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A ESTRELLA DA POESIA: IMPRESSÕES DE UMA TRAJETÓRIA

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NIVERSIDADE

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EDERAL DA

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AHIA

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NSTITUTO DE

L

ETRAS

PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM LETRAS E LINGÜÍSTICA

A ESTRELLA DA POESIA: IMPRESSÕES DE UMA

TRAJETÓRIA

por

MAURÍLIO ANTONIO DIAS DE SOUSA

Salvador - BA 2009

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(3)

U

NIVERSIDADE

F

EDERAL DA

B

AHIA

I

NSTITUTO DE

L

ETRAS

PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM LETRAS E LINGÜÍSTICA

A ESTRELLA DA POESIA: IMPRESSÕES DE UMA

TRAJETÓRIA

por

MAURÍLIO ANTONIO DIAS DE SOUSA

Dissertação apresentada ao Programa de Pós-graduação em Letras e Lingüística da Universidade Federal da Bahia – UFBA, como requisito parcial para obtenção do grau de Mestre em Letras – Documentos da Memória Cultural.

Orientadora: Profª. Drª. Maria de Fátima Ribeiro. Co-orientadora: Profª. Drª. Edil Silva Costa.

Salvador - BA 2009

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Biblioteca Reitor Macedo Costa - UFBA

Sousa, Maurílio Antonio Dias de.

A Estrella da Poesia : impressões de uma trajetória / Maurílio Antonio Dias de Sousa. - 2009.

498 f. : il. + anexo.

Orientadora: Profª Drª Maria de Fátima Ribeiro.

Dissertação (mestrado) - Universidade Federal da Bahia, Instituto de Letras, Salvador, 2009.

1. Santos, Manoel Camilo dos, 1905 - 1987. 2. Literatura de cordel - Publicações. . 3. Editores e edição. 4. Editoração. 5. Marketing. 6. Canais de distribuição. I. Ribeiro,

Maria de Fátima. II. Universidade Federal da Bahia. Instituto de Letras. III.Título.

CDD - 398.5 CDU - 398.51

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MAURÍLIO ANTONIO DIAS DE SOUSA

A ESTRELLA DA POESIA: IMPRESSÕES DE UMA TRAJETÓRIA

Dissertação apresentada ao Programa de Pós-graduação em Letras e Linguística da Universidade Federal da Bahia – UFBA, como requisito parcial para obtenção do grau de Mestre em Letras – Documentos da Memória Cultural.

Salvador, 17 de abril de 2009.

Banca Examinadora:

________________________________________________ Profª. Drª. Maria de Fátima Maia Ribeiro (Orientadora-UFBA)

_________________________________________________ Profª. Drª. Edil Silva Costa (Coorientadora-UNEB)

__________________________________________________

Profª. Drª. Maria Cornelia J. Lemaire (Examinadora Externa- Université de Poitieres)

__________________________________________________ Profª. Drª. Rosa Borges dos Santos (Examinadora Interna - UFBA)

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A Doralice Xavier Alcoforado

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AGRADECIMENTOS

Aos meus familiares:

Oriana Fallaci, pela sua inestimável companhia e apoio. Narly Dias, pelo acesso ao Acervo Manoel Camilo dos Santos. Maria do Socorro Dias, plena de conselhos e orientações. José Rolim, pelos cuidados logísticos.

Joselma Dias, pelo seu atento olhar acadêmico lançado enquanto lia este trabalho. Marco Aurélio, porque da sua perspectiva angular saíram sugestões profícuas. Mailton Dias, pela sua distância próxima que sempre me incentivou.

Meus filhos: Mauriângelo, Francismar, Viviane, Camila e Glenda que aguardaram com paciência o retorno do pai.

Às professoras:

Drª Doralice Xavier Alcoforado que pelas mãos me conduziu enquanto forças teve. Drª Maria de Fátima Ribeiro que sabendo me reconduzir, fez-me pelo bom convívio perceber a importância do deslocamento ao refletir sobre a produção cultural.

Drª Edil Silva Costa que em mim fortaleceu a consciência da vitalidade da poesia popular.

Drª Célia Marques Telles e Alicia Duhá Lose que me advertiram sobre os atraentes e sinuosos corredores dos acervos.

Drª Ria Lemaire do Centre de Recherches Latino-Américaines – Archivos-Fonds Raymond Cantel, da Universidade de Poitiers, França pelas valiosas sugestões, orientações e presença no corpo da banca como convidada especial.

A todos os poetas populares e de modo especial: José Alves Sobrinho, Oliveira de Panelas, Zé Laurentino e Antonio da Mulatinha.

Aos mestres de editoração popular e de tipografia a serviço do cordel: José Alves Pontes, ex-proprietário da Tipografia Pontes e seu sobrinho João Pedro.

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popular e de modo especial: Prof. Jairo Rangel, jurista e educador que com presteza preside a Academia Paraibana de Poesia e o Prof. Francisco Diniz, cordelista e embaixador do cordel em suas diversas modalidades e suportes.

A todos os funcionários da Biblioteca do LAEEL (Laboratório de Ensino de Língua e Literatura) da UFCG (Universidade Federal de Campina Grande) pelo acolhedor atendimento.

Ao Programa de Pós-graduação em Letras e Lingüística da UFBA, incluindo professores e demais funcionários.

Aos colegas do PPGL-UFBA /2007, com os quais partilhei esperanças e reflexões interativas.

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“Digo-te em nome das musas E com ordem do eterno: — És o poeta hodierno Que conhece métrica e fusas Que não usas nem abusas Os termos licenciosos E nem os perniciosos (exemplo aos antepósteros) E hás de ser para os pósteros O modelo dos honrosos.”

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RESUMO

Esta dissertação objetiva examinar algumas práticas ocorridas no mercado editorial do cordel no século XX e tecer sobre elas algumas considerações, bem como identificar as estratégias editoriais postas em prática pela casa editorial Tipografia e Folhetaria Santos/ A Estrella da Poesia. Neste sentido, procura-se evidenciar, no decorrer do trabalho a ordem que regia os diversos personagens envolvidos nesse sistema editorial, bem como suas relações de interesses e dependências. Constata o alto grau de concentração das atividades editorias em torno da figura do poeta-editor que ocupando posição central no universo dessas relações produtivas detém um considerável poder de interferir nas diversas etapas da editoração e publicação do cordel. O poeta e editor Manoel Camilo dos Santos, concentrando uma larga experiência no mundo da poesia popular, acompanha, na sua casa editorial, todas as etapas pelas quais passa a publicação do folheto, desde a entrega dos originais até a distribuição do produto numa extensa malha de comercialização em grosso. Esta análise é feita com base nos referenciais oferecidos pelo historiador cultural Roger Chartier que aponta para a obra como objeto histórico de investigação e também nos conceitos inovadores da sociologia cultural legados de Pierre Bourdieu que reflete sobre as relações estruturais entre as leis de funcionamento e as hierarquias de um determinado campo (literário) apontando para as estratégias individuais ou coletivas que essas posições orientam segundo as próprias condições sociais de produção. Por fim, este estudo desmistifica o olhar equivocado que vê na produção popular o “tosco”, o “improvisado” quando aponta para a complexidade das relações de produção no mercado editorial do cordel.

Palavras-chave: Literatura de cordel. Sistema editorial. Editor. Recursos de editoração.

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RÉSUMÉ

Le but de cette dissertation est d’examiner quelques démarches utilisées dans le marché éditorial du cordel au XX siècle et aussi d’identifier les stratégies éditoriales mises en places par la maison éditrice Tipografia e Folheteria Santos/A Estrella da

Poesia. Dans ce sens, on observe ce qui a réglé les plusieurs personnages engagés

dans le système editorial et leurs rapports d’intérêts et de dépendances. On constate le plus haut niveau de concentration des activités editoriales autour du poète-éditeur, qui maintient le pouvoir d’interférer dans les plusieurs étapes de l’éditoration et publication du cordel. Avec une large expérience dans la poésie populaire, le poète et éditeur Manoel Camilo do Santos suit dans sa maison éditoriale toutes les étapes d’une publication d’un livret (folheto), depuis la livraison des originaux jusqu’à la distribution du produit dans une vaste chaîne de commercialisation en gros. Cette analyse est basée sur a) les référentiels indiqués par le historien culturel Roger Chartier qui perçoit l’oeuvre comme objet historique de recherche; et b) également sur les concepts innovateurs de la sociologie culturelle légats de Pierre Bourdieu qui réfléchit sur les rapports structuraux parmi les lois de fonctionement et les hiérarchies d’un secteur littéraire spécifique signalant les stratégies individuelles ou collectives que ces positions orientent d’après les conditions sociales de production. Nous constatons que la production populaire n’est pas “inculte” ou “improvisée”, quand il montre justement la complexité des rapports de production dans le marché éditorial du cordel.

