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Gama, campeão brasileiro de futebol de 1998 : festa, memória e identidade

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Pró-Reitoria de Pós-Graduação e Pesquisa

Stricto Sensu em Doutorado em Educação Física

GAMA, CAMPEÃO BRASILEIRO DE FUTEBOL DE 1998: FESTA,

MEMÓRIA E IDENTIDADE.

Brasília/DF

2013

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CRISTIANE MELO DE OLIVEIRA

GAMA, CAMPEÃO BRASILEIRO DE FUTEBOL DE 1998: FESTA, MEMÓRIA E IDENTIDADE.

Tese apresentada ao Programa de Pós-Graduação Stricto Sensu em Educação Física da Universidade Católica de Brasília, como requisito parcial para obtenção do Título de Doutor em Educação Física.

Orientador: Professor Doutor Luis Otávio Teles Assumpção.

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Tese de autoria de Cristiane Melo de Oliveira “GAMA, CAMPEÃO BRASILEIRO DE FUTEBOL DE 1998: FESTA, MEMÓRIA E IDENTIDADE”,

apresentada como requisito parcial para obtenção de grau de Doutor em Educação Física da Universidade Católica de Brasília, de setembro de 2013, defendida e aprovada pela banca examinadora abaixo assinada:

Prof. Dr. Luis Otávio Teles Assumpção Orientador

Mestrado e Doutorado em Educação Física - UCB

Prof.ª Dr.ª Tânia Mara Vieira Sampaio Mestrado e Doutorado em Educação Física - UCB

Prof.ª Dr.ª Ludmila Maria Moreira Lima

Universidade Federal do Estado do Rio de Janeiro - UNIRIO

Profª Dr.ª PhD Nanci Maria de França Mestrado e Doutorado em Educação Física - UCB

_________________________________________________________________ Prof. Dr. Gustavo Javier Castro Silva

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Dedicatória

Aos meus filhos e noras que Deus esteja sempre com eles

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Agradecimentos

A Deus por tudo que tenho, por tudo que sou e por mais essa conquista em minha vida, sem ele não sou nada;

Aos meus filhos Vinícius, Felipe, Bruno e Jailton por entenderem o meu isolamento durante o curso;

A minha nora Viviane por “segurar as pontas” em nossa casa quando eu não podia estar com ela;

Ao meu orientador Professor Doutor Luis Otávio Teles Assumpção por nunca ter desistido de mim e por me fazer conhecer mais uma luz do conhecimento;

As Professoras Doutora Tânia Mara Vieira Sampaio, Professora Doutora PhD Nanci Maria de França e a Professora Doutora Ludmila Maria Moreira Lima e aos Professores Doutor Gustavo Javier Castro Silva e Professor Doutor Ph.D Ronaldo Rodrigues da Silva por sabiamente terem conduzido a qualificação e a defesa da tese.

A minha chefe Ouvidora do Ministério do Esporte Maria Ivonete Gomes do Nascimento pela sua compreensão e apoio durante o estudo.

As minhas colegas de trabalho pela tolerância, compreensão e apoio durante o processo de estudo.

Ao Ministério do Esporte por ter fomentado o curso.

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RESUMO

Este estudo trata do esporte - futebol - como elemento de construção de uma memória coletiva capaz de estimular traços de identidade social, por influencia do time de futebol Sociedade Esportiva do Gama, com sede na cidade do Gama no Distrito Federal. O resgate das lembranças e de sentimentos que pareciam ter sido esquecidos tem sido feito por meio do resgate e registro das memórias das pessoas, a partir dos depoimentos pessoais, fotos, documentos, recortes de jornais. Através do resgate de memórias individuais e coletivas é possível compreender a construção de identidades coletivas. A construção de identidade social se processa no âmbito das projeções simbólicas, seja de valores pessoais, paixão por determinado grupo, entidade, nação, pessoas e, até mesmo um clube esportivo. Esse estudo foi desenvolvido a partir de um viés essencialmente qualitativo, no qual fizemos uso, dos fundamentos teórico-metodológicos da pesquisa em memória social e identidade social. O instrumento utilizado foi a entrevista semi-estruturada, e foram analisadas as falas dos entrevistados, bem como o material jornalístico.

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ABSTRACT

This study deals with the use of the festival as an element of building a collective memory can stimulate traces of social identity. The redemption of memories and feelings that seemed to have been forgotten has been done through restoring and recording the memories of people, from personal accounts, photographs, documents, newspaper clippings. Through the redemption of individual and collective memories we can understand the construction of collective identities. The social construction of identity takes place within the symbolic projections, whether personal values, passion for a particular group, organization, nation, people, and even a sports club. This study was developed from an essentially qualitative, in which we use the theoretical and methodological research into social memory and social identity. The instrument used was a semi-structured interview, and obtaining the data analyzed speeches interviewed and journalistic material.

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SUMÁRIO AGRADECIMENTOS

RESUMO ABSTRACT

INTRODUÇÃO... 10

OBJETIVOS ... 12

GERAL...12

ESPECÍFICOS...13

HIPOTESES ...13

PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS ...14

PARTE - I ESPORTE E SOCIEDADE ...15

PARTE II - MÉMORIA E IDENTIDADE...20

PARTE III - ESPORTE E FUTEBOL: UMA FESTA COLETIVA...31

PARTE IV - FUTEBOL DO GAMA...40

5. 1. A REGIÃO ADMINISTRATIVA II CIDADE-SATÉLITE DO GAMA/DF...42

5.2. EXCURSO DO TÍTULO DE CAMPEÃO DE 1998 DA SÉRIE B DA SOCIEDADE ESPORTIVA DO GAMA...43

PARTE V - ANALISE DAS NARRATIVAS...48

5.1. Time e orgulho...49

5.2. Torcida ...58

5.3. Identidade ...64

5.4. Memória e narrativas...69

5.5. Lugar de memória ...80

5.6. Festa ...86

5.7. Camisa ...93

5.8. Mídia ...98

PARTE VI CONCLUSÃO...102

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS...104

ANEXOS...111

Roteiro da entrevista

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“O futebol só começou a ser histórico quando apareceu o primeiro torcedor”. (Nelson Rodrigues)

INTRODUÇÃO

A cidade de Brasília é muito nova, completou cinquenta e três anos em 2013. É uma cidade de colonização recente. Nas primeiras décadas sua população era constituída de migrantes, pessoas culturalmente desenraizadas, situação essa que gera problemas de identidade.

O processo de construção de identidade social e cultural é complexa, os espaços e traços de identificação são frutos de longos processos históricos obedecendo ao passar e ao desenrolar do tempo. Envolve inúmeros elementos sociais, culturais, mitológicos, ritualísticos, memorialísticos etc.

Estudaremos o processo de construção de identificação social e de pertencimento simbólico no futebol, resgatando sua capacidade em construir e despertar estes sentimentos.

Entendemos que uma partida de futebol não se reduz a uma competição esportiva, ela é, também, um locus de valores culturais e simbólicos. As cores, os brasões, os escudos, os mascotes, a tradição, as rivalidades, a origem, as lealdades, viabilizam e fortalecem uma maior ou menor identificação dos torcedores com seus clubes, favorecendo a construção de laços mais ou menos fortes de identidade coletiva.

A Sociedade Esportiva do Gama - SEG é um dos mais importantes clubes de futebol do Distrito Federal. Em sua historia de disputas e conquistas já tem despertado vivos sentimentos de identidade e de pertencimento de torcedores e moradores da cidade onde se localiza.

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No decorrer de sua trajetória, o Gama conquistou vários títulos, marcantes na memória social dos seus torcedores, jogadores, dirigentes e da população gamense, despertando e fortalecendo os sentimentos de orgulho coletivo.

Dentre estes títulos um, em particular, deve ser destacado, tamanha sua importância e significado. Ele foi especial e tornou-se inesquecível na história do clube: a conquista do título de campeão brasileiro de futebol (Série “B”), no ano de

1998.

