• Nenhum resultado encontrado

Avaliação de serviços de saúde mental : validação da versão para trabalhadores de instrumento de avaliação de Recovery

N/A
N/A
Protected

Academic year: 2021

Share "Avaliação de serviços de saúde mental : validação da versão para trabalhadores de instrumento de avaliação de Recovery"

Copied!
185
0
0

Texto

(1)

UNIVERSIDADE ESTADUAL DE CAMPINAS FACULDADE DE CIÊNCIAS MÉDICAS DEPARTAMENTO DE SAÚDE COLETIVA

PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM SAÚDE COLETIVA

MARIANA BARBOSA PEREIRA

AVALIAÇÃO DE SERVIÇOS DE SAÚDE MENTAL: VALIDAÇÃO DA VERSÃO PARA TRABALHADORES DE INSTRUMENTO DE AVALIAÇÃO DE RECOVERY

CAMPINAS 2019

(2)

AVALIAÇÃO DE SERVIÇOS DE SAÚDE MENTAL: VALIDAÇÃO DA VERSÃO PARA TRABALHADORES DE INSTRUMENTO DE AVALIAÇÃO DE RECOVERY

Tese apresentada à Faculdade de Ciências Médicas da Universidade Estadual de Campinas como parte dos requisitos exigidos para a obtenção do título de Doutora em Saúde Coletiva, na área de concentração Política, Planejamento e Gestão em Saúde.

ORIENTADORA: PROFª. DRª. ROSANA TERESA ONOCKO CAMPOS CO-ORIENTADORA: PROFª. DRª. EHIDEE ISABEL GÓMEZ LA ROTTA

ESTE TRABALHO CORRESPONDE À VERSÃO

FINAL DA TESE DEFENDIDA PELA ALUNA MARIANA BARBOSA PEREIRA E ORIENTADA PELA PROFª DRª. ROSANA TERESA ONOCKO CAMPOS

Campinas 2019

(3)
(4)

MARIANA BARBOSA PEREIRA

ORIENTADOR: ROSANA TERESA ONOCKO CAMPOS COORIENTADOR: EHIDEE ISABEL GÓMEZ LA ROTTA

MEMBROS:

1. PROF. DR. ROSANA TERESA ONOCKO CAMPOS (ORIENTADORA E PRESIDENTE DA BANCA)

2. PROF. DR. MÁRIO CÉSAR REZENDE ANDRADE

3. PROF. DR. JUAREZ PEREIRA FURTADO

4. PROF. DR. PRISCILA MARIA STOLSES BERGAMO FRANCISCO

5. PROF. DR. LUIS FERNANDO FARAH DE TÓFOLI

Programa de Pós-Graduação em Saúde Coletiva da Faculdade de Ciências Médicas da Universidade Estadual de Campinas.

A ata de defesa com as respectivas assinaturas dos membros encontra-se no SIGA/Sistema de Fluxo de Dissertação/Tese e na Secretaria do Programa da FCM.

(5)

Aos trabalhadores comprometidos com a atenção psicossocial e com a justiça social, compromisso a cada dia mais árduo e necessário.

(6)

Ao meu companheiro Tiago, por tantas coisas quanto nossa história e profundo amor podem testemunhar. Por me permitir estar ao lado do coração mais puro e forte que conheço.

À minha irmã e melhor amiga, Maíra, com quem compartilho os ideais de um mundo melhor, e com quem aprendo a cada dia sobre o ofício da educação libertária. Y desde entonces soy porque tu eres.

Ao primo irmão Marcellus, companheiro da jornada teatral Primas Inácio, por me permitir descobrir o quanto perdemos crescendo longe, mas a tempo de aprender com sua generosidade, delicadeza e firmeza diante da vida.

Ao primo irmão Bruno, pelo bom humor e leveza em viver a vida, que me ensinam ainda mais do que sua admirável inteligência e sede por conhecimento.

Ao Rui e à Carminha, por não desistirem dos difíceis papéis de pai e mãe, me apoiando incondicionalmente em planos e ideias que sei que muitas vezes não seriam suas escolhas.

Ao Davi e à Zila, pequenas bênçãos que alegram nossas vidas.

À Rosana, minha orientadora e professora desde 2009, pela firmeza na defesa aos direitos humanos e ao direito à voz para todas as pessoas. Pelo apoio e confiança durante todo o trabalho.

À Ehidee, por aceitar fazer parte do projeto; pelo apoio e paciência na função de co-orientadora.

Aos professores Mário César Rezende Andrade, Egberto Ribeiro Turato, Luís Fernando Farah de Tófoli, Juarez Pereira Furtado e Priscila Maria Stolses Bergamo Francisco, pela participação nas bancas de qualificação e de defesa do trabalho. Por aceitarem participar desse processo, e pelas contribuições construtivas a partir de suas reconhecidas experiências.

Aos professores Carlos Roberto Silveira Corrêa e Mark Napoli Costa, por aceitarem o convite para serem membros suplentes da banca, e por acompanharem, cada um à sua maneira, o projeto ampliado do qual esta tese é parte, contribuindo em grande medida para seu desenvolvimento e qualificação.

À professora Maria O’Connell, pela generosidade em compartilhar conosco não apenas a experiência de desenvolvimento do RSA, mas todo o seu

(7)

Às colegas e amigas Leidy Erazo e Ellen Ricci, pelo trabalho conjunto no projeto RSA, por compartilhar as ansiedades, angústias, textos, tabelas, trabalho de campo, almoços, cervejas, e tudo o que vivemos nesse processo. Pela solidariedade e confiança durante esses quatro anos de intenso trabalho.

À Marcela Bigatão, amiga e companheira desde a equipe IV do David Capistrano, pelo apoio ao longo do trabalho, e pela grande ajuda com o trabalho de campo e análise da validação.

Aos colegas do Grupo de Pesquisa Interfaces: Saúde Coletiva e Saúde Mental, por compartilhar comigo o interesse e a sensibilidade em relação à saúde mental e à justiça social; pelo aprendizado que me permitem ter a partir da experiência singular de cada um.

O presente trabalho foi realizado com apoio da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior - Brasil (CAPES) - Código de Financiamento 001.

(8)

Mesmo com avanços reconhecidos no modelo de atenção em saúde mental do Brasil após a Reforma Psiquiátrica, ainda há muitos desafios a serem superados para a qualificação desse tipo de cuidado. Um deles é a necessidade de avaliações efetivas do modelo, já que o país ainda carece de indicadores consistentes na área. A perspectiva de Recovery pode ser compreendida como um processo de reconstrução de sentidos para a vida, independentemente dos sintomas de um transtorno mental, enfatizando a legitimidade do lugar das pessoas com esse tipo de experiência na sociedade. Trata-se de um conceito que tem se consolidado internacionalmente também enquanto construto de instrumentos avaliativos em saúde mental, sendo uma via para construção de indicadores. O Recovery Self-Assessment (RSA) é um instrumento autoaplicável, que tem como objetivo avaliar os graus em que serviços e programas de saúde mental estão orientados para o Recovery. Considerando o papel central que os profissionais tem para o cuidado em saúde mental, o objetivo deste estudo foi adaptar transculturalmente e validar a versão para trabalhadores do RSA-R para o contexto brasileiro. Trata-se de estudo de abordagem quanti-qualitativa, realizado entre 2016 e 2018 no município de Campinas/SP, com a participação de trabalhadores de serviços da Rede de Atenção Psicossocial. O processo de adaptação transcultural contemplou as etapas de Preparação, Tradução, Retrotradução, Harmonizações, Avaliação por especialistas, Grupos Focais, Workshop com pesquisadora do instrumento original, Estudo Piloto. No estudo de validação, foram avaliadas as propriedades confiabilidade e validade. Considerando a contribuição da população-alvo na adaptação transcultural de instrumentos, o estudo contou com a participação de trabalhadores, incorporando também conhecimentos da área de avaliação participativa, o que produziu um processo inovador de pesquisa. A equivalência conceitual foi confirmada, e a avaliação por especialistas mostrou evidências de validade de conteúdo. Além de mudanças nos itens, foram realizadas modificações na escala de respostas, e na apresentação do instrumento. No estudo de validação, a análise exploratória da amostra mostrou pouca variação nas respostas. A análise fatorial apresentou índices de adequação do modelo insuficientes nesta amostra. O resultado referente às cargas fatoriais padronizadas mostrou-se potencialmente positivo, assim como a matriz de correlação entre os domínios. A consistência interna e a estabilidade teste-reteste foram consideradas parcialmente adequadas. Nossos resultados corroboram outras avaliações de que o RSA requer aprimoramentos da sua qualidade psicométrica global. Além de limitações com o tamanho da amostra, dificuldades com a escala de resposta e com o tamanho do instrumento foram observadas e analisadas, também considerando a diversidade do perfil educacional e sociocultural de trabalhadores em todo o território brasileiro. Discrepâncias nas características socioculturais e econômicas entre o contexto de origem do instrumento e o Brasil foram evidentes e, tanto na adaptação quanto na validação, isso acarretou significativos desafios metodológicos. Os resultados deste estudo revelaram um

