

Art. 244 - Deixar, sem justa causa, de prover a subsistência do cônjuge, ou de filho menor de 18 (dezoito) anos ou inapto para o trabalho, ou de ascendente inválido ou maior de 60 (sessenta) anos, não lhes proporcionando os recursos necessários ou faltando ao pagamento de pensão alimentícia judicialmente acordada, fixada ou majorada; deixar, sem justa causa, de socorrer descendente ou ascendente, gravemente enfermo: (Redação dada pela Lei nº 10.741, de 2003)

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Frente às diferentes formas de violência, aquelas realizadas contra a mulher passaram a ser consideradas como uma violação aos direitos humanos, a partir da Conferência das Nações Unidas sobre direitos Humanos, devido à frequência e facilidade com que é praticada ainda nos dias de hoje (ONU, 1993).

2.2.5 Violência Moral

A violência moral entendida como qualquer conduta que configure calúnia, difamação ou injúria sendo previsto pelo art. 7º, V da LMP. Tal violência encontra proteção penal nos delitos contra a honra, calúnia (C.P, art.138), difamação (C.P, art. 139) e injúria (C.P, art. 140). Tais atos quando cometidos em decorrência de vínculo de natureza familiar ou afetiva, configuram violência doméstica. A calúnia e a difamação atingem a honra subjetiva. Segundo Andréa Pachá (2008) – Es uma

violência silenciosa, que afronta la dignidad individual y erosiona los valores y la estrutura de las famílias. São necessários esforços diferenciados, que dependem de

transformações culturais e sociais amplas, para se combater tal violência. Foram muitos anos de luta para que as mulheres pudessem dispor de instrumento legal (lei) no combate a violência. A violência moral é sempre uma afronta à autoestima e ao reconhecimento social, apresentando-se na forma de desqualificação, inferiorização ou ridicularização. São ofensas divulgadas em espaços virtuais massivamente e em rede, de forma instantânea e de difícil comprovação e combate. (FEIX, 210).

De modo geral, a violência moral é concomitante a violência psicológica e dão ensejo na seara cível, à ação indenizatória por dano material e moral. Já com relação à violência patrimonial e moral, não há necessidade de haver relação direta dessas duas violências com os crimes contra o patrimônio e contra honra (DIAS, 2010).

Um sério problema enfrentado por muitas mulheres após o fim do relacionamento é a utilização das redes sociais por partes desses homens para caluniar, difamar sua ex-mulher. Faz uso de imagens, vídeos, fotos produzidas pelo casal, material produzido muitas vezes com o consentimento para não serem publicados, e o ex-marido ou ex companheiro ressentido, expõe tudo na rede. “Alguns homens não são mais aceitos no relacionamento e vão direto paras redes sociais, Facebook, etc. falar mal da mulher: que ela roubou o dinheiro dele, que é mulher da vida, que faz programa. E há, ainda, uma outra questão bem grave que

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vem acontecendo, que é a vingança da pornografia. O homem acaba se utilizando de vídeos, de fotos íntimas produzidas pelo casal – material que foi, muitas vezes, feito com consentimento, na intimidade e não para serem publicizados – e que o ex-marido ou ex-companheiro, ressentido, expõe tudo isso na rede. E como explicita Madgeli Frantz Machado, acaba que, além da grave violência psicológica desencadeada, muitas mulheres têm que abandonar emprego, a escola, às vezes até a cidade, tamanha é a repercussão negativa, sempre para a mulher, claro”, relata a juíza titular do 1º Juizado de Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher. ( MACHADO, Madgeli Frantz. Formas de violência contra a mulher V: violência moral, TR4. 08/04/2016).

Portanto, diante de novas tecnologias de informação, internet e redes sociais, a violência moral contra a mulher tem adquirido novas dimensões. São ofensas divulgadas em espaços virtuais massivamente e em rede, de forma instantânea e de difícil comprovação e combate (FEIX, Virginia, 210).