A importância desse título para a população do Gama é tremendo. Esse título levou o nome da cidade do Gama para todo o Brasil. Eu acho que daqui a 200 ou 500 anos quem olhar lá em 1998 Campeão Brasileiro da Série B vai estar lá o nome da minha cidade, então isso, querendo ou não marca a vida da gente e principalmente de quem torce para a cidade. (Nur - torcedor do time do Gama, 19/9/2012)

Certamente foi o mais importante da história do clube sendo sempre relembrado com emoção, paixão e orgulho, pelos torcedores, jogadores, dirigentes.

Quando de sua conquista uma inédita manifestação festiva em massa se desencadeou, vivenciada pelos torcedores do Distrito Federal e em particular pela cidade do Gama. Foi uma festa de intensas emoções, ufania, altivez, sentimentos coletivos de pertencimento.

Eu lembro que a festa foi muito emocionante, toda uma cidade comemorando, toda a população do Gama ali, nós estávamos no carro do Corpo de Bombeiro, toda uma cidade comemorando o título brasileiro, foi algo muito forte, muito bonito. (Kabila - ex-jogador do Gama em 1998, 14/4/2012)

As manifestações festivas, a comunhão de emoções, a euforia difundida naquele momento revelava o entusiasmo da participação coletiva e da coesão grupal. O que lembramos, o que não lembramos, como lembramos, são fatores que dependem da nossa história de vida, mediados por diferentes estímulos emocionais e sociais.

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história, que revitalizou e recuperou o sentido de participação e construção de identidade, estabelecendo pontes sociais e simbólicas entre grupos e indivíduos.

Rememorar esta conquista do título de 1998 nos permite melhor conhecer a relação futebol e identidade, fornecendo-nos subsídios para identificar relações de pertencimento e nos auxiliando a perceber o quanto o futebol e a memorização dos eventos por ele propiciados é importante e significativa.

A memória deste título histórico, que coroou uma gloriosa campanha do time, jamais será esquecida, pois teve um valor imensurável para os atores e para toda população.

Foi algo muito forte, até porque você alcançar um título brasileiro é algo que não foram poucos que alcançaram, então é uma realização que você alcança é um sonho que foi realizado naquele momento. (Kabila - ex-jogador do Gama em 1998, 1º/9/2012).

O significado desse título foi tudo para mim, eu me orgulho de falar que defendi as cores da camisa do Gama (Jovely Pereira da Silva - “Rochinha” - ex-jogador do Gama em 1998, 4/9/2012)

Trata-se, sempre, da questão da identidade, de saber quem somos e como somos; de saber por que somos” (DaMATTA,1986, p.15).

A decisão de realizar um estudo sobre memória e identidade se deu devido a preocupação em se preservar memórias que constroem identidades coletivas; demonstrar a relevância das memórias esportivas em pequenas comunidades e em varias regiões do Brasil, e constatar a pouca produção acadêmica sobre o tema.

Objetivos Geral

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construção da identidade as lembranças identitárias do título de Campeão Brasileiro da Série B no ano de 1998.

Específicos

 Analisar a manifestação festiva ocorrida na cidade em comemoração ao título de 1998 e a gestação de sentimentos de identidade coletiva.

 Demonstrar que as lembranças do campeonato de 1998 contribuiu para construção de laços identitários da população gamense com o time da cidade.

Hipóteses

 A memória do Campeonato Brasileiro da Série B de 1998 fortaleceu traços identitários dos torcedores.

 As lembranças, o local e “resíduos” do estádio “Bezerrão” constitui um “lugar de memória” da torcida gamense.

 A festa realizada pela população do Gama pela conquista do Campeonato Brasileiro da Série B de 1998 pelo time do Gama propiciou a formação de traços de identidade social.

PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS

Os procedimentos metodológicos que norteiam este trabalho estão fundamentados em uma perspectiva qualitativa.

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O instrumento utilizado foi a entrevista semi-estruturada. Os sujeitos foram ex-dirigentes do clube, ex-jogadores da Sociedade Esportiva do Gama que participaram do campeonato brasileiro de 1998, torcedores e moradores desta cidade-satélite. Usou-se um gravador para gravação das falas dos entrevistados. As falas foram transferidas em forma de texto para procedimento da analise das narrativas transcritas.

Este estudo teve seu início com a coleta de dados no Centro de Documentação da Biblioteca da Câmara dos Deputados; no Centro de Documentação Jornal “Correio Braziliense” e “Jornal de Brasília”, do Distrito Federal; fontes documentais pessoais dos entrevistados, banco de dados da Companhia de Planejamento do Distrito Federal - CODEPLAN/DF, súmulas dos jogos fornecidas pela Federação Brasiliense de Futebol/DF, e depoimentos de torcedores, dirigentes, ex-dirigentes e moradores da cidade (ver anexo).

Na análise das narrativas dos entrevistados, extraímos subitens significativos que contribuíram para se identificar traços de construção de identidade dos entrevistados com o clube esportivo Sociedade Esportiva do Gama.

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PARTE I - ESPORTE E SOCIEDADE

O esporte ocupa um lugar privilegiado no cotidiano humano. Um indicativo de sua importância pode ser percebido pela quantidade de tempo que as pessoas a ele dedicam. Ele desempenha inúmeras funções na vida social: funções físicas, sanitárias, melhoria da qualidade de vida, etc. Desempenha também importantes funções sociais, culturais e simbólicas: constrói identidade coletiva, figuras heróicas, estruturas míticas. Bandeiras, camisas, heróis, sentimento de pertencimento, de nacionalidade, de territorialidade, orgulho, lealdade, são elementos identitários que, por intermédio do esporte são vivenciados, sendo bases importantes para a identificação na vida moderna. Essa dimensão ainda permanece em grande parte inexplorada.

Percebe-se ainda que “construções estereotipadas da identidade no esporte se tornaram uma característica sintomática de grande parte do atual corpo de conhecimento do que é cultura, esporte e sociedade”. (JAVIER, 2006, p. 284).

No caso particular do Brasil, o esporte é um componente importante da cultura do país, em especial o futebol, tomado como representação da identidade nacional, incorporando em sua prática valores da sociedade.

O futebol está inserido no cotidiano das nossas vidas, não sendo possível deixar de vê-lo, ouvi-lo ou, pelo menos, saber sobre ele. Mais do que um jogo, um divertimento ou um passatempo, é uma atividade que expressa à própria cultura local, a organização social estratificada, a preocupação dos indivíduos com a manutenção do status social. (Daolio, 199,7 p. 119 e 124)

Justamente por ter se tornado, ao longo do tempo, um produto cultural de massa em nosso país, esse esporte, como todo fenômeno social de grande alcance, tem sido sistematicamente tema de debates em todos os veículos de comunicação (CALDAS, 1994, p.41).

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O esporte se situa no plano de experiência pessoal da maioria daqueles que o acompanham. A paixão por ele ou por um clube esportivo é vivenciada desde os primeiros anos de vida dos indivíduos.

Muito difícil existir nos dias atuais quem nunca acompanhou o futebol, ou mesmo o praticou, quem não conhece suas regras, seja um jogo oficial ou uma

simples “pelada”.

A maioria dos torcedores pratica ou já praticou o futebol, conhece as regras e as estratégias, pode partilhar o prazer do atleta em realizar difíceis proezas físicas. Os torcedores apreciam tanto a habilidade como o espírito humano necessário para superar os mais altos níveis da competição, os torcedores também apreciam a bravura exigida dos atletas, que se arriscam a sofrer ferimentos. A força física, a habilidade e a coragem transformam os atletas profissionais em símbolos sexuais masculinos (Lever, 1996, p.22).

Nas conversas cotidianas identifica-se a afeição e o sentimento de pertencimento que as pessoas nutrem pelos clubes e pelos atletas. Referem-se a eles com sentimentos de vaidade, lealdade, orgulho.

