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OPOSIÇÃO À AQUISIÇÃO DA NACIONALIDADE PORTUGUESA ÓNUS DA PROVA LIGAÇÃO EFECTIVA À COMUNIDADE NACIONAL

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Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul Processo: 03697/08

Secção: Contencioso Administrativo - 2º Juízo Data do

Acordão: 13-11-2008

Relator: António Coelho da Cunha

Descritores: OPOSIÇÃO À AQUISIÇÃO DA NACIONALIDADE PORTUGUESA ÓNUS DA PROVA

LIGAÇÃO EFECTIVA À COMUNIDADE NACIONAL

Sumário: I – O estrangeiro casado há mais de três anos com nacional português pode adquirir a nacionalidade portuguesa mediante declaração feita na constância do matrimónio ( art.º 3, n.º1 da Lei n.º 25/94).

II- Constituem fundamento de oposição à aquisição da nacionalidade portuguesa a manifesta inexistência de qualquer ligação efectiva à comunidade nacional o exercício de funções públicas ou a prestação de serviço militar não obrigatório a Estado estrangeiro ( als. a) e c) do artigo 9º da Lei 37/81).

III – Constitui ainda fundamento de oposição à aquisição da nacionalidade portuguesa a não comprovação, pelo interessado, da sua ligação efectiva à comunidade nacional.

IV- A acção de oposição à aquisição da nacionalidade portuguesa segue os termos da acção administrativa especial regulada no CPTA.

V- Incumbe ao Ministério Público o ónus de provar a existência de factos que tornam impeditivo o direito ( aquisição da nacionalidade) que o interessado quis fazer valer ( artigo 342º ,n.º2 do Código Civil).

VI- O aspecto relevante e decisivo para a prova da ligação efectiva à comunidade nacional deve ser respeitante às relações familiares, além da demonstração de um sentimento de unidade e de pertença à comunidade nacional.

Decisão Acordam no 2º Juízo do TCA – Sul Texto Integral:

1. RELATÓRIO

Ministério Público, veio interpor recurso jurisdicional da sentença, de 07.12.2007, do TAC de Lisboa, que julgou improcedente a acção administrativa especial de oposição à aquisição de nacionalidade portuguesa, por si intentada contra, Lam ..., nacional da Republica Popular da China, natural da cidade de Chong San, província de Kuomg Tong, residente na Rua …., Edifício …, Macau, Republica Popular da

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China.

Formulou, para tanto, as seguintes conclusões:

“1.A lei não alterou o figurino da oposição à aquisição da nacionalidade, como acção de simples apreciação negativa destinada à demonstração da inexistência de ligação à comunidade nacional, com as consequências daí advindas.

2.Tratando-se de acção de simples apreciação negativa, o ónus probatório incumbe ao réu, a ele incumbindo a prova da existência do direito que se arroga, e não ao autor, a prova da não existência do mesmo direito, sendo certo que a solução acolhida no art.° 343.°, n.° 1, do Código Civil não admite doutrina diferente.

3.A conduta processual do réu (que, nem sequer apresentou contestação) não pode redundar em prova efectiva do direito à aquisição da nacionalidade portuguesa.

4.E ainda que se considerasse (como fez a Mm.ª Juíza) que o ónus probandi incumbia ao Ministério Público, sempre se dirá que, tendo-se feito prova às per si suficiente, o adversário teria, por seu lado, de fazer prova que invalidasse aquela, que a

neutralizasse, criando no espírito do juiz um estado de dúvida ou incerteza. Não carecia de persuadir o juiz de que o facto em causa não era verdadeiro.

5.Ao decidir como decidiu, a Mm.ª Juíza incorreu em erro de julgamento.

6.Sendo assim, deve a douta sentença proferida, e ora recorrida, ser alterada e substituída por outra que decida em conformidade, julgando procedente a oposição deduzida pelo Ministério Público à aquisição da nacionalidade de Lam ...,

ordenando-se o arquivamento do processo conducente ao registo respectivo”.

O Recorrido não contra - alegou.

A Mmª Juíza “ a quo” sustentou o decido a fls.241 dos autos.

Foram colhidos os Vistos legais.

******

2. MATÉRIA DE FACTO

A sentença recorrida considerou provada, com base nos documentos juntos aos autos, a seguinte factualidade:

“1) O réu é natural da cidade de Chong San, Província de Kuong Tong, onde nasceu em 7 de Setembro de 1970, e é filho de Lam ... e de Lao ... (cfr. fls. 11-12, dos autos em suporte de papel, a que pertencem as demais folhas a citar, sem menção de origem).