Mots-clé: Littérature de cordel; Système éditorial; Éditeur; Supports d’éditoration;

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LISTA DE MAPAS

MAPA 1 - Mesorregiões geográficas do estado da Paraíba 72 MAPA 2 - Agreste Paraibano – microrregião geográfica 73

MAPA 3 - Rota do Agreste Paraibano. 75

MAPA 4 - Borborema paraibana – Microrregião geográfica 76

MAPA 5 - Rota da Borborema. 78

MAPA 6 - Sertão Paraibano – microrregião geográfica 79

MAPA 7 - Rota do Sertão Paraibano. 81

MAPA 8 - Mata Paraibana – microrregião geográfica 82

MAPA 9 – Rota da Mata 83

MAPA 10 - Conjunto das rotas no estado da Paraíba. 84 MAPA 11 - Região do triângulo literário editorial 122 MAPA 12 – Rede de agentes vinculados à Estrella da Poesia 248

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LISTA DE QUADROS E TABELAS

QUADRO1 - Microrregião da Borborema e Cariri – Seridó Ocidental. 96

QUADRO 2 - Microrregião da Borborema e Cariri – Seridó Oriental. 96

QUADRO 3 - Microrregião do Agreste e o Curimataú – Curimataú Ocidental. 97

QUADRO 4 - Microrregião da Mata: cidade/nível. 98

QUADRO 5 - Microrregião do Agreste: cidade/nível. 98

QUADRO 6 - Microrregião da Borborema: cidade/nível. 98

QUADRO 7 - Microrregião do Sertão: cidade/nível. 99

QUADRO 8 – Tipografias e Folhetarias 150-151 QUADRO 9 – Reedições: ano, edição e exemplar 199-200 QUADRO 10 - Cordéis e preços na década de 40. 269

QUADRO 11 - O valor dos Cordéis no atacado e no varejo (década de 40) 271

QUADRO 12 - O valor dos Cordéis no atacado e no varejo (1954/1959) 272

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LISTA DE FIGURAS E GRÁFICOS

FIGURA 1 - Xerocópia da primeira página do folheto Procissão e Missão

de Frei Damião em Mulungu. 156 FIGURA 2 - Xerocópia da primeira página do folheto Profecia de Frei

Herculano. 157 FIGURA 3 - Xerocópia da primeira página do folheto Peleja de Camilo com

Correia. 158 FIGURA 4 - Primeira página do folheto O Cachorro Tony . 159 FIGURA 5 - Página do cordel-matriz O Farrapo Humano. 166 FIGURA 6 - Primeira e segunda páginas de um manuscrito semilinguado. 168 FIGURA 7 - Primeira página de um manuscrito no formato linguado. 169 FIGURA 8 - Primeira página de um original datilografado. 170 FIGURA 9 - Reedição atual, 2009, de Viagem a São Saruê. 203

FIGURA 10 - Capa do folheto O Valente Sebastião 205 FIGURA 11 - Xerocópia da página 04 do folheto O Monstro do Pageú. 207 FIGURA 12 - Xerocópia da última página do folheto O bom Amigo. 210 FIGURA 13 - Xerocópia da quarta-capa do folheto O Valente Sebastião. 211 FIGURA 14 - Xerocópia da quarta-capa do folheto Descrição da Capital João

Pessoa e o Forte Paraibano. 212

FIGURA 15 - Xerocópia da quarta-capa do folheto O Monstro do Pajeú. 213 FIGURA 16 - Xerocópia da quarta-capa do folheto Nascimento, Vida, Milagres

e Morte de Jesus. 215 FIGURA 17 - Xerocópia da capa do folheto Brinde da Tipografia Santos. 216 FIGURA 18 - Xerocópia da quarta-capa do folheto Brinde da Tipografia Santos 217 FIGURA 19 - Quarta-capa do folheto A Prisioneira do Castelo do Mar. 219

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FIGURA 20 - Xerocópia da página suplementar do folheto História de Juvenal

e Leopoldina. 220 FIGURA 21 - Quarta-capa do folheto O Cachorro Tony, 1ª edição, 1955 221 FIGURA 22 - Xerocópia da página suplementar do folheto O Grande Romance da

Escrava Branca. 222 FIGURA 23 - Xerocópia das páginas suplementares do folheto Os Amantes

Encarcerados. 223 FIGURA 24 - Xerocópia da quarta-capa do folheto O Grande Romance

O Ébrio e Suas Canções. 224 FIGURA 25 - Fotocópia da quarta-capa do folheto Nascimento, Vida, Milagres

e Morte de Jesus. 225 FIGURA 26 - Quarta-capa do folheto A Vida do Pe. Cícero. 226 FIGURA 27 - Xerocópia da quarta-capa do folheto Os Amantes Encarcerados 227 FIGURA 28 - Xerocópia da quarta-capa do folheto O Martírio de Corina 228 FIGURA 29 - Xerocópia da quarta-capa do folheto A Noiva Ressuscitada. 229 FIGURA 30 - Xerocópia da quarta-capa do folheto A Pobre Orfã Egeitada nas

Malhas da Traição. 230 FIGURA 31 - Xerocópia da quarta-capa do folheto O Monstro do Pageú. 231 FIGURA 32 - Quarta-capa do folheto Os Martírios do Amor. 232 FIGURA 33 - Quarta-capa do folheto A Sofredora do Bosque 233 FIGURA 34 - Xerocópia da quarta-capa do folheto São Francisco do Canindé 234 FIGURA 35 - Xerocópia da quarta-capa do folheto Os Que Souberam Se Amar. 235 FIGURA 36 - Xerocópia da quarta-capa do folheto A Virgem da Conceição 239 FIGURA 37 - Xerocópia da quarta-capa do folheto Nascimento, Vida, Milagres

e Morte de Jesus. 240 FIGURA 38 - Xerocópia da quarta-capa do folheto O Grande Romance O Ébrio. 241 FIGURA 39 - Xerocópia da quarta-capa do folheto O Martírio de Corina. 241

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FIGURA 40 - Xerocópia da quarta-capa do folheto A Pobre Orfã Engeitada

Nas Malhas da Traição. 243 FIGURA 41 - Xerocópia da quarta-capa do folheto O Monstro do Pageú. 244 FIGURA 42 - Xerocópia da quarta-capa do folheto A Filha de um Pirata entre a

Espada e a Sorte. 245 FIGURA 43 - Xerocópia da quarta-capa do folheto Peleja de Manoel

Camilo com Antonio Correia 246

FIGURA 44 - Xerocópia da quarta-capa do folheto O Valente Sebastião. 249 FIGURA 45- Xerocópia da quarta-capa do folheto Descrição da Capital João

Pessoa e o Forte Paraibano. 250 FIGURA 46 - Xerocópia da quarta-capa do folheto As Aventuras de Pedro

Quengo. 252 FIGURA 47 - Xerocópia da quarta-capa do folheto História do Viadinho e a

Moça da Floresta. 252

FIGURA 48 - Xerocópia da capa do folheto Paulo e Joaninha 253

FIGURA 49 - Xerocópia da capa do folheto História de Juvenal e Leopoldina 261 FIGURA 50 – Xerocópia da capa do folheto Descrição da Capital João Pessoa

e o Forte Paraibano 264 FIGURA 51 - Xerocópia da capa do folheto Um beato pistoleiro Ou O alejado

da cruz 265

FIGURA 52 – Exemplar da canção As grandezas do Brasil 274 FIGURA 53 - Xerocópia da capa do Almanaque da Estrella da Poesia 275

GRÁFICO 1 – Campo Estético/Campo Mercadológico 196 GRÁFICO 2 – Agentes relacionados ao editor 267