O campeão esportivo exerce forte dimensão simbólica, estimulando os torcedores a atitudes de superação e êxito em suas vidas cotidianas, os quais projetam em sua imagem pessoal a imagem do campeão.

Jogadores de futebol por vezes tornam-se figuras de alta popularidade, modelos de identidade possível, especialmente no público mais jovem, o qual conhece nomes e hábitos dos seus ídolos. Estes tornam-se modelos de ascensão social e pessoal, levando o torcedor jovem a pensar na possibilidade de destinos comuns: cortam seus cabelos, usam roupas e acessórios semelhantes aos de seu ídolo favorito. Esses atletas que se destacam no mundo esportivo geram uma verdadeira febre coletiva entre jovens que sonham em se tornar um Neymar, um Ronaldinho Gaucho, um Cristiano Ronaldo, um Kaká, um Robinho.

Os jogadores, muitas vezes, transformam-se em objetos de culto e admiração; no imaginário do torcedor são verdadeiros suportes de identidade coletiva. Alguns jogadores tornam-se mitos, seus nomes são dados aos filhos em homenagem aos heróis vitoriosos.

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massa de humanidade que se reúne para partilhar um evento (Lever, 1996, p.22).

Os meios de comunicação de massa, o poder público e grandes empresas nacionais ou multinacionais se apropriam de maneira voraz desses sentimentos identitários. Utilizam-se deste extraordinário poder do esporte em aglomerar grande número de pessoas para comercializarem seus produtos e serviços, sua imagem, suas propostas políticas.

No mundo contemporâneo o esporte torna-se um grande negócio que mobiliza milhões de pessoas e bilhões de dólares, assumindo expressões econômicas e, sobretudo, mercadológicas para além da imaginação do ser humano.

As grandes empresas, sejam nacionais ou internacionais, patrocinam grandes clubes, jogadores de destaques, sempre com o intuito de dar maior visibilidade às suas marcas.

O poder político se apropria da popularidade do esporte a todo o momento. Quantos políticos não associam seus nomes aos clubes, títulos, estádios e a

campeonatos? “As elites empresariais, os meios de comunicação de massa e os líderes políticos reconhecem seu potencial de proporcionar lucros, disseminar propaganda e incutir orgulho.” (LEVER, 1996, p.21)

Observamos esse comportamento em governantes brasileiros que procuram construir arenas esportivas as quais levam o seus nomes, sempre no

superlativo: “Bezerrão”, “Batistão”, “Castelão”, “Estádio Magalhães Pinto” (Mineirão), “Albertão”, “Abadião”, “Vivaldão” todos eles exageradamente

imponentes, frutos do delírio governamental.

Em épocas de Copa do Mundo o país pára para assistir aos jogos, em repartições públicas ou privadas colocam-se televisões para os funcionários assistirem. O poder público por vezes decreta feriado nacional.

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interior e o meio circundante, percebendo este como nosso prolongamento e a nós próprios como parte dele. (Costa, 2010, p.84)

Os estádios superlotam de torcedores. A torcida não vai aos estádios exclusivamente para sentir ódio, para manifestar comportamentos agressivos. A finalidade não é essa, embora, ultimamente, tenhamos presenciado atitudes agressivas que extrapolam o nível ético desejado inclusive pelos próprios torcedores. O esporte torna-se mais do que um simples passatempo, tornando-se experimentação, vivência e reflexão sobre determinados sentimentos e emoções necessários ao homem (DAOLIO, 1997).

Deste modo, faz-se necessário formular outras questões: até que ponto o esporte envolve as pessoas? As festas organizadas motivadas por um evento esportivo reune grupos identitários? As lembranças constroem identidades? Nas narrativas é possível se perceber significados como orgulho, identidade, lugar de memória, amor como elementos significados para construção de identidade coletiva?

Comemorações e celebrações acontecem em todos os lugares. A euforia com as vitórias contagiam a população.

Imensos engarrafamentos de tráfego dominam as cidades, enchem as ruas para uma comemoração sem fim, um estado de êxtase se apodera da população.

As pessoas param seus afazeres para assistirem aos jogos, em momentos de decisão vestem-se com a camisa do seu time, pintam-se com as cores do clube, os quais se tornam verdadeiros “totens” móveis. A sociedade se organiza sem nenhuma cumplicidade de acordos, e o fenômeno social acontece “o povo reunido” sem previa comunicação, surge a “sociedade em ato”.

O torcedor é a paixão materializada, deixa transparecer seus sentimentos, seja de alegria ou tristeza nos momentos de derrotas ou vitorias do seu time.

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O sentimento de pertencimento social vai se adaptando a diferentes circunstâncias, situações e limites, mas é um sentimento básico para a construção da personalidade e da própria sociedade, que resulta da experiência comum de todas essas individualidades (COSTA, 2010).

Assim como em um grande show do cantor ou da banda musical favorita, o esporte emprega recursos retóricos semelhantes: o ambiente esportivo é de alegria e otimismo. O clima é construído sobre a base de apelos identitários.

Mesmo o sofrimento da derrota pode ser apreciado como uma demonstração de lealdade e profunda afeição. Os torcedores frequentemente

usam a palavra “amor” para exprimir seus sentimentos em relação aos clubes e

jogadores prediletos, assim como usam a palavra “ódio” para demonstrar o

desprezo pelos rivais.

Essa paixão pelo esporte desencadeia reações no indivíduo que podem tomar dimensão preocupante, afetando o metabolismo fisiológico, psicológico e físico. Muitos apresentam reações físicas como calafrios, palpitações e arrepios ao presenciarem seus clubes preferidos. Conhecem-se histórias de torcedores que tiveram ataques cardíacos em estádios de futebol durante as partidas, tamanha a emoção sentida diante da vitória ou a conquista de um grande título ou a derrota e decadência do seu clube de coração.

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PARTE II - MEMORIA E IDENTIDADE

A memória como fenômeno social foi objeto de estudo de importantes autores. Estudos clássicos são os de Maurice Halbwachs (2006), Jacques Le Goff (2003), Michel Pollak (1992), Pierre Nora (1993). No Brasil, marcaram época as obras de Ecléa Bosi (1994 e 2003).

O conceito de memória ainda não adquiriu caráter unívoco.

O que é memória social? Segundo Regina Abreu (1994, p.8) o “conceito de memória social deve ser formulado não de modo simples, imóvel e unívoco, e sim, em vez disso, levando em conta sua complexidade e seu caráter inacabado, em permanente processo de construção”.

Nas palavras de Filloux (apud VIANA, 2006, p. 8), memória significa o poder que possui a consciência de se abstrair do presente para voltar-se para o passado, de fazer-se consciência do passado num movimento que transcende o tempo. As lembranças se convertem em realidade social.

Halbwachs (2006) vê a memória como um conhecimento atual do passado, o que significa que a memória é, ao mesmo tempo, um saber e uma lembrança:

“a memória não pode ser vista como uma cópia cronológica da história”.

É preciso distinguir a realidade passada da consciência presente da realidade passada. A realidade passada é uma coisa, sua consciência no presente outra. Lembra Viana (2008) que não é o passado que é reconstruído a partir do

presente e sim a “consciência do passado”. Nesse sentido, a memória deve ser definida e compreendida como consciência virtual, isto é, uma possibilidade suscetível de se realizar, uma potencialidade existente. Enquanto uma consciência virtual ela é recuperada, restituída e interpretada pela consciência ativa, real, concreta.

Um dos mais importantes conteúdos da memória são as evocações de lembranças. Na mente humana existe um conjunto de lembranças guardadas na consciência virtual e, por intermédio de sua ativação, tornam-se recordações.

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Esses mecanismos de ativação da memória estão em sons, situações, imagens, objetos que exercem um importante papel de evocação da memória. Isso pode ser melhor compreendido quando entramos em contato com um objeto de memória, seja ele um artefato, uma imagem fotográfica, um documento, uma gravação de depoimentos, um cheiro, uma música, uma conquista esportiva.

