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Peopleware e Comunicação: a dimensão afetiva e
emocional de uma equipe de Tecnologia de
Informação (TI) na Cultura Organizacional
Robson Dias Jornalista, mestre e doutor em Comunicação. Professor e pesquisador do mestrado em Comunicação da Universidade Católica de Brasília (PPGSSCOM/UCB), linha Processos Comunicacionais nas Organizações. Líder do grupo Prêmios, Indicadores e Estratégias em Comunicação. Odila de Fátima Passos Barboza Mestre em Comunicação (UCB, 2016), especialista em Administração Pública (ENAP, 1994), especialista em
Análise de Sistemas (IDRH, 1984). Assessora da Coordenação de Sistemas Tributários da Subsecretaria de Tecnologia da Informação - SUTIC/SEF. Victor Márcio Laus Reis Gomes Publicitário, mestre em Administração e doutor em Comunicação. Professor e pesquisador do PPGSSCOM/UCB, linha Processos Comunicacionais nas Organizações. Líder do grupo de pesquisa: Núcleo de Estudos Comunicacionais da Estratégia (ESTCOM). Líder do projeto de pesquisa O noticiário de negócios e os discursos sobre a estratégia em grandes empresas privadas do Distrito Federal - FAPDF - 193.001.037/2015 - Projeto Externo Maria Cecília Alves Martinez Relações Públicas (UniCEUB, 1982), Mestre em Engenharia Civil e Transportes Urbanos (UnB, 1995), membro
do Comitê de Ética em Pesquisa - CEP/UCB, professora das disciplinas: Pesquisa de Opinião e de Mercado, Comunicação nas Organizações, Assessoria em Comunicação, Empreendedorismo em Comunicação, nos cursos de Jornalismo e Publicidade e Propaganda (UCB). João José de Avevedo Curvello Jornalista, mestre e doutor em Comunicação. Professor ecoordenador do curso de Comunicação Organizacional (UnB) e pesquisador da linha de Teorias e Tecnologias de Comunicação (PPGFAC/UnB). Líder do grupo de Pesquisa em Comunicação Organizacional e Pensamento Sistêmico (COMSiS). Ex-coordenador do PPGSSCOM/UCB e dos cursos de Jornalismo e Publicidade da UCB.
Resumo
Peopleware (HEHN, 1999) se refere à equipe de TI. Nesta pesquisa empírica, de abordagem mista, quantitativa, utilizou como instrumentos de coleta de dados a aplicação de um questionário estruturado a 42 profissionais de informática: no estudo de caso da SUTIC/SEFAZ/GDF. Discutimos a produção de sentidos compartilhados na Cultura Organizacional como Manifestação da Multidimensionalidade Humana" (SCHULER, 2009), na dimensão afetiva e emocional. Utilizamos aporte com entendimento da Comunicação como fenômeno, processo e sistema (CURVELLO, 2009). Muito mais que Gestão Organizacional e (in)gerência, propomos uma abordagem em Comunicação Organizacional ampliando a noção de Peopleware de modo não-prescritivo, fora do pressuposto de suporte (sufixo "ware") e de recursos humanos: tendo a dimensão humana em plenitude de sentido e interação.
Palavras-chave
Peopleware; Tecnologia de Informação; Comunicação Organizacional.
Abstract
Peopleware (HEHN, 1999) refers to the IT staff. This empirical research with quantitative approach makes a survey: the case focus 42 computer professionals on SUTIC/SEFAZ/GDF. It investigates meanings production and share in Organizational Culture evokes Human Multidimensionality Manifestation (SCHULER, 2009), according to the affective and emotional dimension. It’s based in communication as a phenomenon, process and system (CURVELLO, 2009). This offers more than Organizational Management contributions (bad or good management): we propose an extending Peopleware notion in non-prescriptive way. It denies the support condition as human resources and favors human fullness meaning and interaction human dimension.
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Key words
Peopleware; Information Technology; Organizational Communication.
1. Introdução
O Governo do Distrito Federal (GDF) tem na Secretaria de Fazenda (SEFAZ) todo o seu complexo de tributação e de receita distrital. As rotinas fiscais demandam expressivo aparato de informática. Apesar da existência de inúmeras soluções em Tecnologia de Informação (TI), que fazem parte do Sistema de Integração de Gestão Tributária (SIGEST), nem todas as atribuições em TI são realizadas a partir das máquinas: hardware e software. Uma dimensão não muito estudada em TI é o Peopleware: a dimensão humana da equipe de TI. Áreas voltadas para Aprendizado Organizacional e Gestão do Conhecimento têm estudado muito a questão dos colaboradores. Nesse panorama, temos Silva (2013), O entrelaçamento
da comunicação organizacional e a gestão do conhecimento: um estudo de caso em uma organização pública, também desenvolvida no âmbito do GDF (Companhia Imobiliária de
Brasília - Terracap). Além de Roses (2003), O Gerente de Relacionamento da Unidade de TI
na Criação do Conhecimento Organizacional.
Recentemente, na área de Comunicação, mais especificamente: em Comunicação Organizacional, surgiram estudos relativos a rotinas de TI, com um viés comunicacional: saindo do paradigma do usuário com acesso a informação para o usuário e os colaboradores a partir da produção de sentido. Velloso (2014), A interação de tecnologias da informação e
comunicação no alinhamento das melhores práticas empresariais, está inserida neste
contexto. Além de Freire (2009): Comunicação, Cultura e Organização: um olhar
antropológico sobre os modos de Comunicação Administrativa na perspectiva da Comunicação Integrada. Este último autor ressalta a importância da comunicação como
agregadora na organização:
A corrente de estudos da comunicação integrada concebe a organização como um sistema aberto e não mais como um sistema fechado estritamente orientado para produção ou circulação de bens e serviços.
Esse sistema se caracteriza pela integração de suas partes constitutivas e pela integração com outras organizações. A comunicação é o cimento que une e integra. Consequentemente, administração e comunicação são intrínseca e extrinsecamente relacionadas. (FREIRE, 2009, p. 180).
Nessa perspectiva integrada (KUNSCH, 2003), a TI estaria inserida como um fluxo de Comunicação Administrativa, onde Freire (2009) destaca dezessete balizas.
