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uma abordagem à luz da Lei de Registros Públicos Josanne Cristina Ribeiro Ferreira Façanha

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XXVI CONGRESSO NACIONAL DO

CONPEDI SÃO LUÍS – MA

(2)

Copyright © 2017 Conselho Nacional de Pesquisa e Pós-Graduação em Direito Todos os direitos reservados e protegidos.

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D597

Direito civil contemporâneo II [Recurso eletrônico on-line] organização CONPEDI

Coordenadores: Ana Thereza Meireles Araújo; Edna Raquel Rodrigues Santos Hogemann–Florianópolis: CONPEDI, 2017.

Inclui bibliografia ISBN:978-85-5505-514-0

Modo de acesso: www.conpedi.org.br em publicações

Tema: Direito, Democracia e Instituições do Sistema de Justiça

CDU: 34 ________________________________________________________________________________________________

Conselho Nacional de Pesquisa e Pós-Graduação em Direito Florianópolis – Santa Catarina – Brasil

www.conpedi.org.br

Comunicação – Prof. Dr. Matheus Felipe de Castro – UNOESC

1.Direito – Estudo e ensino (Pós-graduação) – Encontros Nacionais. 2. Civil. 3. Contemporaniedade. XXVI Congresso Nacional do CONPEDI (27. : 2017 : Maranhão, Brasil).

Universidade Federal do Maranhão - UFMA

São Luís – Maranhão - Brasil www.portais.ufma.br/PortalUfma/

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XXVI CONGRESSO NACIONAL DO CONPEDI SÃO LUÍS – MA

DIREITO CIVIL CONTEMPORÂNEO II

Apresentação

O XXVI Encontro Nacional do CONPEDI – SÃO LUIS – MARANHÃO foi promovido em

parceria com a Universidade Federal do Maranhão e a UNICEUMA. Sua temática central

teve como objeto “Direito, Democracia e Instituições de Justiça”. Esse assunto suscitou

intensos debates desde a abertura do evento no Convento das Mercês e inúmeros

desdobramentos ao longo da apresentação dos trabalhos previamente selecionados e da

realização das plenárias. Em especial, as questões relativas à função social do contrato, dos

direitos de personalidade e os reflexos do novo CPC no direito material mereceram um olhar

reflexivo crítico-analítico dos participantes do Grupo de Trabalho “Direito Civil

Contemporâneo II”.

Sob a coordenação das Profa. Pós-Dra. Edna Raquel Hogemann (UNESA/UNIRIO), e Profa.

Dra. Ana Thereza Meireles Araújo (UNEB/ UCSal/ Faculdade Baiana de Direito), o GT

“Direito Civil Contemporâneo II” realizou seu contributo, com exposições orais e bons

debates que se caracterizaram tanto pela atualidade quanto pela profundidade das temáticas

abordadas pelos expositores.

Eis um breve resumo dos trabalhos apresentados:

Tiago Martinez e Edna Raquel Rodrigues Santos Hogemann apresentaram o artigo intitulado

"A trivialização do dano: banalizado por quem? a desmistificação da indústria do dano moral

pela análise da cultura jurídica brasileira e norte-americana". Os autores refletem a respeito

da cultura jurídica brasileira e norte-americana sobre a fixação do valor de reparação dos

danos morais, a influência cultural na determinação dos modelos de fixação do quantum, bem

como da relação dos julgados vinculados ao tema com a banalização do instituto, e apontam

a inexistência de uma indústria do dano moral, tanto no Brasil como nos Estados Unidos, a

partir das diferenças dos modelos jurídicos apresentados.

"O acesso à informação genética e a conformação dos novos direitos da personalidade: o

alcance da proteção à identidade genética sob a perspectiva do direito civil contemporâneo" é

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destaque, a fim de identificar por meio de dedução a melhor interpretação no que tange à

construção da proteção do direito.

O artigo de Wellington Henrique Rocha de Lima e Jussara Suzi Assis Borges Nasser Ferreira

intitulado "Funções do contrato e Ordem Pública" teve como proposta analisar as funções do

contrato referentes à criação, regulação e extinção de direitos, considerando a relevância da

funcionalização com vistas ao equilíbrio dos pactos e a contribuição daí decorrente em

relação ao contexto econômico e social.

Rainner Jeronimo Roweder e Hudson Franklin Felipetto Malta apresentaram o trabalho "O

contrato de compra e venda: semelhanças e diferenças entre o sistema legislativo brasileiro e

português de transferência imobiliária", em que analisaram a compra e venda de bens

imóveis, numa perspectiva de doutrina e legislação comparada, entre os ordenamentos

jurídicos brasileiro e português.

"Direito à filiação e multiparentalidade : uma abordagem à luz da lei de registros públicos",

da autoria de Josanne Cristina Ribeiro Ferreira Façanha, abordou a a ocorrência da

multiparentalidade no Registro Civil brasileiro, a partir da compreensão sistemática e

atualizada do ordenamento jurídico pátrio, especificamente quanto à família, aos

demarcadores do parentesco e aos direitos da filiação.

Felipe de Poli de Siqueira e Francieli Micheletto, autores do trabalho "O poder de

inadimplemento contratual e suas implicações jurídicas" propuseram avaliar a possibilidade

do contratante requerer a quebra ou inadimplemento contratual e as implicações jurídicas e

mecanismos de resolução do referido desligamento.

O artigo de Ivy Helene Lima Pagliusi e Yuri Amorim da Cunha intitulado "A des

(necessidade) de oitiva do genitor biológico no acréscimo do sobrenome do padrasto ao nome

do filho" enfocou uma nova leitura constitucional dos direitos de personalidade, em especial

face ao princípio da dignidade da pessoa humana, em especial quanto ao aferir na Lei de

Registros Públicos o procedimento correto para o acréscimo do sobrenome de padrasto

(madrasta) no do enteado(a) com base em uma interpretação conforme.

O artigo de Cleber Sanfecili Otero e Tamara Simão Arduini intitulado "Os danos decorrentes

da relação triangular estabelecida entre paciente, médico e hospital e as respectivas

modalidades de responsabilidade definidas em lei" partiu do fato de que, nas relações

hospitalares, o paciente é vulnerável por ser consumidor dos serviços e, perante o médico, é

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Assim, o trabalho buscou partir da aferição das características da relação triangular

estabelecida entre paciente, médico e hospital para definir quem poderá ser responsabilizado

pelos danos causados.

Sob o título "A ata notarial como instrumento precípuo na condução da usucapião

extrajudicial", Tatiane Albuquerque de Oliveira Ferreira e Dênio Guilherme Dos Reis

fizeram uso do modelo argumentativo, para responder a seguinte indagação: a ata notarial

cumpre sua função no procedimento de usucapião extrajudicial? Analisaram os efeitos da ata

notarial no procedimento de usucapião fora do âmbito judiciário e concluíram necessidade da

eficiência da ata notarial, demonstrando que o tabelião, revestido de fé pública, é capaz de

certificar veracidade dos documentos comprobatórios de posse do imóvel a ser usucapido.

Camila Caixeta Cardoso apresentou o ensaio sob o título "A aquisição originária da

propriedade por meio da usucapião extrajudicial", cujo objetivo revelou-se a análise da nova

forma de processamento da usucapião pela via extrajudicial, ou seja, por meio de um

procedimento que ocorre internamente no ofício de registro de imóveis.