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FOTOS

FOTO 1 - Trecho da entrada de Guarabira na década de 1940. 134 FOTO 2 - Trecho da Avenida D. Pedro II em Guarabira na década de 1940 138 FOTO 3 - Trecho atual da Avenida D. Pedro II em Guarabira. A casa comercial desta foto é a

mesma que se encontra no lado direito (a primeira) da imagem anterior (figura 2) tirada em 1940 139 FOTO 4 – A logomarca da Estrella da Poesia. 148 FOTO 5 - Prensa manual da Tipografia e Folhetaria Santos 154 FOTO 6 - Impressora manual da Tipografia e Folhetaria Santos 161 FOTO 7 - Prensa manual da Estrella da Poesia 161 FOTO 8 - Cavalete da Estrella da Poesia 163 FOTO 9 - Rama tipográfica da Estrella da Poesia 163 FOTO 10 - Impressora de pedal da Estrella da Poesia 173 FOTO 11 - Cartão de apresentação do poeta-editor Manoel Camilo 198 FOTO 12 - Rádio Caturité na década de 1960 237 FOTO 13- Antiga estação ferroviária de Guarabira 255

FOTO 14 - Antiga estação ferroviária de Campina Grande 255

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SUMÁRIO

INTRODUÇÃO 31

PRIMEIRA PARTE: A GEOGRAFIA DO CORDEL NA PARAÍBA 43

CAPÍTULO 1 - CORDEL: NOÇÕES, AMBIGUIDADES E IMPRESSÕES 45

1.1. DESIGNAÇÕES A PARTIR DE UM SUPORTE 45

1.2. CORDEL LUSITANO E CORDEL BRASILEIRO: VÍNCULOS E

AUTONOMIAS 48 1.3. O PROCESSO DE PUBLICAÇÃO NA LITERATURA DE CORDEL:

ELEMENTOS E PROPRIEDADES DE UMA NOVA ORDEM POÉTICA 50 1.3.1. A revolução do impresso: relações e manuseio 52 1.3.2. O folheto: formas de inscrição e de intervenção 55 1.4. TRÂNSITOS E MEMÓRIA ENTRE O CORDEL E A CANTORIA 57

CAPÍTULO 2 - FUNDAÇÕES E ITINERÂNCIAS 63

2.1.SISTEMAS DE PROPAGAÇÃO 63

2.2.AS ROTAS 70

2.2.1. A microrregião Agreste e do Curimataú 73 2.2.2. A microrregião da Borborema e do Cariri 76 2.2.3. A microrregião do Sertão Paraibano 79 2.2.4. A microrregião da Mata Paraibana 82

2.3.ESPAÇOS DE COMERCIALIZAÇÃO DO FOLHETO 87

2.3.1. Os salões 87

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BRASILEIRO 107

3.1. FATORES HISTÓRICOS E CULTURAIS COMO CONDIÇÃO PARA A INSTALAÇÃO DAS TIPOGRAFIAS POPULARES 107 3.2. PRIMEIRA FASE: TIPOGRAFIAS DE JORNAL E TIPOGRAFIAS

NÃO-ESPECIALIZADAS 112 3.3. SEGUNDA FASE: TIPOGRAFIAS ESPECIALIZADAS

OU TIPOGRAFIAS/FOLHETARIAS 114 3.3.1. Primeira geração dos poetas-editores 116 3.3.2. Segunda geração dos poetas-editores 118 3.4. POETAS, EDITORES E ESTABELECIMENTOS EDITORIAIS 119

SEGUNDA PARTE: O ITINERÁRIO POÉTICO-EDITORIAL DE

MANOEL CAMILO DOS SANTOS 123

CAPÍTULO 4 – DO POETA MANOEL CAMILO DOS SANTOS A SUAS

TIPOGRAFIAS/FOLHETARIAS 125 4.1. AS FASES DA CARREIRA DO POETA E EDITOR MANOEL CAMILO

DOS SANTOS 125 4.1.1. A breve experiência do cantador 125 4.1.2. A formação do poeta de bancada 126

4.1.3. O nascimento do editor 131

4.2. AS CASAS EDITORIAS DE MANOEL CAMILO DOS SANTOS 133 4.2.1. Tipografia e Folhetaria Santos em Guarabira 135 4.2.2. Tipografia e Folhetaria Santos em Campina Grande 139

4.2.3. A Estrella da Poesia 142

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SANTOS 153

5.1. APRENDIZADO TIPOGRÁFICO 153

5.2. PRODUÇÃO E AQUISIÇÃO DOS TÍTULOS 174 5.2.1. As modalidades de aquisição dos títulos 176 5.2.2. Formalidades contratuais 180 5.3. NÍVEIS PRODUTIVOS E ARTICULAÇÕES EMPRESARIAIS 184

5.4. CAMPOS E INTERFERÊNCIAS 189

5.5. AS REEDIÇÕES DE TÍTULOS 199

5.6. ILUSTRAÇÕES E CAPAS 204

CAPÍTULO 6 – ATIVIDADE COMERCIAL DE MANOEL CAMILO DOS

SANTOS 209

6.1. ESTRATÉGIAS DE MARKETING 209

6.1.1. As quartas-capas 236

6.1.2. O programa de rádio 236

6.2. REDE DE DISTRIBUIÇÃO DOS FOLHETOS 238

6.3. O REEMBOLSO POSTAL 249

6.4. OS FOLHETEIROS E DEMAIS ATORES RELACIONADOS À

EDITORAÇÃO 256 6.5. ASPECTOS MERCADOLÓGICOS DOS FOLHETOS 268

6.6. LINHA EDITORIAL ALTERNATIVA 273

Considerações finais 277

Referências 283

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(31)

INTRODUÇÃO

A história da editoração na literatura chamada de “cordel” no Nordeste brasileiro está relacionada com a história da imprensa e da indústria gráfica no país e na região. Dessa região brasileira, a Paraíba é o estado focado neste trabalho pelo fato de a casa editorial estudada – Tipografia e Folhetaria Santos/A Estrella da Poesia – ter sido instalada em duas cidades: Guarabira e Campina Grande. Na Paraíba, logo após a fundação do mais antigo jornal – A União –, os poetas populares introduzem-se no mercado editorial do cordel com a publicação progressiva dos seus folhetos, atingindo altos níveis de produção até o final da década de 1950. No alvorecer do século XX já encontramos poetas paraibanos que, na condição de empreendedores do ramo gráfico, produzem e fazem circular por toda a região, a partir de suas próprias casas editoriais, a poesia popular impressa. Daí, então, as tipografias-folhetarias multiplicam-se e com elas o número de agentes envolvidos na produção e comercialização do folheto.

A Literatura de Cordel é a poesia popular que se torna texto tipográfico e, segundo Roger Chartier (1994, p.17), “não há texto fora do suporte que o dá a ler”. Por isso, o folheto de cordel, enquanto suporte, também está submetido, a partir de sua própria materialidade, à dinâmica do processo editorial. Escreveu Moxon (apud Chartier, 1994, p.37) que, entre o gênio criativo do autor e a aptidão do leitor, “uma multiplicidade de operações define o processo de publicação como um processo colaborativo, no qual a materialidade do texto e a textualidade do objeto não podem ser separadas”.

Sendo a literatura, na Idade Moderna e em comunidades letradas, antes de qualquer coisa, um fenômeno gráfico, isto é, de imprensa, foi mediante a impressão dos folhetos, que eram exibidos nas feiras livres ou cantados pelos poetas populares, que tais produtos tornaram-se objetos de compra, veículo de comunicação de massa e suporte mantenedor de uma tradição oral que, com as devidas modificações, torna-se registrada, documentada. O folheto é a poesia popular mediata, ou melhor, mediatizada pelo suporte impresso. É pelo suporte que o poeta popular transpõe o círculo de seus ouvintes imediatos aos quais se dirige no momento da cantoria e passa a ser apreciado

(32)

pelas gerações pósteras. Mas sendo os folhetos de frágil estrutura material e, por conseqüência disso, de breve duração, ficam para a posteridade apenas aqueles folhetos que, intencional e cuidadosamente, são preservados.

