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ESTUDOS DE AVALIAÇÃO DA DEFORMABILIDADE DO BETÃO DA BARRAGEM DE MONTANTE DO BAIXO SABOR

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ESTUDOS DE AVALIAÇÃO DA DEFORMABILIDADE DO BETÃO DA BARRAGEM DE MONTANTE DO BAIXO SABOR

Carlos Serra* António Lopes Batista Nuno Monteiro Azevedo

Bolseiro de Doutoramento LNEC, DBB

Lisboa cserra@lnec.pt

Investigador Principal LNEC, DBB

Lisboa a.l.batista@lnec.pt

Investigador Auxiliar LNEC, DBB

Lisboa nazevedo@lnec.pt

SUMÁRIO

Os estudos de caracterização da deformabilidade dos materiais estruturais através de ensaios são prática corrente em grandes barragens. A caracterização do comportamento do betão em condições in situ, através de ensaios em células de fluência, pode ajudar na interpretação dos resultados obtidos em laboratório, para melhorar o conhecimento das propriedades do betão em condições de obra e a interpretação do comportamento observado das estruturas.

Neste trabalho apresentam-se as técnicas de ensaio utilizadas na avaliação da deformabilidade do betão da barragem de montante do Baixo Sabor, dando especial relevo aos ensaios de fluência in situ, realizados em células de fluência instaladas no corpo da obra. O plano de ensaios incluiu a determinação do módulo de elasticidade em várias idades e das extensões de fluência do betão crivado, em laboratório, e do betão integral e do betão crivado, in situ. Procedeu-se ainda à análise dos resultados obtidos e a um ajuste preliminar da função de fluência de Bažant e Panula.

Palavras-chave: Betão de barragens, deformabilidade do betão, ensaios in situ e em

laboratório, função de fluência, barragem de montante do Baixo Sabor

(2)

1. INTRODUÇÃO

1.1 Considerações gerais

O trabalho apresentado nesta comunicação refere-se aos ensaios de deformabilidade específicos efetuados pelo LNEC na barragem de montante do Baixo Sabor.

Na classificação de ensaios de deformabilidade incluem-se os ensaios de determinação do módulo de elasticidade e os ensaios de fluência. O ensaio de determinação do módulo de elasticidade é considerado corrente, mas é efetuado usualmente apenas num pequeno número de idades do betão. O ensaio de fluência é um ensaio específico, requerido apenas para obras de grandes dimensões, como é o caso da barragem de montante do aproveitamento hidroelétrico do Baixo Sabor (AHBS). A determinação da evolução do módulo de elasticidade ao longo do tempo e a determinação experimental da função de fluência implica a execução de ensaios a diferentes idades de carregamento. Este tipo de caracterização experimental permite conhecer o comportamento diferido do betão.

A composição do betão integral de barragens dificulta a execução de um grande número de ensaios experimentais, principalmente devido à dimensão máxima dos agregados, em regra de 150 mm, o que obriga a recorrer a provetes de grandes dimensões, pelo que a previsão do seu comportamento diferido é ainda objeto de estudo. É corrente, por isso, proceder à caracterização do betão crivado, obtido do integral por crivagem em fresco dos agregados de grande dimensão. Esta técnica permite o controlo das propriedades do betão ao longo da construção, mas não possibilita a obtenção de valores de referência para as propriedades do betão estrutural endurecido.

O comportamento diferido tem especial relevância, uma vez que, para além de estar diretamente relacionado com o aumento das deformações da estrutura ao longo do tempo em situações de carga (fluência), é também responsável pela relaxação de tensões sob deformações impostas. A determinação das propriedades de deformabilidade do betão de barragens nas suas condições de obra constitui um importante contributo para a realização da análise estrutural e para a interpretação dos resultados observados nas primeiras idades.

1.2 Caracterização da deformabilidade do betão in situ através de células de fluência

As células de fluência são dispositivos específicos para caracterização da deformabilidade

do betão em condições de obra. Cada célula é constituída por um cilindro de betão, de eixo

vertical, inserido no corpo da barragem, de modo a estar sujeito às mesmas variações

termo-higrométricas mas isolado do seu campo de tensões. Nas células ativas, para a

execução de ensaios de fluência, o provete cilíndrico é sujeito a uma tensão constante,

sendo a deformação associada registada por um ou mais extensómetros embebidos no

interior do provete de betão. A aplicação da tensão faz-se através de um macaco plano

deixado na base da célula e acoplado a um sistema de carga acessível (Figura 1).