"Um ensaio sobre direito à privacidade e intimidade. você ainda os tem?" Eis um título de

indagação. Pois essa indagação foi tema da pesquisa materializada em ensaio da autoria de

Milena de Bonis Faria. Que considera que os operadores do direito necessitam de um

desdobramento “just in time”, para atender os anseios de uma sociedade que se transforma

constantemente.

Pastora do Socorro Teixeira Leal e Alexandre Pereira Bonna apresentaram o artigo sob o

título "Controle administrativo e preventivo de cláusulas abusivas em contratos de adesão

pelo Ministério Público", no qual buscam averiguar se o veto presidencial do art. 54,

parágrafo 3º e 5º da lei n. 8.078/90, que no uso da ideia da intenção do legislador configura a

impossibilidade de atuação preventiva e administrativa do Ministério Público das cláusulas

dos contratos de adesão.

"Dano hedônico: uma compensação civil diante da perda da felicidade em viver" revelou-se

um título interessante para o artigo apresentado por Maria Fernanda Miranda Lyra e

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Por fim, Carlos Alexandre Moraes e Marta Beatriz Tanaka Ferdinandi encerraram as

apresentações com o trabalho intitulado "A aplicação da teoria do diálogo das fontes no

direito brasileiro", sobre a aplicabilidade da Teoria do Diálogo das Fontes no direito pátrio,

como método capaz de conciliar a aplicação de diferentes normas.

Profa. Dra. Edna Raquel Rodrigues Santos Hogemann - UNIRIO/UNESA

Profa. Dra. Ana Thereza Meireles Araújo - UNEB

Nota Técnica: Os artigos que não constam nestes Anais foram selecionados para publicação

na Plataforma Index Law Journals, conforme previsto no artigo 7.3 do edital do evento.

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DIREITO À FILIAÇÃO E MULTIPARENTALIDADE : UMA ABORDAGEM À LUZ DA LEI DE REGISTROS PÚBLICOS

RIGHT TO MEMBERSHIP AND MULTIPARENTALITY: AN APPROACH UNDER THE PUBLIC RECORDS ACT

Josanne Cristina Ribeiro Ferreira Façanha

Resumo

Esta pesquisa objetiva investigar a ocorrência da multiparentalidade no Registro Civil

brasileiro, a partir da compreensão sistemática e atualizada do ordenamento jurídico pátrio,

especificamente quanto à família, aos demarcadores do parentesco e aos direitos da filiação.

Para tal, utilizaremos o método científico dedutivo, a técnica de pesquisa bibliográfica e

documental. A Constituição Federal de 1988 permitiu todas as formatações familiares não

expressas, que antes estavam à margem do arranjo matrimonial, dispondo a elas o tratamento

isonômico. Neste sentido, pretende-se abordar a multiparentalidade e a socioafetividade no

contexto da Lei de Registros Públicos e da Constituição Federal de 1988.

Palavras-chave: Direito à filiação, Multiparentalidade, Lei de registros públicos

Abstract/Resumen/Résumé

This research aims to investigate occurrence of multiparentality in Brazilian Civil Registry,

based on the systematic and updated understanding of the legal order of the country,

specifically regarding the family, the kinship demarcators and the rights of the members. For

this, we will use the deductive scientific method, the bibliographical and documentary

research technique. The Federal Constitution of 1988 permitted all non-expressive family

formations, which were previously outside the marital arrangement, providing them with

isonomic treatment. In this sense, we intend to approach multiparentality and

socio-affectivity in the context of Public Registers Law and the Federal Constitution of 1988.

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1 INTRODUÇÃO

Desde o ano de 1916 até o presente 2016 se passaram 100 anos. Não é temoroso

afirmar que um século é tempo considerável para identificar mudanças no panorama social.

Nesse interim o Direito Civil brasileiro também já não é o mesmo.

O movimento de constitucionalização da matéria civil, a partir da promulgação da

Constituição Cidadã em 1988, mudou a forma de operar o Direito Civil. Nessa esteira, o Direito

de Família, enquanto segmento essencialmente de natureza privada, é ramo o que mais absorveu

as influências da novel técnica jurídica. No tabuleiro do Direito Civil, ao lançar os dados da

proteção da dignidade da pessoa humana, o patrimonialismo teve que “voltar duas casas”,

dando largada à sua dimensão pessoal, onde protagonizam os indivíduos de direitos e deveres

em detrimento dos seus bens.

Na parte inaugural do trabalho, serão apresentadas as contorções das relações de

parentesco, cujo escopo é investigar a determinação da parentalidade. Primeiramente, será

analisada a constituição do parentesco natural e civil, observando os fundamentos legais

vigentes e como o movimento de constitucionalização do Direito Privado conduziu à

desbiologização do parentesco, tentando elucidar suas outras “outras origens”.

Abordaremos também a Filiação, que é a relação de parentesco que mais se destaca

no nosso Ordenamento, razão pela qual o Direito sempre se preocupou em atribuir a respectiva

parentalidade, valendo-se de mecanismos legais de presunção, recorrendo à biomedicina, à

genética e, mais recentemente, relativizando dogmas e ficções jurídicas para acolher relações

cristalizadas na vocação familiar.

Nesse contexto, destacaremos a filiação socioafetiva, firmada no estado de posse

de filho, técnica importada, decorrente do paradigma da afetividade, a qual também patrocina

o entendimento acerca da multiparentalidade. No segundo momento, faz-se uma abordagem de

como a Família, enquanto instituição jurídica, teve que se reorientar para se adequar à sua

dimensão social, âmbito onde ela já desponta como uma entidade desprendida e

corriqueiramente informal.

Nesse sentido, na penumbra de um conceito inacabado, estudaremos a noção de

família como núcleo afetivo voltado para a promoção da personalidade dos seus componentes,

independente da sua formatação, seja ela a matrimonial, a convivência estável (heterossexual

ou homossexual), a avoenga, a anaparental, a monoparental e também a multiparental.

Desbravaremos o conjunto de princípios (gerais e especiais), indispensáveis, que regem o novo

Direito de Família e como eles são a base que capitaneiam a mudança estrutural do nosso

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sistema jurídico, colaborando para o sucesso do direito pessoal, onde as pessoas deixaram de

ser um meio para se tornarem um fim em si mesmas.

Doravante, em sede final, veremos como a pluralidade parental ganha visibilidade

nesse novo cenário em que a família está se desmistificando do matrimônio e das relações

sexuais, onde a filiação é unitária, isonômica e dissociada do estado civil dos ascendentes, tudo

isso sob égide da realização familiar.

Em foco, discutiremos como a multiparentalidade exsurge como um novo arranjo

familiar que ainda carece de tutela quanto à elaboração do Registro Civil dos seus interessados.

Por isso, buscou-se entender algumas acepções de Registro Civil das Pessoas Naturais,

consagradas na doutrina, principalmente a asserção identitária, que tem como fundamento a

“teoria do espelho” dos registros públicos.

Com efeito, tentaremos compreender com base no Código Civil e na Lei de

Registros Públicos (Lei Nº 6.015/1973) algumas etapas do procedimento de filiação voluntário

(perfilhação) e judicial referentes à situação de multiparentalidade. Sem olvidar, colocaremos

em teste a importância da prova da filiação por meio do registro de nascimento, por materializar

direitos da cidadania e ser um instrumento de afirmação.

