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PRÁXIS EM CUIDADOS PALIATIVOS: REFLEXÕES DERIVADAS DE UMA EXPLORAÇÃO BIBLIOGRÁFICA

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PRÁXIS EM CUIDADOS PALIATIVOS: REFLEXÕES DERIVADAS DE UMA EXPLORAÇÃO BIBLIOGRÁFICA

Débora Mariane Maia Guerra Bagon* (Laboratório de Psicologia Sociohistórica – LAEPSO, Departamento de Psicologia, Universidade Estadual de Maringá, Maringá-PR, Brasil); Luana Cristina Pinheiro da Silva* (Laboratório de Psicologia Sociohistórica – LAEPSO, Departamento de Psicologia, Universidade Estadual de Maringá, Maringá-PR, Brasil); Renata Heller de Moura (Laboratório de Psicologia Sociohistórica – LAEPSO, Departamento de Psicologia, Universidade Estadual de Maringá, Maringá-PR, Brasil).

contato: de_bagon@hotmail.com luanacristinapinheiro@outlook.com

Palavras-chave: Terminalidade. Paliação. Morte.

Introdução

Os cuidados paliativos, de acordo com a Organização Mundial de Saúde (2007), são cuidados assistenciais direcionados às pessoas que possuem alguma doença que coloca em risco a continuidade de suas vidas, pela inexistência (e/ou desconhecimento) de tratamentos convencionais que poderiam possibilitar cura e pela manifestação de um estágio terminal de adoecimento. Os processos paliativos têm por objetivo a redução do sofrimento da pessoa adoecida e de seus familiares, buscando proporcionar maior qualidade de vida, por meio da prevenção, avaliação e alívio de dores no âmbito físico, social, familiar, espiritual e emocional.

De acordo com a Academia Nacional de Cuidados Paliativos (ANCP, online), as práticas paliativas se concentram em: medidas terapêuticas de controle de sintomas físicos; intervenções psicoterapêuticas; apoio espiritual ao paciente e a seus familiares, como também para os profissionais; apoio social à família; psicoterapia à equipe de saúde do paciente e educação continuada.

Para obter êxito na prática paliativa é necessária a presença de uma equipe multiprofissional para atender às demandas do “paciente” e de sua família. Por conseguinte, de acordo com Scannavina et al. (2013), os profissionais de psicologia podem atuar voltando-se para as manifestações subjetivas do “paciente”, favorecendo a adaptação à sua nova condição de existência, possibilitando a compreensão das limitações, fornecendo apoio e suporte para tomada

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de decisões acerca do tratamento e auxiliando no manejo da dor relacionados a procedimentos médicos. O profissional de psicologia que atua em cuidados paliativos pode ainda elaborar estratégias de enfrentamento para possíveis consequências de procedimentos invasivos e dolorosos, realizar a promoção da qualidade de vida e trabalhar em questões voltadas a subjetividade do “paciente” como a revisão de seus valores para o retorno à sua vida familiar, social e profissional ou até mesmo para o fim da vida (BIANCHIN, 2003; GLANZ; RIMER; LEWIS, 2002; HERMAN, 2007; HERMAN; MIYAZAKI, 2007).

Com base nos aspectos atuais da sociedade brasileira como o envelhecimento da população, o aumento da incidência de câncer, a emergência da síndrome da imunodeficiência adquirida (AIDS) e de outras síndromes autoimunes de difícil tratamento, surge uma maior necessidade do desenvolvimento da área de paliação no âmbito da saúde (GARCIA et al., 2013).

No entanto, a ANCP expõe que as práticas paliativistas no Brasil é cercada por preconceitos e desconhecimento por parte dos profissionais da saúde, gestores hospitalares e poder judiciário, pois essas práticas são confundidas com a eutanásia e a utilização de medicamentos para alívio da dor, como morfina. Há, ainda, poucos lugares que oferecem os serviços de cuidados paliativos embasados em critérios científicos devido a deficiência deste conteúdo na formação dos profissionais da saúde. Este fato demonstra-nos limitações a serem superadas na proposta de cuidado e manejo oferecida aos “pacientes” em fase terminal, nas maneiras de como administrar e reconhecer os sintomas de maneira mais humanizada. O manejo inadequado por parte da equipe de saúde nessas situações de terminalidade pode provocar a morte antecipada de pessoas nessa situação.

