U
NIVERSIDADE
C
ATÓLICA DE
B
RASÍLIA
PRÓ-REITORIA DE PÓS-GRADUAÇÃO E PESQUISA
MESTRADO EM ECONOMIA DE EMPRESAS
O MODELO DE VELASCO EXPLICA A CRISE CAMBIAL ARGENTINA?
ATAÍDE HENRIQUE DUARTE JÚNIOR
Dissertação apresentada à Universidade Católica de Brasília como parte dos requisitos para a obtenção do título de Mestre em Economia de Empresas.
ORIENTADOR: PROF. DR. TITO BELCHIOR S.MOREIRA
ÍNDICE
I- INTRODUÇÃO... 5
II -REFERENCIAL TEÓRICO... 8
II.1 - MODELOS... 8
II.1.1 - MODELOS DE PRIMEIRA GERAÇÃO ... 9
II.1.1.1 – MODELO DE KRUGMAN... 11
II.1.2 – MODELOS DE SEGUNDA GERAÇÃO... 12
II.1.3 - MODELOS DE TERCEIRA GERAÇÃO... 20
III.1 – FATOS ESTILIZADOS... 23
III.1 – A CRISE ARGENTINA... 23
III.1.1 - ANÁLISE DA LEI DE CONVERSIBILIDADE... 29
III.1.2. - OPINIÕES DE EMINENTES LIDERANÇAS SOBRE A CRISE ARGENTINA ... 30
III.1.3 - FATOS MACROECONÔMICOS DA ARGENTINA... 34
III. 2 - CRISES CAMBIAIS PELO MUNDO... 37
III.2.1 - A CRISE DO SME (1992)... 37
III.2.2 - A CRISE NO MÉXICO (1994)... 37
III.2.3. A CRISE NA ÁSIA (1997)... 38
III.2.4 - A CRISE NA RÚSSIA (1998)... 39
III.2.5 – A CRISE NO BRASIL (1999)... 40
III. 3 – MODELOS DE CRISES CAMBIAIS... 42
IV- MODELO DE VELASCO... 43
IV.1- DETALHAMENTO DO MODELO... 44
IV.1.1 – CUSTO POLÍTICO DA DESVALORIZAÇÃO... 48
IV.1.2 - DEFINIÇÃO DAS ZONAS DE CREDIBILIDADE... 50
V- RESULTADOS... 51
VI- CONCLUSÃO... 53
BIBLIOGRAFIA... 55
APÊNDICES... 61
RESUMO
Este artigo efetua a análise da crise econômica ocorrida na
Argentina e que culminou, em dezembro de 2001, com o abandono do
currency board, que vigorava desde 1991. Além disto, se utiliza o
modelo de Velasco (1996) para identificar se as causas da referida crise
foram decorrentes de ataques especulativos, ocasionados por
desequilíbrios nos fundamentos macroeconômicos, ou se os problemas
aconteceram devido a profecias auto-realizáveis, a despeito de os
fundamentos serem bons ou não. Foi considerado no trabalho o período
de 1991 a 2001 – a exceção foi quando se efetuou a análise de algum
indicador cuja influência foi além deste referido período - década em
que se pôde constatar a situação díspare, extrema e contraditória
experimentada pelos argentinos. Num curto espaço de tempo, eles
passaram da fase de uma euforia extremada, após a implantaçao do
Plano de Conversibildade em 1991, até a indisfarçável sensação de
derrota e frustação quando a grave crise econômica foi instalada. Pode-se
concluir pelos resultados apresentados que antes da bancarrota em 2001,
a Argentina era suscetível a crises auto-realizáveis.
Palavras-chave: Ataque especulativo, Credibilidade, Câmbio Flutuante,
ABSTRACT
This work analyzes the economical crisis occurred in Argentine,
that led them to renounce the currency board used since 1991 on
december 2001. Also it was used Velasco’s model (1996) to identify if
the causes of the crisis were due to speculative attacks, caused by
instabilities on macro-economic fundaments, or to auto realized
prophecies, ignoring if the economic fundaments were good or not. This
work covered the period from 1991 to 2001 excepted when the analysis
of any indicator that influence extrapolated this period; a decade that
Argentinean people felt an extreme, singular and contradictory
experience. In short period of time them experienced an extreme
euphoria, right after the Convertible Plan had being established on 1991
to a frustration and the uncomfortable feeling of loses, when the
economical serious crisis happened. Based on the results it was possible
to conclude that before the economical crash on 2001, Argentine was
susceptible to auto realized crisis.
Key words: Speculative Attacks, Credibility, Floating Exchange Rate,
I - INTRODUÇÃO
“O triunfo tem muitos herdeiros, a derrota tem muitos
órfãos”. O leitor que estivesse lendo a Editoria de Política de um jornal e
deparasse com esta frase iria imaginar que o seu autor seria um
destacado governante, responsável por relevantes contribuições para o
bem estar dos referidos herdeiros que, em consequëncia, lhes seriam
grato pelas benesses recebidas. Entretanto, a realidade é outra. Na
verdade, seriam os órfãos quem, de maneira mais incisiva, lamentariam
não a derrota, mas pior ainda, uma sucessão delas. O cenário: a
Argentina, o autor da frase: Carlos Menem, um dos últimos presidentes
daquele país, e a quem a se imputa de forma mais veemente a
responsabilidade pela crise experimentada pelo país, que até os primeiras
décadas do século passado era um dos exemplos emblemáticos de nação
desenvolvida. Menem que pretendia voltar a ocupar a cadeira número 1
do país faz o seu proselitismo lançando mão de indicadores econômicos
que além de eloqüentes lhes eram bem favoráveis. “Quando deixei o
governo, a dívida externa( em 2001) era de US$ 120 bilhões, a renda per
capita de US$ 8.000. Quando o presidente Eduardo Duhalde deixar o
governo a dívida será de US$ 180 bilhões, o que representa 114% do
PIB ao passo que quando eu saí era de 43% ou um pouco menos. O
índice de pobreza subiu para 61%”. Entretanto antes que os candidatos e
os órfãos que ele mesmo citou lhe direcione uma saravaida de críticas ele
fez a mea culpa e destaca que houve realmente excesso nos gastos
públicos. Este desvio do fundamento econômico para um país
reconhecidamente dependente do capital externo para financiar o seu
déficit e que desde 1991 regia a sua economia com o recurso heterodoxo
minaram-lhes as forças e acabaram por determinar o colapso. Contribuiu
para este desarranjo as privatizações em excesso – e em curto espaço de
tempo – e liberdade demais às províncias, dentre outros itens.
No presente artigo, será analisado - com o recurso do modelo
matemático de Andrés Velasco – se a crise cambial argentina é o
resultado de desajustes da economia ou um profecia que se auto realizou.
Ou em outras palavras, se os argentinos foram ingratos ao impedir um
governante que teve o mérito de promover um notável crescimento do
país, voltasse ao poder ou sensatos ao não permitir que Menem – e seu
inseparável Ministro da Economia, Domingos Cavallo – lhes fizessem
mais uma vez de cobaias de mais uma experiência econômica.