Ao visualizarmos uma imagem ou um objeto, ao tocarmos em alguma textura, ao ouvirmos algum som ou sentirmos algum cheiro, por vezes somos levados às lembranças que podem fazer emergir as recordações e, assim, podemos resgatar memórias adormecidas. Nessas situações, é quase impossível não fazermos associações com vivências e lembranças.

Aristimunha relata a importância das imagens como parte fundamental da memória:

As imagens são o artifício pelo qual damos vida aos pensamentos, sejam eles assuntos abstratos ou concretos, sejam idéias nunca antes pensadas ou vividas, sejam lembranças do passado (Aristimunha, 2005, p.45).

A memória é, pois, sempre uma construção feita pelos sujeitos a partir de estímulos, de presenças (ou de ausências) e de tantas outras evocações que podem nos remeter às lembranças de experiências do passado. Lembrar é romper barreiras de espaço e de tempo.

Por isso muitas memórias não emergem, pois o processo de recordação é seletivo.

A representação seletiva do passado de um indivíduo está inserido, em um contexto social, familiar, nacional, grupal: “a utilização deliberada do esquecimento se opera através do caráter seletivo da própria memória.” (SILVA, 2002, p.42).

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Portanto, o valor que damos às lembranças vividas, sejam individuais ou coletivas, tem um valor imensurável para construção de identidade e, de alguma forma, para a preservação da memória histórica de determinados grupos identitários. O valor que damos às coisas, segundo Oliveira (1976).

justifica a escolha de uma via - para se dar conta de um fenômeno social extremamente complexo, solidário de pelo menos três aspectos: o da identidade, cujo domínio é o ideológico; o do grupo social, cujo domínio é a organização; o da articulação social, cujo domínio é o processo (de relações sociais) que tem lugar numa dada formação social. (p.11)

Sentimentos também são fundamentais para a ativação da memória e para a construção de identidades grupais. Eles não podem ser confundidos com

emoções, pois não são reações momentâneas, mas sim formações mentais duradouras que caracterizam a relação afetiva do indivíduo com outros indivíduos ou coisas” (VIANA, 1988, p.6).

Recordamos objetos, momentos, lugares que nos levam a recordar outros momentos relacionados a eles, o que, de alguma forma, dá continuidade ao vivido no passado. Exemplo: uma ferida, seja física ou sentimental, nos faz pensar na dor que dela derivou, tornando-se lembrança indesejável.

Outro mecanismo de ativação da memória é a pressão social. Por exemplo, a importância das datas de acontecimentos históricos e políticos, de aniversários, de casamento ou de nascimento, das datas de ordem pessoal como os aniversários, o casamento ou o nascimento exercem pressão social. De alguma forma, o passado faz parte do presente.

Cada indivíduo tende a perceber suas lembranças de maneira inconsciente, selecionando elementos do mundo que o cerca, sempre em função de suas necessidades e de suas preocupações e do significado destes elementos ao se remeter ao passado.

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sonho, nos atos falhos ou disfarçadas e encobertas em nosso cotidiano (Tostão, 2012, p.65).

A essa situação, Halbwachs (2006) diz que,

não esquecemos que nossos sentimentos e nossos pensamentos mais pessoais têm sua origem em meios e circunstâncias sociais definidas, e também não esquecermos que o efeito de contraste vinha principalmente do que buscávamos nesses objetos (p.41)

De alguma forma a memória do passado permanece viva nos lugares, nas fotografias, nos estádios, nos objetos, etc. São testemunhos, imagens, discursos, sinais de tudo aquilo que nós definimos como memória, ou seja, a constituição gigantesca e vertiginosa do estoque material daquilo que nos é impossível lembrar, repertório daquilo que poderíamos ter necessidades de nos lembrar (AMARAL e MARTINS, 2010).

Depoimentos orais, arquivos, álbuns de fotografias, recortes de jornais, narrativas formam um complexo de conhecimentos que, de alguma forma, representam uma memória, concorrendo “para criar um feixe de questionamentos que seguem no mesmo sentido: a elucidação da realidade existencial coletiva e individual.” (HALBWACHS, 2006, p.8).

O campo da memória é um campo de conflitos. Há uma infinidade delas: ruins, boas, alegres, tristes, que clamam pela rememoração ou que desejam jamais serem relembradas, como: mortes em guerras, entes queridos desaparecidos, o holocausto nazista, o ataque terrorista de 11 de setembro às torres gêmeas, e tantos outros.

Algumas são traumáticas em maior ou menor grau o que irá depender da situação vivida pelo individuo e/ou pelo grupo. Pollak (1992, p. 201) afirma que

podem existir acontecimentos regionais que traumatizaram tanto, marcaram tanto uma região ou um grupo, que sua memória pode ser transmitida ao longo dos séculos com altíssimo grau de identificação”.

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algum acontecimento acaba favorecendo a recordação de outros. Bosi (1994, p. 39) nos lembra que “lembrança puxa lembrança”.

Partindo do pressuposto de que a memória é a faculdade de reter ideias ou reutilizar sensações, impressões ou quaisquer informações adquiridas anteriormente, ela, então, faz “lembrar a própria lembrança”, não deixando que se apaguem as experiências adquiridas pelos envolvidos com determinado episódio ou situação.

Observa-se que o papel da memória e da representação que o indivíduo faz de sua própria vida, no presente e/ou no passado, é importante para a continuidade de sua caminhada pessoal, à reconstrução e à perpetuação de sua história de vida; ao preenchimento de lacunas que, por circunstâncias pessoais ou coletivas foram se esvaindo com o tempo. Nesse sentido a preservação da memória é essencial, pois sua inexistência equivale a dizer “já não existe mais”.

Essa frase“dilacera as lembranças como um punhal.” (BOSI, 1994, p.19).

Inevitavelmente o tempo passa e fatos, datas, lugares, se esvaem. A memória de origem e os “lugares de memória” vão se perdendo e, com eles, de alguma forma, a preservação da identidade coletiva e individual. Como bem afirma

Bosi (2003, p. 45) “na história de vida, perder o tempo é perder a identidade, é perder a si mesmo”.

A necessidade de não se perder no tempo as lembranças dotadas de sentido, sejam alegres, tristes, prazerosas, traumáticas constitui um dos pilares da formação da identidade:

é o sentido da imagem de si, para si e para os outros: a memória é um elemento constituinte do sentimento de identidade, tanto individual como coletiva, na medida em que ela é também um fator extremamente importante do sentimento de continuidade e de coerência de uma pessoa ou de um grupo em sua reconstrução de si. (Pollak, 1992, p. 205)

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A memória “nos situa, nos identifica, nos une a um grupo, nos dá segurança para seguir em frente e nos fornece subsídios para identificar relações de pertencimento” (p.45-46).

Para muitos a memória está inserida no indivíduo. Parece ser um fenômeno individual, “algo relativamente íntimo, próprio da pessoa” (POLLAK, 1992, p.201).

Entretanto rememorar, na mesma linha de Maurice Halbwachs (2006) significa entendermos que a memória individual não existe por si mesma, ela é uma memória constituída socialmente, e a memória social é a manifestação coletiva de uma sociedade ou de um grupo. Expressa a presença do passado e, de certa forma, preserva este passado reconstruído no presente. Não se reduz ao indivíduo.

Bosi (1994, p. 54) argumenta nessa mesma linha ao afirmar que “a memória do indivíduo depende do seu relacionamento com a família, com a classe social, com a escola, com a igreja, com a profissão; enfim, com os grupos de convívio e os grupos de referências peculiares a esse indivíduo”.

As histórias de vida, portanto, vão auxiliar tanto as lembranças como aquilo que não se quer lembrar. A história de vida individual ou coletiva vai depender pois do contexto social dessa memória.