Diante desses fatos, este resumo tem por finalidade apresentar parte dos resultados obtidos em uma pesquisa curricular desenvolvida na graduação de psicologia no ano de 2017. Neste texto que ora apresentamos, concentramo-nos em expor a discussão teórica produzida a partir do material bibliográfico levantado sobre a produção de práxis profissional em cuidados paliativos.

Para empreender esse estudo sobre a produção de práxis profissional em cuidados paliativos, realizamos uma revisão bibliográfica sobre o tema nas bases de dados acadêmicos, como: Scielo, Lilacs, Pepsic, Bvs Psi Ulapsi Brasil, Periódicos CAPES, Biblioteca Digital de Teses e Dissertações (BDTD) da CAPES, Portal do Ministério da Saúde e o Portal da Academia

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Nacional de Cuidados Paliativos (ANCP). Os descritores que nortearam nossa busca, compondo diferentes combinações, foram: “cuidados paliativos”, “protocolo”, “psicologia hospitalar”, “terminalidade/estado terminal”, “morte”, “UTI”.

Realizamos, portanto, uma pesquisa bibliográfica de caráter qualitativo. Segundo Minayo (2001), a pesquisa de caráter qualitativo tem como base as ciências sociais. Ela envolve as motivações, os inúmeros significados, crenças, valores e atitudes, ou seja, trabalha com a realidade dos fenômenos, dos processos e das relações de uma maneira não quantificável. Outra característica metodológica de nossa pesquisa foi seu caráter exploratório, por meio do levantamento bibliográfico nas bases de dados, na busca de estudos existentes que abordassem a produção de cuidados paliativos.

Para análise do material levantado, utilizamo-nos de referenciais da psicologia socio-histórica. Essa perspectiva da psicologia busca superar a visão dicotômica acerca do homem e do mundo e cria uma possibilidade de crítica e análise dos fenômenos sociais, pautando-se no materialismo histórico dialético e no marxismo.

[A psicologia sócio-histórica] Fundamenta-se no marxismo e adota o materialismo histórico e dialético como filosofia, teoria e método. Nesse sentido, concebe o homem como ativo, social e histórico; a sociedade, como produção histórica dos homens que, através do trabalho, produzem sua vida material; as ideias, como representações da realidade material; a realidade material, como fundada em contradições que se expressam nas ideias; e a história, como o movimento contraditório constante do fazer humano, no qual, a partir da base material, deve ser compreendida toda produção de ideias, incluindo a ciência e a psicologia (BOCK, 2001, pp. 17-18).

Nesse sentido, compreendemos o processo saúde-doença-cuidado e os fenômenos de terminalidade e morte a partir das relações objetivas que estes estabelecem com determinado contexto. Entendemos que:

Tanto o saber sobre um determinado assunto, como a prática necessária para intervir sobre uma situação específica são construídos a partir do modo como os homens produzem a sua vida material, ou seja, a partir do modo como suprem suas necessidades e se organizam socialmente. Sendo assim, a consciência científica (teorias, concepções, ideias, escolas de pensamento) e a consciência técnica (prática, modelos de intervenção) são, antes de tudo, consciência histórica. A práxis em saúde refere-se a um conjunto de ações-concepções produzidas sobre o processo saúde-doença, voltadas a satisfazer determinadas

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necessidades humanas, no interior de uma organização social (MOURA, 2014, p. 66).

Sendo assim, queremos considerar em nossa análise o fato de que os princípios e cuidados paliativistas são produto da rede de relações sociais que os homens estabelecem entre si, em sua forma de viver e reproduzir. Por essa lente analisamos o material levantado.