É importante registrar que a crise financeira que abalou a
economia argentina, bem como a de várias nações emergentes - sem
qualquer discriminação - proporcionou a consolidação de um rico, fértil
e vasto campo da literatura econômica alusiva ao assunto. Se se procurar
na história mais recente o fato relevante que motivou os economistas a
abordarem este tópico, que cabe salientar contavam com o importante
recurso de modelos matemáticos para demonstrar a teoria, irá se deparar
com as crises ocorridas no Sistema Monetário Europeu de 1992/93. Estas
combinadas com aquelas ocorridas nos “mercados emergentes”
propiciou, a partir de então, a realização de vários estudos teóricos e
empíricos. Aos modelos convencionais de crises cambiais, conhecidos
como modelos de primeira geração – nos quais os problemas são
decorrentes do resultado da deterioração dos fundamentos
macroeconômicos dos países – foram acrescentados dois outros: os
modelos de segunda geração - em que as crises são auto-realizáveis e os
Este trabalho está estruturado da seguinte maneira: na seção II
feita uma abordagem do referencial teórico com foco na crise Argentina
e nos modelos cambiais. Na seção III é feita uma revisão da literatura
acerca de cada um dos modelos; a seção IV descreve o modelo de
II – REFERENCIAL TEÓRICO
II. 1 - MODELOS
É interessante evidenciar, de antemão, que, a princípio, o modelo
ao prever uma crise, poderia permitir aos agentes econômicos
desencadear as ações necessárias com vistas, senão a evitá-la, pelo
menos minimizar seu impacto.
Vários autores, dentre eles Viana (1999) ressaltam que o modelo
básico “associado ao trabalho iniciado por Paul Krugman (1979), analisa
a ocorrência de uma crise cambial culminando com ataque especulativo
no caso de um país que apresenta um déficit fiscal insustentável
financiado por emissão de moeda, mas que tenta simultaneamente
manter uma certa paridade cambial em relação a uma moeda de
referência”. Mesmo que o país disponha de um estoque aparentemente
elevado de reservas internacionais a impossibilidade de financiamento
não inflacionário por todo o tempo, em função do crescimento
extraordinário, do estoque de dívida pública leva os agentes econômicos
a antecipar o abandono da paridade cambial, provocando assim o ataque
especulativo contra a moeda.
O interessante é que de acordo com Pastore e Pinotti (1998) -
citando Paul Krugman - “os ataques especulativos são inevitáveis e não
ocorrem quando as reservas se esgotam, mas quando elas ainda estão
elevadas”. Flood e Garber aprimoraram esta análise de Krugman,
mostrando que o ataque ocorre justamente no momento em que os
especuladores estão seguros quanto ao fato de que, se for feita a
Crises cambiais sempre terminam na flutuação da taxa cambial.
Quando os bancos centrais estão enredados na crise e tentam tardiamente
desvalorizar o câmbio com reservas baixas, perdem o controle da
desvalorização. Foi isso o que ocorreu na grande maioria dos países que
postergaram seus ajustes macroeconômicos, dentre eles a Argentina em
2001, as nações do Sudeste Asiático, em 1997 e o México, em 1994. Em
todos esses casos sempre ocorreram desvalorizações cambiais muito
grandes, seguidas de recessões profundas, e são exemplos de que, “ainda
que a defesa da paridade cambial com a elevação da taxa de juros tenha
custos, os custos de se chegar à crise podem ser ainda maiores” sinaliza
Pastore e Pinotti (1998).
Antes da década de 90, os ataques especulativos eram
considerados eventos previsíveis, pois conforme frisado, com base nos
assim chamados modelos de primeira geração, eles resultavam da
existência de políticas econômicas inconsistentes (deterioração nos
fundamentos). Os ataques especulativos ocorridos na Europa
(1992-1993) e no México (1994), entretanto, indicaram que as crises cambiais
ocorriam não apenas devido à deterioração dos fundamentos
econômicos. Isto possibilitou o surgimento dos chamados modelos de
segunda geração.
Posteriormente, quando da ocorrência da crise asiática, ficou
evidente que o arcabouço teórico presente nos modelos da primeira e
segunda geração não eram suficientes para explicar a referida crise.
Aparecia então o modelo de terceira geração.
A seguir serão analisadas as características de cada um deles
Apesar de ser creditado a Krugman (1979) o pioneirismo na
elaboração de um modelo que analise a crise cambial, não se pode
descartar o relevante trabalho desenvolvido por Salant e Henderson em
1978, de acordo com Szkurnik (1999). O foco era os métodos propostos
para estabilizar os preços de "commodities" e relacionavam o ataque a
agências internacionais responsáveis pela compra e venda de bens a um
preço pré-determinado.
O modelo desenvolvido por Krugman (1979) e em seguida
aprimorado por Flood e Garber (1984), replicava a história da agência e
da commodity. Os personagens, neste caso, seriam, no entanto, o
governo (agência) do país em questão que se incumbiria da emissão
constante de moeda para financiar seu déficit fiscal, ao mesmo tempo em
que tentava manter uma cotação fixa para a taxa de câmbio
(commodity), usando as suas reservas internacionais para comprar
moeda doméstica à taxa estabelecida. Esta emissão de moeda junto com
a tentativa de manutenção da cotação fixa, iria determinar o aumento da
cotação da moeda estrangeira, eventualmente superando o estabelecido
pelas autoridades monetárias, quando então o ataque se daria. A adoção
de uma política monetária expansionista faria com que a demanda
doméstica fosse maior do que a produção, sendo a diferença
transformada num déficit no balanço de pagamentos que seria financiado
pelo Banco Central através do estoque de reservas internacionais, daí
este modelo inicial também ser chamado de “modelo de crise de balanço
de pagamentos”.
Os especuladores têm ciência do fato que quando as reservas
internacionais se esgotassem, o preço da moeda externa começaria a
subir, fazendo com que fosse mais vantajoso para eles investirem em
a vender moeda doméstica um pouco antes da exaustão total de reservas.
Este movimento se repetiria (uns tentando se antecipar a outros) fazendo
com que quando as reservas caíssem abaixo de um certo nível, haveria
em ataque que rapidamente levaria as reservas internacionais à zero
forçando o abandono da taxa fixa de câmbio.
Os assim chamados modelos de primeira geração explicam as
crises cambiais em decorrência do crescimento do crédito interno,
principalmente para o financiamento do déficit público, sob regime de
câmbio fixo e dadas reservas internacionais limitadas.
Estes modelos se caracterizam pelo seguinte: previsão perfeita e
equilíbrio único, ataque especulativo antecipado contra as reservas do
governo e inconsistência nas políticas fiscal e monetária.
II.1.1.1 – MODELO DE KRUGMAN
No modelo de primeira geração de Krugman (1979), estão
presentes os seguintes parâmetros: uma economia aberta, pequena, que
produz um único bem, cujo preço é determinado pelo mercado.
Flexibilidade completa de preços e salários assegura sempre o pleno
emprego e produção. A diferença entre produção e gastos determina a
balança de pagamento. Só dois ativos estão disponíveis a investidores e a
moeda estrangeira têm taxas de juros nominais igual a zero. A taxa
esperada de inflação é a taxa esperada de depreciação da moeda local.
Sob um regime de taxa cambial fixo, o governo mantém um nível de
reservas estrangeiras e usa isto para manter o câmbio.
A partir de um modelo simples para uma economia pequena,
Krugman destaca que uma crise na moeda é causada pela conjugação dos
fiscal, com políticas monetárias desencontradas que conduzem a uma
perda de reservas estrangeiras e, com isto, o câmbio não pode ser
mantido fixo.
Flood e Garber (1984), tornaram o modelo de Krugman (1979)
linear e estocástico por meio da inclusão de emissão monetária
constante, sujeita a erro aleatório.