(3)

Um grupo de células de fluência é formado por um conjunto de provetes cilíndricos de betão integral e de betão crivado, com vista a caracterizar a sua deformabilidade instantânea e diferida. O betão integral corresponde ao betão estrutural aplicado em obra, sendo proveniente diretamente da produção e tem, usualmente, agregados com dimensão máxima de 150 mm (Φ

max

=150 mm). O betão crivado é obtido do integral por crivagem em fresco, com um peneiro de abertura pré-estabelecida. O betão crivado é utilizado para envolver a aparelhagem de resistência elétrica embebida e é também utilizado na moldagem de provetes de dimensões correntes para controlo industrial de qualidade e caracterização das propriedades do betão.

Figura 1. Esquemas de uma célula de fluência ativa (esquerda) e de células de fluência ativa e corretora e do respetivo sistema de carga aparente no nicho (direita).

As propriedades de deformabilidade a determinar através de células de fluência são o

módulo de elasticidade em diversas idades, através da aplicação de ciclos de carga e

descarga, e as extensões de fluência, sob carga constante. A carga é mantida constante

através de um sistema hidráulico disposto em nicho em galeria, sendo composto por uma

botija que injeta óleo e azoto em pressão, com capacidade para compensar as perdas de

pressão devidas às deformações. Os efeitos térmicos e autogéneos são obtidos a partir das

extensões medidas em células corretoras, idênticas às células ativas (em tensão), para cada

tipo de betão em ensaio. A medição das extensões faz-se através de extensómetros de

resistência elétrica do tipo Carlson, embebidos no interior de cada célula.

(4)

2. INSTALAÇÃO DAS CÉLULAS DE FLUÊNCIA E ENSAIOS

2.1 Solução estrutural da barragem de montante do Baixo Sabor

O AHBS situa-se no troço inferior do rio Sabor e é constituído por dois escalões, o de montante e o de jusante, cujo projeto foi desenvolvido pela EDP. A barragem de montante é constituída por uma abóbada de dupla curvatura, com uma altura máxima de 123,0 m acima do ponto mais baixo da fundação. O coroamento tem um desenvolvimento de 505,0 m e uma espessura de 6,0 m, situando-se à cota 236,0 m. A abóbada tem 32 blocos, separados por juntas de contração verticais, afastadas de cerca de 15 m [1].

O maciço rochoso de fundação é constituído, do ponto de vista geológico, por granito de Zedes – Cabeça Boa – Especiarias e no local de implantação foram detetadas 7 famílias de diáclases na margem direita, 6 na margem esquerda, sendo as mais importantes subparalelas às encostas e com pendor vertical. Existem também falhas e zonas de falha com algum significado [1].

A albufeira criada pela barragem terá uma capacidade de cerca de 1095 hm

3

para o nível de pleno armazenamento (NPA), à cota 234,0 m.

2.2 Características das células de fluência instaladas na barragem

O plano de observação da barragem de montante do AHBS incluiu os seguintes três grupos

de células de fluência: CF1 no bloco 14-15, à cota 176,0 m; CF2 no bloco 17-18, à cota

175,0 m; e CF3 no bloco 20-21, à cota 175,0 m. Cada grupo é constituído por uma célula de

betão integral, com agregados de 150 mm de diâmetro (CFI), uma célula de betão crivado

pelo peneiro com abertura de 76 mm (CFM), uma célula de betão crivado pelo peneiro com

abertura de 38 mm (CFC) e pelas respetivas células corretores, para os diferentes tipos de

betão. Na barragem de montante do AHBS utilizaram-se novos tipos de moldes em EPS

(vulgo esferovite) e de sistemas de aplicação da carga relativamente aos usados

anteriormente, tendo também sido ajustada a dimensão dos provetes e alterada a sua

instrumentação. As dimensões das células e a sua correspondência com a máxima

dimensão dos agregados do betão são apresentadas na Figura 2. A Figura 3 mostra uma

vista geral da instalação do grupo de células CF2 antes da colocação do betão de

envolvimento.