Portanto, tem-se como problemática a existência de arcabouço jurídico no direito

brasileiro para acolher as famílias multiparentais e se o Diploma Civil e a Lei Nº 6.105 atendem

à elaboração do Registro Civil multiparental. Ademais, o comportamento do Poder Judiciário

diante da omissão legislativa e quais indicadores têm sido oferecidos pelos doutrinadores

brasileiros em relação à declaração de multiparentalidade e à elaboração correlato Registro

Civil.

Assim, como objetivo, busca-se a construção de um entendimento sensível acerca

da possibilidade, importância e necessidade do Registro Civil multiparental por meio da

atividade oficial. Especificamente, pretende-se investigar as peculiaridades da

multiparentalidade enquanto instituição familiar e o procedimento de Registro Civil

pluriparental em face das disposições do Código Civil e da Lei de Registros Públicos, sem

prejuízo dos ditames norteadores do Estado Democrático de Direito.

Tudo isso para compreender os reflexos da declaração de multiparentalidade dentro

do Direito Registral, que notadamente, não deve ficar a parte dessas transformações.

Percebendo a natureza pública da atividade do oficial registrador em virtude da necessidade,

que têm as sociedades institucionalmente organizadas, de controle dos acontecimentos que

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Para tanto, por ser objeto da ciência do Direito, o fenômeno da multiparentalidade

repercute no mundo jurídico criando tópicos que serão alvos de estudo, fazendo-se patente a

sua compreensão sob a ótica formal regente do conhecimento acadêmico. O trabalho que se

seguirá, enquanto resultado de pesquisa acerca dos aspectos do registro civil multiparental,

adere ao rigor de investigação exigida pelo modelo do conhecimento científico.

Do ponto de vista metodológico, a pesquisa adota o método dedutivo, pelo qual,

navega-se por questões isoladas, para construir um conhecimento maior e geral a partir das

conjecturas particulares.

2 A OCORRÊNCIA DA MULTIPARENTALIDADE NO REGISTRO CIVIL

BRASILEIRO

2.1Da multiparentalidade

A partir do redimensionamento das funções reprodutiva, econômica-patrimonial e

sacralizada das famílias matrimoniais, desde a igualde de gêneros, a vedação da discriminação

quanto a origem da prole e a admissão do divórcio, as famílias modernas puderam se reorientar

no sentido da realização pessoal dos seus integrantes, balizados princípio da proteção da

dignidade da pessoa humana. Tem logrado a tese a da afetividade, representando a virada

paradigmática do Direito de Família, chave de ouro que abre as portas das explicações para os

seus institutos. Razão pela qual o instituto familiar tem adquirido com mais força o perfil

eudemonista.

O progresso da biomedicina, o advento da engenharia genética e o sucesso das

intervenções na reprodução humana proporcionaram a composição de arranjos familiares que

na prática podem vivenciar uma experiência plural, senão coletiva, acerca da paternidade e da

maternidade. A autora Dias (2013, p. 385) também admite que

Quer os doadores de material genético, quer quem gesta em substituição e acaba por dar à luz, todos geram vínculos com a criança que nasce com sua interferência. Assim não se pode mais que alguém só pode ter um pai e uma mãe. É possível que tenham vários pais.

Nesse panorama, ganha cada vez mais evidência a noção acerca a

multiparentalidade, situação fática que expõe a relação afetiva da prole com multiplicidade de

sujeitos investidos das funções e exercício da paternidade e da maternidade.

(11)

A multiparentalidade não tem previsão legal expressa, a sua definição, configuração

e extensão têm sido desenvolvidas doutrinariamente, fruto de pesquisas e, na prática,

simultaneamente à tentativa do Judiciário de superar os casos concretos que lhes são

apresentados. Lançando uma proposta conceitual, os autores Gagliano e Pamplona Filho (2014,

p. 714) descrevem a multiparentalidade como “uma situação em que um indivíduo tem mais de

um pai e/ou mais de uma mãe, simultaneamente, produzindo-se efeitos jurídicos em relação a

todos eles”.

Consoante Pereira (2013 apud BUCHMANN, 2013, p. 51) “a multiparentalidade

significa o parentesco constituído por múltiplos pais, ou seja, quando um filho tem mais de um

pai e/ou mais de uma mãe”. No nosso sistema jurídico, a determinação da parentalidade socioafetiva sempre procedeu no sentido do afastamento do fato natural do nascimento, até

leva-los ao seu rompimento total perante o Estado e seus agentes. O reconhecimento da

multiplicidade de vínculos parentais deve atentar para o fato de que, não basta comprovação da

existência do liame biológico em concomitância com outros vínculos amadurecidos na

socioafetividade.

Por se tratar de uma face da parentalidade socioafetiva, o reconhecimento da

multiparentalidade está igualmente calcado na qualificação da posse do estado de filho, jamais

na identificação da própria origem genética. A imputação da multiparentalidade busca, tanto no

vínculo biológico quanto no civil, o ingrediente afetivo, revelando que existe o interesse das

partes no exercício da parentalidade e da filiação, desejando serem tratados e reputados como

pais e filhos, atraindo para si os encargos dessa relação de parentesco.

É o que entende Dias (2013, p. 385) ao expor que “todos os pais devem assumir os

encargos decorrentes do poder familiar, sendo que o filho desfrua de direitos com relação a

todos. Não só no âmbito do direito das famílias, mas também sede sucessória”.

Cabe ainda refletir que a multiparentalidade exsurge de um direito relacional.

Significa dizer que, a sua declaração é um direito que assiste não apenas ao filho, mas também

aos sujeitos parentais.

Sem embargo à realização familiar através da paternidade e da maternidade, a

multiparentalidade celebra a assunção das vantagens e dos deveres de assistência mútua, seja

de cunho imaterial (afetivo) ou material (alimentos). É o que diz a inteligência do artigo 1.696

do Código Civil.

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O Poder Judiciário tem sido convocado para fundamentar suas decisões visando

promover o máximo aproveitado dos direitos todos os sujeitos interessados ou afetados pela

multiparentalidade, com base nos direitos e garantias fundamentais que costuram o

ordenamento jurídico pátrio.

Exemplo disso, em decisão monocrática, datada de 2014, proferida nos autos do

processo 027/1.14.0013023-9 (CNJ:. 0031506-63.2014.8.21.0027) pelo juiz monocrático da

Comarca de Santa Maria no Rio Grande do Sul, o magistrado decidiu para procedência do

pedido de declaração de multiparentalidade de uma família composta por duas mães, um pai e

o respectivo filho ainda menor impúbere.

Na riquíssima experiência de um lustro de Jurisdição exclusiva de Família, pronunciava às pessoas, diária e diuturnamente, das poucas certezas que tinha: que afeto demais não é o problema; o problema é a falta (infinda, abissal) de afeto, de cuidado, de amor, de carinho. [...].

A desatualização do arcabouço legislado à velocidade da vida nunca foi impediente ao Judiciário Gaúcho; a lei é lampião a iluminar o caminho, não este, como já se pronunciou outrora; a principiologia constitucional dá guarida à (re)leitura proposta pela bem posta inicial. [...] aguardam, sim, célere e humana decisão, a fim de adequar o registro civil da criança ao que a vida lhe reservou: um ninho multicomposto, pleno de amor e afeto.

Forte, pois, na ausência de impedientes legais, bem como com suporte no melhor interesse da criança, o acolhimento da pretensão é medida que se impõe (Santa Maria/RS. Proc. n. 027/1.14.0013023-9. Juiz: Rafael Pagnon Cunha, j. em 11/09/2014).