Resumindo, o modelo canônico explica as crises cambiais como o
resultado de inconsistências nos fundamentos, tipicamente a manutenção
de déficits governamentais que seriam financiados por emissão de moeda
aliada à tentativa de manutenção de uma taxa de câmbio fixa. O colapso
da moeda, portanto, seria uma conseqüência natural da falta de controle
orçamentário. Pode ser afirmado que estes modelos mostram que nem
sempre colapsos cambiais são resultados de comportamento irracional
dos agentes mas o resultado cultivado pelo próprio governo, que faz com
que manter a moeda doméstica no portafólio dos agentes econômicos se
torne desinteressante, uma vez que seu preço não será mais controlado,
ou estabilizado, pelo Banco Central em questão.
II.1.2 - MODELOS DE SEGUNDA GERAÇÃO
A crise do Sistema Monetário Europeu (SME), em 1992,
introduziu um novo modelo de análise denominado de “segunda
geração” em que um país mesmo com os fundamentos macroeconômicos
(monetários e fiscais) sólidos pode ser vítima de um ataque especulativo,
que passa a ter um caráter auto-realizável.
Miranda (2002) sublinha que os modelos teóricos de crises
cambiais de primeira geração não são suficientes para a explicação das
defender sua respectiva moeda. Isto tanto por deterem reservas
internacionais suficientes para readquirir praticamente a totalidade da
base monetária, quanto por terem amplo acesso ao mercado financeiro,
podendo emitir títulos externos com o objetivo de recuperar as reservas
internacionais. Ao agirem desta forma, entretanto, as taxas de juros
seriam elevadas a tal ponto de colocar em risco o sistema financeiro e
prejudicar o crescimento do produto agregado. Deste modo, a
desvalorização cambial provocada pelo ataque especulativo é, em última
instância, uma opção do governo pelo abandono da fixação do câmbio,
priorizando outros objetivos de política econômica, notadamente a
preservação do sistema financeiro e do emprego
Nos modelos de segunda geração, deve ser acrescentado um fato
novo em relação aos modelos de primeira. Nestes há um equilíbrio
único, enquanto nos modelos de segunda geração como não há mais uma
relação perfeita entre os fundamentos (agora ampliados) e a crise,
existem dois equilíbrios possíveis se o país encontra-se na “região
frágil”. Pode acontecer o equilíbrio com ataque especulativo (quando a
crise auto-realizável ocorre) bem como o equilíbrio sem ataque (e, assim,
sem crise). Aqui fica evidente que como há a possibilidade de equilíbrios
múltiplos, a crise não é mais totalmente previsível, como nos modelos de
primeira geração, com equilíbrio único.
Nos modelos de segunda geração, ao contrário, dos da primeira,
existe uma estrutura estocástica com tempo discreto, fato que determina
a ocorrência de duas propriedades fundamentais: a existência de uma
variável estocástica, que introduz a “incerteza” (entendido como o risco
probabilístico nestes modelos) ; e a não-linearidade no comportamento
Nos modelos de crise cambial de segunda geração, não ocorre a
relação perfeita entre desequilíbrios nos fundamentos “estritos” e crises,
como nos modelos de primeira. Neste segundo item, os ataques
especulativos auto-realizáveis somente ocorrem se os fundamentos
“ampliados” são frágeis, o que impõe um dilema de política às
autoridades monetárias. Assim, países com fundamentos sólidos
continuam sendo imunes aos ataques especulativos auto-realizáveis e,
assim, às crises. Estes modelos não conseguem explicar a recorrência
destes ataques (e, assim, das crises). Esta é uma limitação, portanto, dos
modelos de equilíbrio múltiplo.
Este limite dos modelos de segunda geração, pode ser superado,
com a introdução de uma variável exógena, que teria a função de
coordenar as antecipações dos agentes. Dadas as hipóteses de
expectativas racionais e informação perfeita, esta variável representaria o
comportamento irracional de parcela dos operadores do mercado. Uma
outra forma de solução da “falha” dos modelos de segunda geração
poderia estar vinculada à hipótese de informação perfeita.
Se se procurar um motivo relevante que levaria o governo a
modificar o sistema cambial corrente, poderia ser citado, por exemplo, a
taxa de desemprego. Se ela está alta ao longo do tempo, devido à rigidez
nominal, para baixo, dos salários e neste caso o governo quisesse adotar
uma política monetária expansionista para resolver isto, também não
poderia em razão da taxa cambial fixa. Uma outra razão seria alguma
variável econômica (ou fundamento) estar fixada em moeda doméstica.
Uma possibilidade lógica seria o peso de uma grande dívida em moeda
doméstica. O governo iria querer monetizar - mas não pode porque está
Um motivo para que o governo em questão queira defender o
regime de câmbio fixo, seria a adoção deste regime por razões de
controle de inflação, ou seja, o câmbio funcionando como âncora para os
preços domésticos e "garantidor" de credibilidade. Uma outra razão
poderia ser a suposição de que o câmbio fixo facilitaria o comércio
internacional além de facilitar investimentos estrangeiros no país.
Diante da dúvida entre os custos de manter a paridade cambial e
os custos de defesa da moeda - que estivessem aumentando em relação
aos benefícios da defesa de seu valor - em algum ponto no futuro, o país
poderia desvalorizar a moeda mesmo sem um ataque especulativo. Os
especuladores iriam tentar se antecipar a este movimento, ou seja, vender
moeda doméstica antes da desvalorização, o que pioraria a situação do
governo, fazendo com que a desvalorização ocorresse mais cedo. Como
alguns irão tentar fazer um pouco antes de outros, o resultado é uma
crise que leva ao fim do regime de taxa cambial fixa antes mesmo que os
fundamentos da economia indiquem a necessidade de desvalorização.
Pode ser enfatizado que nos modelos de segunda geração o foco é
a contínua observação que governo realiza entre os benefícios de mudar
a política cambial versus os custos de defendê-la.
Um fato interessante é que tanto os modelos de "segunda geração"
quanto do modelo fundamentalista tem uma característica comum: uma
crise cambial ocorre como resultado de políticas inconsistentes com a
manutenção de uma taxa cambial fixa enquanto os agentes econômicos
tentam proteger seu patrimônio realizando alterações de portafólio
através do mercado financeiro.
Se não houvesse mais uma deterioração nos fundamentos, qual
seria o resultado? E se se acreditasse que o governo pudesse realmente
haver uma crise cambial auto-realizável. O investidor não irá se desfazer
de moeda doméstica se não houver um perigo de desvalorização, mas
sem dúvida irá fazê-lo se um colapso cambial for muito provável. Aí
neste caso a crise pode acontecer justamente se muitos agentes
econômicos alterarem as suas posições em moeda doméstica, ou seja, a
referida crise será auto-realizável. Dever ser destacado, no entanto, o fato
de que mesmo em modelos de crise auto-realizáveis, a presença de
algum fundamento econômico - como por exemplo, reservas
internacionais ou déficit público - fraco é que tornará o país
potencialmente exposto a um ataque especulativo. Desta forma se o
governo passa para a opinião pública a idéia de que abandonará o
controle da taxa cambial por algum motivo, certamente irá ser forçado a
fazê-lo.
