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OS GUARANI-KAIOWÁ E GUARANI-ÑANDEVA E O PROCESSO DE RETOMADA DE TERRAS TRADICIONAIS

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UNIVERSIDADE FEDERAL DE UBERLÂNDIA

4ª Semana do Servidor e 5ª Semana Acadêmica 2008 – UFU 30 anos

OS GUARANI-KAIOWÁ E GUARANI-ÑANDEVA E O PROCESSO DE

RETOMADA DE TERRAS TRADICIONAIS

Nome do primeiro autor: José Luiz de Souza1

Nome da instituição e endereço: Programa de Pós-Graduação em Geografia/ Instituto de Geografia/ UFU Av. João Naves de Ávila, 2121, Santa Mônica, Uberlândia, MG

e-mail: souzajlms@hotmail.com

Nome do segundo autor: Profa. Dra. Vânia Rubia Farias Vlach2

Nome da instituição e endereço: Programa de Pós-Graduação em Geografia/ Instituto de Geografia/ UFU Av. João Naves de Ávila, 2121, Santa Mônica, Uberlândia, MG

e-mail: vaniarubia@netsite.com.br

Resumo: Os Guarani-Kaiowá e os Guarani-Ñandeva, povos indígenas que vivem no sul do Estado de Mato Grosso do Sul, procuram desde a década de 1970 retornar às suas terras tomadas pela criação da Colônia Nacional Agrícola de Dourados (CAND). Durante o processo de criação da referida CAND, o povo Guarani passou por um processo de confinamento, em que sua área originalmente com 20.000 km2, passaram a viver em oito postos indígenas que somam um pouco mais de 18000 hectares. Hoje, o órgão indigenista autorizou a demarcação das novas terras reivindicadas, porém os fazendeiros que estão instalados e o agronegócio estão, por outro lado, buscando seus direitos. A tensão no sul do Mato Grosso do Sul aumentou quando indígenas foram atacados por milícias a mando dos fazendeiros, a fim de expulsarem os Guarani-Kaiowá e Guarani-Ñandeva da área. É apresentado um breve histórico sobre os povos Guarani no Estado do Mato Grosso do Sul, bem como do processo de confinamento estabelecido contra eles.

Palavras-chave: Território tradicional, Guarani, Geografia, Espacialidade indígena. 1. INTRODUÇÃO

1.1. Os Guarani-Kaiowá e os Guarani-Ñandeva3

Ainda hoje, em bancos do ensino médio, professores de literatura falam da língua Tupi-Guarani e do romance de José de Alencar, ‘O Guarani’, escrito em 1857. Muito bonito de se ler e criar imagens ilustrativas sobre os povos indígenas! Infelizmente, na vida real do povo Guarani não existe romance, ao contrário, há uma história de sofrimento e luta pelo tekó-ha (lugar físico – terra, mato, campo, águas, animais, plantas, remédios). No continente sul-americano existem, aproximadamente, 225 mil Guarani. Só no Brasil são 50 mil (CIMI SUL, 2008, p. 10).

Do tronco lingüístico Tupi, os Guarani, no Brasil, subdividem-se em três grupos: Mbyá, Kaiowá e Ñandeva. Esses dois últimos vivem no Mato Grosso do Sul, enquanto é possível encontrar outros Guarani nos Estados de Rio de Janeiro, Paraná, Espírito Santo, São Paulo, Rio Grande do Sul e Santa Catarina. Em muitas bibliografias é possível encontrar as expressões

1 Doutorando em Geografia no Programa de Pós-Graduação em Geografia do Instituto de Geografia da Universidade Federal de Uberlândia..

2 Orientadora e Professora no Programa de Pós-Graduação em Geografia do Instituto de Geografia da Universidade Federal de Uberlândia.

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“Guarani” para os indivíduos da etnia Guarani-Ñandeva; e “Kaiowá” para os indivíduos da etnia Guarani-Kaiowá4.