(5)

CFI CFM CFC

Figura 2. Dimensões das células de fluência e dimensão máxima do agregado 2.3 Composição do betão das células de fluência

As composições de betão aplicadas no corpo da barragem foram estudadas pela EDP, tratando-se assim de composições prescritas [2].

Na moldagem das células de fluência foi utilizado o betão das camadas envolventes das células, que corresponde ao betão aplicado no núcleo da barragem. Foram escolhidas as primeiras amassaduras da camada de envolvimento, após estabilização dos valores de abaixamento do cone de Abrams (slump). No Quadro 1 apresentam-se as dosagens dos principais componentes, em cada célula.

Quadro 1. Dosagens dos componentes do betão integral de envolvimento das células organizadas por tipo de componente (composição prescrita pela

EDP)

Dosagem (kg/m

3

)

Tipo de componente Composição teórica

Composições reais

CF1 CF2 CF3 Média Desvio

padrão

Dosagem de cimento, c 110 110,6 110,1 110,1 110,3 0,3

Dosagem de cinzas, v 110 110,3 110,1 110,1 110,1 0,1

Dosagem de ligante, l = c + v 220 220,9 220,2 220,2 220,4 0,4

Dosagem de água adicionada, w

a

- 59,7 64,9 62,0 62,2 2,6

Dosagem de água proveniente da

humidade dos agregados, w

H

- 69,5 63,4 70,9 67,9 4,0

Dosagem de água total, w 124 129,2 128,3 132,9 130,1 2,4

Dosagem de agregado grosso, g 1425 1434,0 1434,3 1431,2 1433,2 1,7

Dosagem de agregado fino, s 527 520,8 528,0 609,7 552,8 49,4

Dosagem de agregado, a = g + s 1952 1954,8 1962,3 2040,9 1986,0 47,7

(6)

O cimento utilizado é do tipo CEM I 42,5R e as cinzas volantes provêm da central termoelétrica de Compostilla. Os agregados são graníticos e foram obtidos de britagem da rocha proveniente da pedreira de Ribeira de Relvas, situada junto à barragem de montante, na margem direita do rio Sabor.

A proximidade das células possibilitou que as dosagens utilizadas fossem muito semelhantes, o que permitirá uma melhor integração dos resultados das três células. Os principais desvios de dosagem foram no betão da célula CF3 relativamente ao agregado fino e no betão da célula CF1 relativamente à utilização de gelo.

Neste tipo de estruturas de betão em massa, para além das dosagens reduzidas de ligante, têm vindo a ser utilizadas cinzas volantes. No caso da barragem de montante do Baixo Sabor as cinzas volantes correspondem a 50% do ligante total (110 kg/m

3

em 220 kg/m

3

).

2.4 Plano de ensaios

Os ensaios destinaram-se à determinação do módulo de elasticidade e da função de fluência em cada célula, a várias idades de carregamento. Os ensaios de determinação do módulo de elasticidade foram executados às idades de 7, 14, 28, 90 e 365 dias em todos os grupos de células. Os ensaios de fluência tiveram início às idades de 28 dias na CF1, de 90 dias na CF2 e de 365 dias na CF3.

Em complemento aos ensaios in situ foram também realizados ensaios de determinação de módulo de elasticidade e ensaios de fluência, em laboratório, no LNEC, em provetes de betão crivado pelo peneiro com abertura de 38 mm obtido do betão integral colocado em cada grupo de células. No momento da betonagem das células de fluência foram moldados seis provetes prismáticos com dimensões de 20×20×60 cm

3

, sendo três provetes selados com chumbo para ensaios de módulo de elasticidade e de fluência (provetes selados) e três provetes sem proteção superficial para ensaio de módulo de elasticidade (provetes livres).

No LNEC os provetes sem proteção foram mantidos em ambiente com humidade relativa próxima de 100% e temperatura de 20°C±1°C.