Os equilíbrios múltiplos ocorrem justamente quando os agentes
econômicos antecipam a possibilidade de um ataque ser bem sucedido,
forçando assim uma alteração na política econômica vigente. Diante
disto, seriam justamente os fundamentos futuros esperados
condicionados ao ataque ser bem sucedido, e não o estado presente dos
fundamentos, que seriam incompatíveis com a política cambial. Desta
forma aparecem duas possibilidades: um equilíbrio em que não há ataque
e nem mudança nos fundamentos e um outro em que um ataque
especulativo é seguido de uma mudança nos fundamentos que validaria,
após a ocorrência, a mudança cambial que os investidores esperariam
que ocorresse
Krugman (1996) registra dois aspectos muito interessantes sobre
os equilíbrios múltiplos. Primeiro, estes teriam menor probabilidade de
ocorrer quando a situação dos fundamentos econômicos estivesse ruim.
com a política cambial, os investidores teriam pouca dúvida de que uma
crise poderá ocorrer, e rapidamente se caminharia para um equilíbrio em
que a moeda é atacada e desvalorizada. Por outro lado, quando os
fundamentos estivessem bons, não se teria certeza sobre a possibilidade
de uma crise, resultando na possibilidade da existência de equilíbrio
múltiplo. Uma vez que se os agentes econômicos não conhecem as
preferências das autoridades monetárias, poderiam ocorrer diversos
ataques mal-sucedidos, sendo então esses ataques não justificados pelos
fundamentos econômicos correntes.
Calvo (1999) estuda a existência de equilíbrios múltiplos
provocados pela “crise russa” e seu conseqüente “efeito de contágio”1
junto às economias emergentes. Ele considera que, num mundo de
informação assimétrica, os investidores racionais - mas com informação
imperfeita - poderiam reagir de forma muito forte, e volátil, a sinais
repassados por outros investidores “bem informados”. Estes sinais
poderiam ser advindos de fatores que interessassem exclusivamente a
esses “investidores-informados”, que nada teriam a ver com os
fundamentos econômicos das outras economias emergentes. Outro fator
poderia ser também uma suspensão acentuada e não-indicada dos fluxos
de entrada de capitais externos, o que a levaria à existência de equilíbrios
múltiplos
Jeanne (1995) – economista citada por Velasco em seu modelo-
mostra, que é o estado dos fundamentos que determinam a existência e
multiplicidade de equilíbrios. Neste caso nem os fundamentos são tão
1
fortes para fazer um ataque bem sucedido impossível e nem tão fracos
para torná-los inevitáveis.
Nas crises auto-realizáveis, há a suposição de que os mercados são
ineficientes, ou em outras palavras, os agentes não fazem o melhor uso
da informação disponível. Este aspecto permite destacar a existência do
que é convencionado como "comportamento de manada": ou seja, os
investidores vendendo um ativo simplesmente porque todo mundo
também está.
Calvo (1996) também mostra que a diversificação de portafólio
poderia contribuir para a existência de "comportamento de manada".
Investidores muito diversificados têm menos incentivos à estudar
cuidadosamente cada país do que os que são menos diversificados .
Outros modelos de crise cambial tentam explicar o "efeito de
contágio", ou seja, uma crise que precipite o colapso cambial em um
determinado país detonaria a crise em um outro, possivelmente, devido à
transmissão da deterioração dos fundamentos econômicos. Isto se daria
através das ligações econômicas que existem entre países; por exemplo,
se o México sofre um ataque cambial bem sucedido e ele compete nos
mercados externos por produtos semelhantes aos do Brasil, nosso país
passa a ser um sério candidato a ter sua moeda desvalorizada. Também
poderia ter uma outra situação onde um ataque bem sucedido à moeda do
Brasil provocasse um déficit comercial na Argentina, levando a um
declínio gradativo nas reservas internacionais deste último, de tal
maneira que um ataque especulativo o afetasse.
Calvo (1999) analisa o "efeito contágio" da recente “crise russa”
ocorrida em 1998 entre as economias emergentes, com particular ênfase
provocado por uma falha no mercado de capitais, uma vez que o choque
inicial (a crise russa em si) afetou primordialmente os investidores
“informados”, deixando com que a precificação dos títulos dos países
emergentes ficasse nas mãos dos “desinformados”, e estes, teriam
interpretado o movimento de venda de títulos, não como sendo motivado
por uma falta de liquidez temporária, mas sim como indicação de que os
outros países emergentes também estariam com problemas em seus
fundamentos econômicos.
Choueiri (1999) elabora um modelo de equilíbrio múltiplo onde o
contágio é introduzido através da variação do prêmio de risco, ou seja,
uma crise cambial no país A afetaria o país B pelo aumento no prêmio de
risco que os investidores exigiriam para manter títulos emitidos por B;
desta forma, aconteceria o contágio "via crédito". Um investidor que
diversificasse seu risco retendo ativos em vários países emergentes e que
escolhesse a composição de seu portafólio maximizando a sua função de
utilidade esperada e que deparasse com uma crise iria fazer o seguinte:
diminuiria sua exposição no país com problemas, e num modelo de
incerteza, isto iniciaria uma realocação de portafólio fazendo com que o
investidor se retirasse de outros mercados também. Ativos denominados
em moedas que tivessem covariância positiva com a moeda atacada,
tornar-se-iam indesejáveis, e isto se traduziria em um aumento do
componente de prêmio de risco do retorno destes ativos.
Com relação aos modelos de segunda geração, tanto países
emergentes quanto países desenvolvidos seriam da mesma forma
vulneráveis aos ataques especulativos auto-realizáveis. Uma análise
superficial poderia dizer que a diferença estaria na origem do dilema de
crescimento ou do elevado estoque de dívida pública, e no caso dos paíse
emergentes, a fragilidade do sistema bancário.
Cabe ser lembrado que nos ao contrário do modelo da primeira
geração de crises de moeda em que as fraquezas persistentes nos
fundamentos fazem o colapso no regime cambial fixo, inevitável, os
modelos de segunda de geração enfatizam a relação entre os benefícios e
os custos de manter o câmbio fixo.
Nestes modelos pode acontecer também uma crise na moeda, sem
qualquer mudança significativa nos fundamentos mas por causa de um
ataque especulativo na moeda corrente. Neste caso, motivado pelas
expectativas dos participantes de mercado quanto a um colapso no
câmbio. Nesta situação, são identificados dois resultados: sem o ataque
especulativo, o câmbio pode ser mantido indefinidamente. Outro é que a
moeda corrente de uma economia com bons fundamentos
macroeconômicos também pode ser atacada. Neste caso, os
especuladores se antecipam aos fundamentos que mudarão depois do
ataque devido às suas expectativas.
II.1.3 – MODELOS DE TERCEIRA GERAÇÃO
O surgimento dos modelos de terceira geração está relacionado à
crise instalada em alguns países asiáticos. Os modelos convencionais,
tanto da primeira quanto da segunda geração, sobre crises cambiais não
foram suficientes para explicar que apesar do nível elevado de poupança
interna, dos bons fundamentos macroeconômicos e do direcionamento
dos fluxos de capitais para o investimento e não para o consumo interno,
esses países também se tornaram vulneráveis à reversão súbita dos
problemas nos fundamentos macroeconômicos não poderiam ser
apontados como os responsáveis pelas crises.
Estes modelos indicam uma convergência entre as crises cambiais
e crises bancárias e as interações entre estas e incorporam explicitamente
os fluxos de capitais na análise, destacando a sua relevância na eclosão
das crises gêmeas.