A exploração bibliográfica: os primeiros resultados

A exploração das bases de dados utilizando os descritores já mencionados anteriormente nos permitiram identificar 88 textos. No entanto, após uma primeira análise dos materiais, com a verificação dos títulos, palavras-chave e a leitura dos resumos, apenas 14 textos foram selecionados como consoantes com a temática e objetivo da pesquisa.

Em relação aos textos encontrados em consonância com o objetivo da pesquisa, foram identificadas duas categorias textuais: relato de experiência e texto teórico, sendo 4 relatos de experiência e 10 textos teóricos (como demonstra o Gráfico 1 - Categorias de texto).

Os anos das publicações selecionadas datam de 2002 a 2017 (Gráfico 2 - Ano de publicação dos textos), apresentadas em formato de artigos disponibilizados por periódicos online, ou publicados em formato de livros e manuais. Dentre os periódicos, identificamos: Revista da Sociedade Brasileira de Psicologia Hospitalar (SBPH); Psicologia: Ciência e profissão; Revista da escola de enfermagem (USP); Ciência saúde coletiva - Salvador (BA); Revista Brasileira de Terapia Intensiva; Revista Brasileira de Educação Médica (RJ); Revista Interface - Comunicação, Saúde, Educação.

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Ademais, pudemos observar ainda que todos os textos, sendo teóricos ou não, não

mencionam a perspectiva teórica na qual se baseavam.

A partir destes textos consoantes com nossos objetivos, apresentaremos, a seguir, a discussão de três categorias que emergiram de nossa análise: apresentação inicial dos cuidados paliativos; cuidados paliativos e práxis multidisciplinar; cuidados paliativos e formação profissional.

Apresentação inicial dos cuidados paliativos

A categoria que denominamos “apresentação inicial dos cuidados paliativos” engloba, de maneira geral, a apresentação conceitual de cuidados paliativos segundo a ANCP ou a OMS, princípios, níveis de atenção, elaboração, validação e efetivação do protocolo paliativo e principais desafios.

Os materiais analisados apresentam os cuidados paliativos como cuidados direcionados ao “paciente” em situação de terminalidade. Kipper (1999, apud QUINTANA, et. al., 2006, p. 418) define o paciente terminal “de acordo com uma condição de irreversibilidade apresentando uma alta probabilidade de morrer num período relativamente curto de tempo que oscilaria entre três a seis meses”. Esta definição agrega o peso de que nada mais há a fazer a não ser esperar a morte.

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O termo paliativo derida da palavra Pallium (DOMINGUES, et. Al., 2013) que era o manto que cobria os cavaleiros das cruzadas para protege-los das intempéries. O mesmo ocorre com o “paciente terminal”, ele precisa de cuidados que o protejam das dificuldades que enfrentará, as intempéries do fim da vida. De acordo com a Organização Mundial de Saúde,

Cuidados Paliativos são uma abordagem para melhoria da qualidade de vida de pacientes e familiares que enfrentem uma doença ameaçadora da vida, através da prevenção e do alívio do sofrimento, através da identificação precoce e impecável avaliação e tratamento da dor e outros problemas, físicos, psicossociais e espirituais. (OMS, 2007, p.3)

Juntamente com a definição foram formulados alguns princípios básicos: (1) promover o alívio da dor e outros sintomas de angústia; (2) afirmar a vida e considerar a morte como um processo natural; (3) não apressar nem postergar a morte; (4) integrar os aspectos espirituais e psicológicos no cuidado do paciente; (5) oferecer um sistema de suporte que ajude o paciente a viver ativamente tanto quanto possível até sua morte; (6) oferecer um sistema de suporte para ajudar no enfrentamento da família durante a doença do paciente; e (7) utilizar uma equipe profissional para identificar as necessidades dos pacientes e de suas famílias, incluindo a elaboração do luto, quando indicado (COMBINATO e QUEIROZ, 2006).