Localizados na porção meridional do Estado de Mato Grosso do Sul, os Guarani-Ñandeva e os Guarani-Kaiowá têm uma população de 38.645 pessoas. A população dos Guarani-Kaiowá e Guarani-Ñandeva ao ser somada à população de outras etnias de Mato Grosso do Sul faz com que esse Estado ocupe o segundo lugar em número de indígenas, já que, em primeiro, está o Estado do Amazonas. Em termos territoriais, os Guarani-Ñandeva e os Guarani-Kaiowá ocupam “30 terras indígenas, com cerca de 40 mil hectares de extensão” (COLMAN; BRAND, 2006, p. 01) (cf. Figura 01).

Os Guarani de antigamente mantinham uma estrutura social baseada na família extensa. Tradicionalmente, todos os parentes habitavam numa casa grande denominada ogusu, podendo abrigar até 150 pessoas. A religião Guarani sempre muito forte e presente na unidade social que este agrupamento formava e que em dias de festa se reuniam com as demais famílias para a realização dos rituais religiosos.

Atualmente, a casa grande não existe mais, pois abriga somente a família nuclear formada pelo pai, mãe e filhos menores. Entretanto, continuam formando regiões familiares, pois os parentes estão próximos uns dos outros. No tocante à formação de novas famílias, os Guarani não aceitam o casamento de membros de uma mesma família (THOMAZ DE ALMEIDA; MURA, 2003).

Contudo, a proximidade com as religiões da sociedade nacional faz com que muitos destes aspectos sejam alterados internamente sem, no entanto, alterar a força da identidade étnica dos Guarani.

1.2. Localização dos Guarani e o movimento migratório

Historicamente, os Guarani ocupavam um extenso território: “[...] estendiam-se do rio Paraguai a oeste até o oceano Atlântico, a leste[...] (CLASTRES, P., 1982, p. 96). No entanto, esta vasta área não foi ocupada de maneira homogênea, como nos explica John Manuel Monteiro:

A maior parte dos grupos locais encontrava-se nas florestas tropicais e subtropicais, ao longo do litoral e entre os principais rios do sistema Paraná-Paraguai. Os extensos campos abertos e as florestas de araucária que cobrem uma considerável parte da região, por seu turno, eram habitados por grupos prioritariamente caçadores e coletores, destacando-se os ancestrais dos Kaingang e Xokleng e, mais para o sul, os Charrua e Minuano, entre outros. Do mesmo modo, o espaço em torno do alto Paraguai era compartilhado – melhor, disputado – com os Guaykuru e Paiaguá, povos que, a partir do século XVI, tornaram-se formidáveis adversários não apenas dos Guarani, como também dos espanhóis e portugueses (MONTEIRO, 1992, p. 477)

Outro fato marcante na história cultural dos Guarani foi a movimentação migratória. Meliá (1988, apud MONTEIRO, 1992) ao incluir esse movimento Guarani dentro do conceito de “espacialidade” integrado à tradição, sugere uma inter-relação entre a necessidade constante de procura de terras novas para aldeias e roças e a migração de origem profética.

A “terra mítica” da qual se refere John Monteiro trata-se do processo de Oguata (Ogwata) que segundo Rosa Colman (2007) é traduzido como “caminhada”5. Para Hélène Clastres, “[...] todo

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o pensamento e prática religiosos dos índios gravitavam em torno da Terra sem Mal”6 (CLASTRES, H, 1978, p. 51).

Antonio Brand, pesquisador do Programa Kaiowá/Guarani no Mato Grosso do Sul, em sua dissertação de Mestrado, esclarece as razões do processo migratório dos Guarani:

Segundo pesquisas mais recentes, a expansão guarani em direção a estas bacias estava ligada ao aumento demográfico e conseqüente necessidade de novos espaços ao manejo agro-florestal que adquiriam e que permitia dominar e incorporar novas áreas (BRAND, 1993, p. 17).