2.3 CONSEQUÊNCIAS DA VIOLÊNCIA DOMÉSTICA

A violência seja ela de qualquer natureza deve ser interpretada como uma violação aos direitos humanos, independentemente de sexo. A Declaração Universal dos Direitos Humanos, de 1948, alertou que: “toda pessoa tem capacidade para gozar os direitos e as liberdades estabelecidos nesta Declaração, sem distinção de qualquer espécie, seja de raça, cor, sexo, língua, religião, opinião pública ou de outra natureza, origem nacional ou social, riqueza, nascimento, ou qualquer outra condição” (art. 2º, item 1). (Assembleia das Nações Unidas).

A Convenção contra todas as Formas de Discriminação contra a Mulher de 1979 e a Resolução 19 da ONU de 1992 salienta o caráter abrangente da discriminação, entendida como qualquer distinção ou exclusão que prejudique ou elimine o reconhecimento e o exercício pela mulher dos direitos e liberdades fundamentais (....) E tais documentos reconhecem ainda que a discriminação dificulta a participação da mulher em igualdade de condições com o homem em todas as esferas da vida e constitui um obstáculo de desenvolvimento das potencialidades da mulher e do bem-estar da sociedade (Nações Unidas CEDAW- Comitê para a Eliminação da Discriminação contra a Mulher).

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O efeito da violência se traduz também em custos sociais elevados, devido ao menor desempenho e maior absentismo de suas vítimas no trabalho, maior dificuldade de estabelecer relações, baixa auto estima, maior incidência de ansiedade e depressão, afetando o pleno desenvolvimento de suas capacidades criativas e produtivas, e incidindo no maior uso maior uso de serviços de saúde e de medicamentos. (Heise,Lori,Pitanguy,Jacqueline, 1994).

A violência pode gerar à mulher consequências psicológicas que podem persegui-la durante toda a sua vida: depressão, fobia, vergonha, consumo de álcool, drogas dentre outras, além de consequências físicas como graves lesões e pode acarretar também problemas sexuais, sangramento, infertilidade dentre outros (BRUNI, Ana Maria, 2009).

Kofi Annan, ex Secretário-Geral da ONU (1997-2006), em sua mensagem sobre o Dia Internacional para Eliminação da Violência contra as Mulheres, afirmou que:

A violência contra as mulheres causa enorme sofrimento, deixa marcas nas famílias, afetando várias gerações, e empobrece as comunidades. Impede que as mulheres realizem as suas potencialidades, limita o crescimento econômico e compromete o desenvolvimento. No que se refere à violência contra as mulheres, não há sociedades civilizadas.

Sendo assim é possível percebermos que a violência doméstica não apenas abala os direitos, mas desencadeia uma série de riscos e danos sociais que se traduzem em problemas e riscos a toda a sociedade. Isto porque quando nos deparamos com uma sociedade machista, violenta e agressiva está-se comprometendo o bem estar de todos. A violência gera insegurança e profundas marcas emocionais são deixadas.

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3 DIGNIDADE HUMANA E OS MECANISMOS DE PROTEÇÃO ÀS MULHERES

Os direitos humanos são historicamente construídos uma vez que são frutos de conquistas construídas historicamente. Nos dizeres de Bobbio: “(...) os direitos não nascem todos de uma vez. Nascem quando devem ou podem nascer”. Então se pode dizer que direitos são criados para evitar a perpetuação de determinadas violações, protegendo-se, assim, as pessoas de ofensas já anteriormente vivenciadas (BOBBIO, 2004.p. 26). Nessa perspectiva os direitos vão se constituindo como um acúmulo crescente de parâmetros, de conteúdos fundamentais, dos quais todo ser humano é titular. Já os direitos fundamentais são constituídos por regras e princípios positivados constitucionalmente, cujo rol está ligado aos direitos humanos, que visam garantir a existência digna da pessoa. (BOBBIO, Norberto, 2004, p.25).

Também neste sentido, José Joaquim Gomes Canotilho (1998, p. 259), expressa:

As expressões direitos do homem e direitos fundamentais são frequentemente utilizadas como sinônimas. Segundo a sua origem e significado poderíamos distingui-las da seguinte maneira: direitos do homem são direitos válidos para todos os povos e em todos os tempos; direitos fundamentais são os direitos do homem, jurídico-institucionalmente garantidos e limitados espacio-temporalmente. Os direitos do homem arrancariam da própria natureza humana e daí o seu caráter inviolável, intertemporal e universal; os direitos fundamentais seriam os direitos objetivamente vigentes numa ordem jurídica concreta.