A prática dos cuidados paliativos deve ser realizada de acordo com o agravamento da doença e os procedimentos que o paciente necessita. De acordo com a ANCP (2006), há três níveis de atenção em cuidados paliativos, nos quais uma equipe interdisciplinar pode atuar. A equipe deve ser composta por médicos, enfermeiros, psicólogos e assistentes sociais, os quais trabalharão em conjunto em prol do bem-estar do paciente e dos familiares. Sistematizamos os níveis de cuidado na tabela abaixo.

Tabela 01 - Níveis de atenção de cuidados paliativos/ Funções comuns aos profissionais de áreas distintas

Níveis de atenção de cuidados

paliativos

Funções comuns aos profissionais de áreas distintas

Nível 1 Avaliar o grau de sofrimento físico, psicológico, social e espiritual;

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paciente e da família ou do entorno significativo; implementar medidas ou estratégias de tratamento nas diferentes áreas destinadas a aliviar o sofrimento; capacitar a unidade de tratamento para otimizar sua capacidade de cuidado; prevenir a claudicação familiar; valorar resultados dos tratamentos instituídos; detectar indicadores de risco do luto patológico; coordenar os cuidados entre a equipe interdisciplinar; conceder acompanhamento e educação à comunidade sobre os aspectos gerais da repercussão da doença, da morte ou do luto. (ANCP, 2006, p. 42)

Nível 2 Às de nível I se agregam: elaboração e/ou utilização de material de

capacitação (escrito ou audiovisual) para a unidade de tratamento; implementação de estratégias para resolver as urgências/emergências mencionadas como critérios de interconsulta e/ou derivação para esse nível desde o nível I; reuniões familiares para esclarecimento e apoio emocional; atividades preventivas de síndrome de desgaste profissional; trabalho de forma interdisciplinar na tomada de decisões em situações clínicas conflitantes; avaliação de resultados e custos; valoração da qualidade de atenção. (ANCP, 2006, p. 50-51)

Nível 3 Às de níveis I e II se agregam: oferecimento de serviços de

interconsulta a outros níveis de cuidados paliativos e de outras especialidades; respostas a consultas, capacitação e recomendações sobre aspectos éticos no final da vida; oferecimento de consultoria em cuidados paliativos a organizações sociossanitárias governamentais ou não-governamentais; capacitação e docência incidental e sistematizada interna e externa em cuidados paliativos; desenvolvimento de protocolos de investigação científica nas distintas áreas; avaliação da qualidade de atenção. (ANCP, 2006, p. 57)

A ANCP (2006) destaca que a questão do controle da dor que deve ser manejada pelos profissionais com cautela para evitar procedimentos desnecessários que prejudicam a qualidade de vida do “paciente” e não trazem melhora significativa no quadro clínico. Ressalta que também é importante compreender o grau de dor que o “paciente” sente por meio de diversos recursos técnicos visto que é difícil mensurá-la por ser algo subjetivo.

Quanto a elaboração, validação e efetivação de um protocolo de cuidados paliativos em hospitais, leva-se em consideração, geralmente, tanto os níveis de bem-estar global e o “distress behavior” de pacientes e seus familiares, como as dificuldades encontradas por médicos nesse tipo de atendimento e tratamento.

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Entre os desafios sobre o atendimento em cuidados paliativos podemos citar alguns aspectos: a transferência do acompanhamento do paciente para outro médico/equipe de cuidados paliativos (diferente daquela que o acompanhava durante o tratamento); variação da concepção de cuidados paliativos entre os profissionais; falta de espaço nos hospitais destinados ao atendimento paliativo; e dificuldade de deslocamento de pacientes e acompanhantes para o hospital (MOREIRA; FERREIRA; COSTA JUNIOR, 2012). Ademais, esses textos descritos nesta categoria inicial ainda contribuem com sugestões de técnicas e procedimentos para feridas de pacientes terminais.