(9)

também em formas de incorporação do conceito que reflitam verdadeiramente características brasileiras.

Estudos de Validação – Comparação Transcultural – Avaliação em Saúde - Recuperação da Saúde Mental

(10)

Regardless the recognized advances in mental health care in Brazil after the Psychiatric Reform, there are still challenges to overcome for its qualification. One of the challenges is the need for effective evaluations of the system, since the country still lacks consistent indicators in the area. The Recovery perspective can be understood as a process of life meaning reconstruction, independently of mental disorder symptons, emphasizing the legitimacy of people with this type of experience in society. Recovery is a worldwide-consolidated concept as a construct of mental health evaluation tools, therefore representing a way for indicators construction. The Recovery Self-Assessment (RSA) is a self-administered tool that aims to assess the degrees in which mental health services and programs are oriented towards Recovery. Considering the central role that professionals have in mental health care, the goal of this study was to cross-culturally adapt and validate RSA-R workers version for Brazilian context. This is a quantitative-qualitative study, conducted between 2016 and 2018 in the city of Campinas/SP, with the participation of the Psychosocial Attention Network services’ professionals. The cross-cultural adaptation process included the stages of Preparation, Translation, Retrotranslation, Harmonization, Expert Evaluation, Focal Groups, Workshop with the original instrument’s researcher, Pilot Study. For the validation study, reliability and validity properties were evaluated. Considering the target population’s contribution in cross-cultural adaptations, the study included workers participation, also incorporating participatory evaluation knowledge, which produced an innovative research process. The conceptual equivalence was confirmed, and expert evaluation showed content validity evidence. In addition to changes in the items, modifications were made in the response scale, and in the instrument’s presentation. In the validation study, the sample’s exploratory analysis showed little response variation. Factor analysis revealed insufficient model adequacy rates for the present sample. Results regarding standardized factor loadings were potentially positive, as was correlation matrix between domains. Internal consistency and test-retest stability were considered partially adequate. Our results corroborate other assessments that indicate RSA requires improvements in its overall psychometric quality. In addition to limitations with the sample size, difficulties with the response scale and with the instrument size were observed and analyzed, also considering the diversity of sociocultural and educational workers’ profile throughout Brazilian territory. Discrepancies in sociocultural and economic characteristics between the instrument’s source context and Brazil were evident, and in both adaptation and validation processes this entailed significant methodological challenges. This study results revealed a great potential in Brazilian context for a better assimilation of Recovery principles in services evaluation, but also indicated the need to improve not only the instrument’s validity and reliability, but also the concept’s incorporation in a way that truly reflects Brazilian characteristics.

(11)
(12)

SUMÁRIO ... 12

APRESENTAÇÃO ... 14

INTRODUÇÃO ... 16

O conceito de Recovery ... 17

Avaliação de serviços e programas ... 22

Instrumentos de avaliação em saúde mental – o Recovery Self-Assessment (RSA) ... 25

Trabalhadores de serviços de saúde mental ... 28

OBJETIVOS ... 33 Objetivo Geral ... 33 Objetivos Específicos ... 33 MÉTODOS ... 34 Desenho do estudo ... 34 Participantes... 35 Adaptação transcultural ... 38 Preparação ... 38 Tradução ... 40 Retrotradução ... 40 Primeira Harmonização ... 41

Avaliação por especialistas ... 41

Segunda Harmonização ... 45

Grupos focais ... 46

Workshop com pesquisadora responsável pelo instrumento original... 49

Terceira Harmonização ... 51 Revisão de texto ... 51 Estudo piloto ... 51 Validação ... 53 Análise de Dados ... 55 RESULTADOS ... 57

Artigo 1. Recovery Self-Assessment’s (RSA-R) cultural adaptation for Brazilian context: Analysis of the methodological process ... 58

(13)

Artigo 3: Avaliação das propriedades psicométricas da versão para trabalhadores do instrumento

Recovery Self-Assessment (RSA-R) para o contexto brasileiro ... 102

DISCUSSÃO GERAL ... 129 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ... 136 APÊNDICES ... 147 Apêndice 1 ... 147 Apêndice 2 ... 150 Apêndice 3 ... 151 Apêndice 4 ... 153 Apêndice 5 ... 155 Apêndice 6 ... 157 Apêndice 7 ... 171 Apêndice 8 ... 173 ANEXOS ... 178 Anexo 1 ... 178 Anexo 2 ... 179 Anexo 3 ... 180 Anexo 4 ... 183

(14)

APRESENTAÇÃO

A presente tese de doutorado, se insere na área de Política, Planejamento e Gestão em Saúde, e na linha de pesquisa Saúde Coletiva e Saúde Mental. Forma parte de um projeto maior - Recovery: Instrumentos para sua aferição na realidade brasileira – e visa contribuir para a qualificação das avaliações de serviços de saúde mental no Brasil.

O projeto teve início em 2015, com a consolidação da parceria entre o Grupo de Pesquisa Interfaces: Saúde Coletiva e Saúde Mental com o Program for Recovery and Community Health (PRCH), da Universidade de Yale. Alguns anos antes, o Grupo Interfaces já realizava estudos e discussões sobre o tema do Recovery, visando aproximá-lo das perspectivas de Reabilitação Psicossocial e dos modelos de atenção em saúde mental no Brasil.

Dentro do projeto, estão contemplados quatro estudos que tem como objeto de trabalho um instrumento de avaliação de serviços de saúde mental desenvolvido pelo PRCH, o Recovery Self-Assessment (RSA). Os estudos objetivam, em seu conjunto, adaptar e validar para o contexto brasileiro as quatro versões do instrumento - versões usuários, familiares, trabalhadores e gestores de serviços de saúde mental.

A pesquisa aqui apresentada tem como foco a versão dos trabalhadores do RSA.

Na Introdução, os desafios do modelo de atenção em saúde mental no Brasil são brevemente contextualizados, enfatizando-se a tendência à institucionalização das práticas, mesmo nos serviços substitutivos, e a necessidade de avaliações consistentes do sistema. São abordados nesse primeiro capítulo: o conceito de Recovery e suas implicações para as práticas nos serviços; algumas das abordagens sobre avaliação de serviços e programas; instrumentos de avaliação em saúde mental e sua relação com pesquisas transculturais; apresentação do instrumento RSA; particularidades do trabalho em saúde mental.

Após a apresentação dos Objetivos, os Métodos utilizados na pesquisa são descritos. Os procedimentos metodológicos são apresentados de acordo com sua fundamentação na literatura de adaptação transcultural e validação de instrumentos.

(15)

A tese está estruturada no formato alternativo, em que os Resultados são apresentados em artigos, e pretendem responder aos objetivos específicos do trabalho.

O Artigo 1 faz uma discussão metodológica do processo de adaptação transcultural do RSA-R, apontando os principais desafios encontrados, em especial devido às características socioculturais da população-alvo, e as estratégias buscadas para responder a eles.