Sendo assim, é possível observar que apesar de todo sistema legal criado, muitas vezes não é suficiente para coibir condutas de violação aos direitos humanos, os quais são assegurados pelos preceitos legais constituídos e que visam proteger direitos fundamentais da pessoa e em particular aqui, das mulheres.

3.1 DIREITOS HUMANOS

A noção e formulação jurídica dos Direitos Humanos é algo recente e está associada à luta internacional do período posterior à Segunda Guerra Mundial pelo combate às atrocidades cometidas pelo nazismo, sendo um de seu marco fundador a Declaração Universal dos Direitos Humanos de 1948. O fundamento dos Direitos Humanos é o princípio da dignidade inerente à condição humana,

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independentemente de raça, cor, língua, nacionalidade, idade, convicção religiosa. (BARRETO, I.C. Coimbra, 2005, p.127-155). Tais princípios e normas são inerentes a todos os seres humanos, sendo considerados direitos fundamentais.

A Introdução de tais discussões no contexto internacional passou a constituir um sistema de proteção jurídica dos direitos humanos, expressos nos tratados internacionais e nas constituições dos Estados. Os tratados internacionais de direitos humanos garantem direitos específicos aos indivíduos, estabelecem obrigações e responsabilidades aos Estados, criam mecanismos para monitorar a obediência dos Estados em relação às suas obrigações e permitem que os indivíduos busquem compensações por violações desses direitos. Tais direitos são reconhecidos como direitos universais, válidos universalmente, inalienáveis, imprescritíveis, e, que garantem a dignidade do homem perante os demais e também sua autonomia, emancipação e liberdade frente ao poder do Estado. (CAMPOS, 2004).

A partir da Declaração Universal dos Direitos dos Homens, iniciou-se uma caminhada na história da humanidade afirmando-se a necessidade de respeitar a igualdade entre todos os seres humanos. Apesar de isso estar longe de ser alcançado e a partir de tal texto que se desenvolveram movimentos para a descolonização, a favor dos direitos cívicos, da democracia, do bem estar das crianças e da igualdade entre homens e mulheres. (VICENTE, 2000).

Na construção inicial dos direitos humanos, as diferenças de gênero permaneceram invisíveis, quer na sua dimensão de construção social, quer na sua dimensão biológica. A complexidade das diferenças de gênero foi neutralizada durante muitas décadas, começando a ser denunciada apenas a partir do movimento das mulheres, em meados da década de 1960. (FERREIRA, 2005; ROSEIRA, 2005).

E foi somente nos finais da década de 1960 e meados da década de 1970 que se iniciou o processo de conscientização sobre a necessidade de criação de mecanismos institucionais para a melhoria das condições de vida das mulheres de todo o mundo. Em 1967 foi criada a Declaração para a Eliminação da Discriminação contra as Mulheres. Nesse processo, no ano de 1975 foi proclamada pela ONU como ano Internacional da Mulher e realizou-se a I Conferência sobre Mulheres, no México. E no período compreendido de 1976 a 1985 foi declarado como a Década das Mulheres e aprovou-se o Plano de Ação Mundial. (SILVA, 2002).

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Através dessas inúmeras tentativas procura-se desenvolver ações que promovam a consciência e a mudança de prática por muito utilizada, formas discriminatórias estas evidenciadas contra a mulher.

De acordo com Monteiro (2005), foi em 1979, após a Convenção para a Eliminação da Discriminação contra as Mulheres, organizada pela ONU, que a violência contra a mulher passou a ser reconhecida oficialmente como crime contra a humanidade,

Após a Década das Mulheres e até o ano de 1995, a ONU realizou mais três conferências mundiais: 1980, Capenhagem; 1985, Naioróbi e 1995, Pequim. Em 1993 como resultado da Conferência sobre Direitos Humanos, realizada em Viena, surgiu a Declaração de Viena para a Eliminação da Violência contra as Mulheres. Nela encontramos pela primeira vez uma clara classificação das diferentes formas de violência (LOPES 2005; MONTEIRO, 2005). É entendida como um marco, pois representou a imposição aos governos a obrigação de zelar pela garantia dos direitos das mulheres.

