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Modelos análogos para os espaços-tempo de Schwarzschild e Reissner-Nordstrom

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Academic year: 2021

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(1)

Instituto de F´ısica “Gleb Wataghin”

Christyan Costa de Oliveira

Modelos an´alogos para os espa¸cos-tempos de Schwarzschild e

Reissner-Nordstrom

Campinas

2018

(2)

Modelos an´alogos para os espa¸cos-tempos de Schwarzschild e

Reissner-Nordstrom

Disserta¸c˜ao apresentada ao Instituto de F´ısica “Gleb Wataghin” da Universidade Es-tadual de Campinas como parte dos requi-sitos exigidos para a obten¸c˜ao do t´ıtulo de Mestre em F´ısica, na ´area de F´ısica.

Orientador: Prof. Dr. Ricardo Antonio Mosna Coorientadora: Profa. Dra. Carola Dobrigkeit Chinellato

ESTE EXEMPLAR CORRESPONDE `A

VERS ˜AO FINAL DA DISSERTAC¸ ˜AO

DE-FENDIDA PELO ALUNO CHRISTYAN COSTA DE OLIVEIRA, E ORIENTADA PELO PROF. DR. RICARDO ANTONIO MOSNA.

Campinas 2018

(3)

Ficha catalográfica

Universidade Estadual de Campinas Biblioteca do Instituto de Física Gleb Wataghin Lucimeire de Oliveira Silva da Rocha - CRB 8/9174

Oliveira, Christyan Costa de,

OL4m OliModelos análogos para os espaços-tempo de Schwarzschild e Reissner-Nordstrom / Christyan Costa de Oliveira. – Campinas, SP : [s.n.], 2018.

OliOrientador: Ricardo Antonio Mosna.

OliCoorientador: Carola Dobrigkeit Chinellato.

OliDissertação (mestrado) – Universidade Estadual de Campinas, Instituto de Física Gleb Wataghin.

Oli1. Modelos análogos. 2. Schwarzschild, Buracos negros de. 3. Reissner-Nordstrom, Métrica de. I. Mosna, Ricardo Antonio, 1974-. II. Chinellato, Carola Dobrigkeit, 1952-. III. Universidade Estadual de Campinas. Instituto de Física Gleb Wataghin. IV. Título.

Informações para Biblioteca Digital

Título em outro idioma: Analogue models for Schwarzschild and Reissner-Nordstrom spacetimes

Palavras-chave em inglês: Analogue models

Schwarzschild black holes Reissner-Nordstrom metrics Área de concentração: Física Titulação: Mestre em Física Banca examinadora:

Ricardo Antonio Mosna [Orientador] Alberto Vazquez Saa

Raphael Santarelli

Data de defesa: 30-11-2018

Programa de Pós-Graduação: Física

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VADA AO INSTITUTO DE FÍSICA “GLEB WATAGHIN”, DA UNIVERSIDADE ES-TADUAL DE CAMPINAS, EM 30 / 11 / 2018.

COMISSÃO JULGADORA:

Prof. Dr. Ricardo Antonio Mosna - IMECC/UNICAMP Prof. Dr. Alberto Vazquez Saa - IMECC/UNICAMP Prof. Dr. Raphael Santarelli - DF/UFSCar

OBS.: Informo que as assinaturas dos respectivos professores membros da banca constam na ata de defesa já juntada ao processo de vida acadêmica do aluno.

Campinas 2018

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Ao prof. Ricardo Antonio Mosna pela supervisão e auxílio durante todo o processo de produção deste trabalho, e à profa. Carola Dobrigkeit Chinellato pelo apoio dado.

Aos professores João Paulo M. Pitelli e Maurício Richartz, pelas discussões esclarece-doras e sugestões apontadas.

À minha família pelo apoio, especialmente aos meus pais: Isaurina Sousa Costa e Francisco de Assis de Oliveira.

(6)

A partir de analogias é possível obter uma simplificação e, consequentemente, uma melhor compreensão de questões inicialmente complicadas ou obscuras pertencentes a uma determinada área do conhecimento, através do transporte destes problemas para um contexto familiar e bem compreendido. Especificamente no caso da Relatividade Geral, sabe-se que, sob determinadas condições, ondas acústicas num fluido propagam-se de modo similar a um campo escalar num espaço-tempo curvo. Este resultado abre perspectiva para a análise de espaços-tempos relativísticos em termos de sistemas físicos clássicos. No trabalho aqui apresentado, nos propomos a discutir alguns desdobramen-tos desse resultado relacionados às geometrias de Schwarzschild e Reissner-Nordstrom, as quais representam espaços-tempos esfericamente simétricos, soluções das equações de campo da Relatividade Geral.

Dentro deste contexto, apresentam-se modelos análogos para os espaços de Schwarzs-child e Reissner-Nordstrom, baseados em escoamentos supersôncos e subsônicos de fluidos clássicos. Em particular, para (1+2) dimensões, obtemos uma descrição efetiva para esses espaços esfericamente simétricos em termos de um escoamento com simetria linear. Ana-lisando as variáveis descritivas do fluido, observamos divergências nas regiões correspon-dentes às singularidade desses espaços. Por outro lado, observamos um comportamento suave nas demais regiões, inclusive próximo aos horizontes, o que mostra que os modelos obtidos são adequados à descrição dos horizontes dessas geometrias. Por fim, estendemos o estudo realizado com ondas acústicas para o contexto de ondas superficiais em líquidos, e analisamos as decorrentes semelhanças e diferenças que ocorrem neste caso.

(7)

The use of analogies in science often allows a better understanding of intricate or unclear issues of a given area of knowledge. This is accomplished by transporting those issues to a familiar and well understood context. In particular, it is known that, under certain conditions, acoustic waves in a fluid propagate similarly to a scalar field in a curved spacetime. This result opens up a perspective for analyzing relativistic spacetimes in terms of classical physical systems. In this work we discuss some aspects of these results, especially in the case of the Schwarzschild and Reissner-Nordstrom geometries which are spherically symmetric solutions to the field equations of General Relativity.

Specifically, we construct analogue models for the Schwarzschild and Reissner-Nords-trom geometries based on subsonic and supersonic fluid flows. In particular, in the (1+2) dimensional case, we obtain an effective description for these spacetimes in terms of a flow with linear symmetry. By studying the physical quantities that characterize the flow, we observe divergences in the regions corresponding to the spacetime singularities. Nevertheless, the behavior of these quantities is still regular at the horizons, which shows that these models are suitable for the description of the spacetime horizons in this context. Finally, we extend the study of acoustic waves to the framework of surface waves in shallow liquids, and analyze the resulting similarities and differences that occur in this case.

(8)

Introdução 9

1 Métrica Acústica 12

1.1 Escoamento Irrotacional de um Fluido Heterogêneo . . . 12

1.2 Ondas Acústicas . . . 13

1.3 Métrica Acústica . . . 14

2 Buracos Negros Acústicos 20 2.1 Modelos (1+2) Dimensionais em Coordenadas Cartesianas . . . 20

2.2 Modelos (1+2) Dimensionais em Coordenadas Polares . . . 34

2.3 Modelos (1+2) Dimensionais em Coordenadas Esféricas . . . 50

2.4 Comentários sobre Coordenadas Cartesianas e Cilíndricas ... . . 60

3 Ondas Superficiais em Líquidos Rasos 63 3.1 Escoamento Horizontal do Background . . . 63

3.2 Escoamento com Fundo Curvo . . . 67

4 Buracos Negros Baseados em Ondas Superficiais 75 4.1 Modelo (1+2) Dimensional em Coordenadas Cartesianas . . . 75

Conclusão 93

(9)

Introdução

Entre os diversos métodos e técnicas de abordagem e análise científica, uma forma de pensamento particularmente ingênua possui em muitos casos papel central na compreen-são e solução dos mais variados problemas, a saber, a analogia. Entre outras utilidades, analogias podem servir de guia para formulação de conceitos fundamentais e para o esta-belecimento da terminologia básica associada à descrição de um fenômeno. Além disso, analogias também podem ser úteis fornecendo um novo ponto de vista para problemas em aberto de áreas já bem conhecidas, pavimentando uma via de mão dupla, responsável por prover tanto uma nova perspectiva para o tratamento de questões atuais, como uma releitura para o conhecimento previamente estabelecido.

Um exemplo bastante recorrente é a comparação entre o cérebro humano e sistemas tecnológicos. Ao longo dos últimos séculos, o cérebro já foi comparado a redes de telefo-nia, circuitos elétricos, computadores, entre outros. Frequentemente, dessas comparações surgem insights úteis, seja do ponto de vista pedagógico, para divulgação de informa-ção entre o público leigo, ou do ponto de vista técnico, indicando novos caminhos para o desenvolvimento de linhas de pesquisa. Apesar das várias vantagens advindas dessas comparações, deve-se notar que analogias não são identidades, e, portanto, os limites de validade dessas comparações devem ser devidamente respeitados e apresentados de forma honesta, a fim de se evitar cair nas armadilhas das especulações sensacionalistas, as quais causam enorme prejuízo à credibilidade científica.

