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O impeachment de Dilma Rousseff: a possibilidade jurídica da votação em separado da pena no processo de impeachment presidencial

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Academic year: 2018

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UNIVERSIDADE FEDERAL DO CEARÁ FACULDADE DE DIREITO

VICTOR VALANN HOLANDA GOES

O IMPEACHMENT DE DILMA ROUSSEFF – A POSSIBILIDADE JURÍDICA DA

VOTAÇÃO EM SEPARADO DA PENA NO PROCESSO DE IMPEACHMENT

PRESIDENCIAL

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VICTOR VALANN HOLANDA GOES

O IMPEACHMENT DE DILMA ROUSSEFF – A POSSIBILIDADE JURÍDICA DA VOTAÇÃO EM SEPARADO DA PENA NO PROCESSO DE IMPEACHMENT

PRESIDENCIAL

Monografia submetida a Coordenação do Curso de Graduação em Direito da Universidade Federal do Ceará, como requisito parcial para a obtenção do grau de bacharel em Direito.

Orientadora: Raquel Cavalcanti Ramos Machado

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VICTOR VALANN HOLANDA GOES

O IMPEACHMENT DE DILMA ROUSSEFF – A POSSIBILIDADE JURÍDICA DA VOTAÇÃO EM SEPARADO DA PENA NO PROCESSO DE IMPEACHMENT

PRESIDENCIAL

Monografia submetida a Coordenação do Curso de Graduação em Direito da Universidade Federal do Ceará, como requisito parcial para a obtenção do grau de bacharel em Direito.

Aprovada em: ___/___/______

BANCA EXAMINADORA

____________________________________________ Prof.ª Dra. Raquel Cavalcanti Ramos Machado

____________________________________________ Prof. Dr. Hugo de Brito Machado Segundo

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Universidade Federal do Ceará Biblioteca Universitária

Gerada automaticamente pelo módulo Catalog, mediante os dados fornecidos pelo(a) autor(a)

G545i Goes, Victor Valann Holanda.

O impeachment de Dilma Rousseff – A possibilidade jurídica da votação em separado da pena no processo de impeachment presidencial / Victor Valann Holanda Goes. – 2016. 80 f.

Trabalho de Conclusão de Curso (graduação) – Universidade Federal do Ceará, Faculdade de Direito, Curso de Direito, Fortaleza, 2016.

Orientação: Profa. Dra. Raquel Cavalcanti Ramos Machado.

1. impeachment. 2. Procedimentos. 3. Votação em separado. 4. Natureza política. 5. Inabilitação. I. Título.

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A minha família,

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AGRADECIMENTOS

A tarefa de agradecer é prazerosa e ao mesmo tempo árdua. Árdua porque são muitas as pessoas que tanto fizeram por mim, estando ao meu lado, confiando e me incentivando.

Começo agradecendo aos meus pais, que me deram aquilo que considero ser o único combustível que um ser humano necessita para ser humano e uma pessoa do bem, o amor. Com eles aprendi a ser uma pessoa correta, íntegra em tudo o que eu fizer. Com meu pai, a manter os pés no chão, e saber que a humildade é uma qualidade que sempre deve ser cultivada. Com minha mãe, aprendi a perseverar, a nunca desistir e acreditar na minha capacidade. Grande parte do que eu sou, devo, sem dúvidas, a eles.

A minha família por todo apoio que sempre me deram. Principalmente na figura de minha avó materna e minhas tias, todas elas. Aprendi com elas que a família tudo suporta, que vai sempre existir independente do que aconteça e que sua fonte de amor é inesgotável, para todos, sem distinção. Esse exemplo de família é aquele que sempre levo comigo para quando for construir a minha própria. O laço familiar é indestrutível.

Agradeço também a minha namorada e futura companheira e esposa Luana, por todo seu apoio ao longo desses 4 anos que está comigo. Seu amor e confiança depositada em mim é incentivo para que eu queira cada dia mais ser uma pessoa melhor, e o desejo de caminharmos juntos para construir uma família e um mundo melhor para que todos possam viver bem e com amor.

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seres humanos que são ou amor pelo magistério que incentiva e faz cada dia o aluno querer o conhecimento e o melhoramento.

Aos meus amigos da faculdade, Tibério, Guilherme, Obara, Eduardo, Oscar pela companhia em todos esses anos de faculdade. Por motivo de forças alheias a minha vontade não pude me formar junto com vocês, e digo que foi bem solitário ter que passar meu último semestre sem suas presenças nas aulas, e conversas nos corredores. São pessoas que sempre levarei comigo, e que podem contar com a minha pessoa para o que precisarem. O mesmo digo de meu amigo Carlos Liduíno, que desde o ensino fundamental tenho como alguém que sempre estará comigo.

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"Uma coisa que aprendi nessa longa vida: toda nossa ciência, comparada com a realidade, é primitiva e infantil - ainda assim, é a coisa mais preciosa que nós temos."

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RESUMO

Analisa-se o processo do impeachment presidencial, realizando uma abordagem introdutória, histórica e conceitual do instituto, seguindo do estudo de sua natureza jurídica e dos dispositivos que regem seus procedimentos, no intuito de entender melhor o processo e verificar a possibilidade jurídica da votação em separado da pena constitucionalmente cominada para o agente condenado, tendo em vista o artigo 52, parágrafo único, da Constituição da República Federativa do Brasil dispor ser a pena de perda do cargo com inabilitação. Estuda-se também o processo anterior, do impedimento do ex-presidente Fernando Collor, e como tal processo serve de precedente para o ocorrido contra Dilma Rousseff. Por fim, defende-se ser possível a votação em separado das penas, permitindo a condenação autônoma das penas, podendo o condenado sofrer com uma delas, sem necessariamente ser punido com a outra.

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ABSTRACT

The process of presidential impeachment is analyzed, taking an introductory, historical and conceptual approach to the institute, following the study of its legal nature and the procedures governing its procedures, in order to better understand the process and verify the legal possibility of voting in Separated from the constitutionally prepared sentence for the convicted agent, in view of article 52, single paragraph, of the Constitution of the Federative Republic of Brazil to provide for the penalty of loss of office with disqualification. We also study the previous process, the impediment of former President Fernando Collor, and how this process serves as a precedent for the case against Dilma Rousseff. Finally, defends to be possible a separate vote on the penalties, allowing autonomous condemnation of penalties, and the offender may suffer from one of them, without necessarily being punished with the other.

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LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS

ADPF Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental

Art. Artigo

PGR Procurador Geral da República

PDT Partido Democrático Trabalhista

PMDB Partido do Movimento Democrático Brasileiro

PPS Partido Popular Socialista

PSDB Partido da Social Democracia Brasileira

PT Partido dos Trabalhadores

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SUMÁRIO

1 INTRODUÇÃO ... 12

2 O PROCESSO DE IMPEACHMENT EM GERAL ... 14

2.1 Conceito e Origem ... 14

2.2 Do crime de responsabilidade ... 17

2.3 Natureza Jurídica ... 23

3 O PROCESSO DE IMPEACHMENT DE DILMA ROUSSEFF ... 29

3.1 Disposições gerais dos procedimentos no IMPEACHMENT ... 30

3.2 O processo de impeachment contra Collor ... 40

3.3 Procedimentos adotados no Processo contra Dilma Rousseff ... 46

3.4 A Sessão de Julgamento e o destaque de votação em separado das penas ... 50

4 ANÁLISE DA POSSIBILIDADE JURÍDICA DO FRACIONAMENTO DA PENA PELO SENADO NO IMPEACHMENT ... 58

4.1 A interferência da natureza jurídica e a exegese do texto constitucional . 58 4.2 O processo de Collor e sua influência ... 64

4.3 Do direito de destaque ... 65

4.4 A repercussão da decisão de fracionamento ... 67

4.5 Da anulação da votação em separado ... 69

5 CONSIDERAÇÕES FINAIS ... 72

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1. INTRODUÇÃO

O instrumento do impeachment presidencial é ferramenta constitucional utilizada para afastar do cargo aquele governante que age de forma contrária à Constituição e prejudicial ao Estado. Apesar de aparentemente bastante útil contra os excessos que o chefe federal do Poder Executivo possa cometer, foi reduzidamente empregado na história brasileira, mais precisamente em apenas duas ocasiões: primeiro contra Fernando Collor e, atualmente, em desfavor de Dilma Rousseff.