Em 1995 foi realizada a Quarta Conferência Mundial da ONU em Pequim, sendo a violência contra a mulher assumida como uma questão de gênero e definida como qualquer ato, omissão ou conduta que serve para infligir sofrimentos físicos, sexuais ou mentais, direta ou indiretamente, por meios de enganos, ameaças, coações ou qualquer outro meio, a qualquer mulher e tendo por objetivo e como efeito intimidá-la, puni-la ou humilhá-la, ou mantê-la nos papeis estereotipados ligados ao seu sexo, ou recusar-lhe a dignidade humana, a autonomia sexual, a integridade física, moral, ou abalar a sua segurança pessoal, o seu amor próprio ou a sua personalidade, ou diminuir as suas capacidades físicas ou intelectuais (SANCHES; PINTO, 2007, p. 24).

De acordo com Faleiros (2007), a violência de gênero estrutura-se – social, cultural, econômica e politicamente – a partir da concepção de que os seres humanos estão divididos em machos e fêmeas, correspondendo a cada sexo lugares, papéis, status e poderes desiguais na vida privada e na pública, na família, no trabalho e na política” (FALEIROS, 2007, p. 62).

Tal documento constitui uma estratégia fundamentada em termos de ações, sendo considerada uma “cartilha fundamental nos termos internacionais no domínio da identificação no sentido de corrigir as desigualdades de gênero” (ROSEIRA, 2005, p.95).

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Os estudos demonstram atualmente que apesar da criação das inúmeras iniciativas a situação das mulheres ainda continua marcada por graves violações dos direitos humanos. E tal campo, especialmente o do direito das mulheres não é pacífico. Isso devido à força da cultura, crimes cometidos em nome da família, da religião e da cultura do grupo, permanecem por muito tempo fora do escrutínio dos tratados internacionais de direitos humanos, e tais justificativas se relacionam ao direito à liberdade de religião (FERREIRA, 2005).

Também demonstrada por Petchesky e Judd (1998), estes assinalaram algumas condições para a efetivação da titularidade de direitos, dentre as quais: a existência de uma declaração formal desses direitos em leis nacionais e internacionais; a correspondência entre esses direitos e os costumes, valores e comportamentos sociais; a implementação efetiva desses direitos; e a introjeção desses direitos nas representações sociais, incluindo o próprio sentimento de titularidade. Esse é um longo processo que envolve o Estado, a sociedade e os indivíduos.

A violência contra a mulher é uma afronta aos direitos humanos. Criminosa a omissão estatal que sob o mandato da deturpada noção de inviolabilidade do espaço privado, tem chancelado as mais cruéis e veladas formas de violência dos direitos humanos (SUMAYA Saady Morhy Pereira, p.29).

Portanto, a tendência norteadora das práticas legais vinculadas à violência contra mulheres embasa-se nos pressupostos dos direitos humanos de gênero. Essas premissas encontram-se presentes e reduzidas em vivências nas quais se concretizem princípios básicos para o ser humano, como a dignidade e a liberdade.

3.2 VIOLÊNCIA DOMÉSTICA E A CONSTITUIÇÃO DE 1998

Os princípios fundamentais estão preceituados e aplicados na Constituição Federal, cujo objetivo maior é a defesa dos direitos fundamentais e humanos inerentes a toda pessoa, acolhidos de forma ímpar, em particular na estruturação da LMP e no desenvolvimento de ações que visam combater este tipo de violência.

A Dignidade da Pessoa Humana é o fundamento de todo o sistema dos direitos fundamentais, uma vez que estes constituem exigências, concretizações e desdobramentos daquela e com base nela devem ser interpretados. Neste sentido, a

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dignidade humana é o valor que informa toda a ordem jurídica, assegurando os direitos inerentes à pessoa humana. (CARVALHO apud MOREIRA, 2011, p. 36).