Chegando ao âmbito da segunda instância, a Câmara Única da Turma Cível do

Tribunal de Justiça de Roraima (TJRR) acolheu a tese de multiparentalidade da apelante

dando-lhe provimento ao recurso que decidiu pela reforma da sentença do juízo a quo.

Em seu voto, a desembargadora relatora fundamentou que “o estado de filiação

decorre da estabilidade dos laços construídos no cotidiano do pai e do filho (afetividade) ou da

consanguinidade” (TJRR, AC n. 0010119011251, Rel. Des. Eliane Cristina Bianchi. Boa Vista, j. em 27/05/2014).

Em seguida, ela completou sustentando que no caso concreto, consolida-se para

ambos os pais o direito de exercer a paternidade e de pronto atender o melhor interesse da filha.

De acordo com o princípio do melhor interesse da criança, da solidariedade familiar, o caso concreto conduz à conclusão de que ambos devem constar em seu registro como pais, já que os dois exercem o seu papel, sendo, portanto, importantes na vida da criança (TJRR, AC n. 0010119011251, Rel. Des. Eliane Cristina Bianchi. Boa Vista, j. em 27/05/2014).

Logo, para a desembargadora e relatora, a coalisão dos vínculos é uma patente e

prestigia a essência do instituto da filiação, ademais, sendo uma tarefa do Judiciário reconhecer

a multiparentalidade em homenagem aos princípios constitucionais, entre eles o da realidade.

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Aqui não há necessidade de se falar em vínculo socioafetivo em detrimento do biológico ou vice e versa, mas sim de possibilitar à criança se beneficiar do afeto dos dois pais, já que estão propostos a isso, recebendo também outras vantagens, como a inclusão em planos de saúde, planos previdenciários, podendo figurar como dependente dos dois, e até pleitear alimentos dos dois. O Poder Judiciário não pode ignorar que a multiparentalidade, ou seja, a possibilidade de uma pessoa ter mais de um pai e/ou mais de uma mãe, ao mesmo tempo, é uma realidade que pode ser verificada socialmente (TJRR, AC n. 0010119011251, Rel. Des. Eliane Cristina Bianchi. Boa Vista j. em 27/05/2014).

Por fim, havendo o provimento, o acordão restou ementado da seguinte forma:

DIREITO CIVIL. DIREITO DE FAMÍLIA. APELAÇÃO. AÇÃO DE ANULAÇÃO DE REGISTRO DE NASCIMENTO. EXAME DE DNA. PAI BIOLÓGICO QUE VINDICA ANULAÇÃO DO REGISTRO DO PAI REGISTRAL. EXCLUSÃO DO NOME DO PAI REGISTRAL. INOVAÇÃO RECURSAL. INCLUSÃO DO PAI BIOLÓGICO SEM PREJUÍZO DO PAI REGISTRAL. INTERESSE MAIOR DA CRIANÇA. FAMÍLIA MULTIPARENTAL. POSSIBILIDADE. RECURSO PROVIDO. SENTENÇA REFORMADA. 1. 1. Resguardando o melhor interesse da criança, bem como a existência de paternidade biológica do requerente, sem desconsiderar que também há paternidade socioafetiva do pai registral, ambas propiciadoras de um ambiente em que a menor pode livremente desenvolver sua personalidade, reconheço a paternidade biológica, sem, contudo, desfazer o vínculo jurídico oriundo da paternidade socioafetiva. 4. Recurso provido na parte em que foi conhecido para reformar a sentença. (TJRR, AC n. 0010119011251, Boa Vista. Rel. Des. Eliane Cristina Bianchi, j. em 27/05/2014).

De maneira semelhante, o Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul (TJRS)

atualmente tem entendido que a declaração de multiparentalidade não é pedido impossível, pois

a mesma encontra guarida constitucional nos princípios informadores do Direito.

Para o desembargador relator do acordão, em seu voto, “não se há como ignorar a

possibilidade jurídica conferida aos recorrentes de invocarem os princípios da dignidade

humana e da afetividade para ver garantida a manutenção ou o estabelecimento de vínculos

parentais” (TJRS, AC n. 70064909864, Rel. Des. Alzir Felippe Schmitz. Porto Alegre, j. em 16/07/2015).

Em comunhão, a Colenda Turma apontou que a Lei de Registro Públicos é anterior

à Constituição da República de 1988. Em decorrência disso, os princípios da legalidade, da

tipicidade que informam os devem ser relativizados na medida que não forem congruentes e

desarrazoados com a Ordem vigente.

Doravante, para os egrégios magistrados, “o formalismo não pode limitar a evolução dos fatos da vida, devendo os regramentos receber maior flexibilidade, já que as

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Decidido pelo provimento do Apelo da parte requerente, conferindo-lhe o direito

de ter registrado a sua filiação multiparental, fixou-se a seguinte ementa que ilustra o

reposicionamento do Tribunal gaúcho:

APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE ADOÇÃO. PADRASTO E ENTEADA. PEDIDO DE RECONHECIMENTO DA ADOÇÃO COM A MANUTENÇÃO DO PAI BIOLÓGICO. MULTIPARENTALIDADE. Observada a hipótese da existência de dois vínculos paternos, caracterizada está a possibilidade de reconhecimento da multiparentalidade. DERAM PROVIMENTO AO APELO. (TJRS, AC n. 70064909864, Rel. Des. Alzir Felippe Schmitz. Porto Alegre, j. em 16/07/2015).

Por diversas vezes a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça (STJ) tem se

posicionado a favor a primazia da socioafetividade, afirmando que a parentalidade é

determinada com base nos laços de afetos construídos na convivência familiar.

Afirma que, a confirmação da identidade da ascendência genética, sem o

ingrediente afetivo, não é razão suficiente para certificação da parentalidade e sua devida

responsabilização. Representa esse posicionamento o seguinte ementário:

PROCESSUAL CIVIL. CIVIL. RECURSO ESPECIAL. REGISTRO CIVIL. ANULAÇÃO PEDIDA POR PAI BIOLÓGICO. LEGITIMIDADE ATIVA. PATERNIDADE SOCIOAFETIVA. PREPONDERÂNCIA. 1. A paternidade biológica não tem o condão de vincular, inexoravelmente, a filiação, apesar de deter peso específico ponderável, ante o liame genético para definir questões relativa à filiação. 2. Pressupõe, no entanto, para a sua prevalência, da concorrência de elementos imateriais que efetivamente demonstram a ação volitiva do genitor em tomar posse da condição de pai ou mãe. 3. A filiação socioafetiva, por seu turno, ainda que despida de ascendência genética, constitui uma relação de fato que deve ser reconhecida e amparada juridicamente. Isso porque a parentalidade que nasce de uma decisão espontânea, frise-se, arrimada em boa-fé, deve ter guarida no Direito de Família. 4. Nas relações familiares, o princípio da boa-fé objetiva deve ser observado e visto sob suas funções integrativas e limitadoras, traduzidas pela figura do venire contra factum proprium (proibição de comportamento contraditório), que exige coerência comportamental daqueles que buscam a tutela jurisdicional para a solução de conflitos no âmbito do Direito de Família. 5. Na hipótese, a evidente má-fé da genitora e a incúria do recorrido, que conscientemente deixou de agir para tornar pública sua condição de pai biológico e, quiçá, buscar a construção da necessária paternidade socioafetiva, toma-lhes o direito de se insurgirem contra os fatos consolidados. 6. A omissão do recorrido, que contribuiu decisivamente para a perpetuação do engodo urdido pela mãe, atrai o entendimento de que a ninguém é dado alegrar a própria torpeza em seu proveito (nemoauditur propriam turpitudinem allegans) e faz fenecer a sua legitimidade para pleitear o direito de buscar a alteração no registro de nascimento de sua filha biológica. 7. Recurso especial provido. (STJ, Ac 3ªT, REsp n. 1087163 RJ 2008/0189743-0, Rel. Min. Nancy Andrighi. Brasília, j. em 18/08/2011).