Este último processo, e que será objeto de estudo deste trabalho, ocorreu após 24 anos do primeiro, contra Collor. Diante dessa escassez em acontecimentos, sempre que sobrevém uma demanda desse tipo, qualquer decisão tomada, em seu bojo, é peculiar e representa amplo manancial de estudo e análise. No evento em exame, uma decisão no procedimento, tomada pelo Sr. Presidente do Supremo Tribunal Federal (STF) Ricardo Lewandowski, que presidiu o processo de impedimento, trouxe à tona diversos questionamentos quanto à possibilidade de fracionamento da pena naquele processo.

As indagações se devem ao fato de que, em uma leitura rápida, o artigo 52, parágrafo único, da Constituição da República, dispor que a pena, em caso de

condenação, será de “perda do cargo, com inabilitação, por oito anos, para o exercício de função pública” (Brasil, 1988, online), o que em uma sucinta interpretação, leva ao entendimento de que a perda do cargo é sempre acompanhada da inabilitação, de forma inseparável.

Partindo desta disposição constitucional e do estudo do instituto do impeachment, analisa-se a possibilidade de votação em separado quanto às punições previstas, o que permitiria, em caso positivo, a ocorrência de uma pena sem a outra, de forma dissociada, que fora o que de fato verificou-se no caso de Dilma Rousseff.

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instituto, compreender o contexto em que está inserido, procurando, por fim, posicionar-se sobre a viabilidade da votação da pena de forma separada.

No primeiro capítulo do trabalho de conclusão de curso, discorre-se, de forma geral, o que é o impeachment e, mais especificamente, qual é a sua natureza jurídica, para esclarecer bem o processo e suas peculiaridades, e com tais podem influenciar quanto as decisões tomados em seu bojo.

No capítulo seguinte, aborda-se especificamente os procedimentos previstos e adotados no impedimento do Presidente da República, primeiramente descrevendo o processo ocorrido anterior ao de Dilma Rousseff, o de Fernando Collor, enfatizando a análise nas decisões referentes ao rito procedimental adotado, e principalmente sua repercussão. Após será estudado mais especificamente o processo de Dilma, para melhor compreensão de cada etapa ocorrida.

Por fim, o último capítulo do trabalho, tem por finalidade o estudo da possibilidade ou não de se votar em separado a pena do impeachment, e consequentemente a viabilidade de existir pena diferente ou “fatiada”, daquela

extraída da exegese literal do art. 52, parágrafo único, da Constituição Federal, além de sua repercussão no ordenamento pátrio, bem como da consequência de uma eventual anulação da decisão que permitiu a votação em separado.

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2. O IMPEACHMENT EM GERAL

Inicialmente é necessário tecer algumas explicações e apresentar informações gerais quanto ao processo de impeachment, para não só compreender com mais clareza o instituto, como também para fundamentar o posicionamento que será estabelecido ao final deste trabalho.

2.1. Conceito e Origem

Para melhor entender o instituto, é essencial conceituá-lo. O dicionário online da Universidade de Cambridge (2016, online), conceitua o termo impeachment como sendo a ação de acusar formalmente um funcionário público por um crime grave e que tenha relação com seu trabalho.

Em tradução realizada pelo dicionário Michaelis (2016, online), o vocábulo impeach, núcleo da palavra impeachment, possui os seguintes significados: acusar, culpar, contestar, pôr em dúvida, pôr em questão, censurar, criticar, impedir, desacreditar, depreciar. Não é à toa que muitas vezes usa-se como sinônimo de impeachment a palavra impedimento, inclusive pela doutrina (Bonavides, 2011).

Com a conceituação exposta é possível compreender a ideia de intimidade que esta ação tem com os exercícios funcionais do agente público, não sendo qualquer infração grave que a enseja, mas aquela que tenha intrínseca ligação com o trabalho público realizado.

Antônio Riccitelli (2006, p. 17) procurando a conceituação do termo explica que:

Na busca dessa definição, chega-se à origem etimológica da palavra impeachment, do latim impedimentum, que significa impedir, proibir a entrada com os pés, e representa a idéia de não pôr os pés. A raiz comum do inglês peachment e do latim pedimentum é ped, que se traduz por pé, e somada ao preverbo em do inglês ou in do latim, cujo significado é “não”, integram o vocábulo dando o significado já citado. Etimologicamente, impeachment é “a proibição de entrar”

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pelo qual o Legislativo pune a conduta de autoridade pública, destituindo-a de seu cargo e impondo-lhe uma pena de caráter político. Vale pontuar que o processo pode ser realizado contra as mais altas autoridades do Estado, porém por ser objeto desse estudo aquele realizado contra o presidente da República, destaca-se os ensinamentos de Walber de Moura Agra (2014, p. 435) em que o impeachment presidencial se define como:

[...] a destituição do mandatário maior da nação, na duração do seu mandato, por ter incidido em crime de responsabilidade ou em crime tipificado em lei penal. É uma forma jurídica de perda do cargo do Chefe do Executivo, sem ser necessário recorrer à quebra da legalidade democrática. Suprime-se a representação popular, transformada em instrumento para a prática de atos atentatórios contra as disposições constitucionais vigentes.

Para complementar ainda mais o conceito, Araújo e Nunes Júnior (2001)

informam ainda que “a ideia nuclear do impeachment é a de que a autoridade processada deve ser destituída do cargo que ocupa em função de conduta que revele incompatibilidade com os interesses que necessitem ser tutelados pelo cargo que

ocupa. ”

José Afonso da Silva (2005, p. 550) esclarece que o processo de impeachment é típico do sistema presidencialista, explicando que:

[...] no sistema parlamentarista, a responsabilidade do governo (Conselho de Ministros) apura-se perante o Parlamento, mediante mecanismos específicos, como o voto de desconfiança ou a moção de censura que obriga a demissão do Ministério.

[...] o próprio Presidente é responsável, ficando sujeito a sanções de perda do cargo por infrações definidas como crimes de responsabilidade, apuradas em processo político-administrativo realizado pelas Casas do Congresso Nacional.

Ao contrário do parlamentarismo, onde o governo é exercido por agente escolhido pelos próprios membros do Legislativo, o que impõe a estes a responsabilidade de destituí-lo de forma bem mais sintética, no presidencialismo, o Executivo se mostra como poder de elevada força e autônomo, respondendo por seus próprios atos, tendo, portanto, processo específico e bem regulado para que haja a perda do cargo.

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Bastos (1999) informa que o instituto do impeachment teria surgido na Inglaterra, no fim da Idade Média. Originando-se da prática de a Câmara dos Comuns em promover a acusação dos ministros do rei e a dos lordes julgá-los. Por razões da própria transição do absolutismo para o parlamentarismo naquele país, pois outros mecanismos próprios deste sistema surgiram, fazendo com o impedimento fosse perdendo sua razão de ser.

Nesse mesmo sentido, Ferreira Filho (2012, p. 766):

Criação inglesa, desenvolveu-se especialmente do século XIII à primeira metade do século XVII depois do que se tornou menos frequentemente usado. Tinha caráter judicial (no sentido que usualmente se dá a essa palavra). Fundava-se em crime e seu objetivo era não só a destituição da autoridade acusada mas [sic] também a aplicação à mesma de uma pena corporal.

Como mencionado pelo autor, nos primórdios, o instituto se mostrava idêntico ao que temos no direito penal, preocupando-se não só destituir a pessoa de seu cargo, mas também de condená-la a uma punição pessoal, restritiva, sem qualquer ligação com a proteção e defesa do Estado.

