ANÁLISE DO VALOR DO PASSO DA RECONSTRUÇÃO PARA O
CÁLCULO DA DIMENSÃO DE CORRELAÇÃO EM SISTEMAS
CAÓTICOS
Natália Diniz (Uni-FACEF) Antonio Carlos da Silva Filho (Uni-FACEF)
1 INTRODUÇÃO
Seja a seguinte situação: alguém está tentando resolver um problema em uma variável, x, no qual a solução será usada para se resolver o mesmo problema novamente, e assim por diante. Vários fenômenos na natureza podem ser assim descritos. O crescimento de populações em ecologia é um exemplo, onde a quantidade de indivíduos em um determinado instante depende da quantidade de indivíduos em um instante anterior. Matematicamente, tais situações podem ser colocadas através da seguinte expressão geral:
xN+1= f
( )
xN (1) Onde, partindo de um valor inicial x = x0, calcula-se, sucessivamente,x1 , x2 , x3 , etc.
A função f(x) poderá se apresentar de várias formas. Um exemplo é a função linear:
f ( x ) =
λ
xEste tipo de função pode servir muito bem para uma determinada classe de problemas, mas não é a representação adequada de muitos outros. Considere-se o exemplo em ecologia, onde x representa o tamanho de uma determinada população de animais. Neste caso, λ deve ser positivo e deduz-se que:
xN x
N
=
λ
0A função linear diz que esta população vai tender à extinção (se λ for um número entre 0 e 1 ) ou que vai crescer indefinidamente ( se λ for um número maior do que 1 ). O primeiro caso pode perfeitamente acontecer, mas o segundo não. Assim, precisa-se de outra categoria de funções para trabalhar com tais situações. São necessárias as funções não-lineares.
Uma população de animais não pode crescer indefinidamente. Há que se introduzir uma correção na função linear. Assim, por exemplo, faz-se com que o parâmetro λ não seja mais constante, mas varie com o tamanho da população. A maneira mais simples de conseguir isto é fazer a transformação:
λ
→λ
(1− b x)onde b é uma constante positiva. Mudando a escala em que se mede o tamanho da população, chega-se à seguinte expressão para f(x):
f ( )x =
λ
x(1− x ) (2) Agora, o tamanho máximo da população é x = 1. Esta equação é chamada, às vezes, de equação logística, devido a uma equação diferencial estudada pelo matemático belga P. F. Verhulst cerca de 150 anos atrás (BOYER, 1996). Sua versão discreta é conhecida como Mapeamento Logístico.O Mapeamento Logístico é um sistema extremamente simples (formado por uma função do segundo grau), mas exibe (inesperadamente, até a década de 70) os principais elementos de uma dinâmica caótica.
2 MATERIAIS E MÉTODOS
Pode-se definir Caos como um sinal aparentemente aleatório e irregular, gerado por um processo determinista, com as seguintes propriedades adicionais (de GRAUWE, 1993):
(i) Exibe sensibilidade às condições iniciais; (ii) Ë aperiódico;
(iii) É associado a um atrator estranho;
(iv) Tem um espectro de potências de Fourier contínuo e de banda larga; (v) Tem pelo menos um expoente de Liapunov positivo.
O estudo moderno deste tipo de sistema começou com Lorenz na década de sessenta e é relativamente novo, caso se pense na História da Ciência como um todo. Uma das maneira de analisar os sistemas caóticos é através dos dados
destacam-se os seguintes: a Dimensão de Correlação, a Entropia de Kolmogorov-Sinai e os Expoentes de Liapunov.
A Dimensão de Correlação é, atualmente, a medida mais popular de dimensão. Foi proposta por Grassberger e Procaccia (1983). É muito parecida com a dimensão de informação, porém, é mais complexa. A dimensão de correlação é procurada em um gráfico do logaritmo da integral (ou soma) de correlação versus o logaritmo de ε, enquanto que a dimensão de informação é procurada em um gráfico da informação versus logaritmo de (1/ε). Mas, tanto a integral de correlação como a informação são expressas em termos de probabilidades. A diferença fundamental entre ambas está na maneira de se calcular essas probabilidades: para a dimensão de informação, constrói-se uma rede que englobe o atrator e calcula-se, basicamente, a probabilidade de ocupação de cada célula; já para a dimensão de correlação, constrói-se uma célula centrada em cada ponto da trajetória e calcula-se a probabilidade de ocupação desta célula.