Uma situação em que esse tipo de raciocínio comparativo logrou alto êxito, e forneceu

terreno fértil para posteriores explorações, ocorreu no séculoXIX quando J. C. Maxwell se

baseou numa analogia com a Mecânica dos Fluidos para explicar a natureza do fenômeno eletromagnético. Maxwell descreveu as interações elétricas e magnéticas em termos de campos e tensões internas num fluido hipotético, denominado Éter. Apesar de a ideia da existência do Éter ter-se mostrado posteriormente inadequada devido ao surgimento e às verificações experimentais em favor da Relatividade Restrita, a terminologia básica ainda hoje usada é fortemente baseada nessa analogia. Em particular, tem-se que: as cargas

elétricas correspondem às fontes/sorvedouros de fluido; os campos ~E, ~B correspondem

aos campos de velocidade de escoamento; o fluxo do campo elétrico ~E devido a uma

carga corresponde à vazão associada à fonte correspondente; etc. Por fim, o ápice de sucesso desta correspondência reside no fato de as próprias leis que regem a dinâmica das entidades fundamentais do eletromagnetismo (Equações de Maxwell) estarem assentadas sobre conceitos oriundos da Mecânica dos Fluidos.

Percebemos assim que, em geral, analogias são instrumentos de grande valor para a ciência, de modo que partindo de noções inicialmente simples e concretas, pode-se esten-der resultados e generalizar conceitos. Uma boa analogia ressalta aspectos fundamentais de um problema em questão, de modo a tornar sua abordagem mais familiar, ou elucida conceitos novos e não-intuitivos, tornando-os mais facilmente inteligíveis. Além disso, tra-zendo problemas de um contexto pouco familiar para uma situação bem compreendida,

(10)

analogias podem apontar caminhos para uma possível solução, através de resultados pre-viamente estabelecidos.

No decorrer dos últimos anos, precisamente a partir da década de 1980, as simulações de sistemas de escala astrofísica e cosmológica por meio de analogias com sistemas físi-cos simples tem-se tornado particularmente sistemática, principalmente após trabalhos de W. G. Unruh [1], e os esforços empreendidos neste sentido têm sido genericamente denominados por “modelos análogos”, e é neste contexto que o trabalho aqui desenvol-vido se insere. Particularmente, ao longo do texto dedicamos atenção a sistemas físicos correlacionáveis à Relatividade Geral de Einstein. A literatura especializada apresenta um amplo espectro de tais sistemas, e uma revisão detalhada pode ser encontrada em [2]. Por exemplo, há modelos baseados em: condensados de Bose-Einstein [3, 4, 5], acús-tica de fluidos em movimento [1, 6], entre outros. Estes modelos podem ser interessantes por diferentes motivos. Alguns são úteis sob a perspectiva experimental, quando, por exemplo, são sondadas propriedades de sistemas inacessíveis diretamente em laboratório a partir de modelos análogos devidamente construídos; outros são interessantes do ponto de vista teórico, ao fornecerem terrenos conhecidos para exploração de questões ainda não profundamente compreendidas.

O artigo seminal [1] de W. G. Unruh, publicado em 1981, apresenta um modelo baseado na análise da propagação de ondas acústicas em um escoamento supersônico. O sistema sugerido tem por objetivo a investigação de aspectos qualitativos relacionados à radia-ção Hawking [7] — fenômeno de evaporaradia-ção de buracos negros decorrente de um processo quântico presente nestas estruturas, e cuja observação direta é, mesmo em princípio, inviá-vel devido à diminuta escala de energia envolvida. O autor apresenta claramente as van-tagens e os limites desta abordagem. No capítulo 1, fazemos uma dedução matemática da geometria Lorentziana gerada pela propagação de ondas acústicas num fluido supersônico, e apresentamos um caso específico simples, o qual captura algumas características qua-litativas do horizonte de buracos negros. Por enquanto, podemos pensar intuitivamente num buraco negro acústico (dumb hole) como ilustrado na figura 1, onde representa-se um escoamento convergente e circularmente simétrico, com velocidade supersônica a par-tir de certa distância (linha roxa) do sorvedouro. Nota-se que os cones causais acústicos (versões análogas dos cones de luz da Relatividade Especial/Geral) inclinam-se conforme se aproximam do sorvedouro, e orientam-se para “dentro” quando adentramos a região de escoamento supersônico, de modo que observadores e ondas acústicas nesta região ficam impossibilitados de escapar para a região externa subsônica. Qualitativamente, este é o mesmo efeito observado, por exemplo, no horizonte do buraco negro de Schwarzschild [8, 9], onde observadores com velocidade inferior ou igual à da luz ficam inexoravelmente aprisionados na região interior ao horizonte. Lembramos, porém, que o mecanismo aqui responsável por esse efeito é a velocidade de arrasto devida ao escoamento do fluido, en-quanto que no caso relativístico a própria estrutura do espaço-tempo gerada pela massa do buraco negro de Schwarzschild restringe as trajetórias de observadores situados na região interior ao horizonte. Ao longo dos capítulos a seguir, apresentamos, discutimos e desenvolvemos ideias relativas a esse sistema físico e a outros similares.

No capítulo 1 desenvolvemos uma descrição quantitativa para a analogia entre ondas acústicas num fluido não homogêneo e a propagação de um campo escalar num espaço-tempo Lorentziano. Primeiramente, obtemos a equação que rege a evolução dinâmica dos distúrbios acústicos. Motivados pela forma da equação de onda num espaço-tempo curvo, obtemos uma descrição efetiva em termos de uma métrica Lorentziana (denomi-nada métrica acústica) relacio(denomi-nada às variáveis descritivas do escoamento. Feito isto,

(11)

Figura 1: Buraco negro acústico (dumb hole)[3].

apresentamos algumas propriedades da métrica acústica e ilustramos a aplicação desse ponto de vista ao movimento de um fluido supersônico.

No capítulo 2, exploramos os graus de liberdade associados à métrica acústica de modo a obter configurações de escoamento que gerem algumas geometrias específicas da Relatividade Geral. Apresentamos explicitamente configurações de escoamento corres-pondentes às geometrias de Schwarzschild e Reissner-Nordstrom (RN), e discutimos o comportamento de cada variável descritiva em ambos os casos. Em particular, na seção 2.1 obtemos uma descrição para o espaço-tempo RN em termos de um fluido cujas pro-priedades variam numa única direção, o que realiza uma correspondência entre um espaço esfericamente simétrico (RN) e um sistema físico com simetria linear.

No capítulo 3 apresentamos uma analogia entre a propagação de ondas superficiais em um fluido incompressível e a dinâmica de um campo escalar num espaço-tempo curvo. Como no capítulo 1, inicialmente obtemos a lei que rege a dinâmica dos distúrbios na configuração de fundo (background), então construímos uma descrição efetiva em termos de uma métrica Lorentziana. Por fim, discutimos as semelhanças e diferenças entre a descrição obtida e a fornecida pela métrica acústica, e apresentamos condições para o estabelecimento de uma correspondência entre estes dois contextos.

No capítulo 4, desenvolvemos, dentro contexto da dinâmica de ondas superficiais, essencialmente a mesma ideia que no capítulo 2 está amparada na descrição concebida a partir da métrica acústica. Especificamente, neste caso exploramos os graus de liberdade da métrica associada à descrição efetiva das ondas superficiais. Como feito no capítulo 2, apresentamos configurações para as variáveis dinâmicas descritivas do sistema de modo a obter as geometrias de Schwarzschild e Reissner-Nordstrom, e analisamos os respectivos comportamentos destas grandezas.

(12)

Capítulo 1

Métrica Acústica

Neste capítulo, mostramos que a dinâmica de ondas acústicas num fluido heterogêneo pode ser relacionada ao estudo da propagação de um campo escalar num espaço-tempo curvo. O procedimento seguido consiste nos seguintes passos: na seção 1.1 apresentamos as leis que regem a dinâmica desse sistema físico clássico; na seção 1.2 consideramos uma configuração de fundo (background ) satisfazendo as leis enunciadas em 1.1, e aplicando distúrbios de pequena amplitude em torno desses valores de referência, obtemos a lei que governa a dinâmica das ondas acústicas neste contexto; na seção 1.3 damos uma interpretação do resultado obtido sob a perspectiva da geometria diferencial Lorentziana, e apresentamos uma descrição para a propagação do som em termos de um espaço-tempo efetivo, com geometria dada pela métrica acústica. O desenvolvimento apresentado segue as linhas de [6].