3. RESULTADOS DOS ENSAIOS NAS PRIMEIRAS IDADES 3.1 Ensaios de módulo de elasticidade

3.1.1 Considerações gerais

Dada a inacessibilidade e sensibilidade das partes embebidas do sistema de carga, os ensaios de determinação do módulo de elasticidade em células de fluência distinguem-se, em muitos aspetos, dos ensaios usuais realizados em laboratório.

O ensaio de determinação do módulo de elasticidade em obra consiste em executar dois ou

três ciclos de carga e descarga em cada célula ativa e registar as variações de extensão

medidas nos extensómetros embebidos. As variações de carga foram efetuadas em

(7)

patamares crescentes ou decrescentes de 5 bar até se atingirem os valores de tensão superior e inferior de ensaio, respetivamente. A tensão mínima considerada correspondeu a uma pressão de 5 bar. As tensões máximas de ensaio foram calculadas com base nos resultados de ensaios de resistência à compressão, disponíveis na altura dos ensaios.

A velocidade de aplicação de carga procurou reproduzir os procedimentos utilizados em laboratório [3, 4]. Os ensaios de determinação do módulo de elasticidade foram conduzidos de forma suficientemente rápida, para evitar a eventual influência dos efeitos das variações autogéneas (extensões resultantes dos processos de maturação do betão).

3.1.2 Resultados dos ensaios em células de fluência

O valor de módulo de elasticidade obtido nos ensaios realizados nas células de fluência foi determinado a partir da média harmónica dos valores obtidos por regressão linear dos ciclos de carga e descarga, respetivamente, não considerando o primeiro ciclo de carga. Verificou- se que os valores das leituras a pressões inferiores a 15 bar apresentavam um comportamento não linear, que pode ser explicado pela adaptação da almofada à face da célula de fluência, pelo que essas leituras não foram consideradas no cálculo. Os valores obtidos em cada uma das células para as várias idades de ensaio são apresentados no Quadro 2 e representados na Figura 4.

Uma análise preliminar dos resultados permite concluir que os valores dos módulos de elasticidade são considerados elevados, em especial para betão integral nas idades mais jovens. O betão integral contém uma maior percentagem de agregado grosso, originando maiores valores do módulo de elasticidade que nos betões crivados. Por outro lado, as condições de maturação do betão in situ, com temperaturas de cura acima de 30ºC, aceleram o desenvolvimento das reações entre o ligante e a água, promovendo um endurecimento mais rápido do betão que em condições padronizadas de laboratório.

Pode verificar-se um desenvolvimento das propriedades mecânicas retardado no tempo, sendo que entre os 90 e os 365 dias de idade ainda se verificou um aumento do módulo de elasticidade.

Quadro 2. Valores médios dos módulos de elasticidade obtidos nas três células de fluência a várias idades

Módulo de elasticidade (GPa) Idade

(dias)

Média Desvio padrão

CFI CFM CFC CFI CFM CFC

7 31,3 26,2 25,1 3,4 2,1 1,3

14 31,9 27,2 25,4 3,0 0,7 0,2

28 31,5 27,8 26,0 1,7 0,5 0,5

90 33,5 29,7 27,9 1,9 1,2 0,1

365 36,3 31,8 29,9 2,5 0,8 -

(8)

Figura 4. Evolução no tempo dos valores médios dos módulos de elasticidade obtidos nas três células de fluência

1

3.1.3 Resultados dos ensaios em laboratório

De seguida apresentam-se os resultados dos ensaios de módulo de elasticidade obtidos nos provetes prismáticos em laboratório, efetuados pelo LNEC, segundo a especificação LNEC E397 (LNEC 1993). Estes provetes foram moldados, como referido, com betão crivado pelo peneiro de 38 mm de abertura. No Quadro 3 apresentam-se a média harmónica e o desvio padrão dos resultados obtidos em provetes selados e livres. Na Figura 5 representa-se a evolução da média harmónica dos módulos de elasticidade obtidos ao longo do tempo. Os resultados mostram uma evolução significativa do módulo de elasticidade com a idade, atingindo valores de cerca de 34 GPa aos 365 dias. Na Figura 6 comparam-se os valores de módulos de elasticidade obtidos em provetes selados e em provetes livres em laboratório com os obtidos em células de fluência. Verifica-se que os valores de módulo de elasticidade, obtidos nas idades inferiores a 365 dias, são maiores nos provetes in situ, ou seja, o desenvolvimento do módulo de elasticidade faz-se de forma mais rápida em obra do que em condições controladas, a 20°C, em laboratório.