01. A organização é um sistema aberto;
02. As suas partes são integradas;
03. A comunicação é o cimento, a cola dessa integração;
04. Administração e comunicação são fenômenos organizacionais correlatos e intercorrentes;
05. A comunicação organizacional compreende esferas integradas de comunicação;
06. A comunicação administrativa viabiliza o sistema organizacional;
51
de fluxos e redes;
08. A comunicação administrativa não prescinde das modalidades institucional e mercadológica;
09. A comunicação administrativa tem caráter estratégico multilateral e pluri-instancial;
10. A comunicação administrativa serve às atividades de gestão, de planejamento, coordenação, implementação e controle;
11. A comunicação administrativa pode ser motor de mudanças e transformação;
12. A comunicação administrativa não se atém ao público interno, envolvendo a comunicação entre a organização e seus diferentes stakeholders;
13. A comunicação administrativa influi no desenvolvimento de capacidades e competências;
14. A comunicação administrativa não prescinde das tecnologias de informação;
15. A visão exclusivamente formalista e instrumental e não dá conta do objeto comunicação administrativa, no concernente à sua apreensão, análise e proposituras no âmbito da organização, da comunicação e da administração;
16. A eficácia da comunicação administrativa pode ser medida por meio de indicadores adequadamente elaborados;
17. A comunicação administrativa é ainda uma área pouco estudada.
Quadro 01 - Balizamento Cognitivo. Fonte: Freire, 2009, p. 179.
Freire (2009) atenta para a importância da Comunicação Administrativa como um composto fundamental na Comunicação Organizacional, no sentido de que nenhuma organização existe sem pessoas e que, por sua vez, pessoas ao formarem grupos com finalidades em comum utilizam imprescindivelmente da comunicação. Neste sentido, buscamos, neste artigo, muito mais do que os fluxos comunicacionais da perspectiva integrada que limitam a comunicação às profissões clássicas da Comunicação Social (Jornalismo, Publicidade e Propaganda e Relações Públicas) no tocante à Comunicação
Institucional, Comunicação Mercadológica, Comunicação Administrativa e Comunicação Interna. A comunicação passa pela cognição e ela um fenômeno humano; e não, meramente,
profissional ou funcional. Neste sentido, pensamos que a comunicação dentro da equipe de TI é muito maior que essa classificação de Comunicação Administrativa, onde a perspectiva integrada engloba todas as pessoas, profissões e funções que produzam fluxos para além desse paradigma. Desta forma, o estudo do Peopleware se faz imprescindível para buscarmos uma maior compreensão cognitiva do universo organizacional.
2. Referencial Teórico
2.1 Comunicação e TI
A comunicação na TI vai muito além da Comunicação Administrativa, pois esta equipe é composta por pessoas, com suas particularidades de identidade, diversidades, saberes e crenças que influenciam a Cultura Organizacional e a própria Comunicação Organizacional. Já, na área de informática, Marco e Lister (1999), ambos engenheiros de software, em
Peopleware - Como Gerenciar Equipes e Projetos tornando-os mais produtivos, abordava
52 como se elas fossem componentes modulares (sufixo: “ware”, suporte). Dessa maneira, os autores apontavam para o fato de que: o fracasso de muitos projetos computacionais pode não estar na tecnologia (e sim: na comunicação interpessoal dada entre os membros da equipe de TI). Já, naquela área, apontavam para outros saberes que pudessem ajudar a entender problemas em TI que não são de natureza tecnológica, e sim: de natureza social. No caso, em nossa abordagem, relativa à comunicação e interação humana: objeto de estudo da Comunicação, podendo ser aplicado a organizações.
Em Comunicação Organizacional, Velloso (2014) traçou uma interface entre profissionais de TI (paradigma de acesso ao usuário) e Comunicação (produção de sentidos, na perspectiva integrada: mais funcionalista da Assessoria de Comunicação - ASCOM) no alinhamento de estratégias organizacionais. Uma de nossas justificativas pelo estudo do
Peopleware, porém: nossa abordagem aponta para Comunicação Interna e Cultura Organizacional (CURVELLO, 2012), com viés mais amplo de comunicação interpessoal
entre os membros da equipe de TI1.
POSITIVO
Visão de suporte à TI Dependência da TI TI como ferramenta Visão de suporte mútuo Visão de suporte ao negócio
NEGATIVO
Comuns às duas áreas
Falta de entrosamento de ambos.
Diferenças de compreensão e ritmo entre as áreas Capacitação e treinamento das áreas
Falta de entrosamento com as áreas organizacionais. Linguagem técnica de ambos
Problema organizacional, de sistemas incompatíveis. Falta visão de negócio entre os dois.
Mundos opostos/princípio distinto: Comunicação – diálogo e colaboração
TI - controle e autoridade. Acentuado individualismo e pouca margem de negociação.
1 1 - Percepção do membro do Peopleware de como as pessoas se sentem em relação a ele quanto à arrogância (poder) (1), humilhação (2), confiança (3), raiva (4), insegurança (5), felicidade (6), infelicidade (7), inveja (8). 2 - Como o membro do Peopleware se percebe em relação às pessoas quanto à arrogância (poder) (1), humilhação (2), confiança (3), raiva (4), insegurança (5), felicidade (6), infelicidade (7), inveja (8).
3 - Quando ocorre mudança, como isso afeta emocionalmente o membro do Peopleware quanto à autoestima (1), prestígio (2), rejeição (3), reconhecimento (4), liberdade (5), dependência (6), medo (7), poder (8), inveja (9).
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TI Problemas de linguagem da TI
Conflito na percepção da TI sobre o negócio Baixo engajamento
Falta percepção de TI sobre a comunicação Falta qualidade na interação com o usuário TI fechada em si mesma
Enfoque técnico, ágil e superficial. TI fechada em si mesma
Enfoque técnico, ágil e superficial. NEUTRO
Critica a capacitação das áreas.
DICOTÔMICO
Positivo 1 - TI como ferramenta. 2 - Visão de suporte mútuo 3 - Visão de suporte ao negócio
Negativo 1 - Dificuldade em compreender a comunicação. 2 - Falta de definição de papéis e linguagem comuns. 3 - Resistências da TI, ineficácia no atendimento dos prazos.
Quadro 02 - Posicionamentos dos profissionais de Comunicação sobre a Interface: Comunicação e TI. Fonte: Velloso, 2014, p. 158, adaptado.
A pesquisa de Velloso (2014) tentava alinhar Gestão da Informação à Comunicação Organizacional. Há alguns pressupostos e premissas da aplicação da autora com os quais não pactuamos: ela faz uma abordagem mais voltada para o funcionalismo (Comunicação Integrada: ASCOM) e, nós temos um perfil voltado para o construtivismo (Cultura Organizacional). Mesmo assim, a captação dos pontos positivos, negativos, neutros e dicotômicos entre a ASCOM e a TI são muito pertinentes como panorama, em nossa contextualização do objetivo. Logo, segue ponto de vista na perspectiva oposta ao quadro 02:
POSITIVO
Acena com necessidade de maior integração.