Os modelos de terceira geração partem da hipótese de assimetria
de informações no mercado financeiro e não uma conseqüência de
problemas na gestão de política macroeconômica, a ênfase dos modelos
de primeira e segunda gerações.
Uma das causas principais das crises está associada à possibilidade
ao moral hazard (risco moral). Isto acontece quando uma das partes
envolvidas é capaz de deslocar custos (riscos) para outras, após o
estabelecimento formal (contratual) de suas relações econômicas. Para
facilitar o entendimento é anotado a seguir um exemplo: no mercado
financeiro, quando a informação se distribui assimetricamente, o credor
não tem total capacidade de avaliar se o emprestador irá investir os
recursos do empréstimo num projeto de risco elevado ou num projeto
seguro, desde que este seja capaz de transferir o ônus do risco para o
credor. Se as garantias do emprestador forem limitadas, o resultado será
a execução de projetos de elevado risco.
A necessidade de garantias – para minimizar perdas - gera
distorções e estimula a absorção excessiva e insustentável de fluxos de
capitais pelos agentes domésticos (bancos, instituições financeiras
não-bancárias e empresas).
Um outro item relevante relacionado às crises explicadas pelos
liberalização financeira dos anos 90, verificou-se uma expansão do
crédito significativamente superior às taxas de crescimento da produção.
Este aspecto em si, cabe observar, não constitui um problema. O
problema é que no caso da crise asiática, grande parte desta expansão
concentrou-se em empréstimos de risco elevado.
Estes modelos de "terceira geração" têm como base Krugman
(1999). Para ele, os dois fatores determinantes desta onda de colapsos
cambiais seriam: 1) o papel dos balanços das empresas em determinar
suas capacidades de investimento e 2) os fluxos internacionais de
capitais determinando as taxas de câmbio real. As dificuldades nos
balanços das empresas e o impacto da taxa de câmbio real nesses
balanços (a explosão em moeda doméstica de dívidas denominadas em
dólar) seriam, nesta visão, considerados fatores determinantes da crise
asiática.
Ao finalizar a análise destes modelos utilizou-se do expediente de
fazê-lo, com o objetivo de facilitar o seu entendimento, além de se ir ao
encontro do propósito de apresentá-los de maneira mais didática. Cabe
ser destacado, entretanto, que não há uma rigidez considerável nesta
estratificação. Um exemplo é o contágio que para alguns autores pode
ser citada como motivo para crises de segunda geração, para outros
como terceiro enquanto que para Basel (2003), dadas as suas
III – FATOS ESTILIZADOS
III.1– A CRISE ARGENTINA
Nos anos noventa, a Argentina era a estrela brilhante da América
Latina e parecia que finalmente, depois de várias crises econômicas,
havia encontrado novamente seu caminho. A inflação acabou, o capital
afluiu e a economia cresceu a uma taxa anual de mais de 5% naquela
década até 98, ano identificado como o do início da crise naquele país
(gráfico 1). Como explicar, portanto, o fato de que no final da década de
90, aquele mesmo país que no início do século 20 era um dos dez mais
ricos do mundo - à frente da França e Alemanha e crescia a uma taxa
média anual de 5% nas três primeiras décadas de 1900 - entrou em
colapso? Como justificar o fato de aquele mesmo país que tinha a renda
per capita semelhante a da França, Alemanha e Canadá nos anos trinta,
se transformar numa estrela sem brilho? Pior ainda: cadente?
A orgulhosa população argentina - que sempre se vangloriou do
fato de o país, que num acidente geográfico, estava na América do Sul,
mas tinha todas as características de uma nação européia – teve uma
grave crise de auto-estima e perdeu o respeito pelas instituições.
Mas o que deu errado? “O resto do mundo” é a justificativa
oficial: preços baixos das commodities agrícolas; recessão e
desvalorização da moeda do Brasil em 1999 (país que comprava um
terço de suas exportações); crises no México em 1994; Tailândia,
Indonésia, Malásia e Coréia do Sul em 1997 na Rússia em 1998 e no
Brasil em 1999; e a valorização do dólar com o qual o peso argentino
estava ancorado. Estas graves crises econômicas provocavam, dentre
Argentina não seria uma exceção - e a elevação do custo dos
empréstimos externos.
O colapso econômico, financeiro, político e social acabou por se
instalar no terceiro país mais rico da América Latina, e depois de uma
década na qual o peso era, por lei, fixo em paridade com o dólar, teve
que ser desvalorizado e implantado o câmbio flutuante. O peso que já
estava sendo trocado na proporção de dois para 1 dólar no início de
2002, em meados de 2003 chegou à cotação de 3:1. Como a aplicação na
poupança, os empréstimos e os contratos estavam em dólares, a
desvalorização provocou mais caos financeiros. A implementação de
mecanismos com vistas à minimização do problema trouxe ainda mais
descontentamento: os depósitos em poupanças foram congelados, os
depósitos em dólar foram transformados em pesos desvalorizados e
houve restrição quanto aos saques.
Os indicadores econômicos colhidos desta grave crise, como era
de se esperar, foram muito ruins: o PIB contraiu 4,7 % em 2001 e 10,6 %
em 2002(gráfico 1), a recessão provocou a queda da renda per capita (em
dólar) que passou de um crescimento de 6,3% em 1997 para um
decréscimo de 6,9% em 1999(Hanke & Kurt, 2001). O desemprego
subiu para mais de 20% em maio de 2002(gráfico 3) e nas cidades, 44%
da população foram reconhecidas oficialmente pobres, com uma renda
de menos de 120 pesos por mês. Além disto o risco-país chegou a
alcançar quase 7.000 pontos, em junho de 2002(gráfico 13). E tudo isto
com um custo social ainda mais perverso. Com o confisco da poupança,
a relação de confiança entre o governo e cidadãos – o fundamento
essencial de uma democracia próspera - foi destruído.
Fica claro que os problemas não começaram ali. Eles se iniciam na
estreita com a figura populista de Juan Domingo Perón, que governou a
nação de 1946 a 1955. Suas medidas econômicas como o protecionismo
e a concessão de generosos benefícios a empresários tiveram resultados
negativos colhidos anos mais tarde. Se por um lado a democracia foi
restaurada em 1983, após um longo período de ditadura, a economia não
teve a mesma sorte: o país continuava em crise. Entre 1976 e 1989, por
exemplo, a renda per capita encolheu mais de 1% por ano. Períodos de
hiperinflação, dois colapsos bancários, falta de confiança no peso e na
política econômica, levaram os argentinos a colocar em prática um
hábito que não foi mais abandonado: o uso sistemático de dólares em
detrimento da moeda local. Também as pessoas com maior renda
passaram a preferir levar seus recursos para fora do país. No tocante à
hiperinflação é importante evidenciar que a sua magnitude vai bem além
do período acima citado. Desde o início da década de 60, a taxa anual
sempre foi relativamente alta. A média foi de 30,3% entre 1963-73, de
200% durante 1973-78, e de 380 % no período de 1983-87. Em 1989
alcançou o extraordinário número de 3.066,3%.
Em 1991, Carlos Menem e o Ministro da Economia Domingo
Cavallo, definiram o arcabouço para reverter este quadro através de
implantação de várias reformas. O principal item era a implementação do
currency board2, em que o peso era, por lei, fixo por lei na paridade de 1
2
A primeira nação que utilizou o currency board foi as Ilhas Maurício em 1849. Antes da 2ª Guerra Mundial, vários países introduziram este modelo cambial, dentre eles a Argentina. O currency board moderno foi introduzido em Hong Kong em 1983. Em 1991, depois de um período crítico de hiperinflação, é a vez da Argentina.