Entretanto, no dia 21 de setembro de 2016, de maneira inédita, o Supremo Tribunal

Federal (STF) se comprometeu categoricamente com multiparentalidade ao conhecer a matéria

de Repercussão Geral Nº 622 sobre a equalização das verdades biológica e socioafetiva da

parentalidade, superando o leading case sob o Recurso Extraordinário Nº 898060 no processo

de origem do Tribunal de Justiça do Estado de Santa Catarina.

(15)

Sob a relatoria do Excelentíssimo Ministro Luiz Fux, no julgamento em comento,

foi suscitado que, na oportunidade, se fazia imprescindível a apreciação do tema de repercussão

geral sobre a prevalência da verdade socioafetiva em desvantagem do vínculo biológico.

Na mesma ocasião, o Instituto Brasileiro de Direito de Família (IBDFAM),

representado pelo ilustre advogado Ricardo Calderón, requereu a sua habilitação como amicus

curiae em virtude da expressividade deste veredito para os rumos da jurisprudência brasileira.

O caso concreto versa sobre a vindicação extemporânea de uma paternidade

biológica em prejuízo de outra notarialmente cristalizada na socioafetividade.

Em seu voto, invocando a inafastabilidade do Poder Judiciário para decidir em face

da omissão do Legislador, munido das regras de integração do Direito, o Ministro Luiz Fux se

posiciona pela complementariedade das verdades biológica e socioafetiva quando orientadas

pelo desejo da convivência familiar no exercício da parentalidade. Segue:

A omissão do legislador brasileiro quanto ao reconhecimento dos mais diversos arranjos familiares não pode servir de escusa para a negativa de proteção a situações de pluriparentalidade. É imperioso o reconhecimento, para todos os fins de direito, dos vínculos parentais de origem afetiva e biológica, a fim de prover a mais completa e adequada tutela aos sujeitos envolvidos (STF, RE n. 898060 SC, Rel. Min. Luiz Fux. Brasília, j. em 21/09/2016).

Além disso, evocando o direito à busca da felicidade, o excelso jurista enuncia

também que, não são as pessoas que estão à serviço do Direito. Ele deve ser a garantia do

exercício da liberdade existencial de cada pessoa inclusa na sociedade.

O direito à busca da felicidade funciona como um escudo do ser humano em face de tentativas do Estado de enquadrar a sua realidade familiar em modelos pré-concebidos pela lei. É o direito que deve se curvar às vontades e necessidades das pessoas, não o contrário, assim como um alfaiate, ao deparar-se com uma vestimenta em tamanho inadequado, faz ajustes na roupa, e não no cliente (STF, RE n. 898060 SC, Rel. Min. Luiz Fux. Brasília, j. em 21/09/2016).

Ao negar o provimento do Recurso Extraordinário, por maioria dos votos, a Corte

Excelsa fixou a seguinte tese: “A paternidade socioafetiva, declarada ou não em registro

público, não impede o reconhecimento do vínculo de filiação concomitante baseado na origem

biológica, com os efeitos jurídicos próprios” (STF, RE n. 898060 SC, Rel. Min. Luiz Fux.

Brasília, j. em 21/09/2016).

Esta decisão celebra uma importante orientação que fertiliza o terreno de um novo

precedente, com força obrigatória para casos ulteriores sobre a multiparentalidade, bem como

(16)

2.2Do Registro Civil das Pessoas Naturais

2.2.1 Acepções do Registro Civil das Pessoas Naturais

Com vistas para a admissão da multiparentalidade no nosso Ordenamento Jurídico

a partir da interpretação sistemática das normas atinentes à filiação calcada na socioafetividade,

a próxima controversa imediata que envolve a família multicomposta se condensa no

procedimento de inscrição em sede registral de todos os entes parentais, cujas verdades são

oriundas distintamente de laços naturais, sociais e afetivos.

Hodiernamente, a matéria do Registro Civil das Pessoas Naturais é regulada de

maneira especial pelos artigos 29 ao 113 da Lei Nº 6.015, de 31 de dezembro de 1973, conhecida

como Lei dos Registros Públicos (LRP).

Naturalmente, não é surpresa que a referida legislação tenha passado por diversas

mutações desde a sua entrada em vigor para cumprir o desiderato social.

A dinâmica das relações sociais que repercutem no mundo jurídico tem provocado

um movimento de transformação na atividade cartorária em face da verificação de diversas

qualificações cíveis inovadoras como as das relações poliafetivas (a multiparentalidade, o

poliamor, etc.), de modo que, é exigido do oficial de registro, na elaboração de registros civis,

uma técnica mais sensível do Direito, cuja prática deve estar atenta para a essência das

instituições jurídicas.

Com esta exposição se pretende suscitar que, a elaboração do estatuto das pessoas

naturais nos cartórios extrajudiciais pode enfrentar problemas de cunho ontológico diante do

surgimento de um precedente social, como a multiparentalidade, situação fática inédita para o

direito expresso na forma de lei.

Portanto, é conveniente analisar algumas das diversas acepções do Registro Civil

das Pessoas Naturais de acordo com enfoque imprimido na sua elaboração, indicando a sua

importância enquanto instrumento para o exercício de direitos e as suas implicações para as

pessoas físicas, abrindo um caminho consistente que conduza por uma compreensão satisfatória

acerca desse documento na dimensão multiparental.

Acerca da qualificação das pessoas naturais é possível perceber que o Registro Civil

assume diversas acepções de acordo com o referencial adotado como marco para o seu estudo,

em função do elemento que imprime maior valor dentro do seu conceito.

Dentre as acepções marcadas pela melhor doutrina e estudos específicos sobre o

assunto, Tiziani (2015, online) destaca as acepções de Registro Civil enquanto: a) Foro ou

(17)

Serventia; b) Instituto Jurídico; c) Registro Público propriamente dito; d) Função Pública e

Serviço Público; e) Ato de Jurisdição Voluntária, e não menos importante; e) Prova da

identificação do registrando.

A categoria que dispõem sobre Registro Civil enquanto foro, preconiza que o

instrumento se configura na forma um locus, um local, uma repartição voltada para a

consignação e concentração de maneira autêntica dos atos e circunstancias incidentes no estado

civil dos indivíduos em território nacional (TIZIANI, 2015, online).

Essa vertente retrata o Registro Civil pelo lugar específico em que ocorrem os

eventos passíveis de nota, isto é, a serventia extrajudicial. Essa acepção considera que o espaço

físico do cartório congrega os elementos e as relações jurídicas satisfatórias para a lavratura

Registro Civil e com ele se identificando.

O Registro Civil também pode ser entendido enquanto uma instituição jurídica do

Estado. Em termos gerais, a história das sociedades revela a preocupação que os seus indivíduos

tinham de personalizar e averbar as suas relações perante o grupo.