2) O réu é de nacionalidade chinesa (cfr. fls. 45 e 65).

3) Em 5 de Novembro de 2000, na paróquia da Sé, Macau, República da China, contraiu casamento católico com a cidadã portuguesa Tse Heng Sai, natural da freguesia da Sé, concelho de Macau, a qual concluiu em Portugal os seus estudos superiores na Universidade Clássica (cfr. fls. 7 a 10,70 e 71).

4) Em 4 de Maio de 2006, no Consulado-Geral de Portugal em Macau o réu declarou pretender adquirir a nacionalidade portuguesa com base no casamento referido em 3) (cfr. fls. 4-5).

5) Com base nessa declaração foi organizado na Conservatória dos Registos Centrais de Lisboa o processo n°. 19190/06, onde se questionou a existência de factores impeditivos da pretendida aquisição de nacionalidade portuguesa - falta de ligação efectiva à comunidade nacional e exercício de funções públicas sem carácter

predominantemente técnico -, razão pela qual foi remetida ao MP certidão para efeitos de instauração do presente processo (cfr. fls. 1 e 200 a 203).

6) Em 28 de Dezembro de 2001, na freguesia da Sé, concelho de Macau, República Popular da China, nasceu Chon ..., filho do réu e de Heng ..., de nacionalidade

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portuguesa, o qual fala as línguas chinesa e portuguesa (cfr. fls. 18 e 70).

7) Em 20 de Outubro de 2004, na freguesia da Sé, concelho de Macau, República Popular da China, nasceu Hok ..., filha do réu e de Heng ..., de nacionalidade portuguesa, o qual fala as línguas chinesa e portuguesa (cfr. fls. 70 e 199).

8) O réu reside desde 1979 em Macau (cfr. fls. 6,17,40,41,43,44,70 e 71).

9) O réu licenciou-se em engenharia civil na Universidade de Macau, em 1994 (cfr.

fls. 58 a 64 e 98/112).

10) O réu concluiu, em 22.9.2005, a Licenciatura em Direito em Língua Chinesa na Universidade de Macau, com a classificação final de 12 valores, tendo tido as disciplinas e classificações constantes de fls. 26 e 27, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido, nomeadamente:

por integralmente reproduzido, nomeadamente:

-Língua Portuguesa I 15 valores -Língua Portuguesa II 15 valores -Língua Portuguesa III 15 valores

-Linguagem jurídica Portuguesa e Chinesa 11 valores.

11) O réu concluiu com aproveitamento, em Julho de 1998, no Centro de Difusão de Línguas, da Direcção dos Serviços de Educação e Juventude, do Governo de Macau, o curso de Língua Portuguesa - Nível Linguístico II (cfr. fls. 29).

12) O réu mantém regularmente diálogos de complexidade diversa em língua

portuguesa, designadamente em família e com amigos, esforçando-se por aperfeiçoar o conhecimento da mesma (teve-se em conta o teor das declarações de fls. 30, 31, 70, 71, 72 e 78, conjugadas com os factos descritos em 10) e 11) e a circunstância de no auto de declarações de fls. 89/103 o réu ter prestado declarações sem necessidade de intérprete, o qual é de data mais recente que o de fls. 4/5).

13) O réu já visitou Portugal várias vezes, quer por razões de trabalho - sendo que em Julho de 2006 aqui frequentou um Curso de Gestão de Aeroporto e Assuntos de Aviação organizado pela ANA, SA -, quer para passar férias (cfr. fls. 54-55, 65- 66,68,69,70 e 71).

14) O réu convive constantemente com a comunidade portuguesa em Macau e tem ligações de amizade e profissionais com portugueses (cfr. fls. 30,31, 70,71,72 e 78).

15) O réu tem mostrado interesse em conhecer a cultura portuguesa (cfr. fls. 31 e 78).

16) O réu não tem antecedentes criminais em: Portugal, Região Administrativa Especial de Macau e República Popular da China (cfr. fls. 20,32 a 34,51 e 75-76).

17) O réu exerceu de 1 de Janeiro de 1995 a 8 de Julho de 1998 as funções de técnico superior de 2a - Engenheiro de Infraestruturas de Aviação Civil - na Autoridade de Aviação Civil de Macau (AACM) (cfr. fls. 22, 23, 70, 89/103, 92-93/105-106 e 98/112).