Acredita na interface e apresenta visão de aplicabilidade.
Atenção para uma interação equilibrada de ganhos para os dois lados.
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Enfatiza a necessidade de atendimento à TI e de adequação ao cronograma.
Destaca, principalmente as carências e necessidade de TI em processo de implementação.
Sugere ação de aproximação.
NEGATIVO
NEUTRO
Justifica as dificuldades dos profissionais de TI em se comunicarem.
Acentua uma fraqueza de TI, justificativa da falta de integração com outras áreas.
DICOTÔMICO
Positivo 1. Enfatiza a dificuldade de expressão do profissional de TI
2. Desde que o profissional de comunicação compreenda bem a área de TI, ou que sejam necessários às atividades de TI (neste caso observa-se que o entrevistado se refere a produtos voltados para comunicação).
Neutro 1. Esclarece que a integração apresenta restrições pela falta de conhecimentos específicos por parte dos profissionais de comunicação.
Negativo 2. Por inúmeros motivos restritivos
Quadro 03 - Posicionamentos dos profissionais de TI sobre a Interface: Comunicação e TI. Fonte: Velloso, 2014, p. 158, adaptado
2.1 O humano na TI: Peopleware
No Brasil, Hehn (1999), Peopleware: como trabalhar o fator humano nas
implementações de sistemas integrados de Informação (ERP), aborda o lado humano da
Tecnologia da Informação, o chamado Peopleware. Até pouco tempo acreditava-se que a TI era composta somente por dois fatores: o hardware e o software (no paradigma de dar ao usuário: acesso à informação). Mas, percebe-se a dimensão do Peopleware: as interações entre as pessoas e seus efeitos cognitivos (modelos mentais, valores e crenças) na produção de sentido. Alguns aspectos do Peopleware enfatizados como a dimensão humana da TI:
Quando “eles” determinam que seja feito algo com que não concordo, eu cumpro os rituais, faço o que determinam ser minha obrigação, mas não repasso o entusiasmo para minha equipe.
Não exerço minha liderança, não me manifesto; no fundo, deixo claro para minha equipe que nãoesou engajado naquele esforço.
Centralizo a tomada de decisões de fora que nada ande sem a minha presença. E eu, sempre que possível, não estou presente.
Uso a técnica do jogador de pôquer: escondo as coisas boas que eu tenho (informações e dados de que eles precisam) e blefo em relação aquilo que não tenho (informações que provam que o que eles estão tentando implantar falhou em outros lugares).
Atenho-me as dificuldades; não existe projeto em que você não possa encontrar dificuldades comas quais ainda não sabem como lidar. Isso vai gerando insegurança, no mínimo, toma tempo e adia a implantação.
Falto aos compromissos, não estudo, não me preparo, não me interesso em conhecer o assunto.
55 Quando explicam, finjo que não entendi, que o assunto não está claro, que não estão nos dando todas as informações.
Omito a verdade. Se não me perguntam, não falo nada. Procuro agir sempre de maneira dissimulada para ninguém perceber que estou escondendo informações.
Priorizo o que não é prioridade e digo aos outros que, lamentavelmente, não deu, mas a culpa não foi minha!
Arranjo formas de faltar aos compromissos: viagens, chamados inesperados, problemas no campo, vale tudo.
Não considero as propostas impostas. Estabeleço meus próprios objetivos e trabalho neles em silêncio.
Esqueço, fecho a cara, mostro-me irritado. Dessa forma as pessoas ficam com medo de falar comigo.
Articulo nos bastidores, influencio negativamente as pessoas, gero desmotivação e descrença. (HEHN,1999, p.94-95)
Em vista desses apontamentos, formalizemos os contornos desta aplicação.
3. Procedimentos metodológicos
Esta pesquisa é aplicada, exploratória, empírica, quantitativa, utilizando variáveis das dimensões humanas dos colaboradores nas organizações (SCHULER, 2005, 2009), amostral (42 depoentes, de 83 membros da equipe), com a estratégia de estudo de caso da equipe de TI da SUTIC/SEFAZ/GDF, tendo como instrumento de coleta de dados questionário estruturado (plataforma GoogleDocs), com o objetivo vislumbrar processos comunicacionais, a partir da noção de Peopleware (HEHN, 1999; MARCO e LISTER, 1990).
A noção de Peopleware é gerencial e prescritiva, na área de informática, pois tem como foco a má e a boa comunicação para o cumprimento da eficiência, eficácia e efetividade nas rotinas de TI. Nos posicionamos de modo não-prescritivo, pois entendemos a comunicação como um fenômeno humano e livre, ainda que queiramos demarcar como o
Peopleware se situa quanto a variáveis do estudo. Entretanto, não buscamos a excelência da
boa comunicação, mas o conhecimento: de como aa comunicação acontece: entendendo o lastro cognitivo às dimensões física e material, emocional, mental, afetiva, expressiva, visionária e integradora e, também, questões relacionadas à percepção das mensagens emitidas e recebidas no âmbito da TI por seus membros (SCHULER, 2009).
A coleta de dados, via GoogleDocs, incorreu no processamento de 23 gráficos pela própria plataforma. E também 24 tabelas processadas pelo Statistical Package for the Social
Sciences (SPSS) que cruzavam as variáveis com cada papel comunicacional em TI, conforme
quadro 04: Produtor de Sentidos (Gestor Operacional), Mediador de Sentidos (Gestor Técnico), (De)codificador de Sentidos (Analista de Desenvolvimento: o programador de
software) e Canalizador de Sentidos (Analista de Suporte: processamento de dados no hardware). Pelo formato artigo e limite de caracteres, apresentamos um resumo nos quadros
07, 08 e 09, a seguir. Peopleware Tecnologia da Informação (acesso à informação) Comunicação (produção de sentidos)
Gestor Operacional ou Produtor de Sentido. Cria o significado de uma funcionalidade em TI, a partir de um contexto: regras de negócio. Esse briefing é
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Usuário Operacional passado ao mediador.
Gestor Técnico ou
Intermediador entre usuário e analista
Mediador de Sentidos. Portador dos significados, do briefing do produtor de sentido, e responsável pela negociação com o analista de desenvolvimento: programação da solução em TI. Ponte entre briefing e programação.
Analista de
Desenvolvimento ou Programador (software)
(De)codificador de Sentidos. Codifica os sentidos operacionais do usuário em linguagem de máquina (programação, código fonte, fábrica de software). O briefing vira um sistema em dada linguagem (SQL, PHP, COBOL, Html, Java). É a solução em TI para um problema informacional organizacional.