Interessa-me aqui o cordel não como conteúdo literário, mas enquanto folheto-suporte, isto é, como elemento do conjunto artístico constituído pela ilustração, pela impressão, pela paginação, pela estrutura material e, enfim, pela dinâmica das relações editoriais que envolve os diversos agentes produtivos desse sistema, sobremaneira o editor. suporte. Na medida em que o gesto poético é também um gesto de comunicação, por intermédio de um impresso, a Literatura de Cordel supõe o folheto e, ao mesmo tempo, é a sua razão de ser. Diferentemente da cantoria, imediata e performática, o cordel é antecedido por um texto original manuscrito ou datilografado que, por sua vez, passará pelo olhar editorial e pelas mãos do tipógrafo que o tornará impresso. Essa clivagem é a marca inconfundível da passagem da poesia popular oral à escrita, da passagem do ofício de cantador para o de poeta de bancada:

Façam o que fizerem, os autores não escrevem livros. Os livros não são de modo nenhum escritos. São manufacturados por escribas e outros artesãos, por mecânicos e outros engenheiros, e por impressoras e outras máquinas (STODDARD apud CHARTIER, 1990, p.126).

No estudo da Literatura de Cordel nordestina, em que pese a crescente importância da contribuição dos trabalhos intelectuais realizados, seja por pesquisadores brasileiros, seja por estrangeiros, persistem ainda consideráveis lacunas por serem devidamente preenchidas, sobretudo quando se trata das relações que envolvem aqueles que são responsáveis pela publicação e comercialização dos cordéis.

Não pretendo aqui resgatar a história da editoração na Literatura de Cordel, obrigo-me, antes de tudo, a deter-me na reconstrução de parte da trajetória da tipografia-folhetaria A Estrella da Poesia, que, por sua vez, está visceralmente ligada às experiências profissionais do seu fundador, o poeta-editor Manoel Camilo dos Santos. Não obstante ele tenha deixado uma grande contribuição para a Literatura de Cordel na condição de

(33)

poeta popular, enfocarei apenas o seu papel de editor não menos importante para a produção e difusão da Literatura de Cordel.

É preciso, entretanto, caracterizar mais precisamente os diversos papéis desempenhados por aqueles que publicaram e comercializaram a Literatura de Cordel, fazendo-se necessário entender como, de fato, ocorria o trabalho de circulação material do folheto. Esse processo de circulação abrangia desde a manipulação dos objetos tipográficos, que lhe serviam de suporte, até a dinâmica da distribuição do folheto no mercado consumidor, passando antes por etapas intermediárias, entre elas as possíveis modificações ou remodelações do texto para a impressão. Sabemos que os editores de cordel adquiriam os direitos de edição de determinados autores e depois publicavam esses folhetos. Mas em quais condições de informalidade ou formalidade isso ocorria? Como se estabeleciam essas relações? Em que grau ocorria a interferência do editor nos originais do autor? Sabemos também que a difusão maciça dos folhetos de cordel, assegurada em parte pelos vendedores ambulantes, foi um mecanismo de relevância comercial. Então, como a folhetaria relacionava-se com os seus vendedores? Quais as estratégias de comercialização usadas pelos poetas para venderem os folhetos tanto nos salões como nas feiras? Havia alguma relação entre o local, o modo de propagação e o tipo de folheto a ser comercializado? O sistema editorial de cordel conseguiu estabelecer uma rede de representantes comerciais exclusivos?

Sendo assim permanecem em aberto indagações mais precisas sobre os diversos e reais papéis desempenhados por aqueles que participaram diretamente do processo de publicação e circulação da literatura popular de cordel, bem como sobre os mecanismos e recursos que compuseram o trabalho de composição, ilustração, impressão e comercialização desses folhetos.

Isto torna-se relevante, no caso aqui a ser estudado, por tratar-se de uma produção editorial do porte da Estrella da Poesia. Esta viveu seu auge editorial justo no período histórico no qual o Nordeste brasileiro orgulhava-se em poder oferecer à cultura popular

(34)

os grandes vates da segunda geração de poetas de bancada. A Estrella da Poesia também os assistiu com os seus préstimos editoriais por quase quatro décadas ininterruptas.

Esses fatores imprimem neste trabalho um caráter inédito, considerando a quase inexistência de produções específicas sobre o tema aqui abordado. Mais ainda, o próprio trabalho cuida de desmistificar o olhar equivocado que vê na produção popular o “tosco”, o “improvisado”, quando aponta para a complexidade das relações de produção no mercado editorial do cordel. Convém ressaltar que embora esse organismo editorial criado tenha as suas próprias normas, não conseguiu escapar das regulações do sistema e do capital e talvez nem o tivesse desejado.

Isto posto, delineia-se como principal objetivo desta dissertação examinar algumas práticas ocorridas no mercado editorial do cordel no século XX e tecer sobre elas algumas considerações, bem como identificar as estratégias editoriais postas em prática pela casa editorial aqui previamente elegida.

Fundamentalmente, este trabalho busca responder a duas questões:

 Qual a ordem que regia as relações estabelecidas entre os diversos agentes produtores do sistema editorial do cordel?

 Quais os mecanismos que dinamizavam a produção e circulação do folheto, desde o trabalho no interior da folhetaria até a sua distribuição e comercialização pelas inúmeras localidades?

Com o objetivo de responder a essas questões dediquei-me à reconstituição da história da Tipografia e Folhetaria Santos/A Estrella da Poesia a partir de várias fontes: das constantes consultas e pesquisas às bibliotecas universitárias e aos centros de cultura popular localizados principalmente no estado da Paraíba, mas devo, sobretudo, ao Acervo Manoel Camilo, que está atualmente sob os cuidados da cordelista e arconte Narli Dias, a possível ordem de leitura feita sob a história da Estrella da Poesia. Sem o acesso a esse acervo não me teria sido possível coligir o catálogo da editora, a relação

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dos títulos reeditados, a relação dos títulos adquiridos pela editora, a seleção dos inéditos, a seleção dos manuscritos originais, a seleção dos documentos da editora, remontar a rede de agências vinculadas à editora e ilustrar essa área de ação no mapa que pontua essas agências no Norte e Nordeste do Brasil e fazer uso das diversas imagens presentes neste trabalho desde as fotos particulares do autor às diversas capas e quartas-capas dos folhetos.

Devido, sobremodo, à carência de fontes bibliográficas sobre o tema, tornou-se para mim indispensável o trabalho de entrevista com os poetas populares e com personalidades ligadas à área de editoração popular. Sem os seus depoimentos eu não conseguiria reconstituir parte da história da editoração do cordel, nem tampouco compreender a lógica das relações que envolveram os agentes ligados a esse sistema editorial. Foi a partir dessa coleta que realizei o trabalho de sistematização das informações das fontes orais que me possibilitaram traçar as rotas ilustrativas sobre os mapas das microrregiões do estado, bem como a construção dos quadros e tabelas, de modo especial o gráfico que ilustra a relação que o editor mantinha com os diversos agentes a ele vinculados. As gravações originalmente feitas em 11 fitas K7 foram posteriormente regravadas em 09 CDs, que contêm os depoimentos dos poetas José Alves Sobrinho, Oliveira de Panelas, Zé Laurentino, Antonio da Mulatinha e o ex-proprietário da Tipografia Pontes José Alves Pontes.

O uso dos mapas das microrregiões do estado da Paraíba tem duas finalidades: primeiro os apresentei separadamente para que ficasse clara as divisões microrregionais no estado, para a partir daí ilustrar as rotas que tracei com o objetivo de indicar os possíveis roteiros seguidos pelos poetas andarilhos. As capas que selecionei, em sua maioria, indicam, pelos diversos endereços deixados nela pelo autor, os diversos deslocamentos realizados intencionalmente pelo proprietário da casa editorial. Por outro lado, as quartas-capas tanto tinham a função de identificar as estratégias de publicidades empregadas poeta-editor como apontar para a rede de representantes comerciais constituída pelo proprietário da tipografia-folhetaria. Constituídos de um catálogo dos folhetos, de uma seleção de títulos reeditados, de uma relação de títulos adquiridos, de uma seleção de títulos inéditos, de alguns originais manuscritos e datiloscritos, de uma

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seleção de documentos da editora, de algumas imagens de capas e quarta-capas de folhetos, de algumas fotos e, por fim, da classificação do acervo estão os anexos, que possibilitam uma possível consulta de dados e imagens referentes à história da Tipografia e Folhetaria Santos/A Estrella da Poesia.