Nesse sentido, também destaca Ingo Wolfgang SARLET (2001, p. 111-112) “A qualificação da dignidade da pessoa humana como princípio fundamental traduz a certeza de que o art. 1º, inciso III, de nossa Lei Fundamental não contém apenas uma declaração de conteúdo ético e moral (que ela, em última análise, não deixa de ter), mas que constitui uma norma jurídico-positiva com status constitucional e, como tal, dotada de eficácia, transformando-se de tal sorte, para além da dimensão ética já apontada, em valor jurídico fundamental da comunidade”. Nesse sentido, a dignidade humana é o valor que informa toda ordem jurídica, assegurando os direitos inerentes à pessoa humana.

De acordo com Sarlet (2011) é nesse mesmo sentido que a dignidade da pessoa humana representa uma qualidade inerente ao ser humano, que o torna merecedor de apreço e estima pelos demais, de modo que acaba representando um complexo de direitos e deveres fundamentais, que tem por objetivo maior, preservar uma existência digna, saudável, participativa e responsável pelas decisões e destinos da coletividade.

As diversas dimensões dos direitos fundamentais foram oriundas de um processo essencialmente dinâmico e dialético, marcado por avanços, retrocessos e contradições, mas sua concepção está inteiramente ligada ao jusnaturalismo. Os direitos fundamentais são, acima de tudo, fruto de reivindicações concretas, geradas por situações de injustiça e agressões a bens fundamentais e elementares do ser humano. As diversas dimensões que marcam a evolução de processo de reconhecimento e afirmação dos direitos fundamentais revelam que estes constituem categoria materialmente aberta e mutável. (SARLET, 1998, p. 54).

Feita uma breve análise do que seriam os direitos fundamentais é necessário adentrarmos em toda norma jurídica, enquanto considerada como determinante de um ou de muitas outras subordinadas que a pressupõem, desenvolvendo e especificando o preceito em direções mais particulares das quais determinam e, portanto, resumem potencialmente o conteúdo: sejam por estas efetivamente postas, sejam ao contrário, apenas dedutíveis do respectivo princípio geral que as contém. (BONAVIDES, 2010)

Entre os princípios constitucionais que merece uma abordagem especial está o da dignidade da pessoa humana, que de forma geral, é o princípio que se encontra

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implícito em todos os demais e que a violação de tal princípio acarreta diretamente e indiretamente, a violação de todos os demais princípios, segundo afirmado por Flavia Piovesan (2010, p. 421).

Para Moraes (2002, p. 50) a dignidade da pessoa humana: concede os direitos e garantias fundamentais, sendo inerentes as personalidades humanas. Esse fundamento afasta a ideia de predomínio das concepções transpessoalistas de Estado e Nação, em detrimento da liberdade individual. A dignidade é um valor espiritual e moral inerente à pessoa, que se manifesta singularmente na autodeterminação consciente e responsável da própria vida e traz consigo a pretensão ao respeito por parte das demais pessoas, constituindo-se um mínimo vulnerável que todo o estatuto jurídico deve assegurar, de modo que somente excepcionalmente, possam ser feitas limitações ao exercício de direitos fundamentais, mas sempre sem menosprezar a necessária estima que merecem todas as pessoas, enquanto seres humanos.

Com a promulgação da Constituição de 1988 ficou reconhecida a igualdade entre homem e mulher, senão vejamos:

Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e a propriedade, nos termos seguintes:

I-homens e mulheres são iguais em direito e obrigações, nos termos desta Constituição;

XLI- a lei punirá qualquer discriminação atentatória dos direitos e liberdades fundamentais.

A Constituição promulgada em 1988 tratou dos direitos e garantias em cinco capítulos (arts. 5º a 17º) assegurando sua inserção ao novo ordenamento jurídico. Tais direitos foram organizados em direitos e garantias individuais (Capitulo I), direitos sociais (Capitulo II), direitos de nacionalidade (Capitulo III), direitos políticos (Capitulo IV) e direitos que se referem à participação em partidos políticos e sua organização (Capitulo V).

Alexandre de Moraes fez uma breve análise geográfica da Constituição quando da divisão dos direitos e garantias fundamentais, onde assinalou: (MORAES, Alexandre de. Op. cit. nota 22. p. 23)

Direitos individuais e coletivos – correspondem aos direitos diretamente ligados ao conceito de pessoa humana e de sua própria

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