Cuidados paliativos e práxis multidisciplinar

Utilizamo-nos da categoria de “cuidados paliativos e práxis multidisciplinar” para realizar uma discussão acerca das funções profissionais no âmbito do cuidado paliativo. Apoiando-nos no material analisado, faremos a exposição das atribuições e especificidades profissionais da atuação nas áreas de serviço social, psicologia, enfermagem e medicina. Consideramos que a discussão teórica dessa categoria já se iniciou, em parte, na categoria anterior, ao apresentarmos as funções comuns desempenhadas pela equipe de saúde nos diferentes níveis de cuidado.

O serviço social é apresentado como o responsável por apresentar para a equipe informações relacionadas com a situação social e familiar do “paciente” (onde ele vive, em que condições vive e se o mesmo está em condições de receber o atendimento da equipe), fazer o elo entre o paciente-família-equipe, escuta e acolhimento do paciente e seus familiares, conhecendo tanto a situação socioeconômica, como os serviços disponíveis e redes de suporte para atender a demanda do usuário (HERMES E LAMARCA, 2013).

O psicólogo deve buscar a qualidade de vida amenizando o sofrimento, ansiedade e depressão diante da morte, respeitando sempre sua autonomia. Pode ajudar os familiares e os “pacientes” a quebrarem o silêncio e falarem sobre a doença, fornecendo as informações necessárias sobre o tratamento, que muitas vezes é negado pela própria família (esses casos, inclusive, exigem manejo específico e cuidadoso por parte do psicólogo). Ademais, deve ter a percepção do fundamento religioso que envolve o modo de vida “paciente” ou não, e buscar

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meios de reforçar o suporte emocional, proporcionando ao mesmo, entender o sentido da sua vida e do seu adoecimento (HERMES E LAMARCA, 2013).

Já o enfermeiro de cuidados paliativos precisa saber orientar tanto o “paciente” quanto a família nos cuidados a serem realizados, esclarecendo a medicação e os procedimentos, além de prestar cuidados básicos e fisiopatológicos. Por último, a atuação do médico exige uma revisão de seus conceitos, conhecer o limite do seu fazer e saber, trabalhar em equipe, pois as demandas do paciente estão para além do aparato físico devendo ser trabalhado também o lado psicológico, social e espiritual.

Hermes e Lamarca (2013) expõem ainda que a enfermagem é uma das categorias que mais publicam sobre o cuidado paliativo e que a categoria com menor número de publicações é o serviço social, embora tenha um papel importante dentro da equipe e representação nas maiores instituições que tratam de cuidado paliativo no Brasil.

Diante disso, fica claro quando Porto e Lustosa (2010) expõe que os cuidados paliativos são compreendidos como um resgate do lado humano que fora perdido devido às ações de saúde que foram perpassadas pela tecnologia e eficácia curativa. Para conseguir realizar uma prática paliativista, Langaro (2017) evidencia que é necessário que o “paciente” tenha consciência do que está acontecendo com ele, sendo este o ator principal de suas escolhas.

Os profissionais devem fornecer as informações do quadro de saúde de maneira sensível e em conjunto, discutir decisões e produzir um plano terapêutico. Dessa forma, Porto e Lustosa (2010) mencionam a ortotanásia como um modelo de morte moderna que visa valorizar os desejos da pessoa em fim de vida e proporcionar condições de vida dignas com a finalidade de aliviar todos os sofrimentos nos aspectos físico, espiritual e emocional. A morte deve ocorrer no tempo certo, ou seja, sem o prolongamento do sofrimento e sem o adiamento da morte.

Cuidados paliativos e a formação profissional

Por último, a categoria “cuidados paliativos e a formação profissional” contempla a necessidade de se preparar o graduando para enfrentar a morte. Entretanto, o currículo nas instituições de ensino superior na área da saúde ainda não tem assegurado a contextualização da temática de modo consistente e realístico. Os métodos de ensino, na maioria dos cursos de

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graduação da área da saúde, ainda permanecem baseados no modelo tradicional, descontextualizado muitas vezes da realidade e focado nos aspectos fisiopatológicos e técnicos do processo saúde-doença. Com isso, o modo de cuidar continua fundamentado no modelo cartesiano de atenção, mecanicista, centrado na cura e reabilitação da doença (GERMANO E MENEGUIN, 2013, p.523). Os textos ainda apontam que [...] somente com uma mudança substancial na gestão do conhecimento e nos currículos de graduação dos profissionais de saúde é que os cuidados paliativos terão a oportunidade de se consolidar no Brasil (FONSECA E GEOVANINI, 2013, p. 121).