Os documentos do Acervo Manoel Camilo dos Santos (MCS) foram por mim distribuídos em duas coleções que assim nomeei: Coleção Narli Dias de Oliveira (NDO) e Coleção Maurílio Antonio Dias de Sousa (MADS). A primeira coleção é formada da seguinte ordem de documentos: cordéis originais, cordéis-matrizes, cordéis publicados por diversas editoras, cordéis do poeta Manoel Camilo publicados após o fechamento da sua editora, cordéis manuscritos, cordéis datiloscritos, canções publicadas, correspondências pessoais do poeta Manoel Camilo, documentos da editora, diplomas e certificados do poeta, livros da biblioteca do poeta, recortes de jornais com matérias referentes ao poeta, imagens editoriais, fotos, textos em prosa inéditos e cordéis inéditos e uma série de documentos ainda não identificados. A segunda coleção é composta por: cordéis originais, cordéis xerocopiados, cordéis de Manoel Camilo publicados atualmente, zincogravuras, xilogravuras e coletâneas poéticas inéditas. Somam ao todo, até o presente momento, 515 documentos, dos quais 185 são da

Coleção Maurílio Antonio Dias de Sousa (MADS) e 330 da Coleção Narli Dias de Oliveira (NDO), sendo que desta última coleção resta uma gaveta na qual ainda há uma

série de textos que não foram registrados o que levará após o trabalho de classificação a um aumento no número total de documentos.

Iniciei os trabalhos de seleção e classificação dos documentos pela Coleção Narli Dias

de Oliveira (NDO) na qual tomei por base os maços de folhetos enrolados em papel. Foi

só após o trabalho inicial de limpeza dos folhetos que passei a distribuí-los devidamente acondicionados em caixas de papelão nas gavetas dos arquivos. Então, A1-G1-C1 indica tratar-se de documentos que estavam no primeiro maço e foram colocados na primeira caixa (C1), da primeira gaveta (G1) do arquivo 1 (A1). E assim segui.

Para a classificação e seleção dos folhetos adotei o critério cronológico da data de publicação que além de orientar a organização do acervo me possibilitou coligir o

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catálogo da editora. A organização do Acervo Manoel Camilo dos Santos (MCS) produziu no seu próprio interior outras classificações necessárias, tais como:

 Catálogo dos folhetos da editora

 Relação dos títulos do poeta Manoel Camilo que foram reeditados pela sua própria editora

 Relação dos títulos adquiridos de diversos autores pela editora  Relação dos títulos inéditos do poeta Manoel Camilo

 A seleção dos originais manuscritos dos diversos autores vinculados à editora

 A seleção dos originais datiloscritos dos diversos autores vinculados à editora

Como tenciono, num futuro próximo, que o Acervo Manoel Camilo dos Santos (MCS) ofereça um melhor desempenho ao pesquisador, iniciei (e já está bem adiantado) a digitalização de todos os documentos do acervo. Por questões relacionadas ao próprio estado de conservação dos documentos, dei prioridade à digitalização dos folhetos, tanto originais como xerocópias. As viagens que realizei para os estados da Paraíba, Pernambuco, Ceará, Sergipe, Alagoas e Rio Grande do Norte com o objetivo de adquirir novos documentos para a Coleção Maurílio Antonio Dias de Sousa (MADS), bem como a evolução das etapas dos trabalhos de seleção, classificação, datação, catalogação e seus respectivos critérios, foram por mim descritos em textos que permanecem rascunhados numa espécie de diário que intitulei de Memória e Construção de um Acervo.

Com a conclusão da classificação, dei início à preparação dos anexos que acompanham em um volume à parte este trabalho de dissertação e que foram assim distribuídos:

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 Anexo I: Acervo Manoel Camilo dos Santos: classificação e catalogação.  Anexo II: Relação dos títulos reeditados do poeta Manoel Camilo dos Santos  Anexo III: Relação dos títulos adquiridos de diversos autores pela editora  Anexo IV: Títulos inéditos do poeta Manoel Camilo dos Santos

 Anexo V: Originais manuscritos de diversos autores  Anexo VI: Originais datiloscritos de diversos autores  Anexo VII: Catálogo dos folhetos da editora

 Anexo VIII: Capas e Quartas-capas dos folhetos  Anexo IX: Fotos e imagens

 Anexo X: Documentos da editora

Devo reconhecer que este trabalho resgata vivências e relações do passado e que ao serem potencializadas no decorrer dos anos atualizam interesses de outros tempos, em que se manifesta uma notícia de uma crônica enunciada. Além dos depoimentos dos poetas e agentes ligados à Estrella da Poesia, recebi informalmente seguras e fecundas contribuições de três pessoas que mantiveram com o poeta Manoel Camilo, sobremodo a partir da década de 1970, uma estreita relação de convívio e partilhas: Narli Dias, cordelista, parceira de Manoel Camilo nos últimos escritos (inéditos), arconte do acervo, e minha tia; Socorro Dias, minha mãe, irmã de Narli, amiga do poeta naquelas horas em que ele buscava um “ombro amigo”; e, finalmente, José Rolim, meu pai, que em muito colaborou com o poeta na organização prática de sua vida particular nos últimos tempos. Recordo-me bem que um dos primeiros encontros que tive com o grande poeta e editor Manoel Camilo foi precisamente em 1976, entre meus pais, em nosso lar, mas eu com apenas treze anos de idade o entendia mais como o Manoel cordial e amigo da família ou um aparentado. Embora não deixasse de, sempre na sua ausência, resolver com minha mãe, algumas curiosidades minhas sobre ele: – “Mamãe, quem eram essas pessoas que Manoel falou no almoço: Dra. Neuma, Dr. Ariano, Coronel Peregrino, Dr. Lessa?”. – “Onde ficava a gráfica de Manoel?”. – “Manoel

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nasceu em que lugar?” – “A senhora me disse uma vez que o conheceu ainda muito jovem, nessa época ele já escrevia?”. Confesso que ainda hoje não deixei esse hábito e muitas das vezes para elucidar informações históricas contidas nesse trabalho tive que recorrer ao socorro de Socorro, de Narli e de Sr. Rolim. Entre os anos de 1979 e 1982 o meu relacionamento com o poeta estreitou-se. Nesse período, quando já estudava Filosofia em Salvador, muitas das noites dos meus dias de férias, voltando à cidade natal – Campina Grande –, dedicava-as à leitura e às duradouras conversas com o poeta em sua própria residência. Nessas noites o tempo voava e, embevecido pela forte expressão daquele mestre da poesia popular, só percebia a traição do tempo quando meu pai, chegando, dizia num misto de responsabilidade e pressa: – “Maurílio, sua mãe está lhe esperando pra dormir.” Não supunha jamais o jovem que nesse então estava sendo lançada a semente de um futuro trabalho acadêmico. É certo que muitas das coisas ditas naquelas noites longe estão de ser apreendidas pela natureza e objeto desse trabalho e outras frutificam, hoje, num jardim que a mão da escrita ainda não colheu.

Em 2002 decido retomar os estudos de graduação em Letras e nesse mesmo ano defino que os estudos de pós-graduação seriam sobre Literatura de Cordel, mais especificamente sobre o poeta Manoel Camilo dos Santos. A partir de então inicio uma série de viagens anuais ao estado da Paraíba e com elas as anotações, as conversas com familiares, as gravações com os poetas populares, as aquisições de novos documentos para o acervo: hotéis, hospedagens, redes, cafezinhos, sóis, serenos, estradas de barro, caronas, informações, aprendizagens, folhetos, xilogravuras, sonhos, memórias, rascunhos, pré-textos, projetos.