O grupo ou grupos ao qual o indivíduo pertence ou tenha pertencido será sempre um suporte de memória. Embora quem recorde seja sempre o indivíduo, desenrolando fios diversos e tecendo novas tramas este processo se dá a partir de provocações e ordenações sociais, culturais e históricas. A memória, nesse sentido, visaria o passado construído e transmitido por lembranças, imagens, representações e sentimentos reconstruídos no presente.

A memória é reinterpretação, é manutenção, é permanência, e não fidelidade a fatos passados ou experiências vividas.

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Oliveira (1976) já dizia que há grupos de membros que se identificam e são identificados por outros como constituintes de uma categoria distinguível de outras categorias da mesma ordem.

Lembra, ainda o autor que a identidade social surge como a atualização do processo de identificação e envolve a noção de grupo, particularmente a de grupo social.

Significa, assim, conhecermos “a nós mesmos nos outros, a nossa sociedade no confronto com outras” (OLIVEIRA, 1976, p.22).

Como diz DaMatta (1986, p.15) “trata-se, sempre, da questão da identidade, de saber quem somos e como somos; de saber por que somos”. Essa resposta não é individual.

A memória tem importância significativa para a preservação da identidade, importância essa devida a fatores como “esquecimentos” e “apagamentos”. Le

Goff (2003) afirma que “o passado é uma construção e uma reinterpretação constante e tem um futuro que é parte integrante e significativa da história”.

Essa operação em relação a fatos, acontecimentos, situações e interpretações do passado que se quer salvaguardar integra-se em tentativas mais ou menos conscientes de definir e de reforçar sentimentos de pertencimento a coletividades diversas como partidos, sindicados, igrejas, aldeias, regiões, clãs, famílias, nações, clubes de torcedores, torcidas organizadas, etc.

A referência ao passado serve para manter a coesão dos grupos e das instituições que compõem uma sociedade, para definir seu lugar respectivo, sua complementariedade. (Pollak, 1989, p.40).

A memória guarda características importantes: ela é intransferível e parte integrante das experiências vividas pelo sujeito; ela atesta a continuidade temporal da própria pessoa ou do grupo e, em terceiro lugar, ela age em relação à experiência do presente e do futuro reinterpretados (RICOUER apud SILVA, 2002, p. 428).

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grupo ou população. Para isso é necessário rememorar momentos, fatos, vivências, origens, o que nos faz perguntar:

Quais são, portanto, os elementos constitutivos da memória, individual ou coletiva? São os acontecimentos vividos pessoalmente, são os acontecimentos vividos em referencia a outros grupos, ou seja, acontecimentos vividos pelo grupo ou pela coletividade à qual a pessoa se sente pertencer (Pollak, 1992, p.201).

A memória é um instrumento relevante da formação da identidade e do sentimento de pertencimento social. Ela é vital para a permanência do grupo e de uma sociedade que luta por reconhecimento,

a memória é constituída por pessoas, personagens, podemos aplicar o mesmo esquema, fala de personagens realmente encontradas no decorrer da vida, de personagens que, por assim dizer, se transformaram quase que em conhecidas, e ainda de personagens que não pertenceram necessariamente ao espaço-tempo da pessoa. (Pollak, 1992, p.201)

Observamos ao longo do estudo que lembrar é também um movimento de restauração e perpetuação de laços sociais (sempre diferente de restauração histórica). Algumas lembranças insistem porque, de certo modo, são lembranças que se sobrepõem a outras lembranças e, assim, tornam-se uma lembrança mais ou menos incontrolável, impossível de se esquecer.

Assim, memória e identidade estão indiscutivelmente ligadas. No entanto, a ação do tempo e as mudanças sofridas na sociedade contemporânea vão apagando as histórias de vida, as origens, as memórias. Segundo Aristimunha,

apagar memórias/identidades é algo bem comum em nossa sociedade atual.

(ARISTIMUNHA, 2005, p.45).

Portanto, preservar a lembrança significa agir no sentido da “sobrevivência do passado” (sempre reconstruído) (BOSI, 2003, p.53). Trata-se de dar continuidade a uma existência tão presente em nossa vida e “assumida por indivíduos e grupos em diferentes situações concretas. A investigação desse processo nos levará a diferentes formas de identificação.” (OLIVEIRA, 1976, p.4).

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identidade percebe-se que elas se nutrem mutuamente, que se conjugam e se sustentam uma na outra para produzir uma trajetória de vida, um mito, um símbolo, uma narrativa, uma história. A “memória é constituída e ao mesmo tempo, constituidora de História e histórias, histórias individuais, histórias coletivas, histórias de vida” (ARISTIMUNHA, 2005, p.45).

Devemos sempre lembrar que lembranças não são um amontoado de fragmentos em ruínas, mas um conjunto de descobertas que dão significado ao futuro e sentido ao presente, evocando percepções e interpretações pessoais e/ou coletivas de trajetórias de vidas.

O que são recordações? O que são relatos de vidas? São relatos de experiências vividas ou construídas por indivíduos ou sociedades, com base em suas lembranças e, que, apesar de serem seletivas, retém e preservam

informações necessárias à construção do “eu”, afetivo, histórico, cultural, simbólico.

o “eu” e sua duração se localizam no ponto de encontro de duas séries diferentes e às vezes divergentes: a que se liga aos aspectos vivos e materiais da lembrança, a que reconstrói o que é apenas passado. O que seria “eu”, se não fizesse parte de uma “comunidade afetiva” de um “meio efervescente” do qual tenta se livrar no momento em que “se lembra.” (Halbwachs, 2006, p. 12).

As lembranças individuais e coletivas partem das reinterpretações de mundo e das experiências vividas ou construídas. Essas experiências, as mais significativas, vão constituindo o conjunto de marcos que formam a memória e compõem as lembranças e estruturam identidades.

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Percebe-se a importância do resgate da memória para a construção da identidade quando valoriza-se a rememoração, a busca das origens, a ida ao âmago das histórias de vida,aos depoimentos de “testemunha, que só têm sentido

em relação a um grupo do qual se faz parte, porque pressupõe um evento real vivido outrora em comum e, depende do contexto de referência no qual atualmente transita o grupo e o individuo que o atesta” (HALBWCHS, 2006, p.12).

Podemos afirmar que a memória legitima a identidade, um referencial para

sua construção “na medida em ela é também um fator importante do sentimento de continuidade e de coerência do grupo em sua reconstrução em si” (POLLAK, 1992, p. 204).

A importância da memória para o fortalecimento identitário se dá, portanto, pela sua faculdade em conservar estados de consciência passados e tudo que a eles está relacionado. Ela possui o dom de fazer aparecer o passado, mesmo que re-atualizado.

Além dos acontecimentos e das personagens, podemos finalmente arrolar lugares. Existem lugares da memória, lugares particularmente ligados a uma lembrança, pessoal, mas também pode não ter apoio no tempo cronológico. (Pollak, 1992, p.201-202)

O estudo da memória social é um dos meios fundamentais de se abordar os problemas do tempo e da história, em relação aos quais a “memória está ora em retraimento, ora em transbordamento” (Le GOFF, 2003, p. 422).

Com a desmedida aceleração do tempo em que vivemos, observa-se uma preocupação latente com o esquecimento coletivo ou individual, de certa forma, com o medo de causar “uma amnésia coletiva”.

As recordações, as lembranças, pode-se dizer, são o despertar, a liberação, o renascimento, da tomada de consciência de uma identidade.

Apesar de a memória e a História tratarem de objeto semelhante - o passado - o fazem de forma diferente.

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O espaço da memória pode ser visto como um processo de manutenção de lembranças, rememorações, tradições e etc. A memória é uma forma de conservar o passado, que se pretende rememorar, dentro do presente, por isso ele é reinventado.