Analista de Suporte (hardware)
Canalizador de Sentidos. Canal e media pelo qual a informação toma corpo a partir da máquina. (infraestrutura, processamento, servidor, hardware). Sem servidor, o programa não funciona.
Quadro 04 - Papel comunicacional das funções em TI. Fonte: os autores
O Gestor Operacional é produtor de sentido, pois é ele quem percebe o ambiente organizacional e propõe soluções em TI para resolver problemas organizacionais (briefing)2.
O Gestor Técnico assessora o Gestor Operacional no cumprimento da demanda3.
O Gestor Técnico é mediador de sentidos: tem um perfil de mediação e de facilitador entre as instâncias de demanda e de entrega da solução de TI.
O Analista de Desenvolvimento (de)codificador de Sentidos: toda a realidade humana e da Cultura Organizacional enfatizada pelo GO como Regras do Negócio e supervisionada pelo GT é transformada em linguagem de máquina (código de programação), ou seja: a solução em TI4, software. O desenvolvimento é um processo contínuo e, neste sentido, é que o GT supervisiona e se relaciona bastante com este profissional.
Analista de Suporte é o canalizador de sentidos: a estrutura cibernética para estabelecer a comunicação entre homem, máquina e linguagem codificada. O fluxo de
2 Em um supermercado, por exemplo, que tem problemas de baixa de estoque e de registro de preços nos caixas, essa dificuldade organizacional é demandada pelo conhecedor das nuances organizacionais (Regras de Negócio) e ele estabelece a lógica que uma solução em TI terá: sistema de leitura óptica que dê baixa no estoque (1), que atualize a planilha financeira de vendas (2) e que já protocole reposição do artefato (4). Passa isso para um programador (Analista de Desenvolvimento) e testes são realizados com um supervisor (Gestor Técnico). Uma vez homologada a funcionalidade, entregam-na para que o processamento de dados promova o funcionamento do sistema (Analista de Suporte). Na SUTIC/SEFAZ/GDF é servidor e ele é quem faz os testes da solução em TI no ambiente de homologação (servidor de rede para teste com dados fictícios). A aprovação final da entrega é atribuição dele. E comunica isso pelo OASIS, mecanismo corporativo de protocolos entre a equipe do
Peopleware.
3 Logo, tem um perfil mais organizacional em si: planejamento, monitoramento, controle, recursos humanos (principalmente a métrica de pontos de função: contagem de produtividade em TI, para o Gestor Operacional remunerar os analistas: de desenvolvimento, software; e de suporte, hardware). O Gestor Técnico, como supervisor, também faz testes, mas in loco: junto com o Analista de Desenvolvimento, no ambiente de produção. São vários testes pontuais ao longo do processo, além da entrega com o teste em ambiente de homologação. Dentre o Peopleware, seu trabalho é o que é mais caracterizado pela comunicação interpessoal, por excelência: corpo a corpo, face a face. Na SUTIC/SEFAZ/GDF é servidor.
4 Esta instância do Peopleware trabalha na fábrica de software instalada na sede da SEFAZ/DF. Ele se reporta muito ao Analista de Suporte quando o código é enviado para o ambiente de homologação. Na SUTIC/SEFAZ/GDF tende a ser funcionário terceirizado.
57 informação passa por essa instância é o insumo base para a comunicação em TI. Tanto que, quando falta energia elétrica e há algum problema de máquina, hardware (servidores de rede, operações em banco de dados), o sistema fica inoperante5.
Em vista desse panorama dos papéis comunicacionais do Peopleware, vejamos alguns problemas de comunicação interpessoal e de Comunicação Administrativa,
Comunicação Interna e, logo: de Comunicação Organizacional na SUTIC/SEFAZ/GDF:
Embora a figura do analista de suporte não apareça no OASIS, nossa ferramenta oficial de demandas e de comunicação, seu papel no fluxo comunicacional da TI é de fundamental importância. É dele a responsabilidade de colocar no servidor da rede, tanto no ambiente de homologação quanto no ambiente de produção, de um determinado sistema, o código do programa enviado pelo decodificador após sua conclusão. A eficácia da comunicação entre o (de)codificador de sentidos e o canalizador de sentidos nunca foi compatível com a relevância de suas funções. A falta de sintonia entre fábrica e infraestrutura (CPD) impacta diretamente na confiabilidade dos testes em ambos ambientes (homologação e produção), o que confunde o produtor de sentido e o deixa muitas vezes bastante irritado. Esse desencontro de informações acaba gerando um jogo de empurra-empurra entre fábrica e infraestrutura [...] o problema está sempre do outro lado. (BARBOZA, 2016, p. 52)
Assim como visto no Quadro 02 e 03, a comunicação também é um objeto e uma experiência em TI, nas organizações. Velloso (2014) tem um perfil funcionalista, mas concordamos com o quadro comparativo a seguir. Ela atribui verbos de ação como funções da comunicação. Nesta aplicação, nosso perfil opta pela comunicação fluída e livre onde ela acontece a despeito de ser (in) gerência e da função e dos objetivos.
Objetivos da TI, a partir da Comunicação Objetivos da Comunicação
Sensibilização e Esclarecimento Despertar da Consciência Chamar atenção Proporcionar conhecimento Garantir identificação Envolvimento e Participação Suscitar interesse Despertar expectativa Estabelecer a interação Efetivar a ação Conseguir a preferência
5 Esta instância do Peopleware trabalha na fábrica de software instalada na sede da SEFAZ/DF. Ele se reporta muito ao Analista de Suporte quando o código é enviado para o ambiente de homologação. Na SUTIC/SEFAZ/GDF tende a ser funcionário terceirizado, lotado no Centro de Processamento De Dados (CPD).
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Colaboração
Obter fidelidade
Garantir e manter a satisfação
Levar à decisão
Sustentação das Relações Gerar disseminação
Quadro 05 - Papel comunicacional das funções em TI. Fonte: Velloso, 2014, p. 182.
Como os “objetivos” são tarefas, em Velloso (2014) é nítido que a flexão de verbos cumpre a premissa de que um objetivo é cumprido quando: se faz uma tarefa (funcionalista). A comunicação interpessoal não é entendida por nós como uma tarefa, dentre o Peopleware. É uma dimensão humana e não somente caracterização de uma tarefa profissional. Logo, signatários do quadro 05, adaptamos para o contexto desta aplicação.