1.1

Escoamento Irrotacional de um Fluido Heterogêneo

Consideremos inicialmente o escoamento de um fluido simples descrito pelas

quanti-dades: ρ densidade, ~v velocidade e P pressão. As equações de movimento que regem a

dinâmica deste sistema são [10]: a equação da continuidade

∂tρ+ ∇ · (ρ~v) = 0, (1.1)

a qual expressa a conservação da massa no escoamento; a equação de Euler ρd~v

dt = ρ (∂t~v+ (~v · ∇)~v) = ~F , (1.2)

que descreve a atuação das forças presentes no sistema; e uma equação de estado relacio-nando a pressão P e a densidade ρ. Estamos interessados no caso de um fluido barotrópico, isto é, no caso em que a densidade ρ depende somente da pressão P

ρ= ρ(P ). (1.3)

Temos assim cinco equações para os cinco parâmetros (ρ densidade, P pressão, três

(13)

Assumimos ainda que o fluido é invíscido, de modo que as únicas forças internas são devidas à pressão. Além disso, consideramos a força gravitacional e um potencial de forças

externo (arbitrário)Φ, de modo que

~

F = −∇P − ρ∇φ − ρ∇Φ. (1.4)

Ainda como restrição ao tipo de escoamento, assumimos que o campo de velocidades é

irrotacional (∇ × ~v = 0), de modo que, aplicando a relação vetorial

∇( ~A · ~B) = ~A ×(∇ × ~B) + ~B ×(∇ × ~A) + ( ~A · ∇) ~B + ( ~B · ∇) ~A, (1.5) obtemos ∇ 1 2~v 2= (~v · ∇)~v . (1.6)

Substituindo essa expressão na equação de Euler (1.2), ficamos com ∂t~v = − 1 ρ∇P − ∇ 1 2~v 2+ φ + Φ. (1.7) A hipótese de fluido barotrópico ainda nos permite definir a entalpia específica como

h(P ) = Z P 0 dP0 ρ(P0), (1.8) de modo que ∇h = 1 ρ∇P, (1.9)

e a condição ∇ × ~v = 0 permite introduzir o potencial de velocidades ψ tal que

~

v = −∇ψ. (1.10)

Assim, em termos do potencial ψ e da entalpia h, a equação de Euler se reduz a −∂tψ+

1

2(∇ψ)

2+ h + φ + Φ = 0, (1.11)

a qual é conhecida como equação de Bernoulli.

Formulada nestes termos, a dinâmica do escoamento fica expressa pelo sistema de equações: (1.1), (1.11), (1.3), as quais devem ser satisfeitas pelos parâmetros descritivos ψ(~x, t), ρ(~x, t) e P (~x, t).

1.2

Ondas Acústicas

Consideremos agora um conjunto de grandezas (ρ0, P0, ψ0) satisfazendo as equações

de movimento do fluido: (1.1), (1.3), (1.11); ou seja, uma solução de fundo (background ). Estamos interessados em analisar o comportamento de variações (em primeira ordem) nessas quantidades

ρ= ρ0+ ρ(1)+ O(2), (1.12)

P = P0+ P(1)+ O(2), (1.13)

(14)

Estas flutuações nas variáveis dinâmicas do fluido caracterizam o que denominamos co-loquialmente de ondas sonoras. Assumimos, ainda, que os potenciais gravitacional φ e

externo Φ permanecem fixos, ou seja, os distúrbios na configuração do fluido não afetam

os campos φ e Φ. Feitas estas considerações, obtemos (em primeira ordem), a partir da

equação da continuidade (1.1), as duas equações seguintes:

∂tρ0+ ∇ · (ρ0~v0) = 0, (1.15) ∂tρ(1)+ ∇ · (ρ(1)~v0+ ρ0~v(1)) = 0. (1.16) A entalpia fica h(P ) = h(P0+ P(1)+ O(2)) = h0+  P(1) ρ0 + O(2), (1.17)

e, quando substituída na equação de Bernoulli (1.11), fornece o par de equações −∂tψ0+ 1 2(∇ψ0) 2 + h0+ φ + Φ = 0, (1.18) −∂tψ(1)+ P(1) ρ0 − ~v0· ∇ψ(1) = 0. (1.19) De (1.19) vemos que P(1) = ρ0  ∂tψ(1)+ ~v0· ∇ψ(1)  , (1.20)

e da hipótese do fluido ser barotrópico encontramos ρ(1) = ∂ρ ∂P P0P(1) = ∂ρ ∂P P0ρ0  ∂tψ(1)+ ~v0· ∇ψ(1)  . (1.21)

Substituindo (1.21) em (1.16), e lembrando que v(1) = −∇ψ(1), obtemos a equação

(1.22) −∂t ∂ρ ∂Pρ0  ∂tψ(1)+ ~v0 · ∇ψ(1)  ! + ∇ · ρ0∇ψ(1)− ∂ρ ∂Pρ0~v0  ∂tψ(1)+ ~v0· ∇ψ(1)  ! = 0.

A equação (1.22) descreve a propagação da flutuação ψ(1). Uma vez determinado o campo

ψ(1), a equação (1.20) determina P(1), e, por conseguinte, a equação (1.21) determina ρ(1).

Concluímos assim, que (1.22) descreve completamente a propagação de ondas acústicas no

escoamento em questão. Lembramos que os campos do background ψ0, P0, ρ0, resolvem as

equações de movimento do fluido invíscido, barotrópico e irrotacional considerado. Exceto por essa restrição, esses campos são funções arbitrárias da posição e do tempo.

1.3

Métrica Acústica

A fim de realizar uma interpretação geométrica da equação de onda (1.22), fazemos algumas definições de modo a reescrevê-la numa forma mais sugestiva. Primeiramente, a velocidade local do som é

c−2 ≡ ∂ρ

(15)

e definindo a matriz simétrica fµν(t, ~x) ≡ ρ0 c2 −1 −v0j −vi 0 (c2δij − vi0v j 0) ! , (1.24)

onde i, j = 1, 2, 3 e µ, ν = 0, 1, 2, 3, podemos reescrever (1.22) como

∂µ(fµν∂νψ(1)) = 0. (1.25)

Nesta forma, o tratamento da equação de onda (1.22) pelos métodos da geometria dife-rencial torna-se mais claro e simples.

Lembramos que, em uma variedade Lorentziana arbitrária, o operador d’Alembertiano é dado por 4ψ = √1 −g∂µ( √ −ggµν νψ), (1.26)

onde: gµν é a inversa da matriz formada pelas componentes da métrica gµν nas

coorde-nadas xµ= (t, ~x), g = det(g

µν), e ∂µ = ∂x∂µ. A semelhança entre (1.25) e (1.26) motiva a

seguinte identificação

−ggµν = fµν. (1.27)

A equação (1.27) fornece um ponto de partida para aplicação dos métodos da geometria

diferencial. A fim de justificar este passo, é necessário obter uma expressão para gµν(t, ~x)

e verificar se esta métrica possui propriedades de uma métrica Lorentziana usual. Aplicando o determinante a (1.27), obtemos

det(fµν) = (−g)4g−1

= g. (1.28)

Por outro lado, (1.24) fornece

det(fµν) = −ρ 4 0 c2, (1.29) de modo que √ −g = ρ 2 0 c, (1.30) e gµν fica gµν(t, ~x) = 1 ρ0c −1 −vj0 −vi 0 (c2δij − v0iv j 0) ! . (1.31)

Finalmente, tomando a inversa de (1.31), obtemos gµν(t, ~x) = ρ0 c −(c2− v2 0) −v j 0 −vi 0 δij ! , (1.32)

e o elemento de linha fica ds2 = ρ0 c n −(c2− v2 0)dt 2− 2~v 0dt · d~x+ d~x2 o . (1.33)

A métrica efetiva gµν é conhecida como métrica acústica. A seguir, enfatizamos algumas

propriedades de gµν:

• gµν é, de fato, Lorentziana, pois sua assinatura é (-,+,+,+);

• é importante notar que existem duas métricas pertinentes envolvidas na discussão aqui realizada:

(16)

(i) A métrica de Minkowski, a qual descreve a geometria do espaço-tempo físico subjacente1,

ηµν = diag(−1, 1, 1, 1), (1.34)

(ii) A métrica acústica gµν, dada por (1.32), que descreve o espaço-tempo

“expe-rimentado” pelos distúrbios acústicos. É importante ressaltar que a dinâmica envolvida é totalmente Newtoniana, ou seja, as leis que regem as interações no fluido têm a sua origem na física clássica, e a métrica efetiva (1.32) surge como um artifício matemático de nossa interpretação do problema. Apesar disso, não deixa de ser surpreendente que a acústica de um fluido clássico heterogê-neo possa ser associada a um espaço-tempo da Relatividade Geral.

• O campo tangente gerado pela coordenada t do laboratório ∂

∂t



µ = (1, 0, 0, 0)

for-nece uma orientação temporal “natural” ao espaço-tempo descrito por gµν, pois

gµν(t, ~x) ∂ ∂t ! µ ∂ ∂t ! ν = − 1 ρ0c <0. (1.35)

• A quadrivelocidade do fluido (normalizada como gµνVµVν = −1) é

Vµ= (1; v

i 0)

√ ρ0c

(em unidades tais que cluz = 1). (1.36)

Por outro lado,

∂ ∂t !µ = − 1 ρ0c (1; vi 0), (1.37) e, portanto, ∂ ∂t !µ = − V µ √ ρ0c , (1.38)

de modo que as curvas integrais do fluido são ortogonais (com respeito à métrica

acústica) às superfícies t = const..

• O tempo próprio ao longo das curvas integrais do fluido, cuja quadrivelocidade é Uµ = (1; vi 0), é dado por (1.39) τ = Z q −gµνUµUνdt = Z q ρ0(t, ~x)c(t, ~x)dt = Z L(~x, t)dt,

onde definimos L(~x, t) ≡ qρ0(r, ~x)c(t, ~x). Para que essas curvas sejam geodésicas

da métrica efetiva (1.32), é necessário que δτ = 0, ou seja,

d dt ∂L ∂˙xi ! = ∂L ∂xi, (1.40)

1Estamos usando unidades naturais, onde c luz= 1.