A memória, portanto, se transforma ao longo do tempo, se reconstitui cada vez que se rememora o fato. Lembrar-se e esquecer-se significa dizer que mesmo que o indivíduo tenha uma memória própria, ela situa-se em um universo mais amplo, onde há valores sociais, históricos e culturais. Nesse sentido, as lembranças se modificam, pois são influenciadas pelo meio e época em que se vive. A memória é uma construção e reconstrução do passado em função de interesses do presente.

Grupos buscam legitimação no presente recorrendo à memória. Nessa construção, alguns fatos são voluntários e/ou involuntariamente esquecidos. Exemplo: o nome da Place de La Concorde em Paris, o qual foi alterado para apagar as lembranças do tempo em que a praça era cenário de muitas execuções durante a Revolução Francesa; a atual situação do time do Gama que, hoje disputa vaga para disputar a última divisão do campeonato nacional.

A História, ao contrário, parte em busca do que está escondido e recupera o passado para compreensão do presente e melhor percepção do futuro. A memória rememora ou “escolhe” o passado para legitimação do presente. A memória deve ser e pode ser usada como objeto de estudo, mas não deve jamais ser confundida com a História.

É tão comum encontrarmos narrativas semelhantes e/ou de diferentes membros de grupos/coletividades que viveram a mesma situação. As narrativas de uma lembrança podem variar de acordo com o que o sujeito lembra ou quer lembrar a partir de sua intenção.

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Como bem ensina o historiador Eric Hobsbawm (1998, p. 15): “História e memória: o passado como um registro geral aberto a um exame mais ou menos isento e o passado como parte lembrada ou experiência de nossas vidas”.

Quando falamos de memória coletiva, precisamos nos referir ao sujeito que percebe uma dada coletividade, isso por que as lembranças que marcam as diversas coletividades dependem de quem conta e relembra o passado.

Uma parcela da sociedade contemporânea tem buscado os vestígios do passado, não aceita que caiam no esquecimento. “Nossa vida, nossa história, nossa identidade, nosso lugar no mundo” (ARISTIMUNHA, 2005, p. 51).

PARTE III - ESPORTE E FUTEBOL: UMA FESTA COLETIVA

Vamos entrar na festa do povo e vivê-la em sua ludicidade, a festa esportiva, a festa do futebol.

O que é a festa do futebol? Um movimento de massa? Uma construção de identidades? Um êxtase capaz de unir pessoas sob símbolos comuns?

A festa da torcida do Gama começou antes mesmo de a bola rolar. Na entrada do time, os jogadores foram recebidos com fogos de artifícios, gritos de: “é campeão, é campeão” e o desfile do periquito gigante seguia (Caderno de Esportes do Correio Braziliense - 19/12/1998)

O “periquito gigante” tornou-se um símbolo para a população gamense, uma espécie de brasão, o sinal pelo qual o grupo se afirma e se (distingue) distinguia dos demais.

O ser humano é um ser emotivo e festivo, um ser em movimento constante,

habita um mundo que está em constante modificação, e em tal mundo o festival e a fantasia são indispensáveis à sobrevivência” (COX, 1973).

Podemos utilizar a definição de festividade como “uma ocasião socialmente aprovada para expressar sentimentos normalmente reprimidos ou negligenciados.”

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Entendemos que a festa ou o festejar se constitui em um momento que as pessoas rompem com sua rotina de trabalho, quebram paradigmas da vida cotidiana e partem para os momentos de lazer e de sociabilidade, ou de simplesmente fortalecer e nutrirlaços sociais e afetivos. Sobre esse momento da festa ou do festejo, Assumpção (2004) nos ensina que “é uma situação extraordinária, um momento em que são transgredidas as regras da vida cotidiana. Corresponde a um momento especial, que se manifesta por atitudes e comportamentos contrastantes com as rotinas diárias.” (p. 198) ou ainda “a festa tem (mesmo que pequeno) certo poder de ‘instaurar relações de pessoas’” (JÚNIOR, 1982, p.50)

As festas rejuvenescem o espírito fatigado por aquilo que há de muito constrangedor no trabalho cotidiano. Por alguns momentos os indivíduos têm acesso a uma vida menos tensa, mais livre, a um mundo onde sua imaginação está mais à vontade (Durkheim, 1996 p.546).

Portanto, observa-se que, por meio da festa, os indivíduos sociais reafirmam concepções, valores de vida, identidades, permitindo, assim, um percurso de conhecimento e possibilidades de valorização de grupos sociais até então invisíveis à sociedade em geral.

A festa manifesta a glória da coletividade: o esbanjamento, o desperdício, os excessos exprimem a força do grupo em um momento de comunhão. A função latente desses atos é recompor as forças sociais para que renasça uma ordem social nova e revigorada. A festa contribui para eliminar os resíduos produzidos pelos constrangimentos e pelas relações hierárquicas do mundo cotidiano. Como comemoração é um símbolo, pois reafirma a coletividade e fortalece a coesão social (Assumpção, 2004, p. 201).

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Na festa, grupos de pessoas encontram-se para expressar o que pensam, o

que desejam realizar e o que desejam modificar no âmbito pessoal e grupal. “A expressividade dos indivíduos, do povo, torna-se concisa.” (JÚNIOR, 1982, p.23).

É importar ressaltar que a festa une diversidades; onde essas diversidades são respeitadas, respeitam-se também diversidades de pensamentos durante os diálogos. A festa foge da subjetividade e se torna coletiva, promovendo, assim, o congraçamento entre jovens, idosos, crianças e adultos jovens, numa ação intergeracional.

Ao decorrer da festa, pode-se cair na rotina “ao tornar consciente e socialmente abrangentes as vivências setorizadas de micro grupos, a festa pode tornar-se uma ocasião de síntese e integração” (JÚNIOR, 1982, p. 55).

Nas ruas, praças, quadras esportivas, campos de futebol de várzea, até em suntuosos estádios de futebol a vida está sempre em movimento, inesgotavelmente rica em movimento, anunciando os festejos, uma tradição, uma partida de futebol entre amigos (a famosa “pelada”), um embate esportivo oficial, uma responsabilidade

social, “que são unicamente destinadas a divertir, a provocar o riso pelo riso

(DURKHEIM, 1996, p. 542), as festas que acontecem nesses espaços vem

acompanhadas de risos, danças, músicas dos mais diversos estilos e gritos, “a reunião de muitos indivíduos, seus movimentos, as danças, os cantos, os gritos, tudo contribui para a produção de grande quantidade de energia, que é redistribuída para todos os participantes.” (VIANA, 1988, p.53). A ordem e o poder nesse momento é ser feliz.

Essa felicidade Cox (1973) vê como resultado da capacidade peculiar do homem de incorporar em sua própria vida as alegrias. A festividade é uma forma humana de folguedo, mediante a qual a gente insere na experiência própria uma extensa área da vida, inclusive o passado.

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As festas, comemorações e rememorações, sejam de ordem popular ou

particular, sempre fizeram parte da vida do homem. “O homem é transportado para fora de si, distraído de suas ocupações e de suas preocupações ordinárias

(DURKHEIM, 1996, p. 547) ou, ainda, segundo Viana (1988, p.52), “essa oposição entre vida séria e divertimento reaparece em todas as ‘teorias de festa’, mesmo que os termos empregados e as ‘intenções’ sejam diferentes” em todas as classes

sociais. Logo após as festividades, percebemos que voltamos à vida séria com mais entusiasmo e vigor.

A festividade tem de ostentar contrastes. Deve ser notoriamente diferente da “vida de cada dia”. Não pode a festividade reduzir-se meramente ao incomum. Não consiste só em não trabalhar; inclui celebração e excesso. Mas a natureza real da festividade está em função duma alternância com o programa de trabalho diário, da convenção, da medianidade (Cox, 1973, p.27-28).

Só o homem é capaz de celebrar/festejar. Comemorar significa, então, reviver de forma coletiva a memória de um acontecimento considerado como ato fundador, a sacralização dos grandes valores e ideais de uma comunidade constituindo-se no objetivo principal (SILVA, 2002).