Pelas exposições literárias trazidas parece existir certa convergência, apesar de não unânime e de certeza absoluta, no sentido de que o impeachment teria surgido na Inglaterra, como umas das primeiras formas de restrição do poder estatal. A ideia naquela época é bem similar ao que se tem no processo atual, de limitar o poder soberano do rei contra os mais diversos absurdos, além de servir como ferramenta de responsabilização contra eventual dano ou atitude inescrupulosa que o rei ou seus agentes poderiam cometer.

Típico do direito ocidental, o impeachment nasceu na Inglaterra como processo Criminal [...] nasceu no direito medieval em congruência com o próprio surgimento da representação política das únicas classes que podiam estar em parlamento com o rei: os nobres feudais e os novos burgueses enriquecidos, aqueles ainda senhores dos feudos e estes já deles libertos pelo mercantilismo. Em meio a essa tríplice estrutura, em que o rei (a Casa Real) entra em parlamento com os nobres leigos e clericais (a Casa dos Lordes) e com os burgueses (a Casa dos Comuns), o impeachment nasceu, viveu e morreu em função da correlação de forças por efeito da qual tem evoluído o governo inglês: the king in parliament. (BARROS, 2003, 137)

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Soberano Real, e posteriormente, para a destituição do Presidente por cometimento de crime de responsabilidade.

A ideia do processo é servir como freio e contrapeso na atuação do Presidente que possa violar ou viole diretamente a Constituição, com intuito de responsabilizá-lo e impedir que decisões políticas, ainda que na seara independente do Poder Executivo, possam trazer graves danos ao Estado.

Sobre esse assunto, entendendo não ser o instituto violador da separação dos poderes, e da independência funcional destes, Ferreira Filho (1983, p.63) explica que:

Não pode ser, porém, absoluta essa independência, em virtude de necessidades práticas. Assim, não fere, nem contradiz a independência, por exemplo, a convocação extraordinária do Legislativo pelo Executivo, ou o julgamento do Presidente da República, no caso de impeachment, por uma das câmaras legislativas.

O instituto vem exatamente servir como mais um instrumento para contrabalancear os poderes estatais, principalmente devido à grande massa de recursos estarem concentradas nas mãos do Poder Executivo, e com isso, sua atuação política sem restrições causar grave desequilíbrio na tripartição de poderes.

Realizados alguns comentários sobre seu conceito e origem, cumpre agora estabelecer algumas explicações sobre a ideia de crime de responsabilidade, instituto do qual o processo está intimamente ligado e fortemente dependente.

2.2. Do crime de responsabilidade

Todo o conceito de impeachment está ligado diretamente à ideia de crime de responsabilidade e dele depende para existir.

Para o surgimento do processo de impeachment contra o Presidente, é necessário a existência de tal delito. Mas o que seria exatamente o crime de responsabilidade?

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Art. 85. São crimes de responsabilidade os atos do Presidente da República que atentem contra a Constituição Federal e, especialmente, contra:

I - a existência da União;

II - o livre exercício do Poder Legislativo, do Poder Judiciário, do Ministério Público e dos Poderes constitucionais das unidades da Federação;

III - o exercício dos direitos políticos, individuais e sociais; IV - a segurança interna do País;

V - a probidade na administração; VI - a lei orçamentária;

VII - o cumprimento das leis e das decisões judiciais.

Parágrafo único. Esses crimes serão definidos em lei especial, que estabelecerá as normas de processo e julgamento. (Brasil, 1988, online)

Em breve síntese, informa apenas que são aqueles crimes que “atentem contra a Constituição Federal”, e após lista exemplificativa de ações que se

enquadram no conceito. Em seu parágrafo único, delega à lei a definição de tais crimes, determinando também que seja legislado sobre o processo e julgamento destes.

A lei nº 1.079/50 (Brasil, 1950, online), da mesma forma que a Constituição, não define o conceito de crime de responsabilidade, porém arrola diversas condutas que são consideradas como crimes de responsabilidade, dividindo-as em 8 diferentes tipos, quais sejam: dos crimes contra a existência da União, contra o livre exercício dos Poderes Constitucionais, contra o exercício dos direitos políticos, individuais e sociais, contra a segurança interna do país, contra a probidade na administração, contra a lei orçamentária, contra a guarda e legal emprego dos dinheiros públicos, e por fim, contra o cumprimento das decisões judiciárias.

Sobre os tipos apresentados, abre-se um parêntese para uma crítica ao legislador que deve ser levantada.

Algumas definições de condutas trazidas pela lei se apresentam bastante claras e específicas, semelhante ao que se vê nas legislações penais, estruturando com detalhes que tipos de ações se enquadram como crime de responsabilidade, exemplo dessas condutas são:

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Art. 9º São crimes de responsabilidade contra a probidade na administração: 2 - não prestar ao Congresso Nacional dentro de sessenta dias após a abertura da sessão legislativa, as contas relativas ao exercício anterior;

As condutas apresentadas aparentam elevado grau de objetividade, bem similar aos tipos penais presentes na legislação infraconstitucional.

Apesar disso, outras tantas condutas descritas se mostram de uma ampla subjetividade, ensejando interpretações de que quase quaisquer condutas realizadas pelo Presidente podem ser tidas como crime de responsabilidade:

Art. 5º São crimes de responsabilidade contra a existência política da União: 3 - cometer ato de hostilidade contra nação estrangeira, expondo a República ao perigo da guerra, ou comprometendo-lhe a neutralidade;

6 - celebrar tratados, convenções ou ajustes que comprometam a dignidade da Nação;

Art. 9º São crimes de responsabilidade contra a probidade na administração: 7 - proceder de modo incompatível com a dignidade, a honra e o decôro [sic] do cargo.

É difícil objetivar, pelos incisos expostos, o que seria, por exemplo, “ato de hostilidade que expõe a República ao perigo da guerra”, pois os atos de Chefe de

Estado, atuando internacionalmente, podem nem sempre agradar todos os países, e assim, alguns destes se sentirem ofendidos a ponto de declararem guerra ao Brasil.

Mais difícil ainda seria definir um conceito, já tão difícil de conceituar e objetivar, do que seria a “dignidade”. Diga-se de passagem, ainda mais a dignidade de uma nação inteira. Soma-se a isso, agora dos ainda mais subjetivos e de conceitos

mais amplos “honra” e “decoro” que o Presidente deve preservar.

Fechado o parêntese, o que se pode afirmar é que a ideia de crime de responsabilidade, semente do processo de impeachment, é bastante subjetiva e discricionária à vontade daqueles que irão enquadrar determinada conduta. O que se pode dizer é que tal definição tem caráter fundamentalmente político.

Nesse sentido, Bulos (2014, p. 1254) assim define o crime de responsabilidade:

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interna do País, à probidade administrativa, à lei orçamentária, ao cumprimento das leis e das decisões judiciais (CF, art. 85, caput, I a VII)

Com entendimento bastante similar, Mendes (2015, p. 957) compreende

que “os crimes de responsabilidade se caracterizam como infrações político-administrativas que dão ensejo à perda do cargo e à inabilitação para o exercício de

função pública pelo prazo de oito anos (CF, art. 52, parágrafo único). “

A ideia de infração político-administrativa, ressaltada pelos autores, quanto ao elemento político, deriva de determinados atos, cometidos por agentes políticos, ou seja, aqueles de alto poder decisório e de ampla discricionariedade junto ao aparato público, que atentam contra o próprio Estado e suas normas basilares. Devido a este largo leque de opções na atuação do agente, é necessário que haja um controle político que vai analisar como sendo, determinada conduta, infracional, e assim passível de punição nos termos específicos determinados para este tipo de delito. O elemento administrativo decorre da ideia de infração preexistente nos dispositivos legais, com procedimento de apuração definido.

Ferreira Filho (2012, p. 193), ao tratar sobre as figuras presentes na Lei

1079/50, chega à conclusão de que esta lei “define as figuras que dão ensejo ao

impeachment. Sem dúvida, a maior parte dessas figuras retrata comportamentos politicamente indesejáveis e não condutas antissociais. Essas figuras, pois, não são

crimes, no sentido que a ciência penal dá a esse termo. ” Existe então, por parte deste autor, o afastamento de natureza penal, o que a palavra “crime” pode levar a pensar,

da essência do crime de responsabilidade, além de reconhecer a natureza política do instituto.