Antonio Brand afirma que os maiores problemas que afetaram o território Guarani de um modo geral, foi, em um primeiro momento a Guerra do Paraguai (1864), que trouxe um enorme contingente de pessoas como soldados. No entanto, com o final da Guerra, grande parte dos ex-combatentes ficou pela região. Em um segundo momento, Thomas Larangeiras percebeu dois fatores favoráveis à instalação de uma empresa de extração de erva-mate: a grande quantidade de ervais nativos e a abundante mão-de-obra pós-guerra disponível no, então, sul do Mato Grosso.

Segundo Antonio Brand, por toda a década de 1880, a Companhia Matte Larangeiras7 utilizou a mão-de-obra indígena para transporte da erva-mate, afinal conheciam como ninguém a região, além do que “[...] as aldeias localizadas em regiões de ervais nativos engajaram-se amplamente nessa tarefa atraídos pelos bens que a Cia. Matte Larangeiras oferecia, como roupas e ferramentas” (BRAND, 2000, p. 99).

Os Guarani também participaram, mesmo sem querer ou saber, do plano de Getúlio Vargas de “[...] armar um cerco ao latifúndio, de fôlego longo. Apoiar a pequena propriedade de modo que ela, lentamente, corroesse a velha ordem latifundiária e, aos poucos, instaurasse a nova realidade agrícola que o desenvolvimento industrial do país exigia” (LENHARO, 1986, p. 21 apud BRAND, 2000, p. 101).

Foi com a CAND – Colônia Agrícola Nacional de Dourados criada pelo Decreto-Lei n. 5.941, de 28 de outubro de 1943 que os Guarani-Kaiowá e, posteriormente, os Guarani-Ñandeva encontrariam problemas muito mais adversos dos que a Cia. Matte Larangeiras criou. Segundo Brand (2000, p.101), o confronto foi “imediato e total”, pois os colonos se interessavam apenas pelas áreas de ervais nativos, onde se encontravam os tekoha e pela mão-de-obra necessária para a exploração desse produto.

Diante desses fatores de exclusão das populações indígenas existentes, inicia-se o processo de confinamento dos Guarani-Kaiowá e Guarani-Ñandeva pelo sul do atual Estado de Mato Grosso do Sul. Das nove etnias existentes nesse Estado, a situação mais grave em torno de território ficou para esses dois povos. Essa situação, por si só, já permite entender a importância deste conceito ser trabalhado em aulas de Geografia.

2. A DEMARCAÇÃO DO S.P.I., O PROCESSO DE CONFINAMENTO E AS RETOMADAS DE TERRAS TRADICIONAIS

Desde 1977 percebe-se um movimento amplamente organizado para a retomada das terras tradicionais dos Guarani-Ñandeva e dos Guarani-Kaiowá no Estado de Mato Grosso do Sul. No processo de “integração” dos povos indígenas à sociedade nacional, restaram aos Guarani-Ñandeva e aos Guarani-Kaiowá apenas 8 postos indígenas criados pelo Serviço de Proteção ao Índio – SPI entre 1917 com demarcação original de 3.600 ha., porém já no ato de demarcação este valor foi reduzido, como se pode perceber no quadro 01. Fruto do movimento indígena pelos tekoha tradicionais, 11 terras foram retomadas e mais 11 estão sendo reivindicadas pelos Guarani-Ñandeva

6 Segundo Pierre Clastres, Terra sem Mal é o “[...] lugar de repouso dos deuses, onde as flechas partem sozinhas à procura da caça, onde o milho cresce sem que ninguém cuide dele, território dos adivinhos, do qual toda a alienação está ausente, território que foi, antes da destruição da primeira humanidade pelo dilúvio universal, o lugar comum aos humanos e aos divinos” (CLASTRES, P. 1982, p. 101).

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e Guarani-Kaiowá. Todas elas decididas em Aty Guasu, como chamam as grandes assembléias utilizadas, tradicionalmente, pelas lideranças Guarani-Ñandeva e Guarani-Kaiowá para debate de grandes problemas importantes na comunidade.