Dessa forma, percebemos o papel importante das festas, para consolidar um grupo ou uma comunidade. Assim, as comemorações e celebrações surgem como medidas que visam criar nova vitalidade, bem como para o fortalecimento e construção de traços identitários, de relações sociais, aproximando, dessa forma, o

grupo ou a comunidade da sua própria história e memória. “As utilizações sociais da memória são visíveis nesse fenômeno das comemorações que, em todas as partes do mundo, vêm se impondo” (SILVA, 2002, p.432).

Os eventos que buscamos comemorar “são históricos, passado ou futuro, tanto assim que nos ajuda a rememorar” (COX, 1973, p.51).

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Percebe-se, por intermédio da mídia, que países novos e em desenvolvimento, obtêm um grande proveito com a capacidade festiva do esporte de transcender as divergências entre grupos e criar uma imagem nacional unificada e positiva.

Para Murad (1995), no mundo contemporâneo, os esportes, de uma maneira geral, redefiniram seu lugar como instituição social. No pós-Segunda Guerra, e especialmente nos últimos cinquenta anos, readquiriram importância de ponta, numa escala crescente.

O esporte organizado predomina em toda parte e desenvolveu-se com maior evidência, no último século, de um elemento relativamente menor da cultura brasileira para uma instituição social ampla e com prestígio nacional.

O desenvolvimento dos esportes em nosso país, pelo menos até nossos dias, tem sido prescindível, em face de outros problemas considerados mais importantes. Embora polêmico (e talvez por isso mesmo), este é um assunto recorrente nos congressos, simpósios ou mesas-redondas que pretendem discutir o esporte brasileiro (Caldas, 1994, p. 25)

O esporte promove a comunicação; envolve as pessoas numa participação

conjunta: “sendo de bem, doutor ou bandido, ali todos se igualaram no riso, no choro e no calão” (TOUGUINHÓ, 1998); oferecendo ao torcedor símbolos comuns, uma identidade coletiva e uma razão para a solidariedade, existindo uma comunhão de ideias e emoções, com sensações agradáveis.

O esporte tem o poder de igualar as pessoas, independentemente de classe social, poder econômico, gênero, raça ou credo; poder de unir bons e maus. Somos todos iguais na prática do esporte, na torcida pelo nosso time favorito, na torcida pelos nossos representantes nas competições oficiais seja nacionais ou internacionais.

Essa força e poder do esporte ficam bem nítidos no livro de Oldemário Touguinhó (1998), quando ele se refere ao futebol, o esporte considerado paixão nacional:

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verdade de um jogo de futebol. Drama, tristeza ou alegria. Os personagens estão no gramado ou nas arquibancadas (p. 8-9).

Festejar uma vitória seja de ganho pessoal por algo que conseguiu ou uma

vitória esportiva da sua equipe favorita, é uma festa, uma “ocasião especial em que se abandonam as atividades ordinárias e se celebra um determinado evento, afira a simples bondade que existe, ou guarda a memória de um deus ou herói, é uma atividade especificamente humana” (COX, 1973, p.14).

Os eventos esportivos são momentos de festividade, de celebração, de lazer,

parte integrante da vida cotidiana das pessoas constituindo, sem dúvida, o lado mais agradável e descontraído de sua rotina semanal.” (MAGNANI, 1984).

O envolvimento do ser humano com o esporte vem desde tempos remotos. Festejar e praticar qualquer atividade esportiva em cada sociedade, em cada contexto histórico-cultural, compreende desenvolver as etapas da vida humana, definindo a duração delas, suas características e direitos legais como: de praticar esportes, de brincar, de divertir-se, de desfrutar de momentos de lazer e de expressar opiniões próprias, o esporte é uma atividade primária e prazerosa desenvolvida pelo homem e ocupa um lugar privilegiado no cotidiano humano.

Os momentos de celebração e comemoração contribuem para “habilitar o homem a ampliar sua experiência, revivendo eventos do passado, constitui a fantasia uma forma lúdica, alargando as fronteiras do futuro” (COX, 1973, p.14)

É por intermédio dessas manifestações que grupos sociais homenageiam, honram, ovacionam, rememoram seus ídolos ou acontecimentos com os quais eles se identificam. O que é relevante nesses momentos é que o tempo dispensado na festa esportiva nos permite um distanciamento das preocupações pessoais, familiares e do trabalho que nos acompanham diariamente. “A festividade propicia-nos uma breve dispensa das convenções e, sem o elemento da infração de normas de comportamento comum, socialmente aprovada, a festividade nem festividade seria

(COX, 1973, p.27).

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Nessas manifestações, as relações sociais são construídas, ajudando a erigir

novas identidades. A “identidade popular se constrói enfrentando repressões, respondendo a desafios e descontaminando-se de suas inegáveis alienações.”

(JÚNIOR, 1982, p. 21).

O futebol está impregnado de um sentimento lúdico, do âmbito da festa e do entretenimento, mas também vivenciado cotidianamente, muitas vezes consubstanciado em um comportamento transgressor, com desordem nas ruas e, ainda, despertando interesses políticos variados. Inscreve-se na cidade, através do futebol e de suas torcidas, uma variada gama de emoções, preferências clubísticas, adesão a grupos, que traduzem no nível social determinadas regras, padrões de comportamento que transcendem os limites das partidas e jogos em si (TOLEDO, 1996, p. 12).

O ambiente esportivo é um ambiente de festa, existindo nesses momentos a alegria e comemoração da vitória antes mesmo de se saber o time vitorioso, a partir da mobilização coletiva e do encontro entre torcedores a festa já se inicia. Bandeiras, apitos, camisas do time, caras pintadas, bonés, chapéus com as cores e símbolos do clube fazem-se presentes no estádio ou em volta dos campos. Em pé ou sentados, a animação, a alegria, a emoção encontram-se em plena ação.

O futebol é mais do que um passatempo. É uma forma de fornecer um “comentário metassocial’ sobre a sociedade brasileira. É uma história sobre os homens e a sociedade brasileira que eles contam e recontam a si mesmos através do futebol. Por se tratar de um mecanismo de utilização da emoção para fins cognitivos, o futebol no Brasil seria como uma espécie de “educação sentimental”. O futebol é uma forma de experimentação, vivência e reflexão sobre determinados sentimentos e emoções necessários ao homem brasileiro (Daolio, 1997, p. 124).

A mobilização para os eventos futebolísticos começa “desde cedo é intenso o movimento nas imediações do campo: moças, rapazes e crianças circulam entre barraquinhas de milho verde, vendedores de sorvete, pipoca, cervejas, refrigerantes, água” (MAGNANI, 1984, p.148).

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lugares. “Nos fins de semana a casa estava sempre cheia de gente - colegas e parentes, o toca-discos e a televisão, sempre ligados” (MAGNANI, 1984). O amigo ou parente, mesmo não sendo torcedor do time compartilha solidariamente conosco aquele momento de ansiedade. O sofrimento prazeroso inicia-se.

Nessas ocasiões festivas, exageramos de propósito. Vivemos intensamente, ficamos mais acordados por mais tempo, comemos e bebemos mais e gastamos mais dinheiro do que em dias comuns. Ás vezes rimos, outras choramos, ou fazemos as duas coisas juntas (COX, 1973, p. 26-27).

Na vitória ou na derrota do time querido a festa:

é um importante fator para a homogeneização da sociedade, colocando de lado as diferenças e enfatizando o sentimento de unidade, sendo um território propício para a construção de sua identidade enquanto grupo a reafirmação de valores comuns ou a elaboração coletiva de novos valores, incluindo a contestação, inversão ou transgressão das normas que organizam a vida social e cultural desse grupo (Viana, 1988, p. 64-65).