Da mesma forma Cunha Júnior (2012, p. 917) ressalta que “entendemos

que crime de responsabilidade, que é crime apenas no nome, não passa de infração de natureza político-administrativa, que não diz respeito, por isso mesmo, ao direito

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De forma ainda mais contundente, Araujo e Nunes Junior (2001, p. 217) ressalta o enquadramento político do crime de responsabilidade, destacando o juízo discricionário de sua tipificação com que o instituto está sujeito.

Somente os atos que caracterizam crimes de responsabilidade - que, como se disse, não são crimes propriamente ditos, mas infrações político-administrativas - podem provocar o impeachment. Para perfeita compreensão do tema, é importante reconhecer que o crime de responsabilidade não é um delito propriamente dito, mas uma infração de caráter político-administrativo. Logo, sua configuração não viceja a existência de tipicidade e antijuridicidade, mas sim um juízo congressional de oportunidade e conveniência.

A discricionariedade não coaduna com a ideia de crime, que normalmente conhecemos derivada da legislação repressiva. No direito penal existe muito bem delimitadas as condutas que, uma vez realizadas, ensejam obrigatoriamente o devido processo para apurá-las e porventura determinar pena punitiva, previamente estabelecida.

Brossard (1965, p. 64) sugere, ao verificar a confusão que a expressão

“crime” causa na classificação do instituto, que a denominação deveria ser infrações políticas, tendo em vista sua peculiar natureza política e diversa do crime de natureza penal.

Se aos crimes de responsabilidade, enquanto relacionados a ilícitos políticos, se reservasse a denominação de infrações políticas, por exemplo, melhor se atenderia à natureza das coisas e se evitaria o escolho decorrente da designação, pelo mesmo nome, de realidades diversas.

É inviável afastar a natureza política do crime de responsabilidade, ao contrário do que sua denominação poderia simular. Alguns fatores na própria análise das disposições jurídicas do instituto parecem trazer à tona essa ideia.

Primeiramente, a própria pena a que está sujeito o processado “...à perda do cargo, com inabilitação, por oito anos...” que não existe, tanto a perda do

cargo como a inabilitação, como penas autônomas na seara criminal. A ideia é cassar o mandato daquele agente que teve ações politicamente danosas ao Estado, e evitar que retorne imediatamente, ou com certa brevidade, a desempenhar função pública.

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penais. Como já mostrado, a Lei nº 1.079/50 possui tipos delituosos que descrevem condutas demasiadamente subjetivas, ou que utilizam termos passíveis de amplo enquadramento. Tais tipos jamais poderiam ser utilizados na seara criminal ordinária, sob pena do indivíduo comum está passível, a todo instante, a cometer um ilícito penal por condutas que muitas vezes não teriam gravidade alguma, ou sequer causasse algum dano, seja pessoal ou social.

Por fim, o órgão constitucionalmente designado para apurar o crime de responsabilidade não é órgão do Poder Judiciário, mas do Legislativo. Sendo assim, não se exige a fundamentação nas decisões, conforme impõe o artigo 93, inciso IX da

Constituição Federal “...todos os julgamentos dos órgãos do Poder Judiciário serão públicos, e fundamentadas todas as decisões, sob pena de nulidade... “

A ausência é ainda mais nítida quando se verifica a forma como votam os parlamentares em suas deliberações quanto ao processo de impeachment. Enquanto o órgão julgador do Poder Judiciário precisa motivar cada uma de suas decisões, por razões fáticas e jurídicas, os legisladores apenas precisam responder Sim ou Não para surtir o mesmo efeito, podendo decidir por razões, muitas vezes, de cunho pessoal. Isso é o que se extrai nitidamente das disposições da Lei nº 1.079/50 que rege o processo.

Art. 68. O julgamento será feito, em votação nominal pêlos [sic] senadores desimpedidos que responderão "sim" ou "não" à seguinte pergunta enunciada pelo Presidente: "Cometeu o acusado F. o crime que lhe é imputado e deve ser condenado à perda do seu cargo?"

Certa fundamentação existe tão somente no recebimento da peça inicial de acusação pelo presidente da Câmara dos Deputados, porém apenas nos requisitos formais, sem adentrar ao mérito. O Regimento Interno da Câmara dos Deputados esclarece quais os requisitos e dispõe que esta análise é apenas formal.

Art. 218 - § 1º A denúncia, assinada pelo denunciante e com firma reconhecida, deverá ser acompanhada de documentos que a comprovem ou da declaração de impossibilidade de apresentá-los, com indicação do local onde possam ser encontrados, bem como, se for o caso, do rol das testemunhas, em número de cinco, no mínimo.

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Na Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental nº 378, julgada pelo Supremo Tribunal Federal, de relatoria do Ministro Edson Fachin (Brasil, 2015), ficou decidido que os casos de impedimento e suspeição, presente da legislação processual penal, não são aplicáveis ao processo político do impeachment, tendo em vista sua natureza peculiar e política.

Assim, tanto quanto as causas de impedimento e suspeição, outras limitações impostas aos magistrados, próprias do processo jurisdicional, que visam à garantia de um juízo dotado da mais absoluta imparcialidade, não se compatibilizam com o processo jurídico-político do impeachment. (Brasil, 2015, Supremo Tribunal Federal, online)

Excetuando este caso, as demais decisões, inclusive a de mérito que impõe a condenação, se dão de forma como mostrando anteriormente, com a votação dos parlamentares sem motivação expressa, de forma simples com Sim ou Não.

Uma vez não sendo exigida a fundamentação nas decisões, é impossível verificar se a motivação está conforme o ordenamento, ou seja, o simples arbítrio ou desejo íntimo dos membros do Legislativo, sem exposição de motivos, é o suficiente e juridicamente tolerável para enquadrar uma conduta como sendo crime de responsabilidade.

Verificada a essência e substancial natureza política dos crimes de responsabilidade, dos quais está passível de cometimento o Chefe do Executivo nacional, necessário agora é entender a natureza jurídica do processo de impedimento em si, e em como se relacionam os dois institutos.

2.3. Natureza Jurídica

Muito importante se faz a definição da natureza jurídica do impeachment para o desenvolvimento deste trabalho. Sua determinação é de suma importância para fundamentar as ideias que serão apresentadas no decorrer desta produção.

Primeiramente necessário se faz a conceituação do que seria natureza jurídica de qualquer instituto. Segundo Delgado (p.16) buscar a natureza jurídica:

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Assim, buscar a natureza jurídica de um instituto é defini-lo e classificá-lo de forma a enquadrá-classificá-lo em conceitos similares na ciência do Direito, com base em suas estruturas e elementos.

Quanto ao impeachment, a dúvida quanto a sua natureza jurídica orbita entre duas possibilidades: natureza política ou natureza penal.

Grande parte da doutrina se posiciona pela natureza política do processo. Nesse sentido, Uadi Lammêgo Bulos (2014, p. 1266-1267) de forma estruturada e objetiva se posiciona por reconhecer a natureza política do instituto pelos seguintes motivos. Primeiro porque o processo é instaurado sob considerações políticas e julgado segundo critérios políticos, levando em conta a sanção que é imposta, ou seja, a perda do cargo, e o impedimento de novas investiduras. Além disso ressalta que:

Não pune delinquentes, nem intenta atingir a pessoa física e seus bens – simplesmente desveste a autoridade de sua capacidade política, a fim de proteger o Estado no presente e no futuro; logo, é uma instituição de direito Constitucional, e não Penal. (Bulos, 2014, p. 1267)

O intuito do processo é exatamente de proteção do Estado contra os atos de agente político de amplos poderes, e de larga margem de escolha, do qual sua atuação está sendo prejudicial a própria nação. Afastá-lo do cargo se mostra essencial para atingir esse fim de segurança. O impedimento para novas investiduras se mostra como uma segunda pena que atinge pessoalmente o agente político, já que com seu afastamento suas ações passam a ter pouca ou nenhuma capacidade lesiva para o Estado, fazendo apenas que aquela pessoa não possa mais, temporariamente, exerce cargo dentro da esfera pública, como verdadeira punição.