18) O réu exerce presentemente, & desde 9 Julho de 1998, as funções de director de Infraestruturas Aeroportuárias e Navegação Aérea na AACM (cfr. fls. 22, 23, 30, 31, 70, 78, 89/103, 96-97/110-111 e 98/112).

19) Dá-se por integralmente reproduzido o Estatuto de Pessoal da Autoridade de Aviação Civil de Macau - homologado em 4.3.1996 -, e respectivos anexos, constantes de fls. 113 a 156, de onde consta nomeadamente que:

-"Artigo 11°

(Enquadramento profissional)

1. Os trabalhadores da AACM são enquadrados em grupos profissionais, de acordo com o Anexo I, e, dentro de cada grupo, em carreiras, consoante a natureza das

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funções que desempenhem.

(...)

2. As carreiras podem ser compostas por categorias, conforme o Anexo I. (...) 4. As funções específicas de cada carreira são as constantes do Anexo II.

5. As funções das categorias nas carreiras dos grupos profissionais V e VI são os constantes do anexo III.

- "Artigo 15°

(Promoção)

1.Considera-se promoção a passagem de um trabalhador à categoria imediatamente seguinte.

2. A promoção reveste duas modalidades:

a) Automática;

b) Por mérito;

3. A promoção opera-se automaticamente ao fim de quatro anos de antiguidade na categoria, salvo o disposto nos números seguintes.

4.A promoção para as categorias assinaladas com a) no Anexo I depende sempre de avaliação positiva de desempenho a validar pelo Presidente da AACM.

(...)

6. No grupo profissional VI não existem movimentos de promoção, sendo as categorias preenchidas por escolha do Presidente da AACM.";

- "Artigo 16°

(Mudança de carreira)

1. Os trabalhadores poderão mudar de carreira, desde que:

a) Preencham os requisitos de admissão para a carreira para que pretendem mudar;

b) Seja reconhecida pela AACM a necessidade de preenchimento de postos de trabalho na carreira em causa, para o qual gozam de prioridade.

2. O disposto no n." l do presente artigo não se aplica à mudança para carreira do grupo profissional VI, cujo preenchimento é sempre feito por escolha do Presidente da AACM.";

- "ANEXO I

GRUPOS PROFISSIONAIS, CARREIRAS, CATEGORIAS E NÍVEIS SALARIAIS GRUPO CARREIRA CATEGORIA NÍVEL

SALARIAL PROFISSIONAL (...)

V Pessoal 2ª (...) Técnico 1ª a) (...)

Superior Principal a) (...)

Assessor a) (...) Consultor a) (...)

_________________________________________________

VI. Pessoal de Chefe de Sector (...) Direcção e Chefe de Depart. (...) de Chefia Director (...)”

- "ANEXO II

(5)

DESCRIÇÃO DE FUNÇÕES DAS CARREIRAS (...)

E) GRUPO PROFISSIONAL V

Pessoal Técnico Superior - Trabalhador que executa, individualmente ou em grupo, estudos, pareceres, análises e projectos de natureza técnica e/ou científica, exercendo as suas funções com autonomia técnica, embora subordinada a orientações de

princípio aplicáveis ao trabalho a executar, podendo ser supervisionado por profissional de nível superior ou esporadicamente igual.

F) GRUPO PROFISSIONAL VI

Pessoal de Direcção e de Chefia - Trabalhador que programa, organiza, coordena e é responsável pela execução das actividades de uma Direcção, Departamento ou Sector.";

- "ANEXO III

DESCRIÇÕES ESPECÍFICAS DE FUNÇÕES A) CARREIRA DE TÉCNICO SUPERIOR

1- Categoria de Consultor - Trabalhador que, dispondo de formação científica superior ou de reconhecida capacidade técnica, executa trabalhos de natureza técnico-científica de elevado nível de complexidade ou especialidade, destinados a análise e suporte de decisões a assumir pelo Presidente da AACM ou pelos directores.

Poderá integrar e/ou coordenar grupos de trabalho de assuntos interdisciplinares ou assessorar o Presidente da AACM.

2- Restantes Categorias - Funções descritas no Anexo II.