(17)

mas como ∂ ˙∂Lxi = 0, significa que é necessário que

∂L

∂xi = 0, (1.41)

ou, equivalentemente, que √ρ0c não dependa da posição. Reciprocamente, é

ime-diato que se √ρ0c independe da posição, então as curvas integrais do fluido são

geodésicas do espaço descrito pela métrica acústica (1.32).

• Diferentemente de uma métrica Lorentziana arbitrária, a qual possui seis graus

de liberdade em cada ponto do espaço-tempo (matriz 4 × 4 simétrica), a métrica

acústica (1.32) possui somente as funções ψ0(~x, t), ρ0(~x, t), e c(~x, t) como graus de

liberdade. Na verdade, a equação da continuidade (1.1) impõe ainda um vínculo

entre ψ0(~x, t) e ρ0(~x, t), de modo que se tem efetivamente somente os dois graus de

liberdade (ψ0(~x, t), c(~x, t), por exemplo). Esta observação tem importância central

no trabalho aqui desenvolvido, pois no capítulo 2 exploramos estes graus de liberdade para construir configurações de fluido que reproduzam métricas de espaços-tempos específicos da Relatividade Geral (Schwarzschild e Reissner-Nordstrom).

• Destacamos ainda que na Relatividade Geral a métrica do espaço-tempo é relaci-onada à distribuição de matéria através das equações de campo de Einstein [8, 9], enquanto que a métrica acústica (1.32) é relacionada à distribuição de matéria de modo puramente algébrico.

Observamos que o raciocínio aplicado na obtenção de gµν (1.32) pode ser generalizado

para um número arbitrário n ≥ 2 de dimensões espaciais2. Em particular, para n = 2

tem-se gµν(t, ~x) = ρ 0 c 2 −(c2− v2 0) −v j 0 −vi 0 δij ! , (1.42)

cujo elemento fica dado por

(1.43) ds2 = ρ 0 c 2 n −(c2− v2 0)dt 2 + 2~v 0dt · d~x+ d~x2 o .

Como exemplo de aplicação da métrica acústica (1.32), consideremos um perfil de velocidade com dependência em uma direção apenas

~v(t, ~x) = v(x)ˆx. (1.44)

Em regime estacionário(∂tρ0 = 0), a equação da continuidade (1.1) fornece

ρ0(x) =

k

v(x), (1.45)

onde k= constante , e a métrica (1.33) fica

ds2 = k

v(x)c(x) n

−(c2− v2)dt2− 2v(x)dtdx + dx2 + dy2+ dz2o. (1.46)

Devido à independência nas direções Oy e Oz, é suficiente considerar o comportamento da geometria ao longo do eixo Ox, de modo que ficamos com

ds2 = k

v(x)c(x) n

−(c2− v2)dt2− 2v(x)dtdx + dx2o. (1.47)

2Para um cálculo explícito da forma de g

(18)

A estrutura causal do espaço-tempo descrito por (1.47) é codificada pelo comportamento

das geodésicas nulas (trajetórias tais que ds2 = 0). A fim de evidenciar o comportamento

destas curvas, realizamos a mudança de coordenadas

(1.48)      du = dt − dx c+v dw = dt + dx c−v ,

de modo que (1.47) pode ser escrita como

ds2 = −k

vc(c

2− v2)du dw, (1.49)

e as geodésicas nulas correspondem às linhas u, w = constante . Para prosseguirmos

esta análise, deve-se conhecer a forma do campo de velocidades v(x). Consideremos, por

exemplo, v(x) 3, dado por

v(x) = − 2 c

exp(2x a) + 1

, (1.50)

onde a velocidade do som c e o parâmetro a são tomados como constantes positivas. A

figura 1.1 representa o perfil de velocidade (1.50), onde se nota que o ponto x= 0 divide

duas regiões, uma sendo supersônica (x <0) e a outra subsônica (x > 0). Resolvendo as

-10 -5 5 10 x -1.5 -1.0 -0.5 0.0 vHxL

Figura 1.1: Campo de velocidade v(x), dado por (1.50), com c = 1 e a = 1. A região de

escoamento supersônico corresponde a x < 0, enquanto que para x > 0 tem-se escoamento subsônico.

equações (1.48) para (u, w) como função de (t, x) , obtemos

u= t − x c − a c log 1 − exp  −2x a  , (1.51) e w= t + x c + a 3clog  1 + 3 exp  −2x a  . (1.52)

(19)

Como observado em (1.49), nas coordenadas(u, w) as geodésicas nulas — as quais revelam a estrutura causal do espaço-tempo descrito pela métrica efetiva (1.47) — são dadas

pelas linhas u, w= constante. Na figura 1.2 traçamos estas curvas num diagrama (t, x),

das coordenadas do no sistema de referência do laboratório. As curvas em vermelho

correspondem às linhas u = const., e as curvas em azul correspondem às linhas w =

const.. Note que na região x >0, observadores e sinais subsônicos são livres para viajar

-4 -2 0 2 4 x -4 -2 0 2 4 t

Figura 1.2: Geodésicas nulas do espaçotempo gerado pelo perfil de velocidade (1.50), com c = 1

e a = 1. As curvas em vermelho correspondem às linhas u = const., e as curvas em azul correspondem às linhas w = const..

em qualquer direção, enquanto na região x < 0 estes sinais só podem seguir a direção

correspondente a x decrescente. Portanto, o ponto x = 0 exerce papel de horizonte

acústico, e este exemplo representa um caso concreto da situação esquematizada na figura 1.

(20)

Capítulo 2

Buracos Negros Acústicos

Como mostrado no capítulo anterior, à propagação do som num meio não homogêneo está associado um espaço-tempo efetivo, com geometria descrita pela métrica acústica

gµν, dada por (1.32). Neste capítulo, exploramos os graus de liberdade de gµν de modo a

construir configurações das variáveis descritivas (ψ, P, ρ) que simulem os espaços-tempos de Schwarzschild e Reissner-Nordstrom. Ao longo da exposição, concluímos que estas configurações estão relacionadas a uma transformação de coordenadas que, por sua vez, é sujeita a uma equação diferencial. Portanto, o problema da determinação de configurações adequadas à simulação desses espaços-tempos reduz-se à solução de uma equação diferen-cial ordinária. Desenvolvemos estas ideias em alguns sistemas de coordenadas usuais, nos casos de duas e três dimensões espaciais, e analisamos o comportamento dos parâmetros descritivos obtidos em cada caso. Em particular, na discussão realizada no contexto de coordenadas Cartesianas em (1+2) dimensões, obtemos uma correspondência entre um escoamento de fluido com simetria linear e um modelo análogo esfericamente simétrico, o que fornece um modo de descrever a coordenada radial de um modelo com simetria esférica em termos de uma coordenada linear no sistema do laboratório.

2.1

Modelos (1+2) Dimensionais em Coordenadas

Car-tesianas

Primeiramente, consideremos o caso de um escoamento em duas dimensões espaciais. Neste caso, a métrica efetiva (1.43) é dada por

ds2 = ρ c 2 n −(c2 − v2)dt2− 2~vdt · d~x + d~x2o . (2.1)

Consideramos inicialmente que o campo de velocidades varia somente na direçãoxˆ

~

v(~x) = v(x)ˆx, (2.2)

e aplicando a equação da continuidade a um regime estacionário(∂ρ/∂t = 0), obtemos

∇ · (ρ~v) = ∂

(21)

ρ(x) = k

v(x). (2.3)

de modo que a métrica efetiva (2.1) fica

(2.4) ds2 = ρ c 2 n −(c2− v2)dt2− 2v(x)dtdx + dx2+ dy2o = k vc !2( −(c2− v2)dt+ v c2− v2dx 2 + v 2 c2− v2dx 2+ dx2+ dy2 ) = k vc !2( −(c2− v2)  dt+ v c2− v2dx 2 + c 2 c2− v2dx 2 + dy2 ) , ds2 = k vc !2( −(c2− v2)dτ2+ c2 c2− v2dx 2+ dy2 ) , (2.5)

onde a variável τ é tomada como

τ = t +

Z v(x0)dx0

c2− v2(x0). (2.6)

Estamos interessados em obter uma transformação de coordenadas      T = τ X = X(x) Y = y (2.7) de modo que a métrica (2.5) se torne

ds2 = −f (X)dT2 + 1

f(X)dX

2

+ X2dY2, (2.8)

onde X representa uma coordenada radial no espaço-tempo efetivo associado à propagação de ondas acústicas, cujo domínio vai depender da relação específica com a coordenada espacial no sistema do laboratório x, e para tornar Y uma coordenada angular, fazemos

uma identificação dos pontos do plano XY de coordenada Y igual0 e 2π, ou seja, (X, 0) =

(X, 2π).

Vejamos que condições devem ser satisfeitas de modo a expressar a métrica efetiva (2.5) na forma dada por (2.8). Rescrevendo (2.5) tem-se

ds2 = k 2(−c2+ v2) v2c2 dτ 2+ k2 v2(c2− v2)dx 2+ k2 c2v2dy 2, (2.9)

de modo que definindo a coordenada radial X por

X(x) = k c(x) v(x), (2.10) a (2.9) fica ds2 = X2(x) v2(x) − k2 X2(x) v(x) ! dτ2+ k 2X2(x) k2− v4(x) X2(x)dx 2+ X2(x)dy2. (2.11)

Nas coordenadas(T, X, Y ) temos

ds2 = X2 v2(X) − k 2 X2v(X) ! dT2+ k 2X2 (k2− v4(X) X2)X02dX 2+ X2dY2. (2.12)

(22)

Para se ter a forma de (2.8) é necessário ainda que g11= −1/g00, ou seja, k2X2 (k2− v4(X) X2)X02 = − 1 X2v2(X) − k2 X2v(X) . (2.13)

Resolvendo (2.13) para v, obtemos uma prescrição para o campo de velocidade

v(x) = ± k X

0(x)

X(x), (2.14)

ou, de outro modo,

v(x) =  kX

0(x)

X(x), (2.15)

com = ±1 .