1

CFI 3, CFI 3a e CFI3b correspondem a 3 extensómetros embebidos na mesma célula ativa de betão

integral

(9)

Quadro 3. Valores médios dos módulos de elasticidade obtidos nos três conjuntos de prismas em laboratório relativos aos grupos de células de fluência

Módulo de elasticidade (GPa) Idade

(dias)

Média Desvio padrão

Provetes selados

Provetes livres

Provetes selados

Provetes livres

7 21,9 20,1 2,9 1,5

14 20,4 19,5 2,7 1,6

28 22,1 20,4 3,2 1,8

90 25,4 25,4 1,0 1,3

365 34,1 30,0 3,7 1,1

Figura 5. Valores médios dos módulos de elasticidade obtidos nos prismas em laboratório

Figura 6. Correlação entre os valores do módulo de elasticidade obtido em prismas

10 15 20 25 30 35 40 45 50

0 50 100 150 200 250 300 350 400

Módulo de elasticidade (GPa)

Idade (dias) Resultados - provetes selados Resultados - provetes livres Média - provetes selados Média - provetes livres

10 15 20 25 30 35 40 45 50

10 15 20 25 30 35 40 45 50

Módulo de elasticidade (GPa)

Valores do módulo de elasticidade de betão crivado #38 mm obtido em laboratório nos provetes selados (GPa)

Betão integral in situ Betão crivado #76 mm in situ

Betão crivado #38 mm in situ

Betão crivado #38 mm em laboratório - livre

(10)

3.2 Ensaios de fluência 3.2.1 Considerações gerais

Os ensaios de fluência tiveram início após o ensaio de módulo de elasticidade à idade correspondente, e decorreram conforme o plano de ensaios previsto para as células CF1, CF2 e CF3, às idades de 28, 90 e 365 dias, respetivamente. A pressão aplicada no ensaio foi de 60 bar. A escolha deste valor deve-se à capacidade da bomba de óleo e à limitação da tensão aplicada a cerca de 40% da resistência à compressão do betão, no sentido de se mobilizar apenas a fluência primária.

Antes do início do ensaio de fluência, as extensões medidas no betão são devidas a variações de temperatura e a deformações autogéneas. No caso de betão estrutural do núcleo de barragens, é usual considerar-se que não existem trocas de humidade com o exterior durante o endurecimento (na realidade essas trocas só se verificam numa camada superficial junto aos paramentos e às galerias), pelo que as deformações autogéneas são, em regra, muito reduzidas.

O fenómeno de fluência corresponde ao aumento de extensão sob tensão constante, σ(t

0

), em condições de temperatura constante. As deformações instantâneas, ε

i

(t

0

), e de fluência, ε

c

(t,t

0

), dependem da magnitude da tensão, sendo a função de fluência, J(t,t

0

), a deformação total para uma tensão unitária, representando t o tempo decorrido e t

0

a idade de carregamento. Tem-se então,

) , ( ) ( ) , ( ) ( ) ,

( t t

0

t

0

t t

0

t

0

t t

0

J   

total

 

i

 

c

(1)

) , ) (

( 1 ) (

) , ( ) ( ) 1 ,

(

0

0 0

0 0

0

t t

t E t

t t t

t E t

J

fluência

c

 (2)

No sentido de quantificar a fluência do betão, procede-se ao cálculo das extensões específicas em cada célula, ou seja, a extensão para uma tensão unitária, após o início do ensaio de fluência, comparável diretamente com a função de fluência para o caso de tensão e temperatura constante. As extensões medidas na célula ativa, ε(t,t

0

), correspondem às extensões devidas a todos os efeitos, incluindo o carregamento, σ*(t

0

), e as extensões medidas na célula corretora correspondem às extensões devidas apenas às variações de temperatura e às deformações autogéneas, ε

corr

(t). A extensão específica, ε

esp

(t,t

0

), é dada por,

) (

* ) ( ) , ) ( , (

0 0

0

t

t t

t t t

corr esp

    (3)

3.2.2 Resultados dos ensaios em células de fluência

O Quadro 4 resume os resultados de extensão específica obtidos nos ensaios de fluência

nos três grupos de células de fluência, a duas idades de carregamento. De notar que estes

(11)

valores são indicativos e constituem apenas um valor pontual de extensão específica para uma determinada idade do betão (t

0

) e um determinado tempo após carga (t-t

0

).