Paulo Brossard (1965, p. 78) também se posiciona, após minuciosa análise, pela natureza política do procedimento:

Entre nós, porém, como no direito norte-americano e argentino, o impeachment tem feição política, não se origina senão de causas políticas, objetiva resultados políticos, é instaurado sob considerações de ordem política e julgado segundo critérios políticos.

O mesmo entendimento se verifica na obra de Michel Temer (2007) sobre o assunto, explicando que:

(26)

que, tipificada a hipótese de responsabilização, o Senado haja de, necessariamente, impor penas. (Temer, 2007, p. 169)

Fica bastante difícil não se entender pela natureza política do impeachment. Em síntese, é um processo que tem início com uma denúncia oferecida na Câmara dos Deputados, órgão não judicial que irá, sem fundamentação típica do Judiciário, realizar um juízo de admissibilidade da peça inicial. Após, aceita a denúncia, dá-se encaminhamento para o Senado Federal, órgão também não judicial, que também sem fundamentação irá então decidir pela condenação e aplicação da pena ao Chefe do Executivo. Um procedimento nesses moldes, tem todas as razões para ser político, pois se verifica, além de outros motivos já explicados, pela falta de fundamentação, que poderão os julgadores do impedimento decidirem por conveniência e oportunidade.

A governabilidade, ou melhor, sua falta, também é fator bastante considerado para não só condenar um presidente neste processo político, como também elemento, utilizado por alguns autores, como estabelecedor da natureza jurídica, como Dirley da Cunha Jr. (2012) que afirma ser “o impeachment, na verdade, é uma medida de cunho essencialmente política destinada a impedir que determinadas autoridades permaneçam nos seus respectivos cargos públicos, onde a sua ação prejudicaria os interesses do País.”

Percebe-se que o autor trata, na verdade, não do enquadramento de uma conduta nos tipos definidos na lei, mas de potencial risco em manter determinado indivíduo em relevante cargo, ainda que não tenha cometido qualquer ação de tipificação legal, como motivo ensejador do processo. De fato, na prática, os dispositivos constitucionais e legais permitem essa enorme margem de discricionariedade aos parlamentares, permitindo que decidam com base na falta de governabilidade que o presidente possui. Apesar disto, em tese, entendemos que o processo de impeachment somente poderia ocorrer com a existência de conduta, por parte do Chefe do Executivo, que se enquadra nas tipificações legais, sob pena de desvirtuamento do instituto.

(27)

Zawaski citando, Flávio Augusto Saraiva Straus, ressaltou seu entendimento quanto à natureza política do instituto, enquadrando também a questão da governança a qual, se não realizada de forma razoável, poderia ensejar o processo de impeachment.

Mais uma vez é necessário frisar que, pelo extrato essencialmente político dos crimes de responsabilidade, a projeção atentatória à Constituição Federal, exigida pelo art. 85, caput, não se depreenderá, no mais das vezes, do ato unitariamente imputado ao acusado, mas da desenvoltura negativa que ele adquire no contexto de governança global da Administração Pública. Daí a doutrina afirmar que, se por vezes “o crime de responsabilidade pode configurar-se em ato singular e perfeitamente limitado em um momento do tempo, por ouras, quiçá mais numerosas que as primeiras, será possível e necessário investigar toda uma política pública, implementada para uma área específica da Administração, a fim de determinar a ocorrência, ou não, do atentado à Constituição, cuja defesa é garantia primordial de toda a sociedade” (Brasil, STF, Decisão Monocrática, min. Teori Zawaski, 2016)

Sobre a fundamentação dos parlamentares no processo, Castro (2016) ressalta que:

[...] os deputados federais e senadores, movidos por suas convicções e interesses, poderão abdicar de um julgamento imparcial, privilegiando os interesses políticos que detêm ou até mesmo seguir orientação partidária previamente estabelecida, tudo isso contra ou a favor do denunciado.

Apesar disso, deve ser observado que certo traço de natureza jurídica, propriamente dita, existe no processo. Primeiramente pela participação do Presidente do Supremo Tribunal Federal como sendo o membro que irá presidir o processo, e como tal, zelar pela aplicação dos procedimentos previstos, sendo “julgamento que

não exclui, antes supõe, é obvio, a adoção de critérios jurídicos” (Pinto, 1965)

Carlos Alberto Menezes Direito (2006) também ressalta essa interferência jurídica no processo, principalmente quando se trata de ver respeitadas as garantias fundamentais:

Não se pode esquecer que, embora predomine a natureza política, o instituto fica no resguardo das regras jurídicas constitucionais, o que quer dizer, concretamente, que sua aplicação depende do preenchimento dos pressupostos estabelecidos pela Constituição e pela legislação infraconstitucional especial. Invocar o remédio constitucional não é, apenas, uma questão política, é, antes de tudo o mais, uma questão jurídica de Direito Público, e, portanto, subordinada às regras científicas próprias, a começar pelo contraditório e ampla defesa, para não falar do sempre fundamental due process of law [sic]. (Direito, 2006, online)

(28)

bem definido, a margem de escolha política fica bastante reduzido, tanto para enquadrar a conduta, como para desconsiderá-la como sendo crime de responsabilidade. Com esse entendimento, Ferreira Filho (2012, p. 193) explica:

Sem dúvida, há larga margem para apreciação de caráter político, ao se encarar o que seja uma conduta contrária à Constituição. Entretanto, se essa conduta vem definida em lei como configurando "crime de responsabilidade", é difícil compreender de que maneira pode a Câmara, sem violar a lei, deixar de reconhecer como tal uma figura na lei descrita.

Mesmo diante da verificação desta interferência jurídica, percebe-se que ela apenas intervém nos procedimentos e rito que serão aplicados ao processo, jamais adentrará no mérito. Dessa forma, se for utilizado tipo legal subjetivo e de ampla definição, fica impossível qualquer análise jurídica no enquadramento de tipicidade, devendo-se reconhecer que em sua essência, o processo de impedimento presidencial tem natureza estritamente política. Além disso, determinado presidente pode cometer conduta que é entendida como sendo crime de responsabilidade e ser condenado por isso, em uma época, enquanto outro agente cometer a mesma conduta, em outro período, e sequer ter o processo instaurado, exatamente pela natureza das pessoas envolvidas, principalmente dos julgadores.

Nesse sentido, e defendendo a natureza política do impeachment, Dirley da Cunha Júnior (2012, p. 1101) também expõe seu posicionamento.

O impeachment, na verdade, é uma medida de cunho essencialmente política destinada a impedir que determinadas autoridades permaneçam nos seus respectivos cargos públicos, onde a sua ação prejudicaria os interesses do País. Surgiu, assim, como uma necessidade de impedir que os representantes do Poder Executivo ultrapassem o âmbito regular de suas atividades.

Indo contrariamente à ideia política, e de boa parte da doutrina, Pontes de Miranda (1967, p. 353) defende o caráter penal do impedimento.

Não há julgamento político dos julgadores: há aplicação de regras de direito material, por corpo político homogêneo ou misto. O que se tem por fito, com o impeachment brasileiro, inconfundível com o dos outros Estados, é ao mesmo tempo punir-se o dirigente e dar-se-lhe [sic] foro especial durante a permanência do cargo.

(29)

parlamentarismo, onde explica que neste existe a natureza política, ao contrário do impeachment presidencial.

O presidencialismo conhece tão-somente a responsabilidade de ordem jurídica, que apenas permite a remoção do governante, incurso nos delitos previstos pela Constituição. Defronta-se o sistema porém com um processo lento e complicado (o impeachment, conforme vimos), que fora da doutrina quase nenhuma aplicação teve. Muito distinto aliás da responsabilidade política a que é chamado o Executivo na forma parlamentar, responsabilidade mediante a qual se deita facilmente por terra todo o ministério decaído da confiança do Parlamento. (Bonavides, 2011, p. 337)

Pelo o que já foi explicado, principalmente no tópico referente ao crime de responsabilidade, não concordamos com esta ideia de ter natureza penal ou jurídica, não só quanto ao crime de responsabilidade, como para o próprio processo de impeachment. A natureza penal/jurídica enseja não só conduta repulsiva socialmente, cuja punição se dá com a retirada de um dos bens mais importante do ser humano, a liberdade, mas também um grau de especificidade que define objetivamente quais condutas não devem ser realizadas.