Objetivos da TI, a partir da Comunicação
Perspectiva Integrada
Funcionalista (trabalha com objetivos e funções típicas das
carreiras especializadas)
Cultura Organizacional
Construcionista (trabalha com efeitos e produção de sentidos)
Sensibilização e Esclarecimento
Despertar da Consciência Consciência
Chamar atenção Interação
Proporcionar conhecimento Conhecimento
Garantir identificação Identidade
Envolvimento e
Participação
Suscitar interesse Engajamento
Despertar expectativa Esperança
Estabelecer a interação Comunicação
Efetivar a ação Iniciativa
Colaboração
Conseguir a preferência Predileção
Obter fidelidade Fidelidade
Garantir e manter a satisfação Satisfação
Levar à decisão Decisão
Sustentação das Relações
Gerar disseminação Socialização
Baliza epistemológica
Pressuposto: a comunicação é uma função, tarefa a ser cumprida.
Premissa: cumprir uma tarefa para chegar a um objetivo. Profissionais que organização de fluxos.
Pressuposto: a comunicação é compartilhamento de sentidos.
Premissa: a comunicação é uma ação humana (muito mais do que uma ação profissional).
59 Quadro 06 - Papel comunicacional das funções em TI. Fonte: os autores, com base em Velloso (2014, p. 182)
Observe que os verbos de ação somem (coluna da extrema direita). Só ficam os substantivos: que são efeitos, os sentidos (difusos e dispersos na Cultura Organizacional, ora produzidos, ora compartilhados).
3.1 Caracterização dos depoentes na equipe de TI:
SUTIC/SEFAZ/GDF
Metade dos depoentes tem de 01 a 10 anos de trabalho na organização (50%). A função comunicacional, dentro dos papéis da equipe de TI, equivale à Mediadores de
Mensagens (31%), Produtores de Sentido (26,2%) e em mesmo percentual: Transmissores de Mensagens (16,7%) são Codificadores de Mensagens (16,7%).
A maioria dos participantes (54,8%) já sentiu que sua mensagem não foi bem entendida na TI e observa-se, também, um número expressivo (38,1%), informaram que raramente tiveram essa sensação. Isto demonstra uma clara sensação de ruído na comunicação na TI.
Os depoentes percebem (71,4%) que a maior incidência de erros nos sistemas informatizados ocorre em decorrência da parte humana da TI, ou seja: do Peopleware. Em segundo lugar, percebem que os erros são de software (21,4%) e de hardware (7,1%).
A manifestação da cultura na dimensão física e material (SCHULER, 2009), na Cultura Organizacional, classifica o grau de desconforto nos aspectos da dimensão física e material. São condições reais de trabalho tangíveis aos sentidos humanos e influentes nos processos e possibilidades de interação. O campeão de desconforto indicado pelos depoentes foi o mau cheiro nos banheiros (59,5%), em seguida: a falta de área para descontração entre os pares (47,6%). O fator de menor desconforto é a iluminação (28,6%).
A manifestação da cultura na dimensão emocional (SCHULER, 2012) , na Cultura Organizacional, traz a percepção do depoente em relação aos pares da equipe de TI. Sentimentos são variáveis de sensações: raiva, inveja, medo, satisfação, prazer, alegria e tristeza. Segundo a autora, essa dimensão se manifesta na cultura, por meio de hábitos, usos, costumes e crenças. A percepção dos depoentes é de que as pessoas a sua volta não se sentem humilhadas em relação a sua presença (a do depoente) (71%), o que denota boa aceitação no ambiente de trabalho (ao menos pelo critério elencado: de percepção do depoente em relação ao que os outros pensam de dele).
A manifestação da cultura na dimensão expressiva (SCHULER, 2009), na Cultura Organizacional, já é a percepção inversa: aponta para o que o depoente sente em relação às pessoas no seu ambiente de trabalho. A maioria não se sente humilhada em relação aos pares na equipe de TI (78,6%). O mesmo índice aparece na variável não ter confiança nas pessoas no ambiente de trabalho (78,6%). Os depoentes acreditam que a comunicação que acontece atualmente na TI raramente assegura o compartilhamento de informações entre as diversas áreas da organização (52,4%). A frequência de planejamento dos fluxos operacionais é baixa: quase não há reuniões para coordenar os trabalhos.
Na manifestação da cultura na dimensão visionária (SCHULER, 2009), na Cultura Organizacional, os depoentes não se sentem ameaçados em relação ao poder hierárquico (59%) e também em relação à inveja dos pares (59%).
Na manifestação da cultura na dimensão integradora (SCHULER, 2009), na Cultura Organizacional, mostra a relação da identidade com a organização com grau dos valores:
60 adesão. A maioria dos depoentes declara que sentem orgulho (54%) e satisfação de forma razoável (52%).
Em termos de elos sociais, o critério para se inserir em dado grupo social é o de afinidades em comum. E a predominância de um dos gêneros não interfere nas relações interpessoais (52,4%). E acham que há senso de equidade e de justiça quanto a erros e acertos de chefes e subordinados (59,5%). Também acreditam que o chefe atua par solucionar problemas do setor de forma razoável e adequada (47,6%), sem excessos.
O canal de comunicação mais eficiente para o desenvolvimento de demanda para TI é a comunicação direta são as reuniões presenciais, seguidas de contato por telefone. Em último lugar a intranet.
3.2 A dimensão afetiva do Peopleware
A comunicação versa sobre o objeto de estudo da produção de sentidos. Ora, pelo massivo. Ora, pelo interpessoal, que é o perfil deste trabalho. A comunicação interpessoal é perpassada por inúmeras possibilidades: afinidades com as pessoas, abertura, limitações emocionais, dentre tantos aspectos. Muito desses elementos são de dimensão afetiva, os quais Schuler (2009, p. 264):
A cultura se manifesta, na dimensão mental, por meio de hábitos, usos, costumes e crenças relacionados:
ao reconhecimento, ao respeito e à valorização dos outros à aceitação das diferenças individuais;
ao dar e receber;
à necessidade de estima, que, transcendendo a associação simplesmente material e racional, gera o convívio amoroso entre as pessoas; à solidariedade e ao compartilhamento;
ao equilíbrio entre justiça e misericórdia nas relações. (SCHULER, 2009, 243-274)
Schuler (2005, p. 23) entende que a excelência humana na dimensão afetiva:
[...] conduz os indivíduos a respeitar-se e a se reconhecerem uns aos outros, aceitando as diferenças individuais como riqueza do grupo e complementaridade de características, gerando um grupo onde todos se sentem acolhidos, protegidos e incentivados a apresentar o seu melhor desempenho, unificando os padrões individuais com os da organização [...] Quando o indivíduo atinge esse nível, ao mesmo tempo em que a consciência do eu se torna mais clara, surgem as capacidades de compaixão, de compartilhar. A satisfação das necessidades dos níveis inferiores já não é mais um ato egoísta e autocentrado, mas generoso e assistencial. Não basta que se esteja bem, é preciso que todos estejam bem, que todos os seres desfrutem da bem-aventurança conquistada. (SCHULER, 2005, p. 23)
Uma palavra marcante é: consciência, pois a comunicação é um processo cognitivo, antes de tudo. A cognição produz sentidos, aprendizado, conhecimento e nos ajuda a nos movimentar na realidade (e até mesmo a percebê-la). A consciência é uma marca individual. Cada indivíduo está inserido em posicionamento específico no mundo, o que qualifica uma cosmovisão e um lugar de fala de sua individualidade e subjetividade diante da realidade.