É importante enfatizar que do território original com cerca de 20.000 km2, restaram, legalmente, aos Guarani-Ñandeva e Guarani-Kaiowá apenas 18.124 hectares divididos em oito reservas no final da década de 1950, segundo Brand (2000) e que, hoje, apresentam altíssimos índices de densidade demográfica, que caracterizam ostensivamente situações de superpopulação com conseqüências nefastas para os índios (BRAND, 1993; THOMAZ DE ALMEIDA; MURA, 2003; ADRIANA DA SILVA, 2005).

A seguir, observam-se no quadro 01, os 8 postos indígenas criados entre 1915 e 1928 e no quadro 02 em que estão apresentadas as terras retomadas pelos Guarani-Kaiowá e Guarani-Ñandeva a partir de 1980 e a situação jurídica de cada terra. Por último, no quadro 03estão apresentadas as terras indígenas reivindicadas por esses povos, mas que, ainda, não há retorno do Governo Federal sobre a situação delas.

QUADRO 01 – Postos Indígenas criados entre 1915 e 1928 no

Estado do Mato Grosso do Sul

Posto Indígena Data de Criação Extensão em ha.

Pop. (FUNASA, 2006, apud COLMAN, 2007) Observação Reserva de Amambaí ou

Posto Indígena Benjamin Constant

Decreto No. 401, de 10/05/1915

3600 6.663 Em 1926, foi reduzida para 2.429 ha.

Reserva de Dourados ou Posto Indígena Horta Barbosa

Decreto No. 404, de 03/09/1917

3.600 10.205 Atualmente possui 3.475 ha.

Reserva de Caarapó ou Posto Indígena José Bonifácio

Decreto No. 684, de 20/11/1924

3.750 3.838 Atualmente esta área possui 3.594 ha.

Reserva Limão Verde

Decreto No. 835, de

14/11/1928 900 1.175 Atualmente esta área possui 668 ha.

Reserva de Taquaperi ou Posto Indígena de Cerro Perón

Decreto No. 835, de

14/11/1928 2.000 2.728 Atualmente esta área possui 1.886 ha.

Reserva de Sassoró ou Posto Indígena de Sassoró

Decreto No. 835, de 14/11/1928

2.000 2.076 Também conhecida como Ramada, atualmente possui 1.923 ha.

Reserva de Porto Lindo ou Posto Indígena do Jacareí

Decreto No. 835, de

14/11/1928 2.000 3.687 Atualmente esta área possui 1.650 ha.

Reserva de Pirajuí ou Posto Indígena de Pirajuí

Decreto No. 835, de

14/11/1928 2.000 2.551 Atualmente esta área possui 1.923 ha.

Fonte: BRAND, 2000, p. 117-121; COLMAN, 2007, p. 29-30. Organização: SOUZA, 2008.

QUADRO 02 – Terras retomadas a partir de 1980 no Estado do Mato Grosso do

Sul

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COLMAN, 2007)

Rancho Jacaré 1979 Laguna

Carapã 777,53 395 Homologada 1984

Guaimbé 1979 Laguna Carapã 716,93 571 Demarcada 1984

Takuaraty/Yvykuarusu/

Paraguasu 1984 Paranhos 2.609 398 Homologada 1993

Pirakuá 1983 Bela Vista 2.384 473 Homologada 1992

Jaguapiré 1985 Tacuru 2.349 892 Homologada 1992

Sete Cerros 1987 Coronel

Sapucaia 9.584 340

Homologada 1993 e retomada em 1994

Jarará 1983 Juti 479 443 Homologada 1993

Guasuty 1985 Moreira Aral 959 324 Homologada 1992

Jaguari 1987 Amambai 405 355 Homologada 1992

Cerrito 1993 Eldorado 1.950 534 Homologada 1992

Panambizinho 1995 Dourados 1.240 304 Reconhecida 1995. Ocupavam apenas 60 ha. Até 2005

Fonte: CONSELHO, 2000, p. 16-17; COLMAN, 2007, p. 36-41. Organização: SOUZA, 2008.