Quadro 4. Valores de extensão específica obtida nos três grupos de células de fluência

ε

esp

(t, t

0

) (1×10

-6

/MPa)

t

0

=28 dias, t=365 dias t

0

=90 dias, t=300 dias CFI (41,0+37,2+33,4)/3

=37,2

(41,0+40,3+36,5)/3

=39,3

CFM 48,2 39,8

CFC 62,1 -

3.2.3 Resultados dos ensaios em laboratório

Os valores de extensão específica obtidos nos ensaios laboratoriais são praticamente idênticos aos medidos nas células de fluência de betão crivado pelo peneiro com abertura de 38 mm, atingindo valores de aproximadamente 65 × 10

-6

/MPa para o carregamento aos 28 dias, após um ano de ensaio, e 50 × 10

-6

/MPa para um carregamento aos 90 dias, após 200 dias de ensaio.

3.3 Comparação dos resultados obtidos nas células de fluência

A Figura 7 apresenta os resultados de extensão específica obtidos em cada célula, organizados por tipo de betão ensaiado. Apesar dos valores reduzidos das extensões diferidas, podem observar-se as principais características do comportamento diferido, como a diminuição das extensões instantâneas ao longo do tempo, devido ao aumento do módulo de elasticidade, e as menores taxas de aumento de deformação ao longo do tempo para idades de carregamento maiores.

Através da análise dos resultados verifica-se que o betão integral apresenta valores de extensão específica inferiores aos dos betões crivados, em todas as idades de carregamento. O betão crivado pelo peneiro com abertura de 76 mm apresenta valores de extensão específica intermédios entre os do betão integral e os do betão crivado pelo peneiro com abertura de 38 mm. Este comportamento está em concordância com os resultados de ensaios de fluência efetuados em outras obras [5] e parece dever-se ao facto de o betão resultante de crivagem em fresco ter uma dosagem de ligante superior à do betão integral que lhe deu origem. O aumento da dosagem de ligante é tanto maior quanto menor for a abertura do peneiro pelo qual é efetuada a crivagem, dado que o volume dos agregados grossos retidos é ocupado por agregado de dimensões menores e por pasta de ligante, resultando em dosagens maiores de ligante por unidade de volume.

Os resultados mostram betões com extensões de fluência reduzidas, em especial para o

betão integral, no qual, para carregamentos aos 28 dias, as extensões diferidas após um

ano são apenas cerca de 20% das extensões instantâneas. A análise dos resultados deve

ter em consideração, no entanto, que os valores referidos são indicativos, dado que não

consideram o facto de as condições ambientais terem variado.

(12)

Figura 7. Comparação dos resultados de extensão específica obtida in situ agrupados por tipo de betão

3.4 Ajuste preliminar da função de fluência de Bažant e Panula (BaP)

Os modelos de previsão estão associados a funções com características específicas, escolhidas de forma a traduzirem o fenómeno físico da fluência do betão. Os parâmetros destas funções, determinados, em regra, a partir de propriedades conhecidas do material, e, quando disponíveis, ajustados aos resultados de ensaios experimentais, permitem obter uma estimativa dos valores das deformações de fluência dentro de determinadas hipóteses.

No modelo de Bažant e Panula (BaP) [6] a função de fluência, J(t,t

0

), é dada pelo somatório

da parcela elástica, 1/E

0

, da fluência básica, C

0

(t,t

0

), e da fluência de secagem, C

d

(t,t

0

). Este

modelo de previsão das extensões diferidas foi calibrado com base em vários ensaios

experimentais disponíveis e abrange vários tipos de betão.