No Artigo 2 são apresentados os resultados do processo de adaptação transcultural da versão para trabalhadores do RSA-R. São apresentadas e discutidas as principais modificações realizadas em cada uma das etapas, as limitações encontradas, e as características da versão final do instrumento adaptado à realidade brasileira.

O Artigo 3 refere-se aos resultados do processo de validação, a partir de avaliação das propriedades psicométricas, do instrumento para o contexto brasileiro. São discutidas potencialidades e limitações do estudo, também à luz de outras pesquisas de avaliação de confiabilidade e validade do RSA em outros contextos. Algumas recomendações são apresentadas, com vistas ao aprimoramento da validação do instrumento para o Brasil.

Finalmente, na Discussão, são retomados os principais aspectos discutidos nos artigos, considerando o panorama do sistema de atenção em saúde mental no Brasil e as necessidades que se impõem para sua avaliação e qualificação.

(16)

INTRODUÇÃO

A Reforma Psiquiátrica é um processo histórico que compreende tanto uma abordagem crítica de questionamento do modelo de assistência psiquiátrica clássico e seu paradigma, quanto uma abordagem prática que objetiva a elaboração de propostas de transformação desse modelo. No Brasil, esse movimento, iniciado na década de 1970 e baseado na perspectiva da Reabilitação Psicossocial, produziu uma série de transformações que levaram à consolidação de mudanças concretas na estrutura de atenção em saúde mental (1,2). Essa reformulação propõe o desafio de cuidar dos problemas de saúde mental na sociedade, e possibilitar a manutenção e reconstrução de laços afetivos e projetos de vida dos sujeitos em questão (3–5).

Assim, o movimento da Reforma Psiquiátrica levou o país a assumir legalmente a mudança do sistema de atenção em saúde mental. Diretrizes como a Lei n. 10.216 da Reforma Psiquiátrica, a publicação da Portaria 336/02 e a realização da III Conferência Nacional de Saúde Mental, contribuíram para a progressiva inversão do financiamento na área, priorizando os equipamentos substitutivos em detrimento dos hospitais psiquiátricos (6,7). Ainda que se considere o financiamento insuficiente, dada a grande demanda de assistência e as especificidades de cada contexto regional do país, experiências têm revelado que o modelo de serviços comunitários, de atenção à crise e reabilitação psicossocial fora dos muros do manicômio é efetivo (5,8).

Tal modelo de atenção pauta-se, assim, na desinstitucionalização dos serviços e de suas práticas, o que implica direcionar a construção das ações com os usuários, para a promoção de autonomia e protagonismo. Mesmo reconhecendo os avanços no contexto brasileiro, ainda há muitos desafios a serem superados para a qualificação do cuidado em saúde mental e de seus resultados.

Um desses desafios é a exigência de efetivação de mudanças no modelo de atenção, de modo a torná-lo de fato coerente com as necessidades e desejos dos usuários e familiares. Ainda que a perspectiva da Reabilitação Psicossocial tenha esses como seus princípios éticos, o cotidiano dos serviços revela limitações para sua concretização: abordagens mais tuteladas pelos profissionais e menos orientadas para a autonomia dos usuários (9); centralidade do tratamento no diagnóstico e na redução da sintomatologia psiquiátrica pela via da medicalização (10,11); fragmentação das ações de cuidado, que deveriam envolver maior articulação em rede de serviços e programas (12); projetos terapêuticos muito

(17)

restritos aos serviços aos quais os usuários são vinculados, resultando em pouco planejamento direcionado à superação da institucionalização (13). Tais aspectos estão fortemente relacionados com a estrutura social, econômica e cultural brasileira (12).

A partir dessas problematizações, estudos têm se debruçado sobre as relações (semelhanças, divergências e possibilidades mais concretas de aproximação) entre as perspectivas da Reabilitação Psicossocial e de Recovery (9,12,14), aventando a possibilidade de contribuições advindas da utilização da proposta do Recovery na realidade brasileira.

Os princípios do Recovery têm sido internacionalmente aplicados e recomendados para o desenvolvimento e investimento em políticas públicas na área de saúde mental (15,16), sendo essa uma das razões que tem nos levado a aprofundar o diálogo entre essa abordagem e a da tradição brasileira.

O conceito de Recovery

A perspectiva de Recovery pode ser compreendida como um processo de resgate ou reconstrução de sentidos para a vida, independentemente dos sintomas de um transtorno mental, enfatizando a legitimidade do lugar das pessoas com esse tipo de experiência na sociedade (17–20). Pode também ser descrito como:

...um processo profundamente pessoal e único de mudar atitudes, valores, sentimentos, objetivos, habilidades e/ou papéis. É uma maneira de viver uma vida satisfatória, esperançosa e construtiva mesmo considerando as limitações causadas pela doença. Recovery envolve a construção de novos significados e propósitos para a vida, na medida em que a pessoa se desenvolve para além dos efeitos catastróficos de doença mental (tradução livre) (19).

Essencialmente, trata-se de uma concepção que rompe com o estatuto de progressiva deteriorização tradicionalmente atribuído a transtornos mentais graves, especialmente a esquizofrenia (21,22). Mesmo modelos que consideram o papel do contexto social na esquizofrenia, para além de uma disfunção neurobiológica isoladamente, não conseguem suficientemente responder à questão de como as pessoas podem ter mais ou menos sucesso em manejar seu próprio processo de adoecimento. Na verdade, o que todos esses modelos teriam em comum é a compreensão de que pessoas com esquizofrenia não podem se “recuperar” dessa

(18)

condição, seja completa ou parcialmente, seja qual for a definição de “recuperação” (21).

Essa visão, fundamentalmente baseada na concepção kraepeliniana de esquizofrenia, tradicionalmente levou a estratégias de atenção em saúde mental que reproduzem a segregação e a exclusão das pessoas com transtornos mentais, tanto em relação a uma inserção social mais ampla, quanto às decisões sobre seu próprio tratamento/cuidado (21).

Como uma reação a essas concepções de doença mental, que alijam as pessoas mais interessadas do processo de lidar com sua experiência, surgem movimentos, como o Consumer/Survivor Movement1, e outros movimentos de pessoas com transtornos mentais, que passam a reivindicar formas não paternalistas, dentre outros aspectos, de compreensão dessas experiências. Esses movimentos passaram a se unir em torno de uma rubrica em comum, o Recovery (21,22).

Assim, o conceito de Recovery surge no cenário internacional (especialmente nos EUA e alguns países da Europa) nas décadas de 1960 e 1970, a partir das consequências dos processos de desinstitucionalização das concepções e práticas de atenção em saúde mental. Com a necessidade de implantação de novos serviços, passou-se a ter que lidar com os desafios de acessar e compreender quais são as reais necessidades das pessoas com transtornos mentais. Fora dos hospitais, outras necessidades, além do alívio ou remissão de sintomas, começavam a aparecer (19,22). Nesse período, os ideais de autoajuda começavam a se popularizar e, no caso da saúde mental, se conjugaram à perda de confiança nos profissionais de saúde, impulsionando a prestação de serviços comunitários e a promoção de estratégias para redução do estigma (22).

De acordo com Anthony (19), os princípios do Recovery surgem em consonância com os da Reabilitação Psiquiátrica, que visa o olhar de cuidado não apenas para a doença, mas para as consequências e impactos mais amplos que ela acarreta. Esses impactos negativos vão desde elementos considerados sintomas tradicionais de um adoecimento, como alucinações, delírios, passando por dificuldades com habilidades sociais ou para o trabalho/estudos, até desemprego,

1 Movimento de usuários (ou consumidores)/sobreviventes (tradução livre). O termo “sobreviventes” refere-se a

ao fato de serem essas pessoas sobreviventes do tratamento psiquiátrico tradicional, que muito frequentemente envolve internações e outras estratégias involuntárias, e que agora se envolvem na mudança desse sistema (Davidson, 2003).