A morte, além de ser evento biológico, também é uma construção social que pode ser vivida de distintas maneiras pelos profissionais de acordo com os significados compartilhados para esta experiência, uma vez que são influenciadas pelo contexto histórico, social e cultural. Assim, deve ser concebida como um processo e não como fim, o que acarreta em mais um motivo para ser trabalhada durante a graduação (GERMANO E MENEGUIN, 2013, p.526). Outro fator apresentado por Fonseca e Geovanini (2013, p.122) é a postura médica diante da morte. A meta de salvar vidas está enraizada na formação médica. Consequentemente, a morte acaba sendo encarada como temerosa, e os médicos procuram evitá-la a todo e qualquer custo, negando muitas vezes a necessidade dos cuidados paliativos. Diante disso e tendo em consideração da importância da atuação médica em equipe paliativista, segundo resolução 1973/2011 do Conselho Federal de Medicina (CFM), os médicos interessados nessa atuação devem cursar mais um ano para receber o título de paliativista que será oferecido pela Associação Médica Brasileira (AMB) (HERMES E LAMARCA, 2013). Nas demais categorias profissionais ainda não há aparato jurídico estabelecendo parâmetros semelhantes para a formação em cuidados paliativos.

Últimas considerações

De modo geral, os assuntos abordados pelo material que foram analisados tratam de: avaliação de funcionalidade; qualidade de vida relacionada à saúde; efetividade de protocolos de cuidados (preventivos, curativos e paliativos); controle da dor; na qualidade de vida em situação de terminalidade e fim de vida; prognóstico e sobrevida dos doentes. Ainda apresentam um breve

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histórico sobre o surgimento de cuidados paliativos, a psicologia hospitalar, o processo de terminalidade, a construção e transformação dos sentidos/significados da morte, o luto antecipatório, a equipe transdisciplinar e exemplos de práticas paliativas e especificidades de cada profissional em sua atuação.

Fica clara a dificuldade da inserção do conteúdo de cuidados paliativos nas diversas graduações, principalmente, médica, uma vez que, por se tratar de pacientes em terminalidade, tem se a ideia de que os mesmos já virão a óbito. No entanto, deve haver uma mudança não só na graduação, mas no conceito de terminalidade. O “paciente” não é terminal, mas tem uma doença com alto risco na capacidade de vida. Assim, quebra-se também o paradigma de que cuidados paliativos diz respeito apenas à morte/terminalidade. Pelo contrário, trata-se de um cuidado relacionado com a vida, viver com qualidade até o último dia antes da morte. E, para isso, leva em consideração as dores e sofrimentos totais (sociais, espirituais, psicológicos, biológicos) do indivíduo.

A práxis em cuidado paliativo carece de uma equipe multidisciplinar empenhada ao trabalho conjunto e com boa comunicação (tanto dentro da equipe de saúde como com o “paciente” e seus familiares), conhecimento técnico e compromisso ético, levando sempre em consideração a autonomia da pessoa, que é mais que um “paciente”. Deve ser compreendida e acolhida de maneira integral e acompanhada de maneira humanizada e co-responsável.

Nossa exploração bibliográfica reforçou nossa compreensão acerca do papel ativo (e da responsabilidade) dos profissionais envolvidos na produção desse tipo de cuidado em saúde. Concluímos que o trabalho em saúde é sempre um trabalho coletivo, em que os profissionais, com seus saberes e práticas (práxis), encontram-se em relação de interdependência e mutualidade na produção do cuidado (FRANCO; MERHY, 2012).

Referências

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