As vantagens do currency board são credibilidade econômica, inflação baixa e baixas taxas de juros. Mas ele pode não ser uma boa estratégia, especialmente em países que têm sistemas bancários fragilizados ou são propensos a choques econômicos.
para 1 e além disto a emissão de moeda ficava restrita ao nível de reserva
monetária.
A solução encontrada trouxe benefícios imediatos: o PIB chegou a
10,6% em 1991 e a inflação caiu para menos de 1%, uma das mais
baixas do mundo. E os reflexos postivos se estenderam pela década:
entre 1991 e 1997, (período que coincide com o de maior abundância na
oferta de empréstimos externos e que se esgotou com a crise da Ásia em
97. a Em 1994 ocorreu uma mudança no ritmo de crescimento em razão
da crise no México) a economia da Argentina cresceu a uma taxa média
anual de 6,1% enquanto que a inflação se mantinha totalmente
controlada, apresentando, inclusive, números negativos, que oscilavam
em torno de –1%(gráfico 2).
O problema era que o currency board era um regime exigente.
Com o abandono das políticas cambial e monetária (deve ser enfatizado
que as taxas de juros eram, na verdade, fixadas pelo Federal Reserve dos
Estados Unidos, por mais que a margem de risco fosse assumida pela
Argentina), o governo passou a contar com poucas ferramentas para
fazer face a eventos externos.
Mas volta novamente a pergunta: como tudo acabou de forma tão
ruim? A resposta dada por alguns economistas é mais convincente do
que a oficial. Ela começa com o currency board. Além disto, eles
enumeram os seguintes outros problemas: choques externos; paralisação
do aumento de preços das commodities exportadas pela Argentina;
incremento do custo de capital das economias emergentes; apreciação do
dólar e a desvalorização do real. No que se refere ao currency board, a
sua rigidez, dificultava sobremaneira a resposta a estes choques externos
Em meados de 1998, o governo argentino afirmava que a economia
sem nenhum perspectiva de melhora, perceberam os investidores que a
dívida da Argentina poderia ser impagável.
Alguns economistas, no entanto, afirmam que o problema não era
propriamente o currency board, mas a política fiscal, bastante ineficiente.
Para financiar seu déficit fiscal, lançou-se títulos no mercado (uma vez
que havia a restrição com a emissão de moeda). Porém ao invés de
colocar em prática reformas, especialmente nas áreas trabalhistas e de
previdência social com vistas a diminuir os gastos governamentais,
Menem se preocupou em comprar apoio político para um terceiro
mandato. Os gastos públicos aumentaram de forma considerável (gráfico
8), e o equilíbrio fiscal não ocorrera, sendo que dois itens foram os
grandes responsáveis por este problema. Primeiro, o crescimento
econômico não fora o suficiente para proporcionar uma elevação do
emprego. Algumas províncias mais pobres que dependiam das ofertas de
trabalho oferecidas pelas empresas estatais viram o problema se agravar
com a privatização e a abertura comercial. É importante frisar que a
Argentina tem um sistema econômico descentralizado com 23 províncias
semi-soberanas que possuem orçamentos consolidados, em parte, pelas
autoridades fiscais e monetárias centrais.
Além de a política fiscal ser ineficiente ainda havia a corrupção. O
sistema de cobrança de imposto do país tinha – e tem - várias falhas e a
sonegação tributária é alta. A título de exemplo deve ser citado que
enquanto no Brasil, os impostos representam mais de 30% do PIB, na
Argentina o índice é de 21%. Graças a um sistema arcaico de tributação,
cabia ao governo central coletar os impostos e repassar às províncias (até
o ano de 2001) que com isto não tinham nenhuma cobrança - ou estímulo
Para reverter este quadro caótico ainda foram tentadas medidas
heterodoxas. A principal delas refere-se à modificação do currency
board, em que é fixada a moeda, para os exportadores, na proporção de
meio peso para o dólar, meio para o euro. Esta era uma idéia boa, mas o
timing desastroso. A desvalorização, alarmou os investidores
estrangeiros fez com que eles exigissem um prêmio de risco mais alto
para os títulos argentinos. As taxas de juros subiam e com isto a recessão
se aprofundava ainda mais.
Há quem culpe o FMI por impor políticas neoliberais de abertura e
privatizações na Argentina que acabaram não dando certo. Há que se
enfatizar, entretanto, que "políticas neoliberais” não causaram tamanho
caos em nenhum outro lugar. Uma crítica mais aceita, porém,
relacionada ao FMI é que este foi tolerante por muito tempo em permitir
que a Argentina fizesse uma combinação desastrada de taxa cambial fixa
e frouxidão fiscal.
Não há um consenso sobre o peso a ser dado a cada um destes
fatores. É talvez mais lícito dizer que todos os aspectos interagiram. Há
uma convergência, no entanto quanto ao fato de que assim como o
currency board propiciou a Argentina ficar imune ao problema por um
tempo superior ao que se parecia possível, significou também que o
colapso foi proporcionalmente maior.
O FMI reconhece o sucesso do currency board em alguns países.
De acordo com o Fundo, este modelo cambial fortalece tanto a disciplina
fiscal quanto os sistemas bancários. Além disto ele propicia a
manutenção da inflação em patamar baixo, incentiva o policymaker a
adotar reformas econômicas. Isto sem falar no crescimento da economia.
Ao se falar em disciplina fiscal sempre é interessante enfatizar que
monetária é abandonada. Parte da citada disciplina pode vir da nova
forma de atuação do Banco Central e da impossibilidade de administrar o
financiamento monetário dos gastos do governo. Com a renúncia das
políticas cambiais e monetárias, resta ao governo poucas ferramentas
para fazer face aos eventos externos. No caso da Argentina além da
ineficiência da política fiscal, nunca é demais evidenciar, havia ainda o
agravante da ineficácia dos gastos aliada à falta de gestão política.
III.1.1 - ANÁLISE DA LEI DE CONVERSIBILIDADE
Para garantir o cumprimento da paridade, conforme já frisado, a
Lei de Conversibilidade3 exigia que o Banco Central mantivesse reservas
internacionais líquidas equivalentes a 100% da base monetária. Isto
impede todo tipo de emissão que não conta com seu conseqüente
respaldo em reservas, o que torna impossível financiar gastos do governo
através da expansão monetária ou socorrer entidades financeiras através
de empréstimos ou compras de ativos de pouca liquidez.
Sob um sistema de conversibilidade, a expansão ou contração da
base monetária, e, portanto a liquidez da economia, é determinada pelo
resultado da balança de pagamentos e pela variação no estoque de moeda
estrangeira em poder do público. Um sistema de conversibilidade expõe
3
a Ley de Convertibilidad (23.928), estabelecia basicamente dois pontos. Em primeiro lugar, que o Banco Central devia vender todos os dólares que se quisesse comprar a 1 peso (observação: não tinha a obrigação de comprá-los ao mesmo preço; podia fazê-lo a "preços de mercado".) Para assegurar isto, tinha que manter dólares em reserva pela totalidade da massa de dinheiro circulante. Isto significa adicionalmente que a única forma em que se podia emitir moeda era com o ingresso de divisas no Banco Central (via exportações, investimentos ou empréstimos externos.)
o país a grandes flutuações provocadas por choques externos, tal como
ocorreu com a repercussão da crise mexicana, em menor medida com a
crise asiática e, de forma mais incisiva com a brasileira. Em dezembro de
1994, por exemplo, poucos dias após a desvalorização mexicana,
aconteceu uma importante perda da confiança no sistema financeiro e no
esquema cambial. A conseqüente saída de capitais privou de liquidez o
mercado local, e fez com que a taxa de juros experimentasse um brusco
aumento, acompanhado de uma queda do produto e do emprego. A
exposição a crises externas, combinada com a impossibilidade do
governo de realizar políticas monetárias que minimizassem o problema,
acabou por sugerir a análise da conveniência de abandonar a
conversibilidade por um sistema de regras menos rígidas, fato que
acabou por acontecer.