61
Individualmente, é somente depois de certo grau de desenvolvimento que o indivíduo é capaz de amar. Muitos não atingem esse nível durante toda avida, permanecendo sempre em relacionamentos práticos, distantes e utilitários. Para compreender e vivenciar o conteúdo de um nível é preciso tê-lo atingido, mesmo que de forma rudimentar.
Nas organizações, atingir esse nível significa ter outro tipo de cuidado com colaboradores e com o ambiente onde eles atuam, tratando sempre de integrar o maior número possível de pessoas no sucesso, compartilhando os benefícios de forma justa e generosa. Enquanto a organização não atinge esse nível, há avidez na centralização dos lucros e cada benefício concedido, para quem quer que seja, é percebido como perda ou desperdício. Uma vez atingido esse nível, o comportamento mesquinho e avaro é naturalmente substituído por uma assistência natural, espontânea e generosa, mudando a própria compreensão da missão da organização. Normalmente, atingir ou não esse nível é o que faz a diferença entre as empresas onde os funcionários de sentem explorados e exauridos e aquelas nas quais os funcionários se sentem reconhecidos, amparados e protegidos. (SCHULER, 2005, p. 23)
Neste sentido, também lembremos que os sentidos compartilhados no meio social podem facilitar ou dificultar a comunicação interpessoal. Veja pelos sentidos de antipatia, simpatia e empatia que um membro do Peopleware pode compartilhar com outros.
Não somos prescritivos a ponto de qualificar nesta aplicação a correta ou a errada forma da dimensão efetiva nas comunicações (ou mesmo: seu bom ou mau desenvolvimento). Não trabalhamos com essa premissa. Entretanto, nossa baliza em Schuler (2005) nos leva a entender alguns de seus pressupostos, principalmente em Maslow e Goleman. Ressalvados desses riscos, em premissas e pressupostos, como risco inerente a abordagens interdisciplinares como este artigo, retomemos Schuler em um pensamento oportuno para as organizações:
O correto desenvolvimento da dimensão afetiva dá novo sentido à busca de satisfação das necessidades físicas, emocionais e mentais, níveis já transcendidos, e embasa o surgimento dos níveis superiores de consciência, permitindo sua emergência. No que se refere à comunicação, o aparecimento da consciência desse nível faz cair por terra várias das principais barreiras à comunicação [...], ou seja, aquelas relacionadas à cultura e a preconceitos, às diferenças de valores, de suposições e de percepções, que podem construir limites para uma cultura criativa, aberta.
Quando as subculturas alojadas dentro das empresas reforçam as barreiras que se erguem à comunicação interna e externa, é o afloramento da consciência do nível afetivo que poderá fazer com que essas diferenças não constituam mais barreiras ao fluxo de informação, mas sim riqueza de características percebida pelo grupo todo. (SCHULER, 2005, p. 23)
Tendo como objeto de estudo de caso do Peopleware da SUTIC/SEFAZ/GDF, entendemos que a produção de sentidos, compartilhados na Cultura Organizacional, podem influenciar a dimensão afetiva. Os resultados da aplicação foram:
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Dimensão afetiva
Percepção de como as pessoas se sentem em relação a você quanto à arrogância Muito (%) Razoável (%) Pouco (%) Nenhum (%)
Como as pessoas se sentem em relação a você quanto à arrogância 7,1 7,1 35,7 50
Como as pessoas se sentem em relação a você quanto à humilhação 0 0 28,6 71,4
Como as pessoas se sentem em relação a você quanto à confiança 23,8 57,4 19 0
Como as pessoas se sentem em relação a você quanto à raiva 0 21,4 38,1 40,5
Como as pessoas se sentem em relação a você quanto à insegurança 0 7,1 47,6 45,2
Como as pessoas se sentem em relação a você quanto à felicidade 14,3 69 11,9 4,8
Como as pessoas se sentem em relação a você quanto à infelicidade 2,4 11,9 33,3 52,4
Como as pessoas se sentem em relação a você quanto à inveja 4,8 9,5 23,8 61,9
Média 6,55 22,93 29,75 40,78
Quadro 07 - Dimensão afetiva do Peopleware na Cultura Organizacional (leitura que faz dos outros em relação a si). Fonte: os autores
A avaliação é de que os membros do Peopleware têm movimentação livre sem grandes barreiras para relacionamentos, ao menos a partir da autopercepção quanto à arrogância, confiança, raiva, insegurança, felicidade, infelicidade. Esses sentidos são construídos a partir de interações.
Logo, a partir das mesmas variáveis e, ainda tendo como objeto de estudo de caso do
Peopleware da SUTIC/SEFAZ/GDF, checamos a relação oposta (também do ponto de vista da
autopercepção). Os resultados da aplicação foram:
Peopleware Dimensão afetiva
Percepção de como as pessoas se sentem em relação a você
Muito (%) Razoável (%) Pouco (%) Nenhum (%)
Como você se percebe em relação as pessoas quanto à arrogância 0 0 21,4 59,5
Como você se percebe em relação as pessoas, quanto à humilhação 0 4,8 16,7 78,6
Como você se percebe em relação as pessoas quanto à confiança 14,3 69 11,9 4,8
Como você se percebe em relação as pessoas quanto à raiva 0 21,4 38,1 40,5
Como você se percebe em relação as pessoas quanto à insegurança 0 7,1 47,6 45,2
Como você se percebe em relação as pessoas quanto à felicidade 14,3 69 11,9 4,8
63
Como você se percebe em relação as pessoas quanto à inveja 4,8 9,5 23,8 61,9
Média 4,48 24,09 25,59 43,46
Quadro 08 - Dimensão afetiva do Peopleware na Cultura Organizacional (leitura que faz de si em relação aos outros). Fonte: os autores
A avaliação repete tendência vista no Quadro 07 sobre o fato de que os membros do
Peopleware têm movimentação livre sem grandes barreiras para relacionamentos: critério de
autopercepção, que é uma forma de produção de sentidos e determina grupos sociais e territórios onde possam acontecer mais (ou menos) interações.