(19)

ausência de moradia, discriminação e pobreza. Assim, o processo de Recovery em saúde mental envolve muito mais do que a recuperação da doença em si. É uma trajetória também contra o estigma (da sociedade e o introjetado em cada um), contra os efeitos iatrogênicos dos tratamentos, muitas vezes contra o desemprego, ou a falta de outras oportunidades de inserção social (19,22).

É importante enfatizar que o termo Recovery se refere a um processo que as pessoas com transtornos mentais fazem, ou podem fazer. Propostas de tratamento e reabilitação, condução e manejo dos casos são atribuições das equipes e dos serviços de saúde para facilitar esse processo individual que é o Recovery (18,19,22,23).

Nesse sentido, diversos já são os esforços para incentivar e promover práticas orientadas para Recovery nos sistemas de saúde em diversos países (18,20,23,24). Tondora et al. (20), elencam alguns importantes relatórios que refletem a emergência da perspectiva de Recovery como norteadora da organização de sistemas de saúde mental pelo mundo. O International Review of Psychiatry de 2012 é um deles, que traz atualizações sobre o desenvolvimento de pesquisa e prática em Recovery na Austria, Austrália, Canadá, Inglaterra, Hong Kong, Israel, Nova Zelândia, Escócia e Estados Unidos. Em outro documento, uma revisão sobre desenvolvimento de políticas públicas, de 2011, foram identificados 30 documentos governamentais direcionando a atenção em saúde mental para a abordagem de Recovery em países de língua inglesa (20).

A partir de estudos acessados da área, podemos identificar algumas das principais diretrizes para práticas profissionais, ou serviços orientados pela perspectiva de Recovery, de modo a facilitar esse processo para as pessoas com transtornos mentais (18,20,25):

- Auto-determinação e inclusão comunitária como direitos humanos fundamentais. Isso implica, por exemplo, que as pessoas não precisam estar clinicamente estáveis, assintomáticas ou abstinentes para então receberem apoio para realização de seus objetivos de vida (como trabalhar, estudar, etc.). Para a perspectiva de recovery, menos importante é a estabilidade clínica, ou a manutenção de determinados objetivos, do que a conquista de uma vida significativa na comunidade. Da mesma forma, é importante compreender as recaídas e crises como parte do processo de recovery.

(20)

estar cientes e ser ativas no processo de planejamento de seu próprio tratamento. Os objetivos do tratamento devem refletir os valores dos indivíduos, e as intervenções propostas devem estar direcionadas a ajuda-los a alcançar essas metas pessoais. Os serviços de saúde devem trabalhar com a concepção de que as pessoas são (ou serão, no caso de estarem em crise) responsáveis por suas vidas, de modo que os profissionais devem apoiá-las a desenvolver e usar habilidades de autogestão. No sentido da promoção de protagonismo e empoderamento, a maior quantidade de informações sobre tratamento e outros recursos (dentro e fora da área da saúde) para lidar com a experiência de adoecimento deve ser disponibilizada pelos serviços para seus usuários. Nessa direção, a possibilidade de o usuário trocar de equipe ou de serviço, e mesmo sua participação em processos de avaliação dos serviços, devem ser legitimados e incentivados pelos profissionais. - Valores culturais respeitados e apoiados pelos profissionais. O diálogo com comunidades religiosas, por exemplo, pode ser uma função necessária aos profissionais dos serviços, na medida em que isso tenha importância na vida dos usuários e, portanto, no seu processo de recovery.

- Desenvolvimento de relações colaborativas e de confiança entre pessoas em acompanhamento no serviço e profissionais. É importante que os profissionais se interessem ativamente pelo cotidiano das pessoas que atendem, de modo a ajuda-las a identificar e explorar formas a partir das quais suas vidas podem melhorar. Nessa relação, as pessoas devem ser consideradas sem julgamentos em relação a seus desejos e objetivos de vida, e encorajadas a “pensar grande” em seu processo de recovery. Esse tipo de relação também implica que os profissionais estejam abertos a aprender e mudar com os usuários (e não apenas o contrário).

- Linguagem utilizada nos serviços deve refletir os princípios do recovery. Nesse sentido, classificações genéricas e nomenclaturas não acessíveis ao público leigo devem ser evitadas e substituídas por descrições objetivas de como as questões (sintomas, diagnósticos, medicações, resultados de exames, etc) impactam na vida das pessoas.

- Planos de tratamento devem se basear nos potenciais dos indivíduos e na valorização de sua experiência pessoal. Todo o planejamento deve se direcionar a identificar as habilidades pessoais relevantes para os objetivos pensados.

- Ênfase e incentivo a atividades e relações na comunidade. Profissionais devem ajudar os usuários dos serviços a se (re)conectar com sua comunidade, de modo a

(21)

não reproduzir a dependência a serviços ou recursos segregados da vida social. Pessoas do círculo social dos usuários que possam ser apoiadores no processo de tratamento podem ser convidadas a participar com eles do planejamento do projeto terapêutico. Da mesma forma, ajudar as pessoas a retribuir e contribuir com sua comunidade (trabalho voluntário, cuidados com outras pessoas ou animais, etc.) pode ser também uma função dos profissionais.

- Assumir riscos de forma responsável como parte do recovery. Assumir alguns riscos ou desafios deve ser algo apoiado por profissionais, sem penalidades ou retaliações aos usuários. Esse tipo de condução do plano de tratamento implica a construção participativa com os usuários de como os profissionais, e/ou outras pessoas envolvidas no acompanhamento podem intervir na ocorrência de uma crise. Devem ser diferenciados os riscos “positivos” (desafios que levam ao crescimento pessoal e desenvolvimento), que devem ser incentivados, daqueles “prejudiciais” (como atitudes ilegais ou não sancionadas socialmente), que precisam ser evitados. Como exemplo destas ocasiões em que é aconselhável assumir riscos na negociação do plano de tratamento, pode-se citar a restrição ou recusa ao uso de medicações pelo usuário (exceto em situações limitantes).

- Apoio a relações com pares. Pessoas com experiência pessoal com transtornos mentais (pares) podem contribuir diretamente para o processo de recovery de outras pessoas. O envolvimento de pares (peers support) nos serviços de saúde mental, formal ou informalmente, tem sido muito incentivado internacionalmente em serviços orientados para o recovery.

- Construção de sentido para a experiência de adoecimento. A perspectiva de recovery distingue claramente os conceitos de experiência com a doença, e a doença em si, com o consequente foco na pessoa e sua experiência, e não na doença. Nesse sentido, é importante que os profissionais auxiliem os usuários dos serviços a identificar e construir sentidos e significados para suas experiências. Assim, o conhecimento dos profissionais sobre diagnósticos é muito importante, e deve ser compartilhado; mas deve ser oferecido como um recurso para o usuário, e não a única e definitiva resposta.

- Medicação como um recurso no processo de recovery, dentre vários. O uso de medicação, para algumas pessoas ou em alguns momentos da vida, é importante e deve estar disponível. No entanto, não deve ser função dos serviços garantir que as pessoas tomem medicação, seja como for. A função dos serviços e das equipes

(22)

deve ser a de promover recovery, o que pode ocorrer com ou sem medicação. Os profissionais podem ajudar na tomada de decisão dos usuários, quanto a tomar ou não medicação, compartilhando informações e garantindo espaço de diálogo sobre o tema.

- Manejo de situações de crise de acordo com princípios de recovery. O tratamento involuntário ou compulsório pode ser necessário em algumas circunstâncias, quando outras opções foram esgotadas. Quando alguém se coloca, ou coloca a outras pessoas em risco, é importante que a equipe do serviço de saúde intervenha. Entretanto, alguns aspectos devem ser considerados e garantidos a médio e longo prazo, a partir da perspectiva de recovery. Estratégias de prevenção à crise, recursos para auxiliar os usuários a minimizar a perda de responsabilidade que pode ocorrer durante um momento de crise, ajudar e apoiar os usuários a reconhecer e sustentar a própria identidade nos momentos durante e pós crise, devem ser também objetivos das equipes de saúde.