(13)

Uma das particularidades desta função consiste na consideração da evolução do processo de maturação do betão na parcela de fluência básica através da multiplicação de uma potência da idade à data de carregamento, t

0

, por uma potência do tempo sob carga, t-t

0

.

  , ( , , ' ) ) 1

,

(

0 0 0

0

0

C t t C t t t

t E t

J   

d

(4)

t

m

  t t

n

t E t

C

0 0

0 1 0

0

( , )  

   (5)

onde E

0

, φ

1

, m, α e n são parâmetros dependentes das características intrínsecas do betão.

No caso de barragens, pelas razões já apontadas, considera-se que a parcela da fluência de secagem não tem significado face aos valores de fluência básica.

Verifica-se que a previsão do valor do módulo de elasticidade ao longo do tempo pode ser obtida considerando o tempo sob carga, t-t

0

, igual a 0,1 dias [6],

 

n

t

m

E E t

E

0 0

1 0 0

1 10

1 (6)

Os parâmetros da lei de fluência podem ser estimados recorrendo a duas abordagens. A primeira permite a estimativa da função de fluência a partir da resistência à compressão aos 28 dias, f

c,28

(em MPa) e da composição do betão [6]. A segunda abordagem, aqui adotada, considera apenas como característica intrínseca do material o valor de resistência à compressão [7], através das expressões (7) a (10),

2 1 28 1

 0 , 3  152 , 2 f

c, ,

 (7)

05 ,

 0

 (8)

2 28

541

,

, 47 28 ,

0 

f

c

m (9)

 

,28 3,4

10

6

183

, 0 115 ,

0  

f

c

n (10)

A estimativa do parâmetro E

0

foi obtida a partir da expressão (6), considerando o valor médio de módulo de elasticidade aos 365 dias obtido nas células de fluência de betão integral (36,3 GPa). Todos os restantes parâmetros foram determinados considerando, nas expressões (7) a (10), o valor médio da resistência à compressão do betão integral aos 365 dias (32,1 MPa). A partir do ajuste dos parâmetros da previsão a outros resultados experimentais de barragens portuguesas e dadas as diferenças de comportamento do betão de barragens verificou-se que a idade de referência para o valor de resistência a utilizar nas expressões (7) e (10) é 365 dias [8].

Dadas as características particulares do betão de barragens é necessário proceder ao

ajuste das extensões calculadas pelo modelo BaP aos valores experimentais obtidos a partir

das células de fluência de betão integral. Este ajuste preliminar, representado na Figura 8,

foi feito através da alteração dos parâmetros φ

1

, m e n de modo a obter uma boa reprodução

dos resultados obtidos nas células de fluência para as várias idades de carregamento,

(14)

tendo-se chegado à expressão (11). Os valores dos parâmetros são apresentados no Quadro 5. Considerou-se que o ajuste da função aos resultados experimentais é razoável, exceto para a idade de 28 dias onde as extensões de fluência observadas são inferiores ao previsto.

Quadro 5. Estimativa preliminar dos parâmetros da função de fluência de Bažant e Panula Propriedade mecânica do betão integral Parâmetro Modelo BaP + E(t0) Ajuste preliminar

E (365 dias) (GPa) 36,3 E

0

(GPa) 50,1 50,1

f

c

(365 dias) (MPa) 32,1

φ

1

2,7 2,2

m 0,33 0,35

n 0,14 0,12

α 0,05 0,05

12 , 0 0 35

, 0 0 0

0 0 1 0

0

( 0 , 05 )( )

1 , 50

2 , 2 1 , 50 ) 1 )(

1 ( ) ,

( t t t t t t

E t E

t

J   

m

  

n

 

  (11)

O ajuste foi feito utilizando os valores medidos apenas no período de ensaio em que a temperatura se manteve aproximadamente a 30ºC. Deste modo, os valores do ensaio na célula CFI3, aos 365 dias, não foram considerados.

A Figura 9 apresenta os valores de extensão específica medidos nas células de betão

integral e a estimativa preliminar da função de fluência obtida por ajuste aos resultados

experimentais. Na Figura 9 apresentam-se os correspondentes valores de módulo de

elasticidade, os resultados dos ensaios de módulo de elasticidade das células de fluência de

betão integral e os resultados de módulo de elasticidade de provetes cilíndricos de betão

integral com 45 cm de diâmetro e 90 cm de altura mantidos em câmara saturada, a 20ºC.