III.1.2 - OPINIÕES DE EMINENTES LIDERANÇAS SOBRE A
CRISE ARGENTINA
Para Pedro Pou (Presidente do Banco Central até maio de 2001.
Cabe aqui ser citado que ele foi destituído pelo Presidente Fernando de
la Rúa porque se recusou a alterar a lei de conversibilidade que ancorou
o peso ao dólar) a conversibilidade era um sucesso, e a Argentina entrou
em crise em razão de um conjunto de equilíbrios múltiplos e tensões
políticas. A conversibilidade, sugeriu Pou, promoveu uma estabilização e
a Argentina com isto pôde focalizar seus esforços em reformas
importantes, dentre elas: a privatização, abertura comercial,
independência de Banco Central, consolidação e melhoria da situação
fiscal. Pou reconhece, no entanto, que reformas importantes, como a
Se se fosse definir um ano para o início efetivo da crise, 1998 é o
ponto crucial. Com uma dívida pública que somava 43% do PIB e uma
dívida privada equivalente a 12% do PIB, ao lado de um déficit fiscal de
2,6%, cresceu-se o medo de não sustentação da dívida.
Andrés Velasco, Universidade de Harvard, tem a mesma opinião
quanto à data. Para ele 1997/98 era um momento bom para encerrar a
experiência. Entretanto como os agentes “não quiseram pôr fim ao
currency board”, nada foi concluído. A crise decorrente provou os
perigos de se escutar a manada.
Domingo Cavallo, Ex-Ministro da Economia da Argentina, faz a
defesa enfatizando que aquela conversibilidade era o reconhecimento
formal do que já ocorria no país. Antes de 1991, as pessoas já
negociavam e poupavam em dólares.
Anne Krueger, Primeira Subdiretora Gerente do FMI, em uma
conferência promovida em julho de 2002 pelo NBER, destacou que a
Argentina tem dificuldades para sair da crise que houvera sido instalada
também porque os investimentos no país são baixos e as exportações
são, para um país de mais de 30 milhões de habitantes e recursos naturais
abundantes, economicamente pequenas.
De forma bastante didática, nesta mesma conferência ela, em
síntese, enumerou as principais causas da crise. Como se trata de uma
análise posterior, as críticas acabaram por deixar evidente a falta de ação
do órgão a que ela estava vinculada, o Fundo Monetário Internacional.
Adotando uma postura de mescla de mea culpa com defesa prévia ela faz
o seguinte comentário:
“O FMI tem sido repetidamente acusado de ser demasiado
exigente em matéria de política fiscal, crítica que foi claramente
Argentina, ocorreu o contrário. Na América Latina os problemas fiscais
se fazem presente, frequentemente, em um contexto de complacência em
períodos de auge econômico. No caso da Argentina se repetiu esta velha
história, e o FMI devia ter promovido mais energicamente a adoção das
medidas pertinentes. Não obstante, nunca é fácil persuadir às autoridades
sobre a necessidade de apertar o cinto quando os investidores e credores
estrangeiros estão dando um aparente voto de confiança ao colocar
capital no país.
As principais causas citadas por ela são:
• Primeiro, a política fiscal foi muito frágil na fase ascendente
do ciclo, combinada com a crescente sobrevalorização da moeda, reflexo
de una taxa de inflação relativamente alta. No caso da política fiscal é
importante examinar as finanças do setor público tomadas em conjunto,
incluídos o Governo federal e os governos provinciais. Em grande
medida, o problema fiscal obedeceu a falta de disciplina em nível
provincial, exacerbada pela transferência de recursos por parte do
Governo federal. Neste caso se chega a um déficit estimado em torno de
2,5% do PIB, que chegou a seu mais alto nível em 1997 e 1998. As
cifras haviam sido ainda mais elevadas se não se tivesse utilizado os
recursos do programa de privatização para financiar o gasto corrente.
Um dos outros graves problemas que afetaram as finanças
públicas, consistiu na crescente diferença entre os salários pagos pelo
Governo federal e os do setor privado. Em 1994 a remuneração do
empregado federal em média superava em 25% à recebida pelo
empregado em média do setor privado; em 1998, a diferença havia
subido a 45%. Além disto, o número de pessoas do setor público era
mais do que excessivo.
A situação começou a piorar gravemente no fim de 98 e início de
99 devido ao contágio da crise russa no segundo semestre de 98 e ao
colapso do Plano Real no Brasil. Não se pode deixar de mencionar um
problema de ordem política – com consequências econômicas - no
âmbito interno: a adoção de uma política fiscal ainda mais flexível em
virtude do propósito do Presidente Menem de permanecer no cargo.
• Terceiro, o Plano de conversibilidade deu permanência à
sobrevalorização da moeda, dada a falta de flexibilidade da economia
interna.
O valor real da moeda aumentou consideravelmente nos anos
noventa, principalmente nos primeiros anos da década, em que a inflacão
foi reduzida graças à implantação do currency board. Os salários e
preços, no entanto, deve ser salientado, não eram o bastante flexíveis
para se estabelecer uma competitividade, o que determinou um ritmo de
aumento da exportacão mais lento que em outros países
latinoamericanos.
Poderia então ser questionado: quando deveria ter sido
abandonando o regime de conversibilidade? Uma opção seria contar com
o fato de pôr fim a esta estratégia monetária quando ela estivesse no auge
da credibilidade. Outra posibilidade teria sido fazê-lo em 1996-97,
período em que a economia estava se recuperando da crise tequila. Aqui
fica fácil anotar – como engenheiro de obra pronta – que esta poderia ter
sido a última oportunidade de uma saída tranquila.
Não se pode negar que o plano de conversibilidade gozou de
amplo apoio popular como instrumento de apelo contra o
recrudescimento da inflação que a Argentina experimentara há poucos
saída imprevista poderia ocasionar graves perturbações econômicas,
dada a profundidade e a amplitude do endividamento externo.
• Quarto, não se adotou nenhuma medida eficaz para fazer
frente à dívida que se tornava insustentável.
Em março de 2001, quando foi novamante designado Ministro,
Domingo Cavallo frisava a necesidade da adoção de medidas na esfera
fiscal. Cavallo admitiu que a Argentina não podia seguir endividando-se
nem imprimir papel moeda. Com isto ele colocou em prática ações, com
o objetivo de aumentar a arrecadação, como a criação de um imposto
sobre as transações financeiras. Entretanto, isto coincidiu com a
deterioração da confiança no mercado provocada pela introdução do
vínculo dólar-euro, a destituição do Presidente do Banco Central, Sr.