B) CARREIRA DE DIRECÇÃO E CHEFIA

1- Director - Trabalhador que, na esfera da sua responsabilidade e de forma

autónoma, toma as grandes decisões no quadro das políticas e objectivos definidos pelo Presidente da AACM e que colabora na elaboração e preparação das decisões a tomar por aquele.

2 - Restantes categorias - Funções descritas no Anexo II."

20) Dá-se por integralmente reproduzido o Estatuto da Autoridade de Aviação Civil de Macau - aprovado pelo DL10/9l/M, de 4 de Fevereiro - e respectivas alterações, constantes de fls. 159 a 171, de onde consta nomeadamente que:

- "Artigo 1°

(Natureza jurídica)

A Autoridade de Aviação Civil de Macau, adiante abreviadamente designada por AACM, é um instituto público dotado de autonomia administrativa, financeira e patrimonial que se rege pelo disposto no presente estatuto e demais legislação aplicável.";

- "Artigo 3°

(Tutela)

1. A AACM está sujeita à tutela do Governador.

2. No exercício dos seus poderes de tutela, compete designadamente ao Governador:

(...)";

- "Artigo 4°

(Atribuições)

1.A AACM constitui o órgão de orientação, regulamentação e inspecção das actividades relacionadas com a aviação civil no espaço aéreo do Território e no internacional confiado à jurisdição de Macau, sendo dotada de autonomia

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administrativa.

2. A utilização em aviação civil de quaisquer meios que não estejam sob a jurisdição directa de entidade licenciada ou certificada pela AACM far-se-á sempre mediante acordo com esta, em que sejam salvaguardados todos os aspectos ligados à segurança aérea.";

- "Artigo 5°

(Competência)

No exercício das suas atribuições, compete à AACM, em geral, habilitar o

Governador a definir a política aérea do Território e exercer tutela técnica sobre as entidades que desenvolvam, a qualquer título, actividades relacionadas directamente com a aviação civil e, em especial:

(...)".

21) As responsabilidades da Direcção de Infraestruturas e Aeronaves da Autoridade de Aviação Civil de Macau são as constantes de fls. 175-176/190-191/194-195, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido, nomeadamente:

- "Estudar e analisar os planos existentes, verificar a sua adequação às necessidades actuais e propor as adequadas revisões";

-"Estudar e dar parecer sobre os novos projectos de construção, de expansão ou alteração de infra-estruturas aeroportuárias (...)";

-"Preparar e pôr em execução a regulamentação relativa a infraestruturas aeroportuárias: licenciamento, equipamento e serviços";

-"Supervisar o Serviço de Informações e Comunicações relativo à Aviação Civil de Macau";

- "Estudar e dar parecer sobre as matérias da navegação aérea";

- "Analisar e aprovar as licenças de frequências".

22) A presente acção foi intentada em 30 de Março de 2007 (cfr. primeira folha da petição inicial).

******

3- DIREITO APLICÁVEL

O objecto do presente recurso é a sentença do TAC de Lisboa, de 07.12.07, que julgou improcedente a acção administrativa especial de oposição à aquisição de

nacionalidade portuguesa intentada pelo Ministério Público, ao abrigo das disposições conjugadas dos artigos 5º, 9º, als. a) e c), 10º n.° 1, 25º e 26º, da Lei da Nacionalidade 37/81, de 3 de Outubro - na redacção introduzida pelo art. 1°, da Lei Orgânica 2/2006, de 17/4 -, e artigos 4º, do DL 237-A/06, de 14/12, e 56º e ss., do Regulamento da Nacionalidade Portuguesa, aprovado pelo mesmo DL.

Inconformado, o Ministério Público pede a revogação da sentença sob censura, alegando para tanto, que incumbe ao Réu fazer a prova da sua efectiva ligação à comunidade nacional, mas mesmo que assim não se entenda, sempre se demonstrou que esse enlace não existe.

Vejamos então a quem assiste razão, sem não antes, delinear, ainda que perfunctoriamente, as linhas nucleares da construção, no nosso ordenamento jurídico, do “ direito da nacionalidade”, ancorado na Lei 37/81, (sucessivamente alterada pela Lei 25/94, de 19.08, DL n.º 194/2003, de 23.08, Lei Orgânica n.º 1/2004, de 15.01, republicada em anexo, artigo 8º da Lei Orgânica n.º 2/2006, de 17.04 ) e, no Regulamento da Nacionalidade, DL n.º 322/82, (alterado pelos DLs n.ºs 117/93, de 13.04, 253/94, de 20.10, 37/97, de 31.01, L n.º 33/99, de 18.05 ), revogado pelo DL

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237-A/2006, de 14 de Dezembro.