Assim, o Registro Civil pôde ser reconhecido como uma instituição imprescindível

das sociedades complexas e de sistema jurídico aparelhado, em virtude do intenso manuseio de

dados pelo Poder estatal.

Nesse aspecto tocado pela antropologia jurídica, o Registro Civil é concebido como

uma criação humana em coletividade que tem o condão de publicizar os acontecimentos

implicantes do estatuto pessoal dos sujeitos, identificando-os, respaldando-os e conferindo-lhes

autenticidade.

É o que entende Tiziani (2015, online) ao conferir que “o registro civil é uma

instituição necessária à sociedade, porque sua existência é necessária para que se possa

individualizar a pessoa e conhecer a sua genealogia”.

Portanto, enquanto forma de estabelecimento social, a atividade registral rege as

repercussões jurídicas relativas ao estado civil das pessoas naturais, na medida em que a sua

atuação requer afirmação perante o Estado e os demais cidadãos.

Com a atenção voltada para a noção de burocracia, no estado de organização social

dos Estados contemporâneos, é inimaginável uma Administração Pública sem a instituição do

Registro Civil dos seus administrados (TIZIANI, 2015, online).

Outra acepção amplamente aplicada e ligada à anterior é aquela de Registro Civil

enquanto Registro Público propriamente dito, isto é, ato solene, revestido de fé pública, logo de

(18)

Consoante essa compreensão, o Registro Civil das Pessoas Naturais equivale a mais

um dos diversos tipos de Registros Públicos firmados junto aos órgãos e agentes serventes do

Estado para promover nota e promover alterações do estatuto pessoal dos indivíduos,

cumprindo perante o Direito com os elementos da legalidade – indo além da autenticação

(TIZIANI, 2015, online).

Assim, o interior dos livros cartoriais está voltado para a inscrição de situações da

esfera íntima do registrando, que por sua natureza são aptas a repercutir juridicamente para o

assentado e para os demais ligados a ele pelos diversos vínculos associativos. É necessário

arguir que o Registro Civil enquanto um dos tipos de registros públicos não deve ser um

cadastro isolado e inócuo se presta ao Estado (TIZIANI, 2015, online). Sendo mais importante,

a atividade registral depende da atuação do profissional registrador estudioso do Direito e

detentor da técnica jurídica para melhor atender às circunstâncias carecedoras de inscrição, de

modo que, os assentos públicos venham a cumprir a sua função social de continuidade dos atos

neles consignados.

Ao mencionar a importância da atuação do registrador, deparamo-nos com as

acepções de Registro Civil como desempenho de Função e Serviço Públicos. Embora ambas

estejam relacionadas e facilmente confundidas, acabam evidenciando características distintas

ao disporem sobre a natureza jurídica para o Registro Civil.

Essencialmente administrativista, o alinhamento doutrinário que preconiza o

Registro Civil como Função Pública sustenta que, o Estado deve atuar voltado para o interesse

público desempenhando funções que visam melhor atende-lo.

Estas funções são compromissos que o Poder Público deve adimplir através de

serviços públicos e também privados que assistem à vontade social pela sua importância, entre

elas a prestação do aparelho registral.

A atividade do profissional registrador é um munus do Poder Público, o qual tem

ofício de promover tal serventia, sendo desde logo exigível (TIZIANI, 2015, online). Logo, ao

dizer que o Registro Civil é uma função pública, depreende-se que ele se trata de um dos braços

da atividade extrajurídica do Estado, que se aplica para promover diversas instâncias da

cidadania dos particulares.

Não coincidentemente, a concepção de Registro Civil enquanto Serviço Público

encontra esteio no mandamento Constitucional, quando a Constituição da República de 1988

dispõe expressamente no artigo 236 sobre a delegação da prestação do serviço registral e

notarial à iniciativa privada pelo Estado (TIZIANI, 2015, online).

(19)

Art. 236. Os serviços notariais e de registro são exercidos em caráter privado, por delegação do Poder Público.

(...)

§ 3º O ingresso na atividade notarial e de registro depende de concurso público de provas e títulos, não se permitindo que qualquer serventia fique vaga, sem abertura de concurso de provimento ou de remoção, por mais de seis meses. (BRASIL, 1988).

Com base nesse dispositivo constitucional, a autora Padoin (2011, p. 14) descreve

a natureza híbrida do Registro Civil enquanto Serviço Público:

Os serviços notariais e de registro são públicos, porém exercidos em caráter privado, a partir de delegação obrigatória do Estado. Por meio de delegação o poder público transfere ao particular o exercício de determinada atividade que por ele deveria ser desempenhada. No caso, é atribuída a uma pessoa física – o notário ou o registrador – a prática de atos relativos às atividades notariais e de registro.

Nesse diapasão, enquanto Serviço Público, o exercício da atividade notarial,

responsável pela lavratura do Registro Civil, exige a investidura do pelo profissional bacharel

em Direito por meio do certame público, pelo qual, mediante aprovação, receberá a devida

competência para atuar.

4.2.1 Registro de Nascimento e Averbação da Filiação Multiparental

Embora a pluralidade parental seja um fenômeno social que já tem se manifestado,

e agora reconhecido judicialmente, a inscrição da experiência da filiação multiparental no

Registro Civil ainda é considerada novidade, desafiadora inclusive.

Não se pode pensar no reconhecimento da filiação multiparental sem considerar a

respectiva lavratura do Registro Civil, pois, não a observar esse pragmatismo estará se

incorrendo na manutenção da marginalização jurídica da família multiparental, suprimindo

direitos supervenientes à inscrição.

Nesse sentido, Póvoas diz que “o reconhecimento só judicial da multiparentalidade,

sem a inclusão de todos no registro de nascimento da criança, cria mais um problema do que

uma solução” (PÓVOAS, 2012, p. 89).

Complementando esse discurso, o referido autor ainda diz que:

(20)

Sobre a devida inscrição no Registro Civil das Pessoas Naturais, o artigo 29 da Lei

Nº 6.015/1973, informa objetivamente que o nascimento é dos objetos passíveis Registro Civil.

Art. 29. Serão registrados no registro civil de pessoas naturais: I – os nascimentos;

[...]

§ 1º. Serão averbados: [...]

d) os atos judiciais ou extrajudiciais de reconhecimento de filhos ilegítimos; e) as escrituras de adoção e os atos que a dissolverem; (BRASIL, 1973).

Tratando-se de inscrição no Registro Civil das Pessoas Naturais (RCPN), infere-se

do dispositivo supra a constância de dois atos: a) registro e; b) averbação. Em face da revogação

tácita do termo “ilegítimo” na alínea d) do dispositivo em comento, lamenta-se que ele ainda permaneça explícito.

O Código Civil de 2002, em seu artigo 9º, inciso I, combinado com o artigo 10,

inciso II, também é expresso ao dizer que os nascimentos constituem fenômenos que implicam

na lavratura do Registro Civil público.

Art. 9o. Serão registrados em registro público:

I – os nascimentos, casamentos e óbitos” (BRASIL, 2002). Art. 10. Far-se-á averbação em registro público:

[...]

II – dos atos judiciais ou extrajudiciais que declararem ou reconhecerem a filiação; (BRASIL, 2002).

Portanto, todo nascimento deverá ser registrado. O eventual reconhecimento

voluntário extrajudicial da filiação é passível averbação. Da mesma forma, o reconhecimento

judicial, entre elas as ações de investigação de parentalidade e a adoção, se faz por meio da

averbação da sentença declaratória. Isso por que o registro nascimento é o ato inaugural e a

averbação da filiação é o ato modificador.