Sobre a ideia trazida por Paulo Bonavides, discordamos de seu posicionamento quanto a não considerar o cunho político presente no impeachment presidencial. De fato, no parlamentarismo o teor político é evidente e latente, podendo-se o chefe de governo podendo-ser deposto por mera impopularidade ou falta de apoio político, não sendo necessário qualquer enquadramento de crime de responsabilidade. A constatação do caráter político manifesto no parlamentarismo não exclui a também notória, apesar de menor comparada com o sistema de governo parlamentar, natureza política exposta no presidencialismo. Por ter o impeachment presidencial como julgadores os senadores, que julgam levando em conta suas convicções pessoais, muitas vezes político-partidárias, a ideia de crime de responsabilidade se torna simples coadjuvante no processo, depois de sua instauração, sendo gritante também seu teor político.

(30)

deflagração do processo de impedimento, porém sua acessoriedade, na prática, se mostra evidente pelos motivos íntimos que muitos parlamentares se utilizam para proferir seu voto, o que dá ensejo à ênfase do caráter político que está revestido o instituto do impeachment.

Acreditamos que dificilmente, ou melhor, é impossível que os congressistas ao julgar o Presidente deixem de lado suas convicções políticas, e julguem estritamente de forma jurídica/penal. Pelo contrário, a tendência é que julguem politicamente, e deixem completamente de lado a análise jurídica, não só por falta de conhecimento jurídico que eles possuem, mas principalmente pelos interesses pessoais, partidários e políticos.

Para finalizar e sintetizar as ideias já apresentadas, Luís Roberto Barroso também defende a ideia da natureza política do impeachment, usando das lições de Paulo Brossard ao afirmar que:

É inegável que o processo de impeachment tem uma dimensão política, tanto pela natureza dos interesses em jogo e das pessoas envolvidas, como, notadamente, por duas circunstâncias: a) não podem os órgãos do Poder Judiciário rever o mérito da decisão proferida pela Casa Legislativa; b) a decisão não deve reverência aos rigores de objetividade e motivação que se impõem aos pronunciamentos judiciais (CF, art. 93 IX).

Percebe-se que este autor também realça o reduzido caráter, ou ausência, de objetividade e motivação no procedimento, como alguns dos elementos definidores da natureza política do instituto, além dos próprios participantes envolvidos e da matéria em questionamento. Todos esses elementos, sistematicamente trazidos por Barroso, evidenciam muito bem o enquadramento jurídico do impeachment, que se mostra essencialmente político.

Pelas ideias e posicionamentos trazidos e expostos, mostra-se bem latente o caráter político do procedimento objeto de estudo deste trabalho. No próximo capítulo será destacado o procedimento em si, com suas etapas, dispositivos de regência, além da análise dos processos de impeachment que já ocorreram na história brasileira, com ênfase no de Dilma Rousseff.

(31)

Para tratar da possibilidade jurídica do fracionamento da pena que ocorreu no processo de impeachment de Dilma Rousseff, necessário também se faz entender como se dá o procedimento neste processo, e através desta compreensão, analisar as decisões tomadas e sua correlação com o ordenamento.

Porém, antes de aprofundar o estudo do processo alvo deste trabalho, explicações merecem ser dadas com relação, primeiramente, às disposições gerais dos procedimentos prescritos pelo ordenamento quanto ao impeachment presidencial, e após, para uma abordagem mais referencial, analisar o processo pretérito de impeachment presidencial que ocorreu na história brasileira, qual seja, do ex-presidente Fernando Collor.

3.1. Disposições gerais dos procedimentos no impeachment

Inicialmente, cabe expor como a Constituição Federal, base do ordenamento jurídico brasileiro, trata do assunto.

Na Carta Magna, os artigos 52, 85 e 86 são os que regem diretamente a matéria sobre crime de responsabilidade, e como ele deve ser processado, quando se referir ao presidente da República.

Art. 52. Compete privativamente ao Senado Federal:

I - processar e julgar o Presidente e o Vice-Presidente da República nos crimes de responsabilidade, bem como os Ministros de Estado e os Comandantes da Marinha, do Exército e da Aeronáutica nos crimes da mesma natureza conexos com aqueles;

[...]

Parágrafo único. Nos casos previstos nos incisos I e II, funcionará como Presidente o do Supremo Tribunal Federal, limitando-se a condenação, que somente será proferida por dois terços dos votos do Senado Federal, à perda do cargo, com inabilitação, por oito anos, para o exercício de função pública, sem prejuízo das demais sanções judiciais cabíveis.

Art. 85. São crimes de responsabilidade os atos do Presidente da República que atentem contra a Constituição Federal e, especialmente, contra: [...]

Parágrafo único. Esses crimes serão definidos em lei especial, que estabelecerá as normas de processo e julgamento.

Art. 86. Admitida a acusação contra o Presidente da República, por dois terços da Câmara dos Deputados, será ele submetido a julgamento perante o Supremo Tribunal Federal, nas infrações penais comuns, ou perante o Senado Federal, nos crimes de responsabilidade.

§ 1º O Presidente ficará suspenso de suas funções: [...]

II - nos crimes de responsabilidade, após a instauração do processo pelo Senado Federal.

(32)

§ 2º Se, decorrido o prazo de cento e oitenta dias, o julgamento não estiver concluído, cessará o afastamento do Presidente, sem prejuízo do regular prosseguimento do processo.

Da simples leitura dos dispositivos constitucionais é possível retirar diversos regramentos processuais.

Primeiramente, quanto à competência para julgamento, realizado pelo Senado Federal, tendo como presidente, excepcionalmente neste julgamento, o presidente do Supremo Tribunal Federal. Para que a condenação seja decidida, é necessário o mínimo de dois terços dos votos da casa.

Porém existe um traço processual marcante no impeachment que merece destaque, pois o órgão que irá realizar o julgamento de mérito, final, não é o competente para julgar a admissibilidade da denúncia realizada e que poderá levar ao início do processo, diferente de como normalmente se verifica com os órgãos judiciais.

Nesse sentido, André Puccinelli Jr (2012, p. 382) entende como um procedimento bifásico.

O impeachment é bifásico, posto contemplar uma fase preambular na qual se realiza mero juízo de admissibilidade do processo, o que é feito pela Câmara dos Deputados (Tribunal de Pronúncia), além de prever uma segunda fase que é a de julgamento e ocorre perante o Senado Federal (Tribunal de Julgamento).

A Lei nº 1.079/50 utiliza os mesmos termos, referindo-se às funções da Câmara e do Senado no processo.

Art. 80. Nos crimes de responsabilidade do Presidente da República e dos Ministros de Estado, a Câmara dos Deputados é tribunal de pronuncia e o Senado Federal, tribunal de julgamento; (Brasil, 1950)

Antes de prosseguir na explanação, cabe destacar que a Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental nº 378, julgada pelo Supremo Tribunal Federal, de relatoria do Ministro Edson Fachin (Brasil, 2015), decidiu pela não recepção de alguns dispositivos da Lei nº 1.079/50, além de dar interpretação conforme à Constituição para outros.

(33)

[...] por maioria, deferiu integralmente o pedido para declarar que não foram recepcionados pela CF/88 os arts. 23, §§ 1º, 4º e 5º; 80, 1ª parte; e 81, todos da Lei nº 1.079/1950, porque estabelecem os papeis da Câmara e do Senado Federal de modo incompatível com os arts. 51, I; 52, I; e 86, § 1º, II, da CF/88 [...] (Brasil, Supremo Tribunal Federal, 2015, online)

Ao contrário do disposto na antiga Constituição de 1946 (Brasil, 1946, online), diploma do qual a Lei do impeachment tem como fundamento constitucional originário, a atual Constituição define como competência da Câmara apenas a função de autorizar a instauração do processo de apuração de crime de responsabilidade. Por esse motivo, e os dispositivos citados da Lei nº 1.079/50 terem como base o antigo diploma de 1946, além de não mais se coadunarem com a atual Carta Magna, tais artigos foram considerados não recepcionados, na referida ADPF.