Um dos traços caracterizadores do nosso ordenamento jurídico, é a função que é reconhecida à vontade dos indivíduos em todas as vicissitudes que a relação da nacionalidade pode apresentar – v.g., neste sentido, Rui Manuel Moura Ramos, “ Do Direito Português da Nacionalidade”, 1992, págs.118 e segs. E, uma das situações em que a manifestação de vontade do interessado é relevante para a aquisição da

nacionalidade portuguesa, é a contemplada no artigo 3º da Lei n.º 37/81.

De acordo, com o n.º1 da citada norma, na sua redacção original:

“ 1-O estrangeiro casado com nacional português pode adquirir a nacionalidade portuguesa mediante declaração feita na constância do casamento.(…)”

Mas, em 1994, o legislador introduziu uma alteração ao preceito, impôs ao cidadão estrangeiro que permanecesse, pelo menos, três anos casado com um nacional, para que pudesse declarar a sua vontade em adquirir a nacionalidade portuguesa.

Avisa Moura Ramos, na obra citada, a pág. 151, que “ o casamento não é mais do que um pressuposto de facto necessário dessa declaração – mas não é ele o elemento determinante da aquisição”.

Assente que o facto juridicamente relevante para a aquisição da nacionalidade não é o casamento, mas a declaração de vontade do estrangeiro que tenha casado com um nacional português, há mais de três anos, e expresse, na constância do matrimónio, esse desejo de se inserir na sociedade portuguesa.

A última alteração à “ Lei da Nacionalidade”, operada Lei Orgânica n.º

2/2006,manteve incólume o n.º1 do artigo 3º, na versão dada pela Lei n.º 25/94.

Dispõe o citado preceito que:

“ 1-O estrangeiro casado há mais de três anos com nacional português pode adquirir a nacionalidade portuguesa mediante declaração feita na

constância do casamento.(…)”

Todavia, a lei não se basta com a declaração de vontade do cidadão estrangeiro, feita nos moldes descritos, prescreve ainda para que se lhe possa conceder a nacionalidade portuguesa, que o Ministério Público não tenha deduzido oposição à aquisição de nacionalidade, ou caso a tenha, o tribunal venha a considerá-la improcedente.

Na sua versão originária, a Lei n.º 37/81 prescrevia nas alíneas a) e c) do artigo 9º [relevante para o caso dos autos], o seguinte:

” Constituem fundamento de oposição à aquisição da nacionalidade portuguesa:

a) A manifesta inexistência de qualquer ligação efectiva à comunidade nacional;

(...)

c) O exercício de funções públicas ou a prestação de serviço militar não obrigatório a Estado estrangeiro.

A Lei n.º 25/94, altera a redacção da alínea a) do art.º 9º, e passa a exigir ao

declarante interessado na aquisição da nacionalidade portuguesa que comprove a sua ligação efectiva à comunidade nacional. Dispunha, assim, o preceito: “Constituem fundamento de oposição à aquisição da nacionalidade portuguesa:

a)A não comprovação, pelo interessado, da ligação efectiva à comunidade nacional;(…)”

No dizer de Moura Ramos, a alteração levada a cabo pelo legislador de 1994, representava uma “ reacção à tendência jurisdicional” dominante, que

sustentava, face à redacção primitiva do preceito, e “ de acordo com os princípios gerais em matéria do ónus da prova, que, tratando-se de factos impeditivos,

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cabia ao Estado, através do Ministério Público fazer a prova da “manifesta inexistência de qualquer ligação efectiva à comunidade nacional”, (“A Renovação do Direito Português da Nacionalidade pela Lei Orgânica n.º2 /2006, de 17 de Abril”, In Revista da Legislação e Jurisprudência (RLJ), Ano 136, págs 211/213).

E, perante a modificação operada em 1994, a doutrina jurisprudencial passou a entender que cabia ao candidato “ o ónus da correspondente alegação e prova”

(Moura Ramos in RLJ, Ano 136, pág.213); ou seja, pendia sobre o requerente (interessado, em adquirir a nacionalidade portuguesa), o dever de demonstrar a sua ligação efectiva à comunidade nacional por qualquer meio de prova – documental, testemunhal ou outro legalmente admissível.