Avaliação de serviços e programas

No contexto das políticas públicas em saúde mental no Brasil, outro desafio imposto é a necessidade de avaliação efetiva do modelo de atenção e das práticas realizadas nos serviços. Mais de vinte anos após o início da implementação de uma rede especializada de serviços de saúde mental comunitários, o país ainda carece de indicadores que sejam capazes de capturar os diferentes graus de desenvolvimento desses serviços, sendo escassos os estudos brasileiros que avaliam resultados de maneira consistente (26,27). Ou seja, sabemos que o Brasil investiu em políticas públicas, não ignorando que esse investimento ainda é insuficiente, mas não temos indicadores satisfatórios para avaliar essas práticas. É

imperativo construirmos parâmetros para embasar as mudanças que

compreendemos que devem ser feitas.

O planejamento e a avaliação de sistemas de saúde estão relacionados às discussões da qualidade dos serviços como direito básico de saúde, e da concepção de que os processos avaliativos podem levar à consolidação de modelos assistenciais e a mudanças concretas na saúde das pessoas (28,29). Podemos dizer, assim, que o conceito de avaliação está diretamente associado à ideia de ação, à intenção de mudança. Por sua vez, isso implica compreender que a

(23)

aplicação na prática de construtos ou teorias não segue a constância ou linearidade geralmente esperadas. Realizamos avaliações porque nem sempre a transposição do que planejamos para o contexto real tem êxito pleno (30).

A prática abre a teoria ao exterior, questiona-o, apresenta imponderáveis e imprevistos e outras tantas indagações... E por conta desse não saber, dessa dúvida entre o concebido e o implementado, entre o programado e o efetivamente feito é que lançamos mão das mais diversas estratégias para avaliar (30).

O conceito de avaliação de programas públicos surge no cenário mundial após a Segunda Guerra Mundial, a partir da necessidade de determinar e aprimorar as vantagens e custos dos recursos do Estado, situando-se, portanto, no campo das modalidades de intervenção social. No Brasil, a área de avaliação de políticas públicas começa a se desenvolver na década de 1980 (29,31).

Uma das vertentes mais tradicionais da avaliação em saúde é a proposta por Donabedian, que organizou atributos que traduziriam a qualidade da atenção médica nos serviços: eficácia, efetividade, eficiência, otimização, aceitabilidade, legitimidade e equidade. De acordo com o autor, a avaliação seria feita através de etapas de produção: estrutura, processo e resultado. A estrutura corresponderia aos instrumentos e recursos do serviço ou programa, bem como às condições físicas e organizacionais; o processo seria o conjunto de atividades desenvolvidas na relação profissional-usuários; resultados refere-se a mudanças no estado de saúde dos usuários, nos seus conhecimentos e comportamentos, que possam ser atribuídas à sua inserção e acompanhamento no serviço ou programa, além dos graus de satisfação com o cuidado recebido (28,29,31,32).

Ainda que esse modelo se mantenha como um importante referencial para o campo da avaliação, a complexidade das investigações e dos focos das ações de saúde tem demandado a incorporação de outros instrumentais para avaliação. A ampliação da discussão sobre determinantes de saúde, com o diálogo entre o biológico e o social, por exemplo, estimularam novas formas de compreender os fenômenos saúde e doença. A constatação de que, na prática, não há necessariamente homogeneidade e ordem em uma relação funcional entre os componentes da tríade (estrutura, processo e resultado), além da baixa especificidade dos conceitos em sua aplicação concreta, são outros fatores que contribuem para discussões sobre as limitações do modelo. As pesquisas em saúde, acompanhando esse desenvolvimento, ultrapassaram a avaliação de técnicas ou

(24)

procedimentos isolados, e passaram a integrar outros referenciais científicos, como abordagens que enfatizam a pertinência social de ações de saúde (28,31,32).

Assim, novos formatos de avaliação de serviços e programas começam a ser aventados, como sua integração à organização mais concreta do serviço em questão, a transdisciplinaridade, e um caráter progressivo da avaliação, que propõe o envolvimento de toda a equipe de trabalho e outros interessados, e não somente

experts em avaliação (28,33–35). A posição dos atores sociais envolvidos na

avaliação influencia a própria definição de qualidade e a pertinência de determinados critérios em detrimento de outros (31).

Uchimura e Bosi (31) lembram que o campo da avaliação de serviços e programas tem em sua origem e tradição os pressupostos da ciência positivista, privilegiando-se os dados quantitativos e a medição estatística como única forma de valorar os fenômenos, além de ter como objetivo primordial confirmar ou não relações de causalidade entre ações de um serviço e determinados resultados. Não obstante, o paradigma positivista tem sido gradativamente questionado, a partir da compreensão de que a avaliação de serviços deixou de ser considerada um processo exclusivamente técnico, já se admitindo o componente subjetividade em qualquer tipo de avaliação. Mesmo autores como Donabedian, em publicações tardias, indicam a relevância da subjetividade na análise de qualidade de serviços e programas, mesmo que isso não resulte em rompimento com a objetividade das medições quantitativas (31).

Nessa perspectiva, a qualidade em saúde se refere à relação entre meios e fins, em que os meios compreendem o conjunto das estratégias técnicas, psicológicas e sociais de intervenção (31).

O pressuposto é o de que em uma mesma realidade emergem aspectos objetivos e subjetivos. As subjetividades são, portanto, inerentes a qualquer objeto de pesquisas avaliativas, que deve ser compreendido também em um caráter processual, uma vez que a avaliação interfere e modifica o próprio objeto avaliado (36).

Assim, aspectos como subjetividade e cultura são inerentes a qualquer processo avaliativo (incluindo o próprio objeto a ser avaliado), e devem, portanto ser considerados e analisados, mesmo em avaliações que utilizam primordialmente dados quantitativos, como é o caso do instrumento alvo deste estudo.

(25)

De acordo com alguns autores, podemos inserir o instrumento de avaliação em questão neste estudo no campo da avaliação para gestão, dentro do espectro da avaliação de programas (29). Esse tipo de avaliação tem como objetivo principal a produção de conteúdo informativo para a qualificação de determinado objeto ou condição. A participação de avaliadores internos aos programas ou serviços é necessária, e o enfoque é na tradução da caracterização de uma condição em medidas quantificáveis e replicáveis. São utilizadas primordialmente metodologias quantitativas, em que os desenhos gerais são construídos a partir de medidas representativas de uma totalidade. Os produtos da avaliação são direcionados para o desenvolvimento e aprimoramento de indicadores para o desempenho do objeto avaliado.

Instrumentos de avaliação em saúde mental – o Recovery Self-Assessment (RSA)

A perspectiva do Recovery tem se consolidado internacionalmente também enquanto construto de instrumentos avaliativos em saúde mental (37,38), sendo uma via para construção de indicadores. O aprofundamento e atualização dos estudos acerca de medidas de avaliação de sistemas/serviços de saúde mental, tem nos possibilitado a aproximação com grupos de pesquisa que já possuem um caminho percorrido, não apenas em relação ao campo dos instrumentos de aferição, como da utilização da perspectiva de Recovery para esse fim. A partir desses diálogos, é possível pensar sobre a utilização de metodologias avaliativas que possam respeitar as singularidades brasileiras, mas também se comparar a padrões internacionais.

Nesse sentido, destacamos a relevância dos estudos transculturais na área da saúde mental. Sabemos que se trata de uma área em que a cultura se constitui em fator complexo e determinante em muitos aspectos, e essa influência não é diferente na condução de uma pesquisa (nos conceitos investigados, na linguagem utilizada, nas técnicas de coleta de dados, etc).

Um desafio para as pesquisas transculturais é construir metodologias que contemplem características globais, mas que sejam culturalmente sensíveis e válidas, permitindo a utilização de conceitos relevantes e consolidados internacionalmente de forma equivalente em diferentes culturas (39). Nesses estudos, a variação cultural, longe de ser um problema, deve ser um elemento de

(26)

análise para qualificação dos resultados. Assim, no caso de investigações sobre avaliação em saúde, a abordagem transcultural deve também contribuir para o aprimoramento da qualidade da assistência nos diferentes contextos envolvidos (contexto de origem e contexto alvo), como parte de um efeito de “fertilização cruzada” (12).