QUADRO 03 – Terras tradicionais identificadas no Estado do Mato Grosso do

Sul

Nome do Tekoha Retomada Município Data da Área em ha. (FUNASA, 2006, apud População

COLMAN, 2007) Situação fundiária

Sukuri-y/ Mbarakaju/ Maracaju

1995 Maracaju 500 116

Identificada em 1995. Índios foram expulsos da terra em 1996. Homologação em 1998. Mas vivem em apenas 67 ha.

Potrero Guasu 1998 Paranhos 4.985 383

Só foi Demarcada uma área de 400 ha. As terras estão ocupadas por colonos.

Arroyo Korá 1999 Paranhos 7.205 209

O Governo ainda não tomou nenhuma providência para a Demarcação da terra. Vivem em 100 ha.

Aldeia Campestre 1998 Antônio

João 11 327

Localiza-se no centro do território imemorial e tradicional de Cerro Marangatu. A terra foi “cedida” pela prefeitura municipal.

Cerro Marangatu 1998 Antônio

João 9.300 510

Depois de Homologada pelo presidente da República, foi dada reintegração de posse aos fazendeiros e os indígenas foram expulsos. Nada está resolvido.

Lima Campo/ Jatayvaru/

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Nada está resolvido.

Kokue’i 1998 Bela Vista 6.535 148 ocupam apenas 100 ha. Dos 6.535 reivindicados

Takuara 1999 Juti 9.650 202 Ocupam 60 ha. Do que foi reivindicado

Ypytã/Guiraroka/Yvyraroka 2000 Caarapó 11.401 156 Sem providências da Funai

Sombrerito 2005 Quedas Sete 15.000 209

Estão identificados 15.000 ha., mas o Relatório de Identificação não foi publicado ainda. Ocupam 800 ha.

Porto Kambira/ Passo

Piraju --

Dourados/ Laguna

Carapã -- 92

ocupam uma área de 100 ha. E aguardam providências da Funai.

Panambi -- Douradina 2.037 858

Reservada pelo SPI em 1942, mas 1647 ha. Estão invadidos por colonos da CAND. Ocupam apenas 390 ha.

Fonte: CONSELHO, 2000, p. 16-21; COLMAN, 2007, p. 41-47. Organização: SOUZA, 2008.

Figura 01 - Áreas Indígenas Guarani-Kaiowá e Guarani-Ñandeva no Mato Grosso do Sul.

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Enquanto aguardam, as manchetes na imprensa não são positivas. A Funai iniciou os trabalhos de identificação e demarcação das terras reivindicadas como afirma a reportagem de Vinicius Konchinski (2008):

[...] os antropólogos devem percorrer 26 municípios da região sul do MS, entre eles Dourados, Amambai, Maracaju e Rio Brilhante. Durante 73 dias, os profissionais farão um estudo técnico e histórico que servirá de subsídio para relatório sobre quais são os locais a serem demarcados com território exclusivo para ocupação dos indígenas daquela região. O documento será encaminhado posteriormente ao Ministério da Justiça. "O trabalho dos antropólogos é o começo de um longo processo", afirmou [Claudionor do Carmo] Miranda [Administrador Executivo Regional da Funai Campo Grande], lembrando que a demarcação segue um amplo caminho burocrático até ser concluída. "O Guarani-Kaiowá que era nômade agora vive numa área em que só cabe a sua casa. Isto acaba atingindo a auto-estima deles", enumera o administrador regional da Funai. (KONCHINSKI, 2008). O Governo Federal que assumiu compromisso com os povos indígenas de Mato Grosso do Sul, entretanto, enfrenta, atualmente, a oposição dos fazendeiros que receberam o título de propriedade desde a época de Getúlio Vargas e não permitem a entrada da equipe multidisciplinar que compõem os Grupos Técnicos (GTs). Segundo o que apurou Vinicius Konchinski (2008), da Agência Brasil. Os fazendeiros fazem uso de violência para interromperem os trabalhos e coibirem o movimento indígena, inclusive

[...] milícias armadas estariam agindo nos municípios da região sul de Mato Grosso do Sul, a mando de fazendeiros, para intimidar e expulsar índios Guarani-Kaiowá de terras reivindicadas por eles. A denúncia é do Conselho Indigenista Missionário (CIMI) e do Ministério Público Federal de Dourados (MS) (MATTEDI, 2007). Nessa luta, o povo Guarani conta com muitos apoios, entre eles: o Ministério Público Federal, Comitê Regional de Defesa Popular, Movimento de Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST), Universidade Federal da Grande Dourados (UFGD), Conselho Indigenista Missionário, Funai e Sindicato de Trabalhadores da Educação (CONSELHO, 2008).