É, pois, sobre este pano de fundo, traçado em linhas gerais, que entra em vigor a quarta alteração à Lei da Nacionalidade (Lei Orgânica n.º 2/2006. 17.04).

Prevê, o artigo 9º, concretamente as als. a) e c) (no que ao caso importam):

“Constituem fundamento de oposição à aquisição da nacionalidade portuguesa:

” a) A inexistência de ligação efectiva à comunidade nacional;

(...)

c)O exercício de funções públicas, sem carácter predominantemente técnico, ou a prestação de serviço militar não obrigatório a Estado estrangeiro.”

Por outro lado, o art. 56°, n°2 do actual Regulamento da Nacionalidade Portuguesa, aprovado pelo DL n° 237-A/2006, determina que:“(…) 2 - Constituem

fundamento de oposição à aquisição da nacionalidade portuguesa, por efeito da vontade ou da adopção:

a) A inexistência de ligação efectiva à comunidade nacional;

b) ….;

c) O exercício de funções públicas sem carácter predominantemente técnico ou a prestação de serviço militar não obrigatório a Estado estrangeiro».

E no art. 57°, n° 1 deste diploma, dispõe-se que: "Quem requeira a aquisição da nacionalidade portuguesa, por efeito da vontade ou por adopção, deve

pronunciar-se sobre a existência de ligação efectiva à comunidade nacional e sobre o disposto nas alíneas b) e c) do n.° 2 do artigo anterior."

Estabelece o n° 7 do mesmo artigo que “sempre que o conservador dos Registos Centrais ou qualquer outra entidade tiver conhecimento de factos

susceptíveis de fundamentarem a oposição à aquisição da nacionalidade, por efeito da vontade ou por adopção, deve participá-los ao Ministério Público, junto do competente tribunal administrativo e fiscal, remetendo-lhe todos os elementos de que dispuser”

Como observa o autor que vimos a acompanhar, emerge da análise dos normativos transcritos, que o legislador de 2006 adoptou uma posição intermédia, por um lado, repôs “.. o entendimento tradicional quanto ao ónus da prova”, legitimando, assim, uma posição menos restritiva quanto à aquisição da nacionalidade e, por outro, deixou de ser tão exigente na caracterização da inexistência, abandonando, para efeitos de desencadear a oposição a manifesta carência de ligação efectiva à comunidade nacional.

De qualquer forma, continua o interessado a ter necessidade de “pronunciar-se sobre a existência de ligação efectiva à comunidade nacional” .

Em síntese, incumbe ao estrangeiro, casado com um cidadão nacional, há mais de três anos, que pretenda adquirir a nacionalidade portuguesa, expressar essa vontade

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na constância do matrimónio, (conforme n.º 1 do artigo 3º da Lei 31/87, com a alteração introduzida pela Lei 25/94) e demonstrar que se encontra inserido na comunidade nacional (art.º 57.n.º1 do DL 237-A/2006, de 14.12).

Ora, no caso dos autos, o conservador dos registos centrais, entendeu que os

documentos careados pelo cidadão chinês, casado há mais de 3 anos com uma cidadã portuguesa, que expressou vontade em adquirir a nacionalidade portuguesa, não são suficientes para se poder concluir pela existência de uma ligação efectiva à

comunidade portuguesa e, em consequência, o Ministério Público interpôs a

competente acção administrativa especial de oposição à aquisição da nacionalidade portuguesa pelos fundamentos constantes das alíneas a) e c) do artigo da Lei 37/81 (na redacção dada pela Lei Orgânica n.º 2/2006). Defendendo agora que a alteração à chamada “Lei da Nacionalidade”, operada pela Lei n.º 2/2006, “ não [altera] o figurino da oposição à aquisição da nacionalidade, como acção de simples apreciação negativa” ,reclamando a inversão do ónus da prova, ao abrigo do no n.º 1 do artigo 343º do CC.

Que dizer?

Que falece razão ao recorrente.