Pesquisas transculturais podem ser desenvolvidas tanto para explorar uma mesma questão em diferentes culturas, como para medir diferenças entre culturas. Para qualquer um dos objetivos, é necessário um mesmo instrumento para as culturas em questão (40).

Sobre os aspectos transculturais em instrumentos de avaliação em saúde mental, Hungerbühler e Wang (39) argumentam que construir uma nova medida especificamente para a cultura-alvo é um processo árduo e longo, além de dificultar a análise dos resultados a partir de comparação com pesquisas sobre a mesma temática em outro contexto. Por isso, vários autores recomendam adaptar um instrumento já existente quando não há um instrumento próprio para a cultura em questão, ou universalmente válido (39–42).

No Brasil, há instrumentos validados de avaliação de serviços e aspectos relacionados aos resultados do tratamento e do trabalho em saúde mental (35,43,44). Não foram encontrados, entretanto, instrumentos adaptados à realidade brasileira que utilizem o construto do recovery especificamente para avaliação de serviços2.

O Recovery Self-Assessment (RSA) é um instrumento autoaplicável, desenvolvido pelo Program for Recovery and Community Health (PRCH), da Universidade de Yale, nos Estados Unidos, que tem como objetivo avaliar os graus em que serviços e programas de saúde mental estão orientados para o recovery, a partir de quatro grupos de interesse (usuários, familiares, trabalhadores e gestores) (45). Os autores pretenderam ir além da retórica do conceito de Recovery, e operacionar seus princípios em critérios e práticas que pudessem ser observáveis, medidos e, a partir disso, oferecer feedbacks que possibilitassem a utilização das informações produzidas para qualificação da atenção em saúde mental (37).

2 Em estudo recente, Silva et al. (2017) adaptaram e validaram para o contexto brasileiro o Recovery

Assessment Scale (RAS), instrumento que se propõe a aferir a capacidade de “superação” (recovery) das

(27)

O RSA original contém 36 items associados a nove princípios do recovery, identificados através de extensa revisão de literatura e contribuições de pessoas em recovery/usuários de serviços, familiares, profissionais e gestores. Esses princípios são: renovação de esperança e determinação; redefinição do self; incorporação da experiência de adoecimento; envolvimento em atividades significativas; superação do estigma; (re)tomada de controle; empoderamento e cidadania; manejo de sintomas; apoio de outras pessoas. A análise fatorial de componentes principais revelou a existência de cinco fatores, todos apresentando coeficientes de consistência interna de bom a excelente: Metas de Vida (11 itens), Envolvimento (8 itens), Diversidade de Opções de Tratamento (6 itens), Escolhas (6 itens), Serviços Personalizados (5 itens) (37,45).

Os grupos de interesse (usuários/pessoas em recovery, familiares e amigos de usuários, membros de grupos minoritários étnico e raciais, profissionais, pesquisadores, apoiadores/denfensores e gestores) participaram ativamente em diversas etapas do desenvolvimento do instrumento, como revisão de literatura e sistematização dos critérios para formulação dos itens, e grupos focais e debates para revisão e qualificação do questionário. O instrumento apresenta uma escala tipo Likert de cinco pontos para todos os itens, que varia entre as opções “discordo fortemente” (strongly disagree) e “concordo fortemente” (strongly agree), além da opção auxiliar “não se aplica” (not applicable) (37).

Posteriormente, o instrumento original passou por uma revisão, dando origem ao RSA-R, que apresenta seis fatores (Metas de Vida, Envolvimento, Diversidade de Opções de Tratamento, Escolhas, Serviços Personalizados e Acolhimento). A versão revisada do grupo de interesse trabalhadores é composta por 32 itens, e possui escala de resposta tipo Likert de cinco pontos, que varia entre as opções “discordo fortemente” (strongly disagree) e “concordo fortemente” (strongly agree), além das opções auxiliares “não se aplica” (not applicable) e “não sei” (don’t know) (46).

A escala original já foi adaptada e validada para outros países (47–49), e as versões revisadas e abreviadas também tem sido difundidas (50,51), sendo já comumente utilizadas em diversos contextos no cenário internacional, em avaliações da assimilação da abordagem do recovery por serviços de saúde mental. O presente trabalho se concentra na versão do grupo de interesse trabalhadores/profissionais de saúde da versão revisada do RSA.

(28)

Trabalhadores de serviços de saúde mental

Um aspecto de extrema relevância para os princípios do Recovery é a ênfase no papel de relações de aliança terapêutica e cooperação entre profissionais e usuários dos serviços no desenvolvimento de seus objetivos de vida, e como preditores de bons resultados no tratamento (52–54). Esse tipo de relação tende a ajudar na redução de sintomas, no aprimoramento de habilidades sociais e funcionais, na promoção de qualidade de vida e no aumento de níveis de satisfação (54). Da mesma forma, intervenções profissionais diretivas ou coercitivas tendem a gerar impactos negativos para as pessoas com transtornos mentais, podendo resultar também em resistência ao tratamento. Ações dessa natureza acontecem quando trabalhadores influenciam usuários a tomar decisões, ou aceitar direcionamentos de intervenções que correspondem muito mais a preferências ou necessidades do profissional. Isso ocorre, por exemplo, quando um profissional incentiva uma pessoa a aceitar prematuramente um desafio para o qual ela não está preparada (52).

Assim, é possível perceber que as ações dos profissionais dos serviços de saúde mental tem relação direta com o processo de Recovery das pessoas, embora seja esse um processo pessoal, como já mencionado. A relevância da discussão sobre o papel dos trabalhadores se dá na medida em que, enquanto referências para as pessoas em sofrimento psíquico, podem agir no sentido de facilitar o Recovery, ou não cumprir essa função, em alguns casos até mesmo prejudicando e minando o processo.

Embora, como já observado, seja crescente a tendência à organização de ações em saúde mental orientadas por princípios como o Recovery, e outras abordagens centradas nas pessoas e em suas experiências de adoecimento, a disseminação desses conceitos ainda é incipiente em muitos contextos, e ainda há barreiras para a efetivação desse tipo de trabalho.

Algumas das dificuldades estão relacionadas a questões estruturais dos serviços e sistemas de saúde, como sobrecarga de demanda para os profissionais, baixos salários e excessiva quantidade de trabalho burocrático (53). Outros entraves tem relação com aspectos do trabalho em equipe, impactos negativos das relações hierárquicas e paradigmas dominantes. Em alguns países, por exemplo,

(29)

profissionais da saúde mental, como enfermeiros, trabalham prioritariamente em serviços hospitalares, onde abordagens e terapêuticas médicas são predominates. De acordo com alguns autores, esse é um aspecto que também impacta diretamente a atuação da equipe, e pode ser outra das razões pelas quais intervenções psicossociais raramente são implementadas nesses locais de tratamento (55). Há ainda desafios relacionados à sensibilização e capacitação de profissionais para a importância do envolvimento ativo dos usuários em seu tratamento, e de abordagens orientadas pelo Recovery (54). Segundo Livingston et al. (2013), essa dificuldade pode ser reforçada pelo fato de não haver evidências robustas indicando que a participação ativa e protagonista dos usuários leva a resultados positivos de saúde mental (56). Na tentativa de superar algumas das barreiras para consolidação de práticas profissionais voltadas para o Recovery, encontramos iniciativas, no cenário internacional, de treinamento, capacitação e qualificação de profissionais de serviços de saúde mental, assim como estudos de avaliação desses projetos (55,57).

No Brasil, os trabalhadores da área de saúde mental exercem, historicamente, papel fundamental na luta pelos direitos das pessoas com transtornos mentais e pela transformação do modelo de atenção. Lembremos que o Movimento dos Trabalhadores em Saúde Mental (MTSM) foi um dos pilares do Movimento de Luta Antimanicomial e de seus desdobramentos para a Reforma Psiquiátrica brasileira (2).