Portanto, nas coordenadas(T, X, Y ), a métrica efetiva (2.11), com v dado por (2.15), fica

ds2 = − X 04 − k2X6 X2X02 ! dT2+ X 2X02 X04− k2X6 ! dX2+ X2dY2, (2.16)

que é da forma (2.8), com

f(X) = X

04

− k2X6

X2X02 . (2.17)

Observamos que impor condições sobre a forma da função f(X(x)) corresponde a fa-zer com que X(x) satisfaça uma determinada equação diferencial. Através de escolhas específicas para a forma de f(X), podemos em princípio obter modelos análogos para membros da classe de espaços-tempos cuja métrica pode ser escrita na forma (2.8). A seguir, realizamos o processo descrito tomando f(X) com cada uma das seguintes formas

f1(X) = 1 − XS X (Schwarzschild) (2.18) e f2(X) = 1 − XS X + X2 Q X2 (Reissner-Nordstrom), (2.19)

onde XS e XQ são constantes positivas.

Schwarzschild

Escolhendo f(X(x)) como (2.18), a métrica (2.8) resulta em

ds2 = −  1 − XS X  dT2+  1 1 −XS X dX 2+ X2dY2, (2.20)

a qual descreve a geometria do espaço-tempo de Schwarzschild [8, 9] em (1+2) dimensões, e de (2.17) obtemos a seguinte equação diferencial para X(x):

X04(x) + 2X

SX(x)X

02

(x) − 2X2(x)X02(x) − k24X6(x) = 0. (2.21)

Por conveniência, escolhemos unidades de modo que k2 = 1 e, como  = ±1, temos 2 = 1.

A equação para X(x) fica dX(x) dx !4 +nXSX(x) − X2(x) o dX(x) dx !2 − X6(x) = 0. (2.22)

(23)

Resolvemos (2.22) por métodos numéricos. A título de exemplo, e sem perda de generali-dade, fixamos a condição de contorno X(0) = 1, e reescalamos a coordenada X de modo

a ter XS = 1. Como (2.22) envolve potências pares das derivadas de X(x), obtemos duas

soluções reais, uma crescente e uma decrescente. Vamos considerar a solução crescente, a

qual possui o comportamento ilustrado na figura 2.1, onde notamos que lim

x→−∞X(x) = 0, -8 -6 -4 -2 0 2 x 1 2 3 4 XHxL Hxh, XSL

Figura 2.1: Gráfico da solução crescente X(x) de (2.22).

de modo que a singularidade do buraco negro de Schwarzschild (em X = 0) corresponde a

x → −∞, e lim

x→a−X(x) = ∞, onde a = constante. Como a solução é crescente, segue que

o intervalo(−∞, a) de valores da coordenada espacial no sistema de referência do

labora-tório x é mapeado biunivocamente no intervalo (0, +∞) de valores da coordenada radial

X do espaço-tempo efetivo. Com X(x) dada pela solução de (2.22) representada na figura 2.1, a métrica (2.8) representa o espaço-tempo de Schwarzschild usual da Relatividade Ge-ral, o qual é caracterizado como uma solução de vácuo, estática e com simetria esférica,

das equações de campo de Einstein. Note que o horizonte de Schwarzschild (XS = 1) é

mapeado no valor xh = 0 da coordenada espacial (sistema de referência do laboratório)

na construção aqui realizada.

O campo de velocidades, obtido a partir da solução X(x) por (2.15), com k = −1 e

= 1, está ilustrado na figura 2.2, onde vemos que v(x) é negativo pra todo x ∈ (−∞, a),

-6 -2 0 2 x -10 -6 -4 -2 0 vHxL x = xh Figura 2.2: Gráfico de v(x). lim x→−∞v(x) = −∞, (2.23)

(24)

e

lim

x→av(x) = 0. (2.24)

A solução X(x) fornece ainda o perfil da velocidade local do som c(x), pela (2.10),

c(x) = k

v(x) X(x), (2.25)

e seu gráfico é mostrado na figura 2.3. Plotando o gráfico de |v(x)| e c(x) (figura 2.4)

-6 -4 -2 0 2 x 0.2 0.4 0.6 0.8 1.0 1.2 1.4 cHxL x = xh Figura 2.3: Gráfico de c(x).

vemos que no ponto xh = 0 — correspondente ao horizonte — tem-se |v(x)|= c(x). Para

x ≤ 0, tem-se c(x) < |v(x)|, o que significa que sinais acústicos não podem escapar da

região x ∈ (−∞, 0), de modo que esta região representa o interior do buraco negro de

Schwarzschild. Por outro lado, para x ∈ (0, a) temos c(x) > |v(x)|, e, portanto, esta

região representa a parte externa do buraco negro.

-2 -1 0 1 2 x 0.2 0.4 0.6 0.8 1.0 1.2 1.4 ÈvHxLÈ cHxL x = xh Figura 2.4: Gráficos de |v(x)| e c(x).

O gráfico da densidade ρ(x), dada a partir da solução X(x) por (2.3), é mostrado na figura 2.5, onde se nota que

lim

x→−∞ρ(x) = 0, (2.26)

e

lim

(25)

Em particular, nota-se um comportamento regular na região próxima ao horizonte xh. -4 -3 -2 -1 0 1 2 x 1 2 3 4 ΡHxL x = xh

Figura 2.5: Gráfico da densidade ρ(x).

Por fim, a pressão P(x) é determinada por

dP(x) dρ = c 2(x), (2.28) isto é dP(x) dx = c 2 (x)dρ(x) dx . (2.29)

Como já conhecemos as funções c(x) e ρ(x), podemos integrar (2.29) e, a menos de uma

constante, determinar P(x), cujo perfil está ilustrado na figura 2.6, onde se observa um

crescimento da pressão conforme se passa da região interna (x < 0) para região externa

(x > 0) do buraco negro. Além disso, vemos que o valor da pressão é finito tanto para

x → −∞, como para x → a. Explicitamente, lim

x→−∞P(x) = P−∞, (2.30)

lim

x→aP(x) = Pa, (2.31)

onde P−∞ e Pa são constantes, e vale P−∞< Pa .

-4 -3 -2 -1 0 1 2 x 0.5 1.0 1.5 2.0 2.5 3.0 PHxL x = xh

Figura 2.6: Gráfico da pressão P(x). Aqui a condição de contorno da eq. (2.29) foi fixada

(26)

Vemos assim que a transformação determinada pela solução de (2.22) X(x) fornece

uma configuração de escoamento(v(x), ρ(x), c(x), P (x)) bem comportada na região

pró-xima ao horizonte de Schwarzschild, mas a região da singularidade X = 0 não é

devida-mente descrita por esta configuração. Concluímos então que o modelo obtido a partir de X(x) é satisfatório para a descrição efetiva de regiões próximas ao horizonte do espaço-tempo de Schwarzschild.

Reissner-Nordstrom

Escolhendo agora para f(X) a forma dada por (2.19)

f(X) = 1 − XS

X +

X2 Q

X2, (2.32)

a métrica efetiva (2.8) fica

(2.33) ds2 = − 1 −XS X + X2 Q X2 ! dT2+  1 1 −XSX + X 2 Q X2 dX 2+ X2dY2,

a qual descreve a geometria de Reissner-Nordstrom nas coordenadas radial X, e angular Y . Antes de determinar a transformação de coordenadas do sistema do laboratório para as

coordenadas do modelo análogo(τ, x, y) −→ (T, X, Y ), observamos que é sempre possível

reescalar a coordenada X, fazendo ¯X = X/XQ, de modo que

f( ¯X) = 1 − ( XS XQ) ¯ X + 1 ¯ X2, (2.34)

e, portanto, concluímos que é suficiente considerar

f(X) = 1 − m

X +

1

X2, (2.35)

onde m = XS/XQ representa a razão massa/carga do conteúdo de matéria-energia que

gera a geometria RN. As raízes de f(X), às quais correspondem os horizontes do espaço-tempo RN, são dadas por

X± = 1 2  XS± q X2 S− 4XQ2  . (2.36)

Temos três situações possíveis

(i) XS >2XQ, isto é, m >2. Neste caso existem dois horizontes.

(ii) XS = 2XQ, isto é, m= 2. Neste caso há somente um horizonte.

(iii) XS <2XQ, isto é, m <2. Neste caso não há horizonte, ou seja, o espaço-tempo RN

possui uma singularidade nua em X = 0.