A acção de oposição à aquisição da nacionalidade “ segue os termos da acção administrativa especial regulada no Código de Processo nos Tribunais Administrativos” (artigo 62 do DL n.º 237-A/2007). E, de acordo com o artigo 46º, n.º1, do CPTA, “ (..) seguem a forma da acção administrativa especial [...] os processos cujo objecto sejam pretensões emergentes da pratica ou da omissão ilegal de actos administrativos, bem como de normas que tenham ou

devessem ter sido emitidas ao abrigo de disposições de direito administrativo”

A acção administrativa especial abarca “ (...) assim o contencioso anulatório e o contencioso das omissões administrativas: enquanto processo impugnatório, a acção administrativa especial corresponde ao antigo recurso contencioso de anulação, quando tenha como objecto a impugnação de um acto

administrativo, e ao antigo processo de impugnação de normas, quando vise a impugnação de uma norma administrativa; no ponto em que se destine a efectivar uma pretensão dirigida à prática de um acto administrativo devido ou à emissão de uma norma, a acção administrativa especial, dá

concretização prática, no plano processual, ao imperativo constitucional decorrente do n.º 4 do art.º 268º (quando garante, no âmbito da tutela jurisdicional administrativa, o acesso a um tribunal para a determinação judicial da prática de actos devidos)” (cfr. Mário Aroso de Almeida e Carlos Alberto Cadilha, in “ Comentário ao Código de Processo nos Tribunais

Administrativos”, Almedina, 2ª ed., 1ª nota ao artigo 46º, pág.266).

Ora, tal como está configurada, o que se pretende na acção de oposição à nacionalidade portuguesa, é tão só que o Tribunal ordene à Conservatória dos Registos Centrais, que arquive o processo desencadeado pelo pedido do cidadão estrangeiro que pretende adquirir a nacionalidade do conjugue, com quem está casado há mais de 3 anos, por se verificar alguma das condições previstas no artigo 9º da Lei n.º 37/81 (republicada).

E, a acção adequada para atingir tal desiderato, é a acção administrativa especial de condenação à prática de acto devido, prevista nos artigos 66º a 71º do CPTA. Este meio processual, centrado nos direitos dos particulares, veio concretizar o princípio

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da tutela jurídica efectiva e alterou o “ modo de entender a posição do particular no processo administrativo como um verdadeiro sujeito

processual e não como um funcionário da Administração” (Vasco Pereira da Silva, Para um Contencioso Administrativo dos Particulares, pág.47).

Ora, no caso dos autos, a entidade administrativa, com competência e dever legal de decidir, não emitiu qualquer decisão sobre a pretensão do cidadão chinês que

requereu o registo de aquisição da nacionalidade do seu conjugue, e não o fez, por entender que o requerente desempenha funções, sem carácter eminentemente técnico, ao serviço da República Popular da China e não demonstrou,

suficientemente, a sua ligação efectiva à comunidade nacional.

A Administração não praticou um acto de resposta à pretensão que o particular lhe dirigiu e, o MP, como Autor da acção de oposição, pede ao Tribunal que proferia uma decisão condenatória que reveste, aqui, um duplo sentido, por um lado, impõe à Administração a emissão do acto legalmente devido e, por outro, ao proferir essa injunção obriga a Administração a agir de acordo com a determinação concreta do conteúdo dessa conduta, erradicando da ordem jurídica a actuação omissiva.

A simples verificação de uma das situações previstas no artigo 9º da Lei 37/81 (na versão republicada) se é, por um lado pressuposto da acção de oposição, por outro não implica por si mesma, a obrigação de recusa.

Neste sentido, a jurisprudência do STJ (Ac. de 25.02.93, Rec. 83422) considerou “ que os fundamentos de oposição à aquisição derivada da nacionalidade portuguesa, considerados no art.º9 da Lei n.º 37/81, de 3 de Outubro, constituem meros indícios de factores impeditivos da aquisição da

nacionalidade (…) e que carecem de ser completados com a prova de outros factores que sejam expoentes manifestos dessa indesejabilidade…. “.

Mas, se tais pressupostos não passam de factores que podem obstacularizar a aquisição derivada da nacionalidade portuguesa, então haverá que reconhecer que quem os alegar têm de demonstrar a sua existência.

Dito por outras palavras, incumbe ao MP, como Autor da oposição, o ónus de provar a existência de factos que tornam impeditivo o direito (aquisição à nacionalidade) que o interessado quis fazer valer (artigo 342. n.º2 do Código Civil)

Ora, “in casu” não pode considerar-se satisfeito o ónus probatório que recai sobre o MP; não se pode afirmar-se que o A. conseguiu refutar a prova que o R. fez da sua ligação à comunidade nacional, laços que não se circunscrevem à relação

matrimonial ou de parentesco.