Para calcular a dimensão de correlação a partir de dados experimentais representando valores de alguma variável aleatória no tempo, Takens (1981) demonstrou que é possível reconstruir a dinâmica do sistema, a partir de uma única coordenada, preservando certas propriedades do mesmo. O algoritmo baseia-se na construção de vetores ξi m-dimensionais a partir da série temporal {xi}, onde xi = x(ti); i = 1,2,...,N; m é chamada dimensão de imersão e N é o número total de pontos. O teorema de Takens (1981), garante uma representação num espaço reconstruído usando x(ti) como primeira coordenada, x(ti+p) como segunda coordenada, e x(ti+ (m-p)) como última coordenada, onde p é o passo da reconstrução da série, também chamado de “tempo de retardo”. Para a escolha adequada de m, a reconstrução deve ser feita para valores crescentes e sucessivos (m = 2,3,...). Demonstra-se que um atrator de dimensão topológica D0 deve ser imerso num espaço de dimensão m maior, ou igual, a 2D0+1; caso contrário, o atrator aparecerá dobrado sobre si mesmo como numa projeção e pontos inicialmente distantes, tornam-se próximos provocando uma distorção na estatística da medida invariante associada ao atrator reconstruído. Como não sabemos, a priori, qual a dimensão topológica do atrator associado à série de dados experimentais que estamos investigando, uma razoável dose de experimentação e bom senso torna-se necessária ao interpretarmos os resultados obtidos, segundo Ferrara e do Prado (1994). Para efetuarmos o cálculo
da dimensão de correlação (Dc) pensemos na probabilidade de termos dois pontos do atrator num círculo de raio ε, por exemplo. Isso implica a probabilidade da distância entre esses dois pontos ser menor que ε. A medida dessa probabilidade, chamada “integral (ou soma) de correlação”, representada pela letra C, é função de ε e pode ser expressa pela equação abaixo:
onde: Θ(x) é a função degrau de Heaveside definida por:
Essencialmente, C(ε) é uma medida de probabilidade que cresce exponencialmente. Então, numa escala log-log, o gráfico de C(ε) versus ε mostra uma região linear onde:
é satisfeita e a dimensão de correlação é dada por:
Um parâmetro importante na reconstrução do atrator é o Passo (p). O estimador de p tem que ser tal que x(ti) e x(ti+p) sejam parcialmente não-correlacionados e independentes (para não utilizarmos um estimador viciado, do ponto de vista estatístico). Faz-se necessário, então, o estudo da função de autocorrelação definida por:
{
}
1 i j ( 1) 1 i j ( 1) 1 1( )
lim
nº de pares i,j, tais que | x - x |
- | x - x |
N N N N N N N i jC
ε
ε
ε
− →∞ − = ==
<
=
∑∑
Θ
r
r
r
r
0 x se 0 0 x se 1 ) ({
< ≥ = Θ x)
(
log
.
)
)
(
(
log
C
ε
≈
D
c
ε
ε
ε
ε
log
)
(
log
0
lim
C
c
D
→
=
Um estimador de p para a reconstrução do atrator é τ, de forma que:
que indica, aproximadamente, o tempo de descorrelação da série. (TSONIS, 1992). Mas nem sempre o valor assim obtido conduz à melhor reconstrução. Este trabalho vai analisar precisamente este ponto: Qual é realmente, o valor ótimo de C(τ)?
A Dimensão de Correlação será calculada para vários sistemas, como o sistema de Lorenz (LORENZ, 1963), o de Henon e o de Rössler. Este cálculo será feito variando-se o passo da reconstrução desde 1 até N, onde N será determinado pela divergência com os valores já conhecidos para estes sistemas. Os valores ótimos serão, a seguir, localizados no correlograma correspondente, que é um gráfico da Função de Autocorrelação em função do atraso temporal. O conjunto de informações obtidas será, então, analisado para a especificação de um algoritmo para se percorrer o caminho inverso, ou seja: pretende-se fornecer um método para, a partir da Função de Autocorrelação, determinar-se o Passo da Reconstrução.