Nesta dissertação foram analisados 15 textos originais entre folhetos manuscritos e datiloscritos, mais de 250 folhetos, de 50 zincogravuras, de 30 xilogravuras, de 50 títulos inéditos, de 750 minutos de gravações realizadas com diversas personalidades da poesia popular, de modo especial com o poeta, pesquisador e escritor José Alves Sobrinho. Adicionem-se a isso mais de 100 documentos entre correspondências do autor e da editora enfocada. Todavia os dados aqui apresentados – sobretudo nos quadros e tabelas e, de modo especial, aqueles que se referem aos aspectos quantitativos produzidos pela Tipografia e Folhetaria Santos/A Estrella da Poesia, tais como os títulos

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do catálogo e as estimativas de tiragens e reedições – devem ser entendidos como amostragem. Digo isso pelo fato de sempre permanecerem bem abaixo dos dados reais, os quais não me foi mais possível resgatar na totalidade.

O resultado escrito das pesquisas realizadas sobre o tema geral abordado está estruturado neste trabalho em duas partes. A primeira divide-se em três capítulos, que tratam de questões gerais referentes à Literatura de Cordel. No primeiro capítulo, faço uma breve retrospectiva sobre alguns pontos mais discutidos por diversos estudiosos da Literatura de Cordel. No segundo, apresento algumas rotas de cantoria e de comercialização do folheto seguidas por alguns dos grandes nomes da poesia popular, sobretudo entre as décadas de 1930 e 1950. No terceiro capítulo pontuo alguns fatores históricos, sociais e culturais que possibilitaram a emergência do sistema editorial do cordel no Brasil à época.

A segunda parte desta dissertação divide-se em quatro capítulos, que se voltam mais propriamente à história da editora Tipografia e Folhetaria Santos/A Estrella da Poesia e conseqüentemente do seu proprietário e poeta-editor: Manoel Camilo dos Santos. No primeiro capítulo apresento as três fases vividas na carreira do editor: a breve passagem pela cantoria, o autodidatismo do poeta de bancada que, entre outros grandes nomes, compôs a segunda geração dos grandes poetas populares nordestinos e o dinâmico editor que se estabelece no ramo gráfico e dele sobrevive durante muitos anos. No segundo capítulo, historio o estabelecimento da Tipografia e Folhetaria Santos, em Guarabira, o mudar-se para Campina Grande, quando muda também de nome e passa a ser chamada A Estrella da Poesia, denominação que brilhou. No terceiro capítulo, trato do dinamismo das atividades editoriais do proprietário e, finalmente, no quarto capítulo, apresento a vitalidade do trabalho de articulação de Manoel Camilo ao tecer uma rede de representantes comerciais espalhada pelo Norte-Nordeste brasileiro, bem como as criativas estruturas de marketing por ele produzidas com o fim de comercializar os seus produtos culturais.

Ao escolher o tema da editoração na Literatura de Cordel e eleger uma casa editorial e, necessariamente, o seu editor-proprietário como principais objetos de estudo, estou

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assumindo que se estabeleceu entre mim e esses objetos eleitos uma forma de câmbio, ao qual respondo com minha percepção e interpretação. Ciente desse pressuposto, deixo evidente que as reconstruções apresentadas e as reflexões desenvolvidas não tiveram a pretensão de trazer conclusões, nem de esgotar as noções sobre o tema da editoração, pois trata-se apenas de uma primeira impressão. Uma primeira leitura, com suas limitações, aberta a discussões e passível de revisões. Move-me a consciência da relevância do tema e da área/campo de estudos, bem como o interrese por processos de construção da memória cultural pela cultura popular e sob a forma de contribuição que ora se apresenta a desejadas releituras.

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PRIMEIRA PARTE: A GEOGRAFIA DO

CORDEL NA PARAIBA

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CAPÍTULO 1 - CORDEL: NOÇÕES, AMBIGUIDADES E IMPRESSÕES

Numerosos são as ambigüidades e os equívocos produzidos pela denominação “literatura popular” entre os pesquisadores, nascendo dessa imprecisão diversas denominações excludentes entre si (contraliteratura1, paraliteratura 2, entre outras) que conduzem, não raro, à complexa questão da margem ou aos diversos processos de marginalização culturais e artísticos.

1.1. DESIGNAÇÕES A PARTIR DE UM SUPORTE

Não foi sem controvérsias que os poetas populares nordestinos acataram a designação atual de Literatura de Cordel à poesia impressa por eles produzida. O termo cordel para identificar o suporte impresso é recente e fora, durante muitas décadas, antecedido por um termo de origem popular: folheto. Essa designação popular prevaleceu até o final da década de 1960 entre os poetas populares e o seu público consumidor, e a adoção do novo termo não foi automática nem passiva por parte dos poetas populares, sobretudo na década de 1950. Segundo Idelette Muzart-Fonseca Santos (2006), o primeiro intelectual brasileiro a utilizar a expressão “Literatura de Cordel” foi Silvio Romero, em 1888, no seu livro Estudos sobre a poesia popular do Brasil, inspirado “na evidência do exemplo português, ao qual seu mestre Teófilo Braga havia consagrado diversos estudos”. Para Horácio de Almeida (1976) se a expressão “Literatura de Cordel” é antiga e corrente em Portugal, a sua introdução no Brasil é recente, uma vez que “no tempo de Leandro desconhecia-se a expressão”. Por sua vez, Umberto Peregrino (1984) defende que Francisco das Chagas Batista (1929), contemporâneo de Leandro Gomes de Barros (1929), já tinha empregado em “Cantadores e Poetas Populares” a expressão “popular literatura poética de cordel”. Por outro lado, o poeta e pesquisador José Alves

1 Cf. Zilá Bernd, “Inscrição do oral e do popular na tradição literária brasileira” in Zilá Bernd e Jacques

Migozzi (organizadores), Fronteiras do Literário – Literatura oral e popular – Brasil/França, Porto Alegre: Editora da Universidade Federal do Rio Grande do Sul, 1995: 75-81.

2 Cf. Jacques Migozzi, “Literatura Popular: um conceito problemático”, in Zilá Bernd e Jacques Migozzi

(organizadores), Fronteiras do Literário – Literatura oral e popular – Brasil/França, Porto Alegre: Editora da Universidade Federal do Rio Grande do Sul, 1995: 11-30.

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Sobrinho (2003)3 argumenta que a definitiva introdução do termo “Literatura de Cordel” no âmbito da poesia popular do Nordeste deveu-se em muito, a partir da década de 1960, ao trabalho de articulação mais intensamente desenvolvido pelos pesquisadores, sobretudo pelo jornalista Mark Curran, que em muito se empenhou entre os poetas para que essa designação se estabelecesse. Segundo ainda o poeta paraibano, o termo aqui é um artificialismo diferentemente de Portugal, pois lá o termo nasce de uma realidade local. Não era uma realidade nordestina a disposição do folheto exposto à venda pendurado em cordão, sentido original do termo cordel e que bem se aplica à realidade do modo de exposição lusitana do produto. E não foi sem resistência por parte de alguns poetas populares que o termo acabou sendo admitido, fato que coincidiu com o período de decadência maior do folheto no âmbito do comércio popular no Nordeste, o que corresponde ao interstício da segunda metade da década de 1960 para a década de 1970. Ainda segundo José Alves Sobrinho, a palavra cordel é estranha ao nosso português, pois aqui se usa popularmente cordão, e não cordel, como em Portugal, conforme ressalta o próprio poeta:

[...] Eles sabiam cordel o que era, mas o poeta não sabia... que vende escanchado em cordão, nunca no Brasil se vendeu, antes disso, nunca se vendeu folheto escanchado em cordão, vendia-se na mão, vendia-se no encerado, vendia-se na tampa de uma banca, numa banquinha daquela de folheto, numa mala velha, em cima de uma mala velha ou no chão estendido numa esteira... É tanto que poetas como Manoel de Almeida morreu e não aceitou... não aceitou... botou em arame... o sujeito dizia: – “O senhor tem cordel? – Não senhor, tenho aramel...” Isso é de Manoel de Almeida: “Eu não tenho cordel não, senhor, tenho aramel, aqui é escanchado em arame”. Era dos revoltados. Joaquim Batista de Sena não aceitava (Manoel), Camilo custou muito a aceitar a palavra, depois aceitou porque generalizou e foi... mas foi no tempo também em que ele já estava caindo.[...] Eles colocaram esse “cordel” servindo-se de Portugal daquela época em que D. João IV instituiu uma lei para aquela poesia ser vendia pelos cegos e os cegos escanchavam em cordel, chamavam cordel, porque até essa palavra cordel nunca foi usada por nós, cordel é do português de Portugal, aqui chamamos cordão, chamamos cordão de rede, chamamos linha, cordão ponta de linha, ponta de rede, mas cordel... cordonete, minha mãe chamava cordonete para estender roupa, mas cordel?! Eu mesmo estranhei muito isso... mas nos meus

3

José Alves Sobrinho (José Clementino de Souto) – Picuí (PB), 1921. “Cantador, poeta popular, pesquisador folclorista e escritor com vários livros publicados, tem instrução secundária, é conferencista, professor de Literatura Popular. Aposentado pela Universidade Federal da Paraíba. Reside em Campina Grande”. (ALVES SOBRINHO, 2003, p.72).