3.3 A dimensão emocional do Peopleware
A manifestação da Cultura Organizacional, onde são compartilhados os sentidos, tem uma dimensão emocional, que segundo Schuler (2009, p. 256):
A cultura se manifesta, na dimensão emocional, por meio de hábitos, usos, costumes e crenças relacionados:
à autoestima;
ás emoções (raiva, medo, tensão, apetite, satisfação, prazer, inveja, ciúme, alegria, tristeza);
às necessidades de segurança e integridade do corpo físico e da vida, de abrigo e proteção de todos os tipos;
às características de valor, coragem e constância no mundo como lugar de luta e objeto de conquista;
aos rituais;
à sexualidade e aos papéis de gênero. (SCHULER, 2009, p. 243-274)
Logo, essa é a dimensão humana do Peopleware, por excelência: onde os colaboradores executam suas tarefas, mas com a incidência (ou não) de sua dimensão emocional (autoestima, prestígio, rejeição, reconhecimento, liberdade, dependência, medo, poder, inveja). Estes podem acelerar ou retardar processos6, interferir em estados mentais e cognitivos. Tanto que, sabemos que um rol de enfermidades de cunho emocional, afetivo e psíquico podem ser relatados como da esfera do trabalho e das organizações, como a
Síndrome de Burnout: que é a estafa e frustração agudas, um quadro agravado pelo
colaborador se sentir culpado por não cumprir expectativas7. Schuler (2009) relaciona o lado emocional ao físico:
O bom atendimento das necessidades do nível anterior ao emocional, ou seja, do nível físico, vai permitir a indivíduos e a organizações um bom desenvolvimento do nível emocional e de segurança. Debilidades no nível físico vão significar dificuldades no desenvolvimento do nível emocional e de segurança. O surgimento da consciência do nível emocional e de segurança, por sua vez, dará um novo matiz à percepção das necessidades físicas, de nível inferior, bem como ao modo de supri-las. As necessidades de nível físico continuarão a ser supridas, mas agora permeadas pelos
6 A própria ideia de Mentoring e Couching em Aprendizado Organizacional leva em conta essa perspectiva. 7 Conhecemos mais, frequentemente, as doenças de ordem repetitiva e física como a DORT: Distúrbio Osteomuscular relacionado ao trabalho.
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critérios de segurança, de prazer e de emotividade. Se os dois níveis forem satisfatoriamente desenvolvidos, isso deverá significar uma melhor performance da organização, uma maior sofisticação e qualidade em sua ação. (SCHULER, 2009, p. 243-274)
E a relação com a comunicação é enfatizada
No que diz respeito à comunicação, o bom desenvolvimento desse nível proporciona uma maior facilidade, para os indivíduos, de entrarem em contato, liberados de medos compulsivos e imaginários, de inseguranças, de invejas obsessivas [...] e tantas outras emoções mal controladas, que impedem a emergência de um bom nível de relacionamento interpessoal, nas organizações. Ele gera também um clima organizacional saudável, quando as pessoas estão em relacionamento desde um ponto de auto-estima equilibrada, vivendo com prazer e alegria sua cotidianidade. Isso potencializa uma comunicação mais abundante, fluente e leve, que fomenta a criatividade nas pequenas ações cotidianas. (SCHULER, 2009, p. 243-274)
A Tecnologia da Informação trabalha com o paradigma de: dar ao usuário acesso à informação. Apesar dos estudos de Peopleware, naquela área, entenderem a questão da dimensão humana, não é objeto de estudo daquele saber alguns meandros em torno disso. Apesar das aplicações interdisciplinares sempre acontecerem e tensionarem as epistemologias, teorias e arcabouços de cada área. Um tema muito desenvolvido é a Gestão da Informação, que trabalha com a (in)gerência dos insumos informacionais e das soluções em TI. Como a premissa, neste contexto, é a da eficiência, da eficácia e da efetividade, há uma inclinação do pensar para os processos racionalizantes. Talvez, essa seja uma marca que tentamos apagar neste trabalho (ou controlá-la), no intuito de deixar fluir a dimensão afetiva e emocional.
Perceba esse discurso em Hehn (1999), a maior referência nacional em Peopleware:
Vivemos num mundo onde as variáveis conhecimento e tecnologia formam um poderoso ciclo de reforço. Conhecimento e tecnologia provocam mudanças. As mudanças tendem a ocorrer na mesma taxa de progressão geométrica em que o conhecimento e a tecnologia evoluem.
A tecnologia é um change trigger, ou seja, as mudanças que ela provoca em geral não são moda, são avanços sem volta. Tecnologias provocam descontinuidades, criam novos paradigmas. Quando uma nova tecnologia se torna algo de uso generalizado, as pessoas ou organizações podem não ter mais a alternativa de não adotá-la, elas são levadas pela decisão da maioria.
A integração pela tecnologia da informação evolui rapidamente. Podemos projetar que grande parte da sociedade economicamente relevante estará totalmente integrada na primeira década do próximo milénio, o que irá revolucionar a forma de fazer negócios.
Diversas forças estão se combinando para obrigar as organizações a racionalizar e informatizar seus processos de gestão. Algumas das mais importantes são: economia cada vez mais globalizada, crescimento da logística internacional, efeito commodity, necessidade de inovar e oferecer cada vez mais produtos e serviços, pressão dos clientes.
Os quatro tópicos anteriores se traduzem em duas palavras: mudanças contínuas. Em um ambiente de muitas mudanças, o "gargalo" da transformação está nas pessoas e não na capacidade de a organização investir ou contratar serviços, isso fará com que organizações com pouco poder económico, porém flexíveis e adaptáveis, superem outras, mais rígidas e
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difíceis de mudar, apesar de terem grande poder económico. (HEHN, 1999, p.43)
Neste aspecto, o autor trabalha um grande vetor das organizações e dos saberes que versam sobre este âmbito: a mudança organizacional.
A mudança incide em cognição, em aprendizado, em comportamento, em patrimônio, em gestão, em conhecimento, dentre outros. Este foi um vetor que utilizamos para checar o emocional na pesquisa empírica. Na sequência, como Hehn ilustra as mudanças organizacionais suscetíveis aos membros do Peopleware.