Esta é a situação atual dos Guarani-Kaiowá e Guarani-Ñandeva no Estado do Mato Grosso do Sul. Não muito diferente de outras etnias que estão distribuídas pelas cinco regiões brasileiras. Fruto da concentração de terras, os chamados latifúndios e, agora, a pressão econômica do agronegócio, principalmente das usinas de álcool e cana-de-açúcar que pressionam os indígenas a viverem um modo de vida degradante.

Muitos dos problemas enfrentados pelos Guarani e várias etnias no Brasil são frutos da ignorância e do preconceito. É enfoque do uso das terras pelos índios numa visão puramente capitalista. Para esses últimos, as terras têm riquezas, tanto no solo quanto no subsolo, que do ponto de vista capitalista, estão sub-aproveitadas. Daí a expressão “muita terra para pouco índio” Essa visão tem sido freqüentemente divulgada pela grande imprensa. O caso mais notável é o do julgamento da demarcação contínua da Terra Indígena Raposa Serra do Sol, já homologada pelo presidente da República, mas que foi julgada no Supremo Tribunal Federal, a pedido dos fazendeiros que ali estão.

A grande imprensa contribui para o entendimento de que a distribuição de terras aos índios é irracional e que prejudica os interesses nacionais, influenciando até na soberania do Brasil. Isso significa que falta a visão humanista, histórica e antropológica do assunto, da mesma forma, são precários ou nulos, os conhecimentos jurídicos sobre a questão indígena.

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3. AGRADECIMENTOS

Agradecimento à Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior – CAPES pela bolsa de estudos fornecida, sem a qual, tal trabalho não existiria.

4. REFERÊNCIAS

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93-131.

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Socioambiental, 2003. Disponível em:

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THE GUARANI –KAIOWÁ AND THE GUARANI-ÑANDEVA AND THE

TAKING BACK OF TRADITIONAL LANDS PROCESS

Fist author’s name: José Luiz de Souza8

Institution name and address: Post Graduation in Geography Program of the Geography Institute of the Federal University of Uberlândia.

e-mail adress: souzajlms@hotmail.com

Second author’s name: Profa. Dra. Vânia Rubia Farias Vlach9

Institution name and address: Post Graduation in Geography Program of the Geography Institute of the Federal University of Uberlândia.

e-mail adress: vaniarubia@netsite.com.br

Abstract: The Guarani-Kaiowá and the Guarani-Ñandeva are indigenous people that live in the south of Mato do Grosso do Sul State. These people try to go back to their land since the decade of 1970; their lands were taken from them by the creation da Colônia Agrícola de Dourados (Agricultural Cologne Creation of Dourados) (CAND). During the creation of the CAND process the Guarani people have been trough a confinement process. Their area which was originally of 20 000 km² became 18 000 hectares on which people had to live on 8 indigenous posts. Nowadays the indigenous agency authorized the demarcation of the new claimed lands, but, on the other hand, the farmers installed and the agribusiness are claiming for their rights. Tension in the south of Mato Grosso do Sul has increased when the indigenous people were attacked by militias sent by the farmers in order to get rid off the Guarani-Kaiowá and Guarani-Ñandeva from the area. It’s presented a brief historical about the Guarani peoples in the Mato Grosso do Sul State as well as the confinement process established against them.

Key-words: Traditional territory, Guarani, Geography, indigenous spatiality

8 Doctoral candidate in Geography on the Post Graduation in Geography Program of the Geography Institute of the Federal University of Uberlândia.

Referências

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