O antigo diploma constitucional se referia expressamente à função de instaurar o processo pela Câmara dos Deputados.

Art 88 - O Presidente da República, depois que a Câmara dos Deputados, pelo voto da maioria absoluta dos seus membros, declarar procedente a acusação, será submetido a julgamento perante o Supremo Tribunal Federal nos crimes comuns, ou perante o Senado Federal nos de responsabilidade.

Parágrafo único - Declarada a procedência da acusação, ficará o Presidente da República suspenso das suas funções. (Brasil, 1946, online)

Ressalta-se ademais, que uma vez procedente a acusação, declarada pela Câmara dos Deputados, o Presidente estaria suspenso das funções de seu cargo, diferente da atual disposição, que exige que seja instaurado pelo Senado o processo para que tal suspensão se dê. (Brasil, 1988)

Prosseguindo na exposição, antes da denúncia chegar às mãos do Senado, para que este julgue o processo, a Constituição prevê que a Câmara dos Deputados, por no mínimo dois terços dos votos de seus membros, decida por autorizar a instauração do processo de impeachment com base na peça inicial, conforme já exposto.

(34)

Art. 51. Compete privativamente à Câmara dos Deputados:

I - autorizar, por dois terços de seus membros, a instauração de processo contra o Presidente e o Vice-Presidente da República e os Ministros de Estado; (Brasil, 1988, online)

Sendo a função da Câmara apenas autorizar, o Senado ainda deliberará sobre a instauração do processo. Nem a Casa do Povo tem poder para instaurar o processo de forma autônoma, nem o Senado tem força para instaurar o processo sem a autorização daquela. Nota-se a necessidade de uma sintonia entre as casas para que o processo seja efetivamente instaurado, com a possível punição do Chefe do Executivo.

Uma vez inadmitida a denúncia, representada por não atingir o quórum constitucional qualificado, o impeachment morre ainda em sua fase embrionária, pois sequer chegará a apreciação dos senadores federais.

Vale ressaltar que a fração mínima necessária, tanto para a admissibilidade, como para a condenação é de dois terços do total absoluto de congressista em cada casa. Essa conclusão é nítida quando se nota que a fração se

refere diretamente às expressões “do Senado Federal” e “da Câmara dos Deputados”,

ou seja, tratando-se diretamente da casa em si, ou, do número de representantes que correspondem a cada uma das casas.

Uma vez recebida a denúncia, pelo mínimo previsto de votos pela Câmara dos Deputados, e instaurado o processo pelo Senado Federal, o Presidente da República ficará suspenso de suas funções pelo prazo máximo de cento e oitenta dias, findo os quais, se não houver ainda a sentença, o mesmo retornará a desempenhar suas funções normalmente. Destaca-se que, se sentenciado antes de transcorrido o prazo de 180 dias, e não sofrer a punição de perda do cargo, o Chefe do Executivo retornará logo em seguida da decisão absolutória, não sendo necessário aguardar o esgotamento do prazo máximo de suspensão.

Durante esse período de suspensão, o Presidente será substituído pelo seu sucessor, que pela leitura do artigo 79 da Constituição Federal, será o

(35)

Frisa-se que a expressão “impedimento” usada nesse dispositivo

constitucional, não é a mesma da que se utiliza a doutrina para sinônimo de impeachment (Bonavides, 2011), sendo, nesse contexto, utilizada com o significado de ausências temporárias, como é o caso da suspensão após a instauração do processo de impeachment, onde “impedimentos são situações que temporariamente impossibilitam o Presidente de exercer o cargo (ex.: viagem ao exterior; tratamento de saúde) ”. (CANOTILHO et al., 2013)

Após o recebimento da denúncia, instauração do processo pelo Senado e consequente suspensão do Presidente, o processo e suas fases procedimentais devem ocorrer. Todavia, a Constituição em si, não prescreve, além do que já fora levantado, qualquer outro detalhe quanto aos procedimentos que devem ser seguidos. Por isto, a Carta Magna dispõe, no anteriormente citado parágrafo único do artigo 85, que não só a definição dos crimes de responsabilidade, mas também as normas de processamento e julgamento do impeachment serão estabelecidas em lei especial.

Como já mencionado, a Lei a que se refere tal dispositivo constitucional é a Lei nº 1.079/50. Segundo o texto desta lei, o procedimento seguirá o trâmite da forma como será exposta adiante, com as ressalvas dos dispositivos que foram considerados não-recepcionados, que também serão mencionados.

Primeiramente será apresentada a denúncia, que pode ser feita por qualquer cidadão brasileiro. Temer (2007) utiliza o mesmo conceito de cidadania que é comumente utilizado pela doutrina, ou seja, aquele indivíduo de nacionalidade brasileira, com capacidade e plenitude de exercer seus direitos políticos.

Todo cidadão no gozo de seus direitos políticos é parte legítima para oferecer a acusação à Câmara dos Deputados. Somente os cidadãos, isto é, aqueles que a Constituição define como brasileiros (art. 12). E devem estar no gozo dos seus direitos políticos. Só quem deles goza pode exercê-los. A acusação da prática do crime de responsabilidade diz respeito às prerrogativas da cidadania; do brasileiro que cem o direito de participar dos negócios políticos. (Temer, 2007, p. 168)

A mesma ideia de cidadania está presente na Lei nº 4.717/65 (Brasil, 1965), exigindo documento hábil que comprove o exercício de direitos políticos “A prova da cidadania, para ingresso em juízo, será feita com o título eleitoral, ou com

(36)

A disposição legal que permite que qualquer cidadão seja a engrenagem iniciadora do processo de impeachment, coaduna com o entendimento antes explicado e pelo qual se posiciona este trabalho e boa parte da doutrina, qual seja, da natureza política do processo objeto de estudo. Nada melhor do que aquele que é o elemento constituidor da sociedade e do Estado, através da vontade transformadora de sua atuação política, ainda que unitária, para dar início a um processo político que pode destituir um representante de sua função pública (Bonavides, 2011).

Encaminhada a denúncia para a Câmara dos Deputados, seguindo o que é disposto na Lei nº 1.079/50, será criada comissão especial, com representação proporcional de todos os partidos, para emitir opiniões sobre a exordial. Nesta comissão será escolhido relator que emitirá parecer quanto à denúncia. O processo dentro da comissão será similar à fase de instrução de um processo penal comum, onde poderá a comissão requisitar as diligências que julgar necessárias para esclarecer os fatos alegados. Dentre as diligências, poderão ser solicitados maiores e melhores explicações dos acusadores, bem como manifestações por parte do acusado e oitiva de testemunhas.

Na citada ADPF nº 378, ficou decidido que tais diligências possuem o intuito tão somente de esclarecer os fatos da denúncia para uma melhor compreensão dos deputados.

[...] declarar recepcionados pela CF/88 os artigos 19, 20 e 21 da Lei nº 1.079/1950, interpretados conforme à Constituição, para que se entenda que as “diligências” e atividades ali previstas não se destinam a provar a improcedência da acusação, mas apenas a esclarecer a denúncia [...] (Brasil, Supremo Tribunal Federal, 2015, online)

Como já ressaltado, pela atual regra constitucional de competência no processo de impeachment, a Câmara dos Deputados não possui mais a função de pronunciar o acusado, similar ao que ocorre no Tribunal do Júri (Capez, 2016), passando esta função para a competência do Senado, dessa forma, por ser papel dos representantes do povo o mero juízo de admissibilidade, o conhecimento dos fatos deve se dar de forma menos profunda, com intuito apenas de esclarecimentos.

(37)

deputados, onde se iniciará a votação sobre se a denúncia será objeto de deliberação. Não sendo, a denúncia será arquivada.