O imenso valor simbólico da festa, um todo imaginário, torna-a irresistível como

contexto do desenvolvimento humano, “instante mágico e estético do comportamento

(MURAD, 1995). Seu valor agregado a paixões pela vida, inteligentemente apreciado e vivido, é altamente útil para todos e para cada um, nos torna próximos e iguais.

Podemos arriscar dizer que não há entre tantos outros fenômenos da cultura contemporânea que leve tanto prazer a tanta gente como as festas estão entre as principais: particulares (para um pequeno grupo), para milhares de pessoas (carnaval, as festas religiosas ou de cultura local), esportivas (Copa do Mundo, Olimpíadas). Desde a sua organização até sua realização efetiva, empolgam e envolvem do jogo infantil, a recreação livre ou profissionalização, o evento casual e a livre expressão da vida cultural até os encontros coletivos, comunitários e cívicos.

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“a festa dos loucos” (de alegria). “Nessa manifestação colorida, cidadãos ordeiros cantam” (COX, 1973, p.11).

O futebol é uma festa do povo. Povo de economia regrada, de cotidiano de labuta, de lazer quase inexistente, não economiza energia, emoções, vibrações e efervescência nas realizações de festividades. As realizações das festas se dão pelo prazer de homenagear alguém que se ama ou algo que o satisfaça, até mesmo a vitória do time do coração. A festa torna-se um passado coletivo para quem viveu cada momento da festividade de uma conquista significativa para um determinado grupo ou indivíduo.

Um dos esportes com o qual o povo brasileiro mais se identifica é o futebol, por ser fácil sua prática e de baixo custo econômico. Embora tenha sido importado, vindo

da Inglaterra, temos no futebol o “nosso” esporte, reinventado e atualizado pelo

brasileiro.

O futebol assume uma importante dimensão social, cultural e simbólica, podendo mesmo ser pensado como uma manifestação de nossa identidade enquanto nação, tão bem relatado por Murad (1995):

O futebol é a maior paixão popular do planeta e, no caso brasileiro, assume dimensão ímpar, por ser uma das raízes centrais de nossa identidade, indispensável para uma compreensão globalizante de Brasil. O futebol é um esporte repleto de significados, de simbologias, de valores para a existência humana em geral e, de forma singular, para os modos históricos de sua manifestação no interior da sociedade e da cultura brasileira. Logo, é impostergável a sua assimilação à pesquisa e análise sociológica permanente, como parcela integrante e necessária de nosso cotidiano. O futebol é um instante muito especial das celebrações ritualísticas da cultura brasileira e por isso tem capacidade e envergadura para metaforizar o país (p. 108).

Dos pontos mais extremos do Brasil - Oiapoque/AM e Chuí/RS - uma enorme quantidade de pessoas joga futebol, uns sem habilidade outros com mais habilidade; o importante é que a maioria do povo brasileiro joga ou mesmo gosta de futebol. Muito difícil existir nos dias atuais quem nunca jogou futebol ou quem não conhece

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A invenção ou a transformação de uma prática esportiva não depende unicamente da transformação das convenções definindo as regras explícitas do jogo (por exemplo, para o futebol, o tamanho dos gols, a duração da partida, o número de jogadores, a lista das “faltas” sancionadas, ou ainda a famosa regra do impedimento ou off-side), ela tem implicações nas condições materiais e financeiras mas também “morais” de sucesso, conjunto de fatores que Mário Filho, um dos inventores desse novo jogo social, soube aperfeiçoar reinventando ao mesmo tempo sua própria profissão (Lopes, 1994).

As pessoas param os seus afazeres para assistirem seu time jogar, e, se é decisão de campeonato embandeiram os seus carros, suas casas e suas ruas, vestem a camisa do seu time, se pintam com as cores do clube, se tornam verdadeiros outdoor móveis. “Nosso sentimentalismo e nossos anseios redundam do fato de nos terem sobrado tão poucos festivais, e os que ainda temos estão tremendamente atrofiados em seu ritual e seu vigor celebrativo” (COX, 1973, p. 15).

O futebol é um fenômeno capaz de produzir, de tempos em tempos, mitos e histórias representativas da comunidade, que são verdadeiros dramas sociais de extrema relevância para um entendimento das questões mais profundas de uma cultura. Símbolos, mitos, heróis, compõem o mundo futebolístico. Valorizamos nossos ídolos e símbolos. As partidas, gols e jogadas inesquecíveis - simultaneamente trágicas e esfuziantes, enfim, o futebol é pródigo em momentos “bons para pensarmos” (COELHO, 1995).

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PARTE IV - FUTEBOL DO GAMA

A Sociedade Esportiva do Gama: uma história de amor

Um novo tipo de torcedor está surgindo: aquele que mostra com orgulho o escudo do Gama (Jornal de Brasília - Caderno de Esporte - 21/12/1998)

Existe algo no mundo futebolístico que encanta a todos. Além de vermos belas partidas, lindos dribles, lances infalíveis, defesas imaginarias e diversos golaços, o futebol não seria o mesmo se não existissem os torcedores. Como

disse Nelson Rodrigues: “o futebol só começou a ser histórico quando apareceu o primeiro torcedor”.

O assunto aqui é sobre amor e paixão de verdadeiros torcedores, aqueles que fizeram do Campeonato Brasileiro de Futebol da Série B de 1998, o seu lazer, a sua diversão e do time da cidade do Gama a sua paixão.

Falar do time do Gama na visão do torcedor e dos moradores da cidade é narrar uma história de amor e respeito.

O nome da Sociedade Esportiva do Gama merece respeito pelo passado do Gama. (Jovely Pereira da Silva “Rochinha”- ex-jogador do Gama em 1998, 04/09/2012).

Não tem palavras para descrever quando vemos um estádio lotado com torcedores apaixonados gritando, pulando e cantando o hino do clube, tudo para incentivar o seu time. Sem duvida é algo único e empolgante. A torcida faz parte de todo o cenário do futebol do Gama, é o fator muitas vezes motivacional dos jogadores, vivem incentivando e mesmo quando reclamam fazem com muita paixão por terem muito amor pelo time do coração.

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e tocando os instrumentos da fanfarra, isso trazia garra a cada jogador, pois sabiam que estavam representando dentro de campo toda uma cidade.

Grandes jogos trazem grandes espetáculos dos torcedores. Trago como exemplo a final do Campeonato de 1998, onde no estádio “Mané Garrincha” a torcida do Gama mostrou a sua força e o seu amor. Realizaram um grande espetáculo, que não ficou atrás dos proporcionados por torcidas de grandes clubes como a do Flamengo e do Corinthians.

Em dias em que o futebol virou um grande comércio ainda vemos pessoas com um sentimento verdadeiro pelo seu clube, e é isso que encanta e traz vida ao jogo, já que o esporte é feito de pessoas.

O time do Gama com toda simplicidade soube usar a torcida a seu favor, fazendo dela o seu décimo segundo jogador.

A torcida foi o 12º jogador nosso com certeza, por que todo time que entrava no Bezerrão só de vê como a torcida se comportava ali nós já estávamos ganhando o jogo de 1 x 0, já saiamos vitoriosos. (Gerson Lira - ex-jogador do Gama em 1998, 17/8/2012)

Esse congraçamento foi vivenciado e sentido pela população da cidade- satélite do Gama quando torcedores se uniram em festa:

a torcida de Brasília realizou a festa. Sob uma chuva de fogos de artifício, que durou dois minutos e meio, e aplaudido de pé por mais de 40 mil torcedores, o Gama acendeu o estádio Mané Garrincha e transformou a galera em um décimo segundo jogador (Caderno de Esportes do Correio Braziliense - 19/12/1998).

Está nítido que a torcida pode mudar o resultado de uma partida, se não, eleva a autoestima do seu jogador. A maior força que o torcedor pode passar para o time vem direto das arquibancadas. O torcedor demonstra fisionomicamente que a qualquer momento o seu coração irá saltar pela boca diante de um lance que demonstra um gol certo para o seu time ou um gol certo para o adversário.

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