Assim, as conquistas em termos de políticas públicas, priorizando o modelo de atenção comunitária e da Reabilitação Psicossocial, são devidas, em grande medida, à dedicação de profissionais comprometidos com esse trabalho. Entendemos esse fato como positivo, considerando-se os avanços consolidados e a vigilância dos profissionais no sentido de garantir acesso e qualidade do tratamento para pessoas com transtornos mentais. No entanto, compreendemos também que esse protagonismo e centralidade do papel dos trabalhadores, tanto nos movimentos em prol da qualificação da atenção quanto no cotidiano dos serviços, tem relação com características da sociedade brasileira que limitam fortemente o exercício efetivo da cidadania por grande parte da população. Os altos índices de desigualdade social e econômica do país acarretam que os serviços públicos de saúde sejam utilizados, fundamentalmente, pela classe trabalhadora (em detrimento de uma assimilação de fato universal), que possui menos recursos para uma organização mais autônoma (58). Os usuários e familiares dos serviços ainda

(30)

desempenham insuficientemente o controle social e a reivindicação de seus direitos relativos à qualidade da atenção.

Dessa forma, encontramos no cenário brasileiro que os profissionais engajados com a saúde mental se identificam com o trabalho, tomando muitas vezes para si a responsabilidade por mudar a realidade (não apenas de adoecimento, mas social) das pessoas com transtornos mentais. Agrega-se a isso o fato de a clínica em saúde mental não possuir, em sua essência, protocolos pré-estabelecidos consensuais para a execução do trabalho, como ocorre em outras áreas da saúde (59). O trabalho clínico ocorre muito mais a partir do contato com as experiências subjetivas e necessidades dos indivíduos atendidos, o que possibilita maior abertura para sensibilização e criatividade na condução dos projetos terapêuticos (60,61). Nesse contexto, muitos trabalhadores da saúde mental tendem a criar soluções inovadoras junto aos usuários, de modo a facilitar sua inserção na sociedade enquanto cidadãos (14,62), aproximando-se dos conceitos de inteligência prática e sabedoria prática, de Dejours (63).

Embora seja necessário considerar as diferenças sociais e culturais, uma tendência centralizadora e diretiva dos profissionais em relação ao acompanhamento dos usuários é identificada também em outros contextos. Estudo de Osborn e Stein (2016) com trabalhadores nos EUA, revelou associação positiva entre intervenções mais diretivas e satisfação pessoal e profissional. Uma hipótese discutida pelos autores, é de que pode haver uma percepção de que esse tipo de intervenção reflete maior engajamento e competência profissional, também influenciada por uma tradicional crença dos usuários de que os trabalhadores sabem avaliar melhor a eficácia e pertinência das intervenções, devido à sua expertise e experiência (52).

Reconhecemos, portanto, a importância que a centralidade nos serviços e nos trabalhadores tem para os usuários brasileiros, que em geral trazem consigo marcas profundas da falta de acesso a uma série de direitos, aliadas às marcas do adoecimento e do estigma a ele associado. Mas também é necessário reconhecer que, em nome da reabilitação, muitos aspectos são negligenciados. Como já mencionado anteriormente, há uma ênfase excessiva no diagnóstico, na sintomatologia e no recurso, muitas vezes banalizado, a intervenções como tratamento involuntário, contenção física e paternalismo, que revelam o predomínio de um tipo de relação hierárquica entre profissionais e usuários do serviço, em que

(31)

os primeiros prescrevem o que os segundos devem fazer. Os serviços e os trabalhadores muitas vezes sobrepõem concepções teóricas e técnicas terapêuticas às reais necessidades dos usuários, contribuindo para a institucionalização com o preceito de tratar (12,14).

Além disso, não é raro que nos serviços no Brasil coexistam diferentes concepções sobre saúde mental e abordagens de cuidado, por vezes conflitantes. Assim como características que refletem a tradição da Reabilitação Psicossocial ou outras abordagens afins, aspectos como distanciamento de trabalhadores em relação aos interesses dos usuários, isolamento dos núcleos profissionais e desconhecimento da importância de diferentes práticas profissionais, intervenções centradas em tecnologias duras, processo de cuidado reduzido à produção de procedimentos, aparecem com frequência nas equipes de serviços substitutivos (62).

De forma análoga a experiências de outros países, muitas das dificuldades enfrentadas pelas equipes de serviços de saúde mental no Brasil estão relacionadas a questões estruturais de gestão do trabalho, que prioriza a

fragmentação do cuidado em procedimentos isolados, individuais e

descontextualizados da realidade. O excesso de burocracia e de demandas, falta de recursos diversos, precária estrutura física e a imposição da produção de indicadores quantitativos muitas vezes dissociados do processo de cuidado são fatores que impactam o cotidiano de trabalho (61,62).

Além dos efeitos nos resultados em termos de saúde mental dos usuários dos serviços, muitos dos entraves presentes no processo de trabalho traduzem-se também em impactos negativos para os profissionais. A partir de perspectivas como a Psicodinâmica do Trabalho, a subjetividade é reconhecida e se faz presente em todos os âmbitos e hierarquias do trabalho, mesmo quando a tentativa é de silenciá-la ou controlá-silenciá-la (63).

A subjetividade dos trabalhadores é reafirmada pela necessidade de seu controle para que aquilo que foi traçado seja rigorosamente cumprido. Dito de outro modo, sua importância é reconhecida pelo avesso, ou seja, para evitar ao máximo a possibilidade dos trabalhadores criarem obstáculos e desvios na produção. Logo, quanto mais se desce na hierarquia da empresa, menor vai ser a possibilidade de expressão de seus pensamentos e desejos na condução das atividades (63).

(32)

Especificamente no campo da saúde mental, profissionais relatam sobrecarga emocional devido ao objeto de trabalho (lidar com a loucura, com questões subjetivas de outras pessoas). Soma-se a isso a ausência, ou insuficiência, de dispositivos institucionais para cuidados dos profissionais (61).

Nesse sentido, há estudos, na literatura internacional, que indicam que o trabalho com usuários em uma perspectiva orientada pelo Recovery, além de bons resultados para essas pessoas, pode gerar benefícios pessoais e profissionais também para as equipes (52,53).

Portanto, focar este trabalho no segmento trabalhadores torna-se uma tarefa bastante complexa. De um lado, ela deve dar conta da inegável relevância dessas pessoas para a construção e continuidade dos projetos em saúde mental no país. De outro lado, também deve partir da necessidade que tem sido apontada internacionalmente de rever as práticas nos serviços comunitários a fim de torna-los de fato orientados pelas necessidades de seus usuários.

É justamente pelo papel central que os trabalhadores desempenham na atenção em saúde mental que os consideramos peças-chave para o necessário processo de reflexão crítica e avaliação acerca do que tem sido ofertado nos serviços e de como isso corresponde, ou não, às demandas das pessoas atendidas. No contexto brasileiro, a superação da institucionalização das práticas, princípio do Recovery, embora não dependa unicamente dos profissionais, só será alcançada a partir de um trabalho conjunto, que considere a participação ativa desse segmento.

(33)

OBJETIVOS Objetivo Geral

Adaptar culturalmente e validar a versão para trabalhadores do instrumento RSA-R3 (Recovery Self-Assessment) para o contexto brasileiro de

serviços de saúde mental.

Objetivos Específicos

- Descrever e analisar o processo metodológico de adaptação transcultural do instrumento RSA-R (Recovery Self-Assessment), nas versões do usuário, do familiar e do trabalhador, para o contexto brasileiro;

- Adaptar semântica e culturalmente ao português brasileiro a versão para trabalhadores do RSA-R;

- Verificar confiabilidade e validade da versão para trabalhadores do RSA-R no Brasil.