Apesar de já mencionado o mínimo de votos para o recebimento da denúncia conforme a Constituição, qual seja dois terços, a Lei nº 1.079/50 estabelece em suas disposições gerais, artigo 81 que “a declaração de procedência da acusação

nos crimes de responsabilidade só poderá ser decretada pela maioria absoluta da

Câmara que a preferir” (Brasil, 1950), disposição esta que nitidamente não coaduna com as disposições constitucionais, e que foi declarada não recepcionada pela já referida ADPF nº 378, tendo em vista a Carta Magna se referir claramente à fração diferente sobre este assunto.

Sendo pela improcedência, o processo será arquivado. Do contrário, pela procedência, o denunciado será intimado imediatamente sobre a aprovação do recebimento da denúncia, que se autorizada, segundo a letra legal, surtirá como efeito o afastamento do cargo de Presidente, e a redução dos subsídios recebidos pela metade, até a sentença final do julgamento, este que será realizado pelo Senado. Conforme já citado, a ADPF nº 378 declarou não recepcionada tais disposições, que estão referidas nos §§1º e 5º do artigo 23 da Lei nº 1.079/50.

Art. 23 - § 1º Se da aprovação do parecer resultar a procedência da denúncia, considerar-se-á decretada a acusação pela Câmara dos Deputados.

§ 5º São efeitos imediatos ao decreto da acusação do Presidente da República, ou de Ministro de Estado, a suspensão do exercício das funções do acusado e da metade do subsídio ou do vencimento, até sentença final.

Dessa forma, conforme já relatado, a suspensão somente se dará após a instauração do processo pelo Senado Federal.

Quanto à suspensão, o texto constitucional impõe o limite de 180 (cento e oitenta) dias, findo os quais o presidente afastado retornará a exercer suas funções normalmente, ao contrário do “até sentença final” utilizado no dispositivo legal. Outro detalhe da lei que merece ser frisado é quanto ao artigo 82 das Disposições Gerais,

dispondo que “Não poderá exceder de cento e vinte dias, contados da data da declaração da procedência da acusação, o prazo para o processo e julgamento dos

crimes definidos nesta lei”, no qual, pela interpretação conjunta com a Constituição,

(38)

afastamento do cargo, que não poderá exceder 180 dias, contados da instauração do processo pelo Senado Federal, conforme já mencionado.

Parece-nos bastante indicado que o Senado encerre todo o processo antes do prazo limite de afastamento do Presidente, tendo vista que do contrário, haverá seu retorno e uma possível destituição posterior, definitiva, o que poderá gerar grave instabilidade política ou interferências no processo.

Passada essa fase, será o que fora apurado no processo, juntamente com o decreto de autorização da Câmara, remetido para o Senado, para então dar início ao julgamento propriamente dito. Como já mencionado, o Senado Federal é o órgão competente para processar e julgar o Presidente da República.

O que fora apurado até então pela Câmara, será remetido, juntamente com o decreto de acusação, ao Senado, que intimará os acusadores para oferecimento de libelo, e marcará data para sessão de julgamento, intimando o acusado, que poderá oferecer novos meios de provas. (Brasil, 1950, online)

Sobre o libelo acusatório, primeiro há de se destacar que o Código de Processo Penal, será utilizado de forma subsidiária à lei, conforme dispõe a Lei nº 1.079/50:

Art. 38. No processo e julgamento do Presidente da República e dos Ministros de Estado, serão subsidiários desta lei, naquilo em que lhes forem aplicáveis, assim os regimentos internos da Câmara dos Deputados e do Senado Federal, como o Código de Processo Penal.

Tendo em vista que a lei do impeachment nada dispõe, além de simplesmente mencionar o instituto do libelo, será utilizado complementarmente o Código de Processo Penal, onde neste dispunha, antes da revogação gerada pela Lei nº 11.689/2008 que:

Art. 417. O libelo, assinado pelo promotor, conterá: I - o nome do réu;

II - a exposição, deduzida por artigos, do fato criminoso;

III - a indicação das circunstâncias agravantes, expressamente definidas na lei penal, e de todos os fatos e circunstâncias que devam influir na fixação da pena;

IV - a indicação da medida de segurança aplicável.

(39)

§ 2º Com o libelo poderá o promotor apresentar o rol das testemunhas que devam depor em plenário, até o máximo de cinco, juntar documentos e requerer diligências.

Apesar da revogação do instituto no Código de Processo Penal, essa não parece ter gerado efeito no caso do processo de impeachment. Primeiro porque a revogação não atingiu diretamente a Lei nº 1.079/50, e segundo, pois o regimento interno do Senado, que também é usado de forma subsidiária à lei, prevê tal procedimento de oferecimento de libelo:

Art. 380. Para julgamento dos crimes de responsabilidade das autoridades indicadas no art. 377, obedecer-se-ão as seguintes normas:

[...]

III – a comissão encerrará seu trabalho com o fornecimento do libelo acusatório, que será anexado ao processo e entregue ao Presidente do Senado Federal, para remessa, em original, ao Presidente do Supremo Tribunal Federal, com a comunicação do dia designado para o julgamento;

Sendo assim, os dispositivos revogados sobre o assunto deverão ser utilizados, excepcionalmente, e subsidiariamente, para regular o processo de impedimento presidencial.

Similar ao que ocorre no júri, dará início ao procedimento de pronúncia, no Senado, onde será instruindo o processo para que seja apurado fortes indícios de materialidade e autoria dos delitos alegados (Capez, 2016) e de fato possa ter início o julgamento.

Será criada comissão especial, similar ao que fora explanado sobre a Câmara, para colher provas, emitir parecer pelo relator e discussão, pela comissão, sobre este parecer. Em seguida, será o apurado remetido para o plenário do Senado, que por votação de maioria simples, decidirá sobre a instauração do processo. A similaridade à pronúncia, conforme ocorre no Tribunal do Júri, é bem aparente, com a diferença apenas de que tanto a pronúncia como o julgamento final são realizados, aqui no impeachment, pelo mesmo órgão.

(40)

A comissão especial passará agora a apurar os fatos, com nova instrução, com fins conhecer da causa para que o plenário do Senado possa julgar de fato o presidente pelas alegações da denúncia por crime de responsabilidade, e se for o caso, aplicar pena. Neste momento, nos termos do parágrafo único do artigo 52 da

Constituição de República, “funcionará como Presidente o do Supremo Tribunal Federal” (Brasil, 1988)

Poderão ser utilizadas, além das que foram produzidas pela Câmara, novas provas, como testemunhas ou autoridades diferentes. Após essa fase, ocorrerão discussões sobre tudo que fora apurado, e o Presidente do Supremo Tribunal Federal produzirá relatório resumido de tudo que ocorreu, com todas as provas que foram produzidas, e remeterá ao Senado para que seja realizado o julgamento.

Conforme já relatado, a deliberação dos representantes dos estados se dará, na condenação, pelo voto de dois terços dos senadores. Sendo absolutória, ou seja, não se atingindo esse mínimo constitucional, o Presidente, desde logo, retornará a exercer as funções de seu cargo. Do contrário, a votação de condenação faz com

que o acusado seja “ipso facto destituído do cargo” (Brasil, 1950, online)

Contudo um dispositivo legal muito importante, na temática deste trabalho, é o referente ao artigo 33 da Lei nº 1.079/50, que ressalta que “No caso de condenação, o Senado por iniciativa do presidente fixará o prazo de inabilitação do

condenado para o exercício de qualquer função pública. ” (Brasil, 1950, online)

Após reconhecer que o Presidente cometeu infração definida como crime de responsabilidade, o Senado iria deliberar ainda sobre a pena de inabilitação a qualquer função pública. Vale ressaltar que antes da Constituição Federal de 1988, a lei se refere a pena de até 5 anos devido se coadunar com os termos da Constituição

de 1946 impondo que “não poderá o Senado Federal impor outra pena que não seja a da perda do cargo com inabilitação, até cinco anos, para o exercício de qualquer função pública, sem prejuízo da ação da Justiça ordinária” (Brasil, 1946), fato que restou superado devido a Constituição atual dispor ser de 8 anos a pena, sem o termo

Referências

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