A fim de determinar a transformação (τ, x, y) −→ (T, X, Y ), devemos obter a função

X(x). Sendo assim, substituímos (2.35) em (2.17) e obtemos

1 − m X + 1 X2 = X04− k2X6 X2X02 , (2.37)

(27)

de onde segue que dX(x) dx !4 +mX(x) − X2(x) − 1 dX(x) dx !2 − X6(x) = 0. (2.38)

Do mesmo modo que para a geometria de Schwarzschild, obtemos numericamente duas soluções reais para (2.38), uma sendo crescente e outra decrescente. Na figura 2.7, são ilustradas soluções de (2.38) para alguns valores de m. Na seção a seguir, vamos considerar

as configurações de escoamento conforme cada caso acima indicado: (i) m > 2; (ii) m = 2;

(iii) m < 2. -3 -2 -1 1 x -5 5 10 X HxL m = 4 m = 3 m = 2 m = 1 m = 0

Figura 2.7: Gráfico da solução X(x) de (2.38) para alguns valores de m e condição de contorno fixada como X(0) = 1.

(i) Caso m >2

Para m > 2, a solução X(x) de (2.38) tem o aspecto ilustrado na figura 2.8, onde

notamos que X(x) é crescente e mapeia biunivocamente o intervalo (xmin, xmax) de valores

da coordenada no sistema do laboratório, num intervalo (Xmin, Xmax) da coordenada

radial do espaço-tempo efetivo RN. Observamos que, em particular, a singularidade em

X = 0 é mapeada por essa transformação, assim como os horizontes X− e X+. Há ainda

uma região na qual X < 0, mas esta região não corresponde ao espaço RN usual da

Relatividade Geral, de modo que vamos desconsiderá-la aqui1.

O perfil de velocidade associado à solução X(x) neste caso, dado por (2.15), com

k = −1 e  = 1, fica como ilustrado na figura 2.9 , onde vemos que a velocidade é nula

na singularidade v(x0) = 0, e v(x = xmin) = 0, v(x = xmax) = 0. Juntamente com v(x),

a velocidade do som c(x) está representada na figura 2.9, onde se vê que c(x) diverge na singularidade, isto é, lim x→x±0 c(x) = +∞, (2.39) e, além disso, lim x→x+minc(x) = 0, (2.40) lim x→x−max c(x) = 0. (2.41)

1Tentativas de considerar a região em que X < 0 levam a valores negativos de ρ(x) e c(x), o que não

(28)

-4 -3 -2 -1 1 2 x -2 2 4 6 X XHxL Hx-, X-L Hx+, X+L x = x0

Figura 2.8: Gráfico da solução X(x) de (2.38), com m = 3 e X(0) = 1.

-4 -3 -2 -1 1 2 x -2 2 4 cHxL vHxL x = x0 x = x -x = -x+ Figura 2.9: Gráficos de v(x) e c(x).

Lembramos que nos horizontes tem-se |v(x)|= c(x), de modo que as interseções nestes gráficos indicam os valores correspondentes da coordenada espacial no sistema do labora-tório x que mapeiam os horizontes do espaço-tempo RN. Estes gráficos estão plotados na

figura 2.10, e como neste caso existem dois horizontes, temos dois valores x− e x+ tais

-2 -1 0 1 2 x 0.5 1.0 1.5 2.0 2.5 3.0 cHxL ÈvHxLÈ x = x0 x = x -x = -x+ Figura 2.10: Gráficos de |v(x)| e c(x).

(29)

que |v(x±)|= c(x±). Na região x > x+, os sinais acústicos podem se propagar em qualquer

direção, visto que o arrasto devido ao fluido é insuficiente para restringir o movimento

destes sinais. Este mesmo comportamento se repete na região x0 < x < x−. Na região

x−< x < x+, tem-se |v(x)|> c(x) e como v(x) < 0, sinais acústicos propagam-se somente

para a esquerda. 0.6 0.8 1.0 1.2 1.4 x 0.4 0.5 0.6 0.7 0.8 0.9 1.0 cHxL ÈvHxLÈ x = x+

Figura 2.11: Gráficos de |v(x)| e c(x).(Ampliado)

O gráfico da densidade ρ(x) associada à solução X(x) por (2.3), é mostrado na figura 2.12, onde verificamos que ρ(x) diverge na singularidade, ou seja,

-3 -2 -1 1 2 x 2 4 6 8 10 ΡHxL x = x0 x = x -x = -x+ Figura 2.12: Gráficos de ρ(x). lim x→x±0 ρ(x) = ±∞, (2.42) e lim x→a+ρ(x) = −∞, (2.43) lim x→b−ρ(x) = +∞ . (2.44)

Além disso, observa-se que ρ(x) é regular nas regiões correspondentes aos horizontes X±,

o que destaca a eficiência desta configuração de escoamento na descrição das regiões

(30)

Obtemos a pressão P(x) resolvendo (2.29), e seu gráfico está representado na figura 2.13. -3 -2 -1 1 2 x 2 4 6 8 PHxL x = x0 x = x -x = -x+

Figura 2.13: Gráfico da pressão P(x).

Vemos que P(x) diverge na singularidade, isto é,

lim

x→x+0

P(x) = +∞, (2.45)

e é finita para X →+∞, ou seja,

lim

x→b−P(x) = P∞, (2.46)

onde P∞ é um valor constante. Novamente, observamos um comportamento regular nas

regiões correspondentes aos horizontes X±. Concluímos enfatizando que o comportamento

regular das variáveis dinâmicas nas regiões dos horizontes mostra que a configuração de escoamento obtida a partir da solução de (2.38) é adequada para o estudo dos horizontes da geometria RN neste caso.

(ii) Caso m= 2

Resolvendo (2.38) com m = 2, obtemos a função X(x) mostrada na figura 2.14, na

-3 -1 0 1 2 x -4 -2 2 4 6 8 10 X XHxL x = x0 Hxh, XhL

Figura 2.14: Gráfico de X(x), para m = 2 e X(0) = 1.

(31)

valor x0 da coordenada espacial no sistema do laboratório. Além disso, tem-se novamente

que X(x) é crescente e

lim

x→x−max

X(x) = +∞, (2.47)

de modo que o intervalo de valores (0, +∞) da coordenada radial do espaço-tempo RN é

mapeado pelo intervalo limitado(x0, xmax), de variação da coordenada espacial no sistema

do laboratório. Portanto, nota-se um comportamento qualitativo similar ao observado no caso m >2.

Analogamente ao caso anterior, mas agora escolhendo k = 1 e  = 1, obtemos v(x)

e c(x) como mostrado na figura 2.15, onde vemos que v(x) é finita em todo o intervalo

-4 -2 -1 0 1 2 x -0.5 0.5 1.0 1.5 2.0 2.5 3.0 vHxL cHxL x = x0 x = xh

Figura 2.15: Gráficos de v(x) e c(x), para m = 2.

(xmin, xmax) e se anula no ponto correspondente à singularidade X = 0 (isto é, v(x0) = 0).

Vemos ainda que c(x) diverge na singularidade e tende a zero nos extremos de (xmin, xmax).

O único horizonte corresponde ao ponto xh indicado na figura 2.16. A região de interesse

(x0, xmax) — onde X > 0 — para a descrição do espaço RN neste caso divide-se em duas

partes: (i) x < xh e (ii) x > xh. Na região (i), como a velocidade do som c(x) excede o

arrasto devido ao escoamento, sinais sonoros podem se propagar em qualquer direção e

inclusive atravessar (escapar) para a região(ii). Na região (ii) as ondas sonoras também

podem se propagar em ambas as direções, porém o horizonte xh atua como uma barreira

(pois v(x) é positiva) de modo que sinais oriundos de (ii) não conseguem acessar a região x < xh. -0.4 -0.2 0.0 0.2 0.4 x 0.85 0.90 0.95 1.00 1.05 1.10 1.15 1.20 vHxL cHxL x = xh

(32)

Pelo mesmo procedimento usado no caso m > 2, obtemos a densidade ρ(x) como mostrada na figura 2.17, a qual possui o mesmo aspecto qualitativo do caso anterior.

-1 0 1 2 x 0 2 4 6 8 10 ΡHxL x = x0 x = xh

Figura 2.17: Gráfico de ρ(x), para m = 2.

Particularmente, notamos um comportamento regular na região próxima ao horizonte, o que mostra que este modelo é adequado para a descrição dessa região.

Finalmente, obtemos a pressão P(x) como solução de (2.29), e seu gráfico está

repre-sentado na figura 2.18, que, por sua vez, também possui o mesmo aspecto qualitativo do

-1 0 1 2 x -1 0 1 2 3 4 5 PHxL x = x0 x = xh

Figura 2.18: Gráfico de P(x), para m = 2.

caso m >2, e mais uma vez observamos um comportamento suave na região do horizonte

xh. Enfatizamos que o fato de todas as variáveis dinâmicas do fluido exibirem

comporta-mento suave no horizonte xh mostra que a configuração de escoamento obtida é adequada

para a descrição desta região. (iii) Caso m <2

Para m <2 a solução X(x) de (2.38) obtida numericamente possui o aspecto

represen-tado na figura 2.19, onde temos qualitativamente o mesmo comportamento que nos casos

m > 2 e m = 2, e à singularidade X = 0 da geometria RN corresponde o ponto x0 no

sistema de coordenadas do laboratório, isto é, X(x0) = 0. As outras grandezas do

esco-amento são obtidas do mesmo modo realizado nos casos anteriores e estão representadas nas figuras 2.20, 2.21, 2.22.