(34)

MÉTODOS

Trata-se de estudo de abordagem quanti-qualitativa, que contempla os processos de tradução, adaptação transcultural para o português brasileiro e validação da versão para trabalhadores do instrumento RSA-R. O estudo foi realizado entre 2016 e 2018.

Desenho do estudo

Estudo que objetivou traduzir, adaptar culturalmente e validar para o contexto brasileiro o instrumento Recovery Self Assessment-RSA, versão dos trabalhadores, que faz parte do projeto Recovery: Instrumentos para sua aferição na realidade brasileira.

Os procedimentos metodológicos seguiram as recomendações de estudos e manuais reconhecidos na literatura para tradução, adaptação cultural e validação, que serão posteriormente citados. Para isso, inicialmente foi realizada revisão da literatura acerca da metodologia quanti-qualitativa de adaptação cultural e validação de instrumentos, a partir da qual delimitamos os estudos mais utilizados na área, e aqueles que responderiam mais precisamente à estrutura do RSA e aos objetivos da pesquisa.

De acordo com alguns autores, não há consenso em relação a muitas questões metodológicas da área, e diferentes técnicas tem sido empregadas na prática (40,64). Entretanto, a partir da revisão de literatura identificamos diretrizes e recomendações mais utilizadas para um trabalho preciso e rigoroso, considerando as características específicas deste estudo.

Um consenso é em relação à insuficiência da tradução para dar conta de especificidades culturais, e mesmo erros de tradução, no processo de adaptação de um instrumento. O principal desafio das pesquisas transculturais é construir metodologias que contemplem uma perspectiva global, cujos construtos mantenham equivalência e capacidade de generalização, mas que sejam também culturalmente válidos. Pretende-se, assim, avaliar os conceitos de forma equivalente, em diferentes culturas. Para alcançar o máximo de equivalência entre o instrumento original e sua versão adaptada, o processo requer rigor em relação a seu planejamento, à preservação do construto que se objetiva avaliar, e à sua validade para a população-alvo. A tradução literal de palavras e frases deve, portanto, ser uma primeira etapa, à qual segue um processo cuidadoso de adaptação cultural,

(35)

que por sua vez deve contemplar outros passos para harmonização e contextualização dos itens do instrumento de acordo com as especificidades locais e da população-alvo (39,65).

Assim, o processo de tradução e adaptação cultural do instrumento contemplou as etapas de Preparação, Tradução, Retrotradução, Primeira Harmonização, Avaliação por especialistas, Segunda Harmonização, Grupos Focais com trabalhadores, Workshop com pesquisadora responsável pelo instrumento original, Terceira Harmonização, Revisão de texto (português), e Estudo Piloto. Após a adaptação cultural, procedemos ao estudo de Validação, para avaliação das propriedades psicométricas, em que foram analisadas as características de confiabilidade e validade. Toda a fase de campo da pesquisa ocorreu no município de Campinas, contando com a participação de trabalhadores de serviços de saúde mental nas etapas dos grupos focais, estudo piloto e validação.

Participantes

Os participantes deste estudo foram trabalhadores de serviços de saúde mental da rede de atenção psicossocial do município de Campinas. Os critérios de inclusão foram: trabalhar no serviço há pelo menos três meses (50,66), desempenhar função no serviço relativa à atividade-fim, e aceitar participar da pesquisa.

Para o recrutamento dos participantes, foi realizado inicialmente contato com a gestão municipal (Coordenação de Saúde Mental de Campinas) e com a gestão da instituição conveniada com a prefeitura para alguns serviços da rede de atenção psicossocial (Serviço de Saúde Dr. Cândido Ferreira). A partir desse contato, que ocorreu na fase de preparação do estudo, os gestores locais das unidades também tomaram conhecimento da pesquisa, e procedemos então à comunicação direta com cada serviço de saúde. Os serviços de saúde contemplados foram CAPS, Centros de Convivência e Cooperativa (Cecos), Núcleos de Oficina e Trabalho (NOT) e Casa das Oficinas, Consultório na Rua4.

Na etapa dos grupos focais, alguns trabalhadores foram recrutados por indicação dos gestores locais; quando não houve indicação, as pesquisadoras

4 Foram incluídos no estudo trabalhadores dos CAPS adulto da cidade (CAPS III e CAPS ad), excluindo os

CAPS infanto-juvenil, pois compreendemos que o RSA tem um foco na clínica para adultos, considerando as particularidades dos serviços voltados para crianças e adolescentes. O NOT e a Casa das Oficinas são serviços da Rede de Atenção Psicossocial de Campinas para geração de trabalho e renda.

(36)

realizaram contato direto com os serviços para recrutamento. Na etapa do estudo piloto, as gestoras de dois CAPS foram contatadas para indicação de trabalhadores. Nenhum participante da fase piloto participou dos grupos focais. Para o estudo de validação, os gestores dos serviços foram contatados pela pesquisadora, que foi às unidades para aplicação do instrumento com os trabalhadores que aceitaram participar da pesquisa. Os trabalhadores que participaram dos grupos focais ou do estudo piloto não participaram da validação.

(37)

Tabela 1: Caracterização dos trabalhadores de serviços de saúde mental de Campinas/SP, participantes da pesquisa realizada entre 2016 e 2018, em cada uma de suas fases, de acordo com profissão, gênero, idade e tempo de serviço na unidade.

Trabalhadores Grupos Focais Trabalhadores Estudo Piloto Trabalhadores Validação Profissão Técnico em Enfermagem 1 4 47 Terapeuta Ocupacional 3 2 31 Fisioterapeuta 1 0 0 Psicólogo(a) 1 1 39 Enfermeiro(a) 1 1 13 Médico(a) 0 0 18 Farmacêutico 0 0 2 Técnico em Farmácia 0 1 1 Assistente Social 0 0 3 Educador(a) Físico 0 0 2 Outra5 0 1 27 Gênero Feminino 6 5 133 Masculino 1 5 47 Outro 0 0 2 Sem resposta - - 1 Idade 18 a 24 anos 6 25 a 30 anos 2 3 36 31 a 36 anos 2 4 59 37 a 42 anos 2 2 37 43 a 48 anos 0 0 21 49 a 54 anos 1 1 13 55 anos ou mais 0 0 10 Sem resposta - - 1 Tempo de serviço 3 meses a 1 ano 0 3 20

>1 ano até 5 anos 6 6 103

>5 anos até 10 anos 0 1 39

>10 anos até 15 anos 1 0 13

>15 anos 0 0 7

Sem resposta - - 1

TOTAL PARTICIPANTES 7 10 183

5 Na categoria “Outra”, entraram as seguintes profissões/ocupações: Monitor, Agente de Ação Social (Redutor de

Referências

Documentos relacionados

considerado sujeito de direito, pois era propriedade do dominus. O trabalho escravo continuava no tempo, de modo indefinido, mais precisamente enquanto o escravo vivesse ou deixasse

For additional support to design options the structural analysis of the Vila Fria bridge was carried out using a 3D structural numerical model using the finite element method by

A assistência da equipe de enfermagem para a pessoa portadora de Diabetes Mellitus deve ser desenvolvida para um processo de educação em saúde que contribua para que a

forficata recém-colhidas foram tratadas com escarificação mecânica, imersão em ácido sulfúrico concentrado durante 5 e 10 minutos, sementes armazenadas na geladeira (3 ± 1

10.11 Treinamento: a empresa vencedora deverá ministrar TREINAMENTO DE OPERAÇÃO gratuito, às equipes responsáveis pela operação do(s) equipamento(s), que o IHB assim

O Patrimônio Histórico, concebido aqui como uma relação entre memória social (CARLAN, 2008, p.82) e soma dos bens culturais, agrega conjuntos de informações,

Idealmente, a melhor comparação para as UC tratadas viria do grupo de UC tratadas, ou seja, o grupo que receberam as ações de EE, mas na situação em que eles não tivessem

3 Mecanismos que visam garantir que o grupo de controle não receba as ações de EE são fundamentais para que a contaminação do grupo de controle não inviabilize a