Em sede de multiparentalidade, podem haver situações em que, ocorrendo o

nascimento de uma pessoa, os seus pais poderão se dirigir ao cartório que atende o local do

parto, ou aos seus domicílios, para elaborar o registro de nascimento e a averbação da filiação

pluriparental completa.

Ocorre que, a multiparentalidade é um fenômeno verificado de maneira mais tardia

em relação ao nascimento, de modo que, efetuar-se o registro de nascimento do registrando, e

num momento futuro, realiza-se a averbação da parentalidade ainda não reconhecida no ato do

registro, por vias judiciais.

Essa situação geralmente se configura nos casos de famílias reconstruídas, do tipo

mosaico, famílias que recorrem às técnicas de intervenção na reprodução e famílias onde os

(21)

entes parentais optaram pela adoção à brasileira, independentemente de serem núcleos

heteroafetivas ou homoafetivas.

Doravante, havendo procedência da multiparentalidade no âmbito judicial, o

assento constando a pluralidade parental será executado pelo oficial registrador em

conformidade com o teor do artigo 97 da Lei 6.015/1973.

Art. 97. A averbação será feita pelo oficial do cartório em que constar o assento à vista da carta de sentença, de mandado ou de petição acompanhada de certidão ou documento legal e autêntico, com audiência do Ministério Público (BRASIL, 1973).

Quando se trata do instituto da adoção legal, registra-se originalmente o nascimento

do adotando que, entregue à adoção, futuramente virá ser cancelado, procedendo ao novel

registro de filiação mono, bi ou multiparental. Vide o artigo 47 do Estatuto da Criança e do

Adolescente (ECA), com a nova redação:

Art. 47. O vínculo da adoção constitui-se por sentença judicial, que será inscrita no registro civil mediante mandado do qual não se fornecerá certidão.

§ 1º A inscrição consignará o nome dos adotantes como pais, bem como o nome de seus ascendentes.

§ 2º O mandado judicial, que será arquivado, cancelará o registro original do adotado. § 3º A pedido do adotante, o novo registro poderá ser lavrado no Cartório do Registro Civil do município de sua residência.

§ 4º Nenhuma observação sobre a origem do ato poderá constar nas certidões do registro. (BRASIL, 2009).

É importante destacar que o Conselho Nacional de Justiça (CNJ) colabora com a

multiparentalidade em sede de inscrição no Registro Civil, pois, desde o ano de 2009, com a

edição do Provimento Nº 3, no artigo 5º, ainda vigente, que uniformizou o modelo de certidão

de nascimento, tornou-se imprescindível constar o campo da filiação de forma livre, isto é, sem

determinar o número de espaços a serem preenchidos, antes destinados apenas a um pai e uma

mãe.

PROVIMENTO Nº 3. Implementa mudanças nos modelos das certidões de nascimento, de casamento e de óbito, em consideração às sugestões apresentadas pela Associação dos Registradores das Pessoas Naturais do Brasil - ARPEN-BR.

Artigo 5º. Orientar que as certidões pré-moldadas em sistema informatizado devem possuir quadros capazes de se adaptar ao tamanho do texto a ser inserido e não devem consignar quadros pré-estabelecidos para o preenchimento dos nomes do genitores e progenitores, a fim de que seja evitada desnecessária exposição daqueles que não possuem paternidade identificada. (Corregedoria. CNJ n. 198/2009, dje em 19/11/2009, p.16-21).

Doravante, em conformidade com o artigo 54 da Lei de Registro Públicos, alguns

requisitos continuam imprescindíveis para ato do registro de nascimento.

Quando se fala no registro da multiparentalidade, a consequência imediata do

(22)

cumulação de nomes não é empecilho posto que o item 4º) do artigo supra autoria a inclusão

dos nomes que forem dados ao registrando. Cumpre que, fazer constar a filiação integral

desvela-se o dilema nuclear.

Considerando que a Lei de Registro Público está há mais de 40 anos vigente, o

dispositivo supramencionado está impregnado de conservadorismo quanto à matéria de filiação,

portanto, é compreensível que ele a ainda valorize a família matrimonializada, quando

disciplina no item 7º) que na certidão de nascimento deve constar o local de casamento dos pais

do registrando.

Entretanto, isso já está superado por força constitucional, quando do desligamento

da filiação do estado civil dos pais, sendo ademais entendimento pacífico na doutrina e

consolidado pela jurisprudência.

Portanto, não é justificável a insuficiência normativa para que não seja autorizada

a inscrição da multiparentalidade no Registro Civil. Nesse seguimento, as autoras Teixeira e

Rodrigues (2010 apud BUCHMANN, 2013, p. 65) pugnam que

Os efeitos da múltipla vinculação parental operam da mesma forma e extensão como ocorre nas tradicionais famílias biparentais. Por força do princípio da isonomia, não há hierarquia entre os tipos de parentesco. Portanto, com o estabelecimento do múltiplo vínculo parental, serão emanados todos os efeitos de filiação e de parentesco com a família estendida, pois, independente da forma como esse vínculo é estabelecido, sua eficácia é exatamente igual, principalmente porque irradia do princípio da solidariedade, de modo que instrumentaliza a impossibilidade de diferença entre suas consequências.

Na mesma esteira, compartilhando desse entendimento, Póvoas (2012, p. 90) aduz

que “a lei Registral, infraconstitucional, jamais pode ser óbice ao reconhecimento da dupla

filiação parental, porque esta é baseada em princípios constitucionais superiores a ela”.

Assim, alinhamo-nos ao entendimento de que não carece que a elaboração de

legislação nova específica ou reforma legislativa para que seja averbada a filiação multiparental

no documento de registro do nascimento, pois, por simetria se aplica a norma já vigente com

base no arcabouço jurídico principiológico e doutrinário já suscitado.

4.3 Prova da filiação multiparental

Precipuamente, é importante considerar o assento das pessoas naturais como um

ato solene e formal, cujo escopo é evidenciar a relação entre todos os seus interessados, sejam

eles os particulares, a sociedade ou o Estado.

(23)

O Registro Civil de nascimento inaugura a cidadania das pessoas naturais, isto é a

vida civil, a existência jurídica do registrando. Para a autora Padoin (2011, p. 34) “é importante

ressaltar que o registro do nascimento se constitui em instrumento de realização mínima da

cidadania, pois, juridicamente, o indivíduo existe somente após ser registrado.

Destaca-se a relevância da função das anotações no Registro Civil, o qual, para

Fachin (2003 apud MADALENO, 2013, p. 504), é uma descrição pessoal, “a biografia jurídica

do cidadão, no qual estão indelevelmente fixados os fatos relevantes da vida de cada um, como

o nascimento, o nome, a: filiação, o casamento, o óbito etc.”.

Desde a promulgação da Constituição Cidadã brasileira em 1988, o Registro Civil

das Pessoas Naturais alçou a qualidade de Direito Fundamental. Consta em seu artigo 5º, inciso

LXXVI, a concessão da gratuidade para a lavratura da certidão de nascimento, tamanha a sua

importância para o Direito brasileiro.

Art. 5ª. Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes: (...)

LXXVI – são gratuitos para os reconhecidamente pobres, na forma da lei: a) o registro civil de nascimento;

Trata-se, pois, de documento que representa estatuto pessoal dos nacionais,

premissa para o reconhecimento e exercício da cidadania. Por isso, o constituinte teve a

sensibilidade de determinar a dispensa do emprego de ônus para a emissão dos atos

imprescindíveis para uma vivência cidadã.