Nosso intuito foi o de trabalha a dimensão emocional do Peopleware devido a mudanças organizacionais. Hehn (1999, p. 110), baseado na questão humana da consciência e, logo, da individualidade, personalidade e variáveis em relação às pessoas trata das
“resistências e se preparando para elas”:
Todo esforço de modernização enfrenta resistências. Elas surgem nas mais diferentes, sofisticadas e disfarçadas formas, variando segundo a criatividade das pessoas.
É ilusão acreditar que através do poder ou da autoridade se consegue lidar com resistências ou mecanismos de sabotagem. Os exemplos de mecanismos individuais procuram mostrar que, quando as pessoas não querem algo, sempre encontram uma forma de lutar contra.
A Onda é o principal mecanismo coletivo de sabotagem. Muitas vezes sem perceber, as pessoas de uma organização a alimentam, mesmo sabendo que serão prejudicadas.
As resistências e sabotagens devem ser vistas como sintoma e não como doença a ser tratada. As pessoas as praticam com o objetivo de evitar perdas ou obter ganhos, principalmente relacionados com fatores não materiais: auto-estima, poder, reconhecimento, medo, inveja...
A melhor forma de lidar com as resistências é estruturar e conduzir o projeto de maneira que as perdas não materiais sejam minimizadas. Isso se consegue principalmente com o envolvimento das pessoas. (HEHN, 1999, p.110)
Tendo como objeto de estudo de caso do Peopleware da SUTIC/SEFAZ/GDF, verificamos a produção de sentidos em relação a mudanças organizacionais. Os resultados da aplicação foram:
Peopleware Dimensão emocional:
Quando ocorre mudança, como te afeta
Muito (%) Razoável (%) Pouco (%) Nenhum (%)
Quando ocorre mudança, como te afeta quanto à autoestima 19 40,5 31 9,5
Quando ocorre mudança, como te afeta quanto ao prestígio 7,1 31 45,2 16,7
Quando ocorre mudança, como te afeta quanto à rejeição 11,9 28,6 33,3 26,2
Quando ocorre mudança, como te afeta quanto ao reconhecimento 21,4 38,1 31 9,5
66
Quando ocorre mudança, como te afeta quanto à dependência 9,5 23,8 45,2 21,4
Quando ocorre mudança, como te afeta quanto ao medo 4,8 11,9 42,9 40,5
Quando ocorre mudança, como te afeta quanto ao poder 2,4 9,5 59,5 28,6
Quando ocorre mudança, como te afeta quanto à inveja 4,8 4,8 31 59,5
Média 10,84 26,2 38,9 28,77
Quadro 09 - Dimensão emocional do Peopleware devido a mudanças organizacionais. Fonte: os autores A mudança organizacional é fator de muitos desafios e constrangimentos organizacionais. Na avaliação dos efeitos emocionais sobre o Peopleware os contextos de mudança não configuram ameaças quanto à autoestima, prestígio, rejeição, reconhecimento, dentre outros.
Considerações Finais
Esta abordagem é exploratória e um dos primeiros esforços na área de Comunicação sobre o tema. Pensamos que pode ser de grande valia também para Tecnologia da Informação, Engenharia de Produção, Engenharia de Redes, Administração, Psicologia Organizacional, dentre outros. Os processos cognitivos podem incidir em comunicação (sentido), aprendizado, coordenação de equipes e tantos outros aspectos. No artigo, nos distanciamos muito dos paradigmas de Gestão Organizacional e de Gestão da Informação, com a finalidade de influenciar (in)gerências e desenvolver a organização em dado critério. Acreditamos nessas abordagens, mas não são pauta para o momento, ao menos na área de Comunicação: onde objeto de estudo deste departamento oferece condições de versar sobre a questão comunicacional humana, em plenitude, a despeito dos impactos de gestão.
Uma discussão que vemos como muita oportuna no Peopleware é o diálogo entre os saberes com a questão da comunicação entre homens e entre máquinas. O próprio rol do que se convencionou chamar de Teorias da Comunicação tem em seu arcabouço teórico a Teoria da Informação (desenvolvida pelos engenheiros Claude Shanon e Warren Weaver, no paradigma da comunicação como transmissão) e outros autores que trabalham com a questão da consciência humana (no paradigma da comunicação como atribuição de significado compartilhado na cultura: produção de sentido). Vemos como oportunidade: em tempos de internet das coisas e de inteligência artificial o interesse social e científico no intercâmbio entre os saberes sobre as dimensões entre homem-homem, homem-máquina, dentre outras possibilidades. Cremos que o objetivo desta aplicação cumpre seus propósitos e pode ser uma ferramenta que agregue saberes e pesquisadores interessados, a partir da circulação em bases indexadas.
Em decorrência da interdisciplinaridade de nossa abordagem, por vezes, tivemos que nos resguardar de alguns pressupostos e premissas, balizas de arcabouços teóricos de outros saberes. Enfatizamos que referendamos os autores citados na importância e consistência de seus trabalhos, mas, nesta aplicação, foi importante fazer algumas ressalvas que não comprometessem a configuração desta abordagem.
Mais que ciência, os fenômenos comunicacionais ligação a rotinas em TI também aparecem no noticiário e são fruto, inclusive, de personagens humorísticos: Vida de Suporte8
8 http://vidadesuporte.com.br/ http://loja.vidadesuporte.com.br/
67 (DIÁRIO DE PERNAMBUCO, 2011; FOLHA DE S. PAULO, 2013; UOLTECNOLOGIA, 2013; REVISTAEXAME, 2013; CORREIOBRAZILIENSE, 2011; DIÁRIODONORDESTE, 2012; JORNALAGORA, 2011).
Vemos como limitante do trabalho a questão de ser uma pesquisa empírica amostral e um estudo de caso, mas o que se justifica por ser uma das primeiras abordagens exploratórias, onde o acúmulo de casos e a sistematização teórica podem configurar outro momento para pesquisas confirmatórias.
Na perspectiva funcionalista da Comunicação, há muitos estudos sobre profissionais de Jornalismo, Publicidade e Propaganda, Relações Públicas, Cinema e Audiovisual. No entanto, esta aplicação nos abriu um novo paradigma: o dos profissionais de informática, na perspectiva do Peopleware (Gerente de Sistemas, Analista de Sistemas, Analista de Suporte, Programador, Documentador, Operador, Digitador, Preparador de Dados, Técnico de manutenção).
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informação - TI. (Dissertação, Mestrado em Comunicação). UCB. 2016
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