(15)

Figura 8. Ajuste preliminar da função de fluência e resultados dos ensaios nas três células de fluência de betão integral

Figura 9. Valores de módulo de elasticidade segundo o ajuste preliminar da função de fluência, resultados de ensaios nas células de fluência de betão integral e resultados de

ensaios de provetes de betão integral obtidos em laboratório 4. CONCLUSÕES

Na presente comunicação são referidos os aspetos relevantes do projeto e instalação dos três grupos de células de fluência da barragem de montante do AHBS e apresentam-se os resultados dos ensaios realizados nas primeiras idades, tanto nas próprias células como em provetes laboratoriais a elas associados. Apresenta-se ainda o tratamento dos resultados

0 20 40 60 80

10 100 1000

J(t,t0) (110-6/MPa)

Idade (dias) 28 dias - Função de fluência preliminar 28 dias - J(t,t0,T=30ºC)

90 dias - Função de fluência preliminar 90 dias - J(t,t0,T=30ºC)

365 dias - Função de fluência preliminar 365 dias - J(t,t0,T=10ºC)

1/E(t0) - Função de fluência preliminar

CF1 CF2 CF3

0 10 20 30 40 50

1 10 100 1000

Módulo de elasticidade (GPa)

Idade (dias)

E(t0) - Função de fluência preliminar Valores medidos nas células de fluência

Valores medidos - Laboratório (média de toda a obra) Valores medidos - Laboratório (betão aplicado na CF1) Valores medidos - Laboratório (betão aplicado na CF2) Valores medidos - Laboratório (betão aplicado na CF3)

(16)

disponíveis, bem como uma estimativa preliminar da função de fluência do betão estrutural da obra.

Relativamente aos resultados obtidos, os valores de módulo de elasticidade dos ensaios in situ e em laboratório tiveram um aumento significativo nas primeiras idades, sendo que o crescimento da sua taxa de variação tem vindo a diminuir com o tempo. Nos ensaios de fluência, apesar das respetivas extensões terem valores reduzidos, verificou-se que as extensões específicas aumentaram no período inicial sob carga, mas estabilizaram a longo prazo, tendo-se confirmado as principais características do comportamento diferido do betão.

AGRADECIMENTOS

Agradece-se à EDP a autorização concedida para a apresentação dos resultados dos ensaios do betão da barragem de montante do Baixo Sabor.

Os trabalhos de campo e laboratoriais foram executados por vários técnicos do LNEC, a quem se deve muito do sucesso nos resultados obtidos.

REFERÊNCIAS

[1] EDP (EDP Produção, Departamento de Engenharia de Barragens) – Aproveitamento Hidroelétrico do Baixo Sabor. Escalão de montante. Projeto, Porto, 2005.

[2] IPQ – NP EN 206-1. Especificação, desempenho, produção e conformidade. Lisboa:

Instituto Português da Qualidade (IPQ), 2005.

[3] LNEC – Especificação LNEC E 397. Lisboa: Laboratório Nacional de Engenharia Civil, 1993.

[4] DIN – Testing concrete: testing of hardened concrete (specimens prepared in mould).

Deutsches Institut fur Normung. Part 5. Vol. 1048. Berlin. 1991.

[5] Pinho, J. – Contribuição para o estudo da deformabilidade do betão de barragens.

Lisboa: Laboratório Nacional de Engenharia Civil, 1989. Tese de especialista.

[6] Bažant, Z. P. e Osman, E. – “Double power law for basic creep of concrete, Materials and Structures” (RILEM, Paris). vol. 9, Nº 49 (1976), p. 3 11.

[7] Neville, A.; Dilger, W. e Brooks, J. – Creep of plain and structural concrete, New York:

Longman Inc., 1983.

[8] Serra, C.; Batista, A. L.; Tavares de Castro, A. – Creep of dam concrete evaluated from

laboratory and in situ tests. Strain. vol. 48 Nº 3 (2012) p. 241-255. doi: 10.1111/j.1475-

1305.2011.00818.x.

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