A partir das reformas legislativas promovidas pela edição da Lei Nº 9.534/97, que

modificou o conteúdo do artigo 30 da Lei de Registros Públicos, a gratuidade quanto a lavratura

do Registro Civil de Nascimento passou a ser benefício estendido a todos os brasileiros sem

vinculação à sua capacidade financeira ou poderio econômico de quem dele solicitar.

Art. 30. Não serão cobrados emolumentos pelo registro civil de nascimento e pelo assento de óbito, bem como pela primeira certidão respectiva (BRASIL, 1997).

O legislador ordinário também atentou para a importância do registro das pessoas

naturais ao dispor, no artigo 1.603 do Código Civil de 2002, que o registro é ato elementar da

qualificação pessoal dos cidadãos, título de prova para o gozo dos direitos filiação e outros dela

decorrentes.

(24)

Alinhada a esse entendimento sobre o conteúdo probatório do Registro Civil das

Pessoas Naturais (RCPN), especificamente a certidão de nascimento, para o Direito de Família,

Padoin (2011, p. 35) nos diz que:

O RCPN tem a finalidade de comprovar os fatos e atos da vida civil, mais relevantes juridicamente, capazes de gerar direitos e obrigações, pois do registro decorrem importantíssimas relações de direito relativas à família, à sucessão e à organização política do Estado. Como é sabido, é a partir do registro que o cidadão é considerado maior ou menor, capaz ou incapaz, interdito, emancipado, solteiro ou casado, filho e/ou pai. Em outras palavras, o registro informa a biografia jurídica de cada sujeito de direito.

Vale lembrar que, a prática da “adoção à brasileira” não constitui ilícito quando não

há defeito de falsidade. Nesse caso se fala apenas de fato típico. Todavia, havendo engodo

quando à filiação, não restando caracterizado a socioafetividade, poderá ser desconstituído o

registro de nascimento como meio de prova.

Por fim, diante de todo o exposto, o registro civil de perfil poliafetivo, aqui

especificamente a certidão de nascimento multiparental, guarda consigo uma importante

ferramenta de afirmação para essa inovadora relação filial, a qual ainda carece de efetiva tutela

jurídica se comparada com todas as demais já consolidadas.

Coroa nosso posicionamento as palavras de Cassettari (2015, p. 188): “O direito

não está, pois, criando ‘invencionices’; está, isso sim, tutelando e tentando proteger, da melhor

forma possível, o que já existe em nossa sociedade”.

3 CONSIDERAÇÕES FINAIS

De maneira terminativa, viu-se que a Família brasileira mudou. Isso não significa

que ela deixou de ser tradicional, mas que, agora ela também passou a ser versátil, diversificada

e inovadora. Constatamos que o Direito não tem mais a preocupação estabelecer um conceito

inequívoco de família, mas sim de conferir a especial proteção às instituições familiares

conforme a Constituição da República, que além dos tipos expressos, acolhe os implícitos,

como é o caso da multiparentalidade.

Aferiu-se que o Direito de Família contemporâneo é informado por princípios

gerais e específicos, entre eles, o da liberdade, o da isonomia, da solidariedade familiar, da

afetividade, da realidade e vedação ao retrocesso social. Todos eles revelam que a

multiparentalidade é compatível com a Ordem vigente. Verificou-se que o parentesco pode ser

determinado de maneira natural ou civil, sendo a filiação a relação que mais se destaca. Logo,

(25)

a filiação natural é aquela que decorre do fato do nascimento, portanto de origem biológica. Já

a civil é aquela que decorre da afinidade, da adoção ou de outra origem não biológica.

Nessa esteira, apurou-se que, diante dessa indeterminação terminológica da Lei, a

doutrina e jurisprudência apontam a socioafetividade como o novo paradigma, pelo qual, as

relações de parentesco são consolidadas imprescindivelmente por vínculos afetivos. Significa

que, em Direito, a filiação pode ser biológica ou não biológica, mas deve ser sobretudo

socioafetiva. E por ser a filiação um conceito relacional, esse entendimento se demonstra a

melhor opção por privilegiar ambas as partes, filhos e pais, inclusive aqueles em contexto

multiparental.

Portanto, com isso, averiguou-se nesse caso que a parentalidade é socioafetiva

quando flagrado o estado da posse filho. Isto é, quando há o tratamento, a reputação e fama de

filho por aqueles que desempenham a função de pais. Destarte, por ser prudente, entendemos

que a socioafetividade e o estado de posse de filho vão ao encontro da multiparentalidade, onde

se observa a comunhão de vínculos de origens biológica e afetiva.

Por tudo isso, foi possível compreender que o ordenamento Jurídico admite a

multiparentalidade de acordo com o conceito de filiação unitária e isonômico, implicando na

vedação de designações discriminatórias, na sua dissociação do estado civil dos ascendentes e

a integral proteção da prole. Defronte para os constantes avanços na reprodução humana e da

emergência dos inovadores arranjos familiares na contemporaneidade, o direito que assiste os

sujeitos em contexto multiparental carece de atenção quanto à sua publicidade por via de

inscrição no Registro Civil.

Como o sistema normativo não foi capaz de prever de maneira expressa a

multiparentalidade, os operadores do direito incorreram em técnicas constritivas (a exclusão de

algum vínculo parental na certidão de nascimento), motivo pelo qual, as famílias multiparentais

têm acionado as Cortes de Justiça com o escopo de assegurar suas garantias constitucionais e

os seus direitos fundamentais atinentes à filiação e à parentalidade.

Viu-se que, sem sede de jurisprudência, o Supremo Tribunal Federal acolheu a

multiparentalidade quando se posicionou favoravelmente à coexistência dos vínculos de

paternidade biológica e socioafetiva, quando decidiu o tema de repercussão geral Nº 622.

Nessa condição, o obstáculo aparente que acabava por impor o não acolhimento do

registro multiparental restou superado. Impedimento que, aliás, tratava-se de resistência do

recurso humano ao invés de legal.

Logo, o que resta é a desatualização de determinadas serventias em relação ao

(26)

da Lei de Registro Públicos, em homenagem ao princípio de proteção da dignidade humana, o

sistema jurídico pátrio autoriza a relativização do conteúdo que não for mais compatível com

os ditames da Constituição da República.

Constatou-se que a doutrina aponta para asserção identitária do Registro Civil, pois

o documento guarda consigo o valor probatório da filiação e que, por seu turno, a jurisprudência

utiliza a “teoria do espelho” do registro civil para justificar que tal documento deve fornecer o

perfil exato do registrado. Diante de todo o exposto, por fim, conclui-se que a inscrição do

Registro Civil das Pessoas Naturais é um direito fundamental, garantidor da cidadania, dos

direitos de personalidade e de filiação.

Sustenta-se que seja desnecessário a aprovação de uma nova lei para promovê-lo.

Por meio da hermenêutica inclusiva, em respeito aos Direitos Fundamentais e observância ao

Princípio da Dignidade da Pessoa Humana o registro multiparental far-se-á no que couber assim

como ocorre em relação a outros arranjos familiares consolidados, de modo que, suas arestas

possam ser aparadas incidentalmente no caso concreto até que uma nova norma discipline de

maneira inovadora – e integralmente – as novas circunstâncias familiares.

REFERÊNCIAS

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(27)

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Referências

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