(33)

-3 -1 0 1 2 x -4 -2 2 4 6 8 10 X XHxL x = x0

Figura 2.19: Gráfico de X(x), com m = 1 e X(0) = 1.

-4 -2 -1 0 1 2 x -2 -1 1 2 3 4 5 vHxL cHxL x = x0

Figura 2.20: Gráficos de v(x) e c(x), para m = 1.

-2 -1 0 1 2 x -2 2 4 6 8 10 ΡHxL x = x0

(34)

-1.0 -0.5 0.0 0.5 1.0 1.5 2.0 x 0 2 4 6 8 10 PHxL x = x0

Figura 2.22: Gráfico de P(x), para m = 1.

O comportamento qualitativo das variáveis dinâmicas é essencialmente o mesmo dos casos anteriores, com exceção do gráfico de |v(x)| e c(x) (Figura 2.20), no qual se observa que c(x) > |v(x)| para todo x, o que ilustra a ausência de horizontes. Portanto, nesta con-figuração de escoamento, sinais acústicos são livres para acessar qualquer região do espaço, o que reflete o fato do espaço-tempo efetivo RN neste caso possuir uma singularidade nua.

2.2

Modelos (1+2) Dimensionais em Coordenadas

Po-lares

Na seção anterior, para descrever a coordenada radial de um espaço-tempo (efetivo) com simetria circular em termos da coordenada linear do laboratório, foi necessário fazer

uma identificação entre os pontos(X, 0) e (X, 2π), do plano (X, Y ). No que diz respeito à

dinâmica de ondas acústicas, esta identificação pode ser efetivamente realizada fixando-se condições de contorno iguais nas regiões correspondentes do fluido em escoamento no la-boratório. Outro modo de obter esta identificação consiste em considerar inicialmente um

escoamento com simetria circular em coordenadas polares, de modo que os pontos (r, 0)

e(r, 2π) são idênticos. A seguir desenvolvemos neste contexto a mesma ideia apresentada

na seção anterior e buscamos configurações de escoamento (caracterizadas por uma trans-formação de coordenadas) que descrevam geometrias específicas, que em nosso caso são as de Schwarzschild e Reissner-Nordstrom.

Primeiramente, consideremos um escoamento com simetria circular, ou seja, com campo de velocidades

~

v(~x) = v(r)ˆr. (2.48)

A equação de continuidade aplicada a um regime estacionário fornece ∇ · (ρ~v) = 1 r ∂ ∂r[rρv(r)] = 0 ⇒ ρ(r) = k rv(r). (2.49)

(35)

O elemento de linha (1.43) em coordenadas polares fica (2.50) ds2 = ρ c 2n −(c2− v2)dt2− 2v(r)dtdr + dr2+ r2dθ2o = k rvc !2( −(c2− v2) dt+ v c2 − v2dr 2 + v 2 c2− v2dr 2+ dr2+ r2 dθ2 ) = k rvc !2( −(c2− v2)dt+ v c2 − v2dr 2 + c 2 c2− v2dr 2+ r22 ) ds2 = k rvc !2( −(c2 − v2)dτ2+ c 2 c2− v2dr 2+ r22 ) , (2.51)

onde definimos uma coordenada auxiliar τ por

τ = t +

Z v(r0)dr0

c2− v2(r0). (2.52)

Buscamos uma transformação de coordenadas      T = τ R = R(r) Θ = θ (2.53)

de modo que a métrica (2.51) se torne

ds2 = −f (R)dT2+ 1

f(R)dR

2+ R22, (2.54)

onde R representa uma coordenada radial no espaço-tempo efetivo associado à propagação

de ondas acústicas no escoamento considerado, eΘ ∈ (0, 2π).

Seguindo a mesma linha de raciocínio da seção 2.1, reescrevemos (2.51)

ds2 = k2 1 c2(r) − 1 v2(r) ! dτ2+ k 2dr2 r2v2(r) (c2(r) − v2(r))+ k2 c2(r)v2(r)dθ 2, (2.55)

definimos a coordenada R por

R(r) = k

c(r)v(r), (2.56)

de modo que nas coordenadas(T, R, Θ) a métrica efetiva (2.55) se expressa como

ds2 = R 2v4(R) − k2 r2v2(R) dT 2+ k 2R2 (k2− R2v4(R)) R02dR 2+ R22. (2.57)

Para que (2.57) tenha a forma (2.54), v deve satisfazer a equação R2v4(R) − k2

r2v2(R) = −

(k2− R2v4(R)) R02

k2R2 , (2.58)

de modo que devemos ter

v(r) = k R(r)

(36)

Com v dado por (2.59), a métrica (2.57) fica ds2 = " k2R6 − r8(R)R04 r6(R)R2R02 # dτ2+ " r6(R)R2R02 r8(R) R04 − k2R6 # dR2+ R22, (2.60)

a qual possui a mesma forma de (2.54), com

f(R) = r

8(R)R04− k2R6

r6(R)R2R02 . (2.61)

Do mesmo modo realizado em coordenadas Cartesianas, para obtermos como modelo análogo um determinado espaço-tempo efetivo na classe de geometrias cuja métrica pode ser expressa na forma (2.54), realizamos as etapas:

(i) Impomos uma forma para f(R);

(ii) Obtemos uma equação diferencial para R(r);

(iii) Verificamos a existência de soluções com as propriedades desejadas (ex: bijetividade, [Imagem de R(r)] = (0, +∞), etc.).

Tendo obtido R(r) nestas condições, e, consequentemente, um modelo análogo para o escoamento com simetria circular, passamos à análise das relações entre as grandezas

descritivas do fluido (v(r), ρ(r), c(r), P (r)) e o espaço-tempo efetivo obtido. A seguir,

consideramos as seguintes formas para f(R): f1(R) = 1 − RS R (Schwarzschild); (2.62) f2(R) = 1 − RS R + R2 Q R2 (Reissner-Nordstrom). (2.63)

Schwarzschild

Tomando f(R) como (2.62), substituindo em (2.61) e rearranjando os termos, obtemos

a seguinte equação diferencial para R(r): dR(r) dr !4 + RSR(r) − R 2(r) r2 dR(r) dr !2 − k2R6(r) r8 = 0. (2.64)

Para esta escolha de f(R), a métrica efetiva (2.54) fica

ds2 = −  1 −RS R  dT2+  1 1 −RSRdR 2+ R22, (2.65)

a qual descreve a geometria do espaço-tempo de Schwarzschild. É sempre possível

rees-calar a coordenada R , de modo que se faz suficiente estudar o caso RS = 1. Além disso,

também podemos considerar unidades de modo que k2 = 1. A fim de resolver (2.64)

num caso específico, deve-se fixar uma condição de contorno para R(r). Na figura 2.23

mostramos as soluções obtidas quando fixamos R(r0) = 1 para r0 = 10, r0 = 2, r0 = 1,

e r0 = 0.1, onde se nota que conforme r0 se aproxima de zero, maior é o intervalo de

valores de R mapeado por R(r). Observamos também que a singularidade em R = 0 não é coberta por nenhuma solução deste tipo.

(37)

0 1 2 3 4 5 x 1 2 3 4 R R(10) = 1 R(2) = 1 R(1) = 1 R(0.1) = 1

Figura 2.23: Gráfico de R(r), para várias condições do tipo R(r0) = 1.

0 5 10 15 20r 1 2 3 4 5 R RHrL r = rmin R = Rh

Figura 2.24: Gráfico da solução R(r) de (2.64) , com R(10) = 1.

0 2 4 6 8 10 12 14 r 0.95 1.00 1.05 1.10 1.15 1.20 R RHrL r = rmin Hrh, RhL

Figura 2.25: Gráfico de R(r) na região próxima ao horizonte Rh de Schwarzschild.

Vamos analisar o caso em que R(10) = 1. O perfil da solução é mostrado na figura 2.24. Observamos que R(r) é decrescente com domínio (coordenada espacial no sistema do laboratório) dado pelo intervalo(rmin,+∞), onde 0 < rmin <1 para o conjunto particular

(38)

de unidades e condição de contorno escolhido, e que lim r→rmin+ R(r) = +∞, (2.66) lim r→+∞R(r) = R∞, (2.67)

onde R∞é uma constante menor que Rh = 1, e Rh é o valor da coordenada R no horizonte

de Schwarzschild. Portanto, vemos que a transformação determinada por R(r) mapeia

o intervalo de valores (rmin,+∞), da coordenada radial no sistema do laboratório, no

intervalo de valores (R∞,+∞) da coordenada radial R, do espaço-tempo (efetivo) de

Schwarzschild.

Uma vez obtida R(r), o comportamento das variáveis dinâmicas do escoamento fica determinado. Em particular, v(x) é dada por (2.59), e c(x) é obtida de (2.56). Na

figura 2.26 traçamos os gráficos destas funções, onde observamos que v(rmin) = 0 =

0 5 10 15 r 0.0 0.5 1.0 1.5 2.0 2.5 3.0 vHrL cHrL r = rmin r = rh Figura 2.26: Gráficos de v(r) e c(r).

c(rmin), v(rh) = c(rh), e o fato de ser v(r) ≥ 0, ∀r, revela que este campo de escoamento

corresponde a um buraco branco com horizonte em rh. A região rmin < r < rh corresponde

ao interior do buraco branco, e nesta região os sinais acústicos propagam-se em qualquer

direção, podendo, em particular, escapar para a região r > rh. Por outro lado, um sinal

emitido na região r > rh não pode acessar a região rmin < r < rh, devido ao arrasto

supersônico presente naquela.