Os principais sistemas a serem analisados serão:
a) O Atrator de Lorenz: dx/dt = σ(y-x) dy/dt = -xz + rx – y dz/dt = xy – bz onde, usualmente: σ = 10; r = 28; b = 8/3 b) O Atrator de Rössler: dx/dt = -y - z 1 ( ) lim ( )( ) 1 (0) lim ( )( ) i i N i i N C x x N C x x N
x
x
x
x
τ τ + →∞ →∞ = − − = − −∑
∑
)
0
(
2
1
)
(
C
C
τ
=
dy/dt = x + ay dz/dt = b + z(x – c) onde, usualmente: a = b = 0,2; c = 5,7 c) O sistema de Chen: dx/dt = a(y-x) dy/dt = (c – a)x – xz + cy dz/dt = xy – bz onde, usualmente: a = 35; b = 3; c = 28 d) O Mapa de Hénon: Xn+1 = 1 – a(Xn)2 + bYn Yn+1 = Xn onde, usualmente: a = 1,4; b = 0,3
e) O Pêndulo Forçado Amortecido:
dx/dt = y
dy/dt = -senx - by + Asen(Ωt)
onde, usualmente, b = 0,05; A = 0,6; Ω = 0,7
3 RESULTADOS
Seguem alguns resultados, colocados em gráficos, já obtidos para o Sistema de Lorenz. Todos os programas foram escritos no Matlab.
-1 -0.5 0 0.5 1 1.5 2 -4 -3.5 -3 -2.5 -2 -1.5 -1 -0.5 0
Fig. 1 log(FC) x log(ε): Lorenz com 200 pontos e dimensão variando de 2 a 10.
0 0.2 0.4 0.6 0.8 1 1.2 1.4 1.6 1.8 0 1 2 3 4 5 6
0 0.2 0.4 0.6 0.8 1 1.2 1.4 1.6 1.8 0 1 2 3 4 5 6
Fig. 3 Dim x log(ε): Derivadas com 21 pontos, para o gráfico da figura 1.
0 0.2 0.4 0.6 0.8 1 1.2 1.4 1.6 1.8 0 0.5 1 1.5 2 2.5 3 3.5 4 4.5 5
0 0.2 0.4 0.6 0.8 1 1.2 1.4 1.6 1.8 0 0.5 1 1.5 2 2.5 3 3.5 4 4.5 5
Fig. 5 Dim x log(ε): Derivadas com 41 pontos, para o gráfico da figura 1.
0 0.2 0.4 0.6 0.8 1 1.2 1.4 1.6 1.8 0 0.5 1 1.5 2 2.5 3 3.5 4 4.5
0 0.2 0.4 0.6 0.8 1 1.2 1.4 1.6 1.8 0 0.5 1 1.5 2 2.5 3 3.5 4 4.5
Fig. 7 Dim x log(ε): Derivadas com 61 pontos, para o gráfico da figura 1.
0 0.2 0.4 0.6 0.8 1 1.2 1.4 1.6 1.8 0 0.5 1 1.5 2 2.5 3 3.5 4
LORENZ COM 500 PONTOS; DIMENSÕES DE 2:10 -1 -0.5 0 0.5 1 1.5 2 -4.5 -4 -3.5 -3 -2.5 -2 -1.5 -1 -0.5 0
Fig. 9 log(FC) x log(ε): Lorenz com 500 pontos e dimensão variando de 2 a 10.
0 0.2 0.4 0.6 0.8 1 1.2 1.4 1.6 1.8 0 0.5 1 1.5 2 2.5 3
4 ANÁLISE E CONCLUSÃO
Aprendemos, como pode ser visto, a calcular a Dimensão de Correlação para um conjunto de dados. As próximas etapas do trabalho consistirão em aplicar os mesmos algoritmos aos demais mapeamentos.
BIBLIOGRAFIA
BOYER, Carl B. História da Matemática.São Paulo: Editora Edgar Blucher Ltda./Editora da Universidade de São Paulo, 1996. 496 p.
DE GRAUWE, P., DEWACHTER, H. e EMBRECHTS, M. Exchange Rate Theory. Oxford: Blackwell Publishers, 1993. 328 p.
FERRARA, N. F. e DO PRADO, C. P. C. Caos – Uma Introdução. São Paulo: Edgard Blücher Ltda., 1994. 402 p.
GRASSBERGER, P; PROCACCIA I. Measuring the strangeness of strange attractors, Physica, v. 9D, 1983.
HANSELMAN, Duane; LITTLEFIELD, Bruce. Matlab 6 – Curso Completo. São Paulo: Prentice Hall, 2003. 676 p.
LORENZ, E. N. Deterministic Nonperiodic Flow. J. Atmos. Sci., v. 20, p. 130-141, 1963.
SCHUSTER, H. G. Deterministic Chaos: an introduction. Weinheim, VCH Verlagsgesellschaft, 1989. 367 p.
TAKENS, F. Detecting Strange Attractors in Turbulence. In: RAND D. A., YOUNG L. S. (ed.) Dynamical Systems and Turbulence, (Springer Lecture Notes in Mathematics) vol 898, Springer-Verlag, 1981.
TSONIS, A. A. Chaos: from theory to applications, New York, Plenum Press, 1992. 348 p.