A ligação de pertença à comunidade nacional não significa o preenchimento cabal de todos os itens que usualmente são reconhecidos como medidores dessa pertença (conhecimento da língua, dos costumes, do hino, convívio com a comunidade nacional, residência em Portugal, etc...) nem requer que a cada um deles seja atribuído o mesmo relevo, o que se exige, para aferir, como decisivo e suficiente é uma visão de conjunto, que permita concluir (como se conclui no caso vertente) que se encontra estruturada e arreigada no âmago do candidato a caminhada para adquirir a nacionalidade portuguesa. E, a prova dessa caminhada foi dada na última vez que o R. prestou, no âmbito do processo de aquisição da nacionalidade,

declarações no Consulado de Portugal em Macau, sem necessidade de se fazer acompanhar de um tradutor. E, este esforço de aprendizagem tem de constituir um sinal relevante do laço que prende o R. à comunidade portuguesa residente naquele território, sabendo-se, como se sabe, que é ínfima a percentagem de nacionais de

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etnia chinesa, ainda que de nacionalidade portuguesa, que entendem ou sequer falem a língua de Camões. Assim, somos de crer, que o aspecto aqui relevante e decisivo para a prova da “ ligação efectiva à comunidade nacional “ deve ser o

respeitante às relações familiares, como aliás bem nota a Mmª Juíza “ a quo” na sua douta sentença, quando escreve:” as especificidades do caso concreto …. são insuficientes para pôr em causa o interesse da unidade familiar”.

Sustenta ainda o MP, como fundamento de oposição, que o R. desempenha no Departamento Infra-Estruturas Aeroportuárias e Navegação Aérea da Autoridade de Aviação Civil do Governo da RAEM, um cargo de chefia, com pendor

predominantemente politico, que impede a concessão da nacionalidade portuguesa.

Não se nega que da leitura do “Estatuto de Pessoal da Autoridade da Aviação Civil”

pode concluir-se que as funções de direcção, são funções públicas sem carácter predominantemente técnico, mas a conclusão a que se chega só pela leitura isolada do estatuto, não é em si suficiente para dar como provado o fundamento de oposição à aquisição da nacionalidade portuguesa, vertido na alínea c) do artigo 9 da chamada

“ Lei da Nacionalidade”.

Emerge do probatório que o R. iniciou funções no Departamento de Infra-

Estruturas e Aeronaves da AACM, no ano de 1994, como técnico superior e ascendeu ao lugar de chefia quando o território de Macau se encontrava sob soberania

portuguesa (em 1998), como resulta provado que as responsabilidades cometidas a esse departamento são funções de índole predominante técnica (ponto 21 da matéria de facto). A isto ainda acresce, o teor da declaração conjunta entre o Governo

Português e o Governo Chinês, sobre a Questão de Macau, na qual se garante a esta Região um alto grau de autonomia, por um período de 50 anos, autonomia que só é excepcionada nas questões relacionadas com a condução da politica externa e da defesa, permitindo-se aos nacionais portugueses que, previamente tinham

trabalhado nos serviços públicos, a manutenção dos seus empregos.

Como refere a douta sentença o acordo entre Portugal e a China, foi mais longe ao admitir a possibilidade de “se nomear e contratar pessoal, funcionários e agentes públicos portugueses que hajam previamente trabalhado em Macau ou cuja

actividade seja considerada particularmente útil para exercício de funções técnicas especializadas”, e em atenção ao acordado, foi criada, uma licença especial para o exercício transitório de funções públicas ou de interesse público na RAEM por funcionários e agentes públicos portugueses (DL n.º 98-G/98, de 13.04).

Emerge dos autos que o R. demonstrou ser portador de um sentimento de unidade e de pertença com a comunidade nacional, em termos de um sentir português, que vai para além dos laços familiares, prova que o MP nem conseguiu beliscar, como lhe incumbia, nem o facto do requerente desempenhar funções de chefia se mostra suficiente para por em causa a unidade familiar, uma vez que se provou serem de índole predominante técnica as atribuições cometidas ao Departamento onde o R.

ocupa funções de chefia.

Em face do exposto, não merece a sentença recorrida a censura que lhe vem dirigida, improcedendo, em consequência, as conclusões da alegação do recorrente.

4. DECISÃO

Acordam, pois, os juízes que compõem a secção de contencioso Administrativo, deste TCAS, em negar provimento ao recurso jurisdicional e confirmar a decisão recorrida.

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