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livros eu dou a entender que não gostei... (ALVES SOBRINHO. Entrevista ao autor. Campina Grande, 06/01/2007 – CD 07).

Findo o período de maior resistência, no âmbito dos poetas nordestinos, o termo “cordel” passa a ser acolhido nos versos populares. A primeira estrofe do folheto “Sertão, folclore e cordel”, do poeta e xilógrafo José Costa Leite, testemunha essa adoção ao termo:

Cordel é folheto em versos como Manoel Riachão Zezinho e Mariquinha Juvenal e o Dragão Os aventureiros da Sorte José de Souza Leão (LEITE, 1973, p.1).

Essa atitude também reflete-se no trabalho editorial, fato que é comprovado pela atenção dada à questão pelo editor João José da Silva, proprietário da Tipografia e Folhetaria Luzeiro do Norte, em Recife, que, a partir de 1960, ao inteirar-se da nova designação, a introduz como nota explicativa nas capas dos folhetos produzidos pela sua editora: “Literatura de Cordel, antiga poesia popular”.

Ria Lemaire (2008)4 ao retomar em seu artigo “Folheto ou Literatura de Cordel? – uma questão de vida ou morte”, as reflexões sobre a mudança do nome de folheto para cordel o faz afirmando tratar-se de uma apropriação indevida resultante de uma postura interpretativa de intelectuais que pertencem à cultura hegemônica:

Apropriação bastante míope, na verdade, mas bem dentro dos quadros do discurso escriptocêntrico das ciências humanas da época, voltadas exclusivamente para as formas escritas e impressas das línguas e das literaturas que por sua vez exprimiam e divulgavam geralmente a ideologia das elites e da sua relação com o poder (LEMAIRE, 2008, p.14).

Entendo que a adoção do nome “cordel” para a literatura popular nordestina consiste num flagrante desrespeito às práticas e métodos de venda da maioria dos poetas

4 Ria Lemaire – Dirige o Centre de Recherches Latino-Americaines/Fonds Raymond Cantel da

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populares, tratando-se, portanto, de uma transferência indevida de um termo que originalmente fora atribuído a um fenômeno ibérico, mas que impropriamente os estudiosos brasileiros de finais do século XIX aplicaram aos folhetos do Nordeste. Todavia, me parece que essa designação instalou-se de maneira definitiva, sendo atualmente inviável pensar em substituí-la.

Todavia parece-me mais satisfatório deslocar essa dicotomia centro/margem para uma perspectiva de “campo literário” conforme Pierre Bourdieu (1989)5, que, ao dividir “o

campo de produção literária” em dois grandes subsistemas, concebe e integra a literatura como fenômeno poliédrico, permitindo-nos, desse modo, pensar o conjunto das produções literárias não de maneira dicotômica, mas como um polissistema no qual cada sistema desenvolve-se a partir de regras particulares suficientes para a sua autonomia e formação.

1.2. CORDEL LUSITANO E CORDEL BRASILEIRO: VÍNCULOS E AUTONOMIAS

Se, para alguns autores, os traços comuns existentes entre o cordel brasileiro e o português servem como prova do vínculo 6, para outros autores, a exemplo de Márcia Abreu, o cordel brasileiro guarda a sua autonomia diante do cordel lusitano. A concepção unificadora que vincula a literatura popular brasileira à literatura popular lusitana foi problematizada por Márcia Abreu (1999) no livro “História de cordéis e folhetos”, no qual ela busca mostrar, a partir de documentos encontrados em bibliotecas,

5

Pierre Bourdieu, O Poder Simbólico, Rio de Janeiro, Bertrand Brasil, 1989. A teoria do sociólogo francês divide o “campo de produção literária” em dois grandes subsistemas: o campo de produção restrita, que se caracteriza pela denegação “vanguardista” do lucro imediato e das motivações econômicas dos produtores, que se dirigem prioritariamente a seus pares, e o campo de produção em larga escala, impulsionado pelas leis do mercado e produzindo para o público em geral obras de consumo fácil.

6 Entre os autores que defendem o cordel como uma tradição de origem ibérica encontram-se: Sebastião

Nunes Batista, Marck J. Curran e Manuel Diegues Júnior. Cf. Sebastião Nunes Batista: “Restituição da Autoria de Folhetos do Catálogo, Tomo I, da Literatura Popular em Verso”. In: Literatura popular em verso. Estudos. Tomo I. Rio de Janeiro: MEC/ Fundação Casa de Rui Barbosa, 1973. Cf. Marck J. Curran com o artigo “A Sátira e a Crítica Social na Literatura de Cordel”. In: Literatura popular em verso. Estudos. Tomo I. Rio de Janeiro: MEC/ Fundação Casa de Rui Barbosa, 1973. Cf. Manuel Diegues Júnior com o artigo “Ciclos Temáticos na Literatura de Cordel”. In: Literatura popular em verso. Estudos. Tomo I. Rio de Janeiro: MEC/ Fundação Casa de Rui Barbosa, 1973

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tanto de Portugal quanto do Brasil, as diferenças entre a Literatura de Cordel lusitana e a literatura de folhetos nordestina. A autora confronta em sua obra as duas literaturas e a partir desse cotejo aventura formular uma nova hipótese:

[...] discutir a independência destas duas formas literárias e as motivações da teoria da vinculação da literatura de folhetos nordestina à Literatura de Cordel lusitana, culminando na formulação de uma nova hipótese explicativa para o surgimento da literatura de folhetos nordestina (ABREU, 1999, p.05).

Abreu afirma, também, que “apesar de que alguns estudiosos têm freqüentemente estabelecido uma relação de dependência entre a produção nordestina e lusitana, outros concordam em haver ‘adaptações’, ‘recriações’, ‘transformações’ e/ou ‘desdobramentos’, resultantes da fusão entre a literatura popular ibérica e a prática dos poetas improvisadores”. A ensaísta elenca algumas das diferenças mais importantes para ela entre as duas formas de literatura, todavia a principal entre elas é a produção textual: “Os folhetos nordestinos possuem características próprias que permitem a definição clara do que seja esta forma literária” (ABREU, 1999, p. 5-6) o que significa que há uniformidade nos textos nordestinos e que eles têm suas regras seguidas de forma rígida, o que não acontece em Portugal.

Por outro lado, a pesquisadora Vilma Quintela, em O Cordel no Fogo Cruzado da

Cultura, conquanto também afirme a relação de independência entre o cordel brasileiro

e o português, entende que a perspectiva adotada por Abreu é simplificadora, na medida em que não considera as semelhanças entre ambos, no que se refere à linguagem e ao projeto editorial:

Vista por outro ângulo, a ênfase nas diferenças, isto é, na oposição entre o caso português, situado pela autora no campo da produção letrada, e o brasileiro, por ela situado, estritamente, no campo da oralidade, não deixa de implicar uma redução problemática. Dessa forma, a abordagem coloca em segundo plano ou oblitera as semelhanças entre os dois sistemas opostos, isto é, os aspectos formais e editoriais que relacionam o folheto nordestino à cultura letrada, bem como os traços da oralidade que ajudaram a fazer do cordel português um fenômeno popular (QUINTELA, 2005, p.21).

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De fato se estabelece entre a poesia oral e a escrita um trânsito de influências em mão dupla que em muito contribuiu com as duas formas de enunciação poética. Como podemos ver as questões relacionadas à designação e à origem da Literatura de Cordel brasileira são temas que prometem muitos estudos e confrontos, aliando-se a eles o tema da editoração, que ainda apresenta consideráveis lacunas a serem devidamente preenchidas, tais como a elucidação de toda a dinâmica que envolvia o sistema de produção do cordel, no que se refere à ordem da publicação, da circulação e da comercialização do folheto.