Podemos também calcular a densidade ρ(r) correspondente à solução R(r), com auxílio de (2.49). O resultado é mostrado na figura 2.27, onde se nota que

lim

r→rminρ(r) = +∞, (2.68)

e

lim

r→+∞ρ(r) = 0. (2.69)

Observa-se novamente um comportamento regular na região próxima ao horizonte rh, e,

além disso, um decréscimo ao se passar do interior (rmin < r < rh) ao exterior (r > rh)

do buraco branco.

Por fim, a pressão P(r), obtida de

dP(r)

dr = c

2(r)dρ(r)

(39)

2 4 6 8 10 12 14 r -1 0 1 2 3 ΡHrL r = rmin r = rh

Figura 2.27: Gráficos da densidade ρ(r), para R(10) = 1.

tem o aspecto ilustrado na figura 2.28, onde também observamos um comportamento regular próximo ao horizonte. Em particular, tem-se

lim

r→+∞P(r) = P∞, (2.71)

lim

r→rminP(r) = P0, (2.72)

onde P0 e P∞ são constantes.

0 2 4 6 8 10 12 14 r 6 7 8 9 10 11 12 PHrL r = rmin r = rh

Figura 2.28: Gráficos da pressão P(r), para R(10) = 1.

Mais uma vez enfatizamos que todas as variáveis dinâmicas (que determinam a confi-guração do escoamento), obtidas a partir da solução de (2.64), possuem comportamento regular na região do horizonte de Schwarzschild, o que mostra que esta configuração é adequada para a descrição desta região.

Reissner-Nordstrom

Considerando f(R) como dada por (2.63), a métrica efetiva (2.54) assume a forma

ds2 = − 1 −RS R + R2Q R2 ! dT2+ 1 1 − RS R + R2 Q R2 dR 2+ R22, (2.73)

(40)

que representa a geometria do espaço-tempo (efetivo) de Reissner-Nordstrom. Com base no mesmo argumento da seção 2.1.2, lembramos que sempre é possível reescalar a coor-denada R, de modo que se faz suficiente considerar

f(R) = 1 − m

R +

1

R2. (2.74)

Sendo assim, tomamos f(R) dada por (2.74) em (2.61), rearranjamos os termos e obtemos

a seguinte equação diferencial para a função R(r): dR(r) dr !4 + " mR(r) − (1 + R2(r)) r2 # dR(r) dr !2 −R 6(r) r8 = 0. (2.75)

A seguir, analisamos os três casos: (i) m >2 (2 horizontes);

(ii) m= 2 (1 horizonte);

(iii) m <2 (singularidade nua).

(i) Caso m >2

Neste caso f(R) possui duas raízes, a saber

R− = 1 2  m −√m2− 4, (2.76) e R+ = 1 2  m+√m2− 4, (2.77)

às quais correspondem os horizontes do espaço-tempo de RN. As soluções reais de (2.75),

com m= 3, estão representadas na figura 2.29, onde também estão indicados os horizontes

0.0 0.5 1.0 1.5 2.0 2.5 3.0r 0.0 0.5 1.0 1.5 2.0 2.5 3.0 R R1HrL R2HrL r = r0 Hr-, R-L Hr+, R+L

Figura 2.29: Gráficos das soluções reais R1(r) e R2(r) de (2.75).

R− e R+ (linhas pontilhadas). Notamos que a solução crescente R1(r) mapeia o intervalo

de valores (rmin,+∞), da coordenada espacial r no sistema do laboratório, no intervalo

(0, α) da coordenada radial do espaço-tempo RN, onde α é um valor tal que R−< α < R+

e

lim

(41)

Por sua vez, a solução R2(r) mapeia a região do espaço-tempo de Reissner-Nordstrom

correspondente a R ∈(β + ∞), onde β é uma constante tal que R−< β < R+ e

lim

r→+∞R2(r) = β. (2.79)

Portanto, nestas circunstâncias são necessárias as duas soluções para cobrir todo o espaço-tempo de Reissner-Nordstrom. Analisemos agora o comportamento das funções descritivas

da dinâmica do fluido(v(r), c(r), ρ(r), ...) para cada uma das soluções R1(r), R2(r) .

Começamos pela solução R1(r). O perfil de velocidade v1(r) do escoamento é dado

por (2.59) e a velocidade do som c1(r) é obtida de (2.56). Escolhendo  = 1 e unidades

tais que k= 1, o comportamento obtido para estas grandezas tem o aspecto ilustrado na

figura 2.30, onde se observa que v1(r) é nula na singularidade R = 0, isto é, v1(r0) = 0. O

0.0 0.5 1.0 1.5 2.0r 0.0 0.5 1.0 1.5 2.0 2.5 3.0 v1HrL c1HrL r = r0 r = r -Figura 2.30: Gráficos de v1(r) e c1(r).

horizonte interno R−é mapeado na coordenada espacial r−, para a qual vale v(r−) = c(r−)

(linha pontilhada). A região em que a coordenada espacial r no sistema do laboratório

é tal que r− < r corresponde a valores da coordenada radial R1 do espaço-tempo efetivo

com R− < R (exterior ao horizonte), e a região r < r− corresponde a valores tais que

R < R− (interior ao horizonte). Notamos ainda que sinais acústicos emitidos na região

r > r− são impossibilitados de acessar a região r < r−, devido à velocidade supersônica

de arrasto do fluido na região de emissão. Além disso, vemos que c1(r) diverge em R = 0,

ou seja,

lim

r→r0c1(r) = +∞. (2.80)

A densidade ρ1(r), dada por (2.49), tem o aspecto representado na figura 2.31, na qual

notamos que lim r→r+0 ρ1(r) = +∞, (2.81) lim r→+∞ρ1(r) = 0, (2.82)

e um comportamento regular nas proximidades do horizonte rh.

Por sua vez, a pressão P1(r) tem o perfil representado na figura 2.32, onde se nota mais

uma vez um comportamento regular próximo ao horizonte r−, e um decréscimo conforme

r se afasta da singularidade r0, ou de outro modo

lim

r→r+0

(42)

0.0 0.5 1.0 1.5 2.0r 0.0 0.5 1.0 1.5 2.0 2.5 3.0 Ρ1HrL r = r0 r = r

-Figura 2.31: Gráfico da densidade ρ1(r).

0.0 0.5 1.0 1.5 2.0r 1 2 3 4 P1HrL r = r0 r = r

-Figura 2.32: Gráfico da pressão P1(r).

lim

r→+∞P1(r) = P1 , com P1 = constante. (2.84)

Considerando agora a solução R2(r), cujo domínio (rmin,+∞) mapeia a região externa

ao horizonte R−, ou seja, a região na qual β ≤ R ≤+∞, obtemos os perfis mostrados na

figura 2.33 para v2(r) e c2(r), onde observamos que a velocidade v2(r) se anula quando

R →+∞ e diverge quando R → β, isto é,

lim

r→rminv2(r) = 0, (2.85)

lim

r→+∞v2(r) = +∞. (2.86)

Além disso, c2(r) se anula tanto para R → +∞, quanto para R → β, ou seja,

lim

r→rminc2(r) = 0, (2.87)

lim

r→+∞c2(r) = 0. (2.88)

Ao horizonte R+do espaço-tempo efetivo corresponde a coordenada espacial r+no sistema

do laboratório, para a qual vale v2(r+) = c2(r+). Na região em que a coordenada espacial r

no sistema do laboratório satisfaz r < r+, tem-se v2(r) < c2(r), e a coordenada radial R do

(43)

0.2 0.4 0.6 0.8 1.0r 0.0 0.2 0.4 0.6 0.8 1.0 1.2 v2HrL c2HrL r = rmin r = r+ Figura 2.33: Gráficos de v2(r) e c2(r).

Por outro lado, para r > r+ a região mapeada pela transformação R(r) corresponde ao

interior de R+, onde temos v2(r) > c2(r). Sob a perspectiva do laboratório isto significa

que sinais acústicos emitidos em r < r+ podem se propagar em qualquer direção e, em

particular, ter acesso à região r > r+, mas sinais oriundos de r > r+ não podem chegar à

região r < r+ devido ao arrasto supersônico do fluido.

A densidade ρ2(r) proveniente da solução R2(r), obtida de (2.49), possui o aspecto

mostrado na figura 2.34, onde notamos novamente um comportamento regular próximo

0.0 0.5 1.0 1.5 2.0r 1 2 3 4 5 Ρ2HrL r = rmin r = r+

Figura 2.34: Gráfico da densidade ρ2(r).

ao horizonte rh e um decréscimo de ρ2(r) conforme r aumenta. Observa-se ainda que

ρ2(r) diverge quando R → +∞, e tende a zero quando R → β, ou seja,

lim

r→rminρ2(r) = +∞, (2.89)

lim

r→+∞ρ2(r) = 0. (2.90)

Finalmente, a pressão obtida neste caso está ilustrada na figura 2.35, onde se nota um

comportamento decrescente conforme se passa da região exterior ao horizonte R+(r < r+)

para sua região interior (r > r+). Além disso, temos

lim

Referências

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