1.3

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O PROCESSO DE PUBLICAÇÃO NA LITERATURA POPULAR DE CORDEL: ELEMENTOS E PROPRIEDADES DE UMA NOVA ORDEM POÉTICA

A Literatura de Cordel é, antes de tudo, a poesia popular nordestina impressa e são os folhetos os suportes que estabelecem a materialidade desse tipo de poesia que surge entre os poetas do povo. No que tangencia às primeiras edições de folhetos, Roberto Benjamim (2004, p.49) cita o final do século XIX e as primeiras décadas do século XX como um período em que “um grupo de poetas populares iniciou uma nova literatura no Nordeste do Brasil”, a partir de então à tradição oral é dada uma forma impressa, isto é, é facultado aos poetas populares a possibilidade de veicularem os seus versos impressos num suporte fora dos próprios poetas, posto que até então eles viam os seus versos num suporte intrínseco a eles mesmos: a própria voz.

Isso não significa, necessariamente, que, nos primeiros anos de produção, os folhetos de cordel eram impressos nas tipografias dos poetas populares. E isto é esclarecido por Ruth Brito Lemos Terra (1983, p.24), em Memórias de lutas: literatura de folhetos do

Nordeste (1893 a 1930), ao afirma que os folhetos “eram impressos em tipografias de

jornal ou em tipografias que faziam serviços gráficos diversos”, uma vez que só a partir de 1909 ou 1913 é que “começam a funcionar tipografias de poetas populares, mas só em 1918 é que a impressão de folhetos passa a ser feita quase exclusivamente nestas”, passando assim para a responsabilidade das editoras populares grande parte da produção de folhetos.

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A Literatura de Cordel como arte popular no Nordeste brasileiro é, sobretudo, um fenômeno gráfico, isto é, de imprensa. Mediante a impressão dos folhetos, exibidos nas feiras livres ou cantados pelos poetas populares é que eles se tornaram objetos de compra, veículo de comunicação de massa e suporte mantenedor de uma tradição oral que passa a ser registrada, documentada; e, por conseqüência, um legado poético popular. O folheto de cordel, a partir de sua forma material, está vinculado à dinâmica do processo criativo que estabelece entre o poeta popular e o público leitor uma série de operações que antecedem a comercialização do folheto e que se desenvolvem no interior da tipografia-folhetaria. A análise desse sistema produtivo nasce da descrição dos procedimentos e normas de publicação do folheto. Demanda a reconstrução das práticas editoriais e literárias que governaram a relação dos poetas e editores com as obras impressas.

É o mundo da imprensa que faz surgir, diante do público receptor da poesia popular, os diversos tipos de narrativas impressas, que tradicionalmente eram anunciadas oralmente: as histórias tradicionais da cultura popular nordestina passam, então, a ter um suporte material, visível, e que pode ser adquirido. É esse mesmo mundo, o portador, em sua própria dinâmica, de mudanças na poética popular, tanto do ponto de vista da natureza de sua produção, como do ponto de vista literário, pois, ao determinar uma nova forma de inscrição a essa poesia, aponta para uma diversificada maneira de difusão e incita uma nova relação do receptor para com a materialidade impressa: o folheto.

Mesmo não tendo sido, inicialmente e por muito tempo, objeto de leitura de grande parte do seu público-alvo – por motivos histórico-culturais situados e peculiares ao Nordeste brasileiro, a introdução da poesia impressa passa a ser, a partir do momento em que vai ofertar um novo produto cultural, um sistema concorrente ao da poesia oral. À proporção que apresentou uma modalidade diferente à poesia popular acabou influenciando nas transformações dos hábitos culturais, contribuindo, dessa forma, com o processo de alfabetização e, por conseqüência, com a prática da leitura e do manejo do suporte impresso. Essa nova ordem de enunciação poética se estabelece a partir das relações entre: a) as categorias dos textos e seus respectivos suportes materiais; b) os

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locais e as formas de enunciação; e c) a circulação comercial e as possibilidades de reedições.

Essas relações estão arraigadas a uma história de longa duração da poesia popular impressa, salvaguardando as condições de produções técnicas, instrumentais, individuais e espaciais peculiares a cada período histórico editorial que, para efeito de estudo, pode ser dividido, de modo geral, em duas fases. A primeira, quando os folhetos eram produzidos em tipografias de jornal e nas tipografias não-especializadas. A segunda quando, com o passar do tempo, passaram a ser impressos em tipografias dos próprios poetas. Contudo, essa divisão não deve ser entendida de forma estanque, pois nessa segunda fase os processos de publicação ocorrem de maneiras muito diversificadas. Já contando com as tipografias especializadas, os poetas populares recorriam tanto às tipografias não-especializadas quanto às gráficas de jornais, desde que as condições lhes favorecessem a publicação do folheto.

1.3.1. A revolução do impresso: relações e manuseio

O folheto altera o sistema do discurso poético popular que antes disperso e fragmentado, na voz dos seus poetas e cantadores se incorpora, agora, a um novo meio de transmissão, ao ser materializado e tornado acessível numa forma impressa, passível de aquisição, de comparação e de seleção mais precisas. Nesse sentido, a revolução do texto impresso constitui também uma mudança metodológica que transforma a modalidade da enunciação poética popular e sugere uma compreensão das condições e processos dessa categoria de produção.

Outro regime inaugurado com a ordem da poesia popular escrita e impressa é a autoria, o estabelecimento da apropriação individual à produção artística popular. A partir da categoria impressa, a poesia popular passa a ter singularidade e originalidade, além dos procedimentos relacionados aos direitos de reprodução.

Todavia, é a instituição editora que fundamenta, formaliza, ratifica e perpetua o autor, pois, diferentemente da poesia oral, é na categoria impressa que a poesia materializa-se

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em um suporte palpável: o folheto. A composição literária passa a ser regular e materialmente comercializável. É das relações entre o autor e a instituição-editora que nasce a necessidade de se normatizar a autoria, uma vez que não é mais o corpo que liga o autor à obra, como no caso do cantador. Faz-se necessário, então, que se estabeleçam normas que produzam a vinculação legal entre o autor e sua obra que, agora fora e distante dele, torna-se mais passível de adulterações, se comparada à forma de enunciação oral.

Sem a espontaneidade da poesia oral, a poesia impressa fixa normas e procedimentos até então estranhos à oralidade e que fazem parte de um modelo de produção diferente: o editorial. A poesia popular institui-se como poesia impressa fundamentalmente pela instauração da instituição editora, que gerou necessariamente o reconhecimento da autoria. Foi nesse sentido que formalmente o editor produziu o autor, e não o contrário. É a instituição editora que inaugura a prática de compra e venda da obra e dos direitos sobre ela e, por força disso, introduz o regime da propriedade e dos direitos editoriais e autorais, os quais gradativamente vão regulando e formalizando os padrões de normalização daquilo que no contexto cultural pode ser entendido e aceito como legal. É mediante o instituto da autoria que a ordem entre autor e editor sustenta-se. A autoria é o mecanismo de funcionamento dessa ordem; é ela a condição para que se possa ter assegurados tanto os direitos morais e econômicos do autor quanto o lucro e a produção da folhetaria. Todavia é justo contra o direito do autor que se adotou uma prática de resistência e de desvio, a qual foi sendo combatida até a conquista gradual de um período de mais maturação e aceitação do direito editorial e de autoria.

Conformando-se a produção poética a uma estrutura material – o folheto, tornam-se possíveis gestos inéditos, tais como a leitura; a assimilação; o domínio do todo e das partes de determinada obra; a noção clara dos limites visíveis de início e fim; a ordem de encadernação das páginas; a riqueza da dinâmica ilustrativa das capas, a funcionalidade atribuída à quarta capa; a noção de volume e tamanho; bem como as distinções mais precisas dos elementos poéticos, tipográficos e gráficos, como, por exemplo, a justeza formal das rimas e da metrificação nas estrofes, a correção do folheto através da “prova” tipográfica e o acabamento dos tipos de ilustrações. A durabilidade física do texto impresso passou a propiciar, no suporte, estudos que envolvem, além dos

Referências

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