Pou, e um grande estoque de dívidas. Os investidores, por outro lado,
não se mostraram impresionados com as diversas medidas, algumas das
quais reduziram a eficácia da administração tributária. Além do aporte
concedido pelo FMI e apesar do apoio do G7, os empréstimos não
puderam fazer face à dívida, cada vez mais insustentável. Se
comprovaria, sob a ótica cômoda de analisar a crise após a sua
efetivação, que tudo isto foi em vão.
Em outras palavras, a Argentina se viu presa em um círculo
vicioso de escassa atividade, sobrevalorização da moeda e crescente
endividamento.
Anne Krueger ainda evidenciou os problemas imediatos
enfrentados logo após a crise: inflação de 30% nos primeiros seis meses
de 2002 (medido pelo IPC), e um déficit fiscal de 4%.
Roque Fernandez, eminente economista argentino, ao apresentar
os números deficitários fiscais para 1991-2001, citou que o problema da
de um único equilíbrio ruim. O equilíbrio bom: baixas taxas de juros (em
relação à inflação), produção alta e eficaz política de arrecadação não
estava presente, e além disto, o fim do financiamento externo instalaram
o caos na Argentina.
III.1.3 - FATOS MACROECONÔMICOS DA ARGENTINA
Além de importantes fatos macroeconômicos já citados como
inflação - que nunca é demais lembrar foi reduzida consideravelmente
durante os anos 90, graças ao currency board – PIB e desemprego, dada
a sua relevância é importante identificar alguns outros indicadores que
estão diretamente vinculados à crise argentina.
• A combinação da baixa inflação durante a década de 90 e uma
moeda valorizada acabou por gerar uma conta corrente deficitária
(gráfico 5);
• No final de 1994, a dívida do governo federal era em torno de 70
bilhões de dólares e o PIB de 250 bilhões. Em 2002, a dívida dá
um salto e alcança 132 bilhões de dólares, quase 90% a mais,
enquanto o PIB passa a ser de 235 bilhões — 6% menor. Fica
evidente a boa situação econômica experimentada pela economia
argentina na década de 90, que cresceu em média 5% no período
de 1991 a 1994. Este fato positivo perdura até 98 quando então a
crise foi instalada e o PIB teve uma queda extraordinária em
2002(gráfico 2). Este fato foi possível graças a presença de dois
bons indicadores: baixas taxas de juros (gráfico 13) e
investimentos diretos importantes (gráfico 11). O senão era o
• A Dívida Pública (gráficos 7 e 8) era outro indicador que
evidenciava a situação ruim da Argentina. O déficit orçamentário
(gráfico 6) foi especialmente causado pela introdução de um novo
sistema previdenciário a partir de 94;
• O Risco-País (gráfico 12) que em janeiro de 2001 era de 670
pontos e dá um salto para quase 7.000 pontos (10 vezes mais) em
junho de 2002, consolida a evidência de que a crise houvera sido
efetivamente instalada. Os investidores se retraíram, repatriaram o
capital, e em conseqüência as taxas de juro subiram, aumentando o
risco e completando o círculo vicioso;
• O ataque especulativo não é o resultado de diminuição das
reservas internacionais. No gráfico 10 observa-se que estas
referidas reservas não caem a despeito da crise;
• Conforme pode ser observado no gráfico 9, aumentou de forma
contínua a provisão de dinheiro doméstico;
• O índice de desemprego se manteve sempre alto a partir de
95(gráfico 3);
• A taxa Libor - London InterBank Offering Rate - (gráfico 15 em
que estão anotados os percentuais relacionados aos períodos de
180 dias) é a base da taxa de juros que se paga sobre depósitos
entre bancos no mercado de Eurodólares (depósitos a prazo
atrelado ao dólar). A taxa Libor é a média das taxas fixadas pelos
cinco maiores bancos. (Bank of America, Barclays, Bank of
Tokyo, Deutsche Bank e Swiss Bank). Como se trata de taxa de
juro externa ela exerce uma influência relevante na dívida externa;
• A dívida externa (gráfico 14) cresceu cerca de 10% em menos de
necessidade do financiamento externo para fazer face a mitigação
da crise;
III.2 – CRISES CAMBIAIS PELO MUNDO
Crises cambiais na década de 90 proliferaram pelo mundo e afetou
desde economias emergentes como a Argentina – que é objeto de análise
deste trabalho – Brasil, México e países da Ásia até as ricas nações
européias
III.2.1- A CRISE DO SME (1992)
A crise que afetou diversos países da Europa no início da década
de 90 tem uma estreita ligação com os modelos de segunda-geração.
Havia naqueles um alto nível de desemprego determinado causado por
demanda insuficiente. As autoridades monetárias destes países sofriam
pressões a favor da adoção de políticas monetárias expansionistas
enquanto que, por outro lado, o sistema de flutuação, estreita, era
imposto pelo mecanismo de taxas cambiais do SME. Os governos
ficavam assim num impasse entre os custos políticos de uma taxa de
desemprego alta e deflação de um lado, e do outro os custos políticos de
deixar o mecanismo de taxas do SME. As políticas cambiais ficavam
sujeitas à tensão entre dois propósitos: a flexibilidade - capacidade de
responder a choques inesperados – em contraposição à credibilidade -
capacidade de fazer frente às violações casuísticas dos compromissos
que foram assumidos de maneira prévia.
O México, no início de 94, era um país que tinha muitos
indicadores positivos: o déficit fiscal havia se tornado um superávit, as
privatizações foram bem sucedidas, ocorreu a desregulamentação da
economia e a economia fora aberta à competição internacional. Por outro
lado, no entanto, havia um problema: o crescimento econômico era
pequeno, menos de 3% a.a.
Soma-se a isto o fato de a inflação mexicana e a taxa nominal do
peso em relação ao dólar ter deixado a economia mexicana sem
competitividade. Entre 1988 e 1994 o sistema passou de um câmbio com
taxa nominal completamente fixa para um sistema de desvalorizações
pré-anunciadas, com as desvalorizações sendo menores do que a taxa de
inflação corrente, e depois para um sistema de bandas com um teto
móvel.
III.2.3. A CRISE NA ÁSIA (1997)
Em julho de 1997, a Tailândia não resistiu às fortes pressões que
sua moeda, o Baht, estava sofrendo e deixou que ele flutuasse
livremente. No segundo semestre de 1997 as moedas da Malásia,
Indonésia, Coréia e Filipinas também sofreram fortes pressões e foram
desvalorizadas, pelos respectivos governos, em relação ao dólar, moeda
que servia de alguma maneira como âncora para as taxas nominais de
câmbio.
O início da crise pode ser atribuído à redução das exportações na
região, devido principalmente à valorização do dólar (moeda que servia
como âncora cambial) frente ao iene, à competição da China e à recessão
Apesar de haver um consenso quanto ao melhor modelo para
explicar a crise asiática, que seria o de “terceira geração” - conexão entre
fragilidade financeira e crises cambiais - alguns economistas insistem
que a crise é melhor explicada como uma extensão do modelo de
segunda geração. A crise cambial neste caso seria um subproduto de uma
corrida bancária, ou seja, uma perda de confiança, auto-realizável que
forçaria os intermediários financeiros a liquidar seus investimentos
prematuramente, com conseqüente perda de rentabilidade esperada. Os
países mais atingidos pela crise na Ásia, é importante frisar, estavam
fragilizados pelo fato de terem altos passivos em dólar, lastreados em
ativos em moeda local.
Outras explicações para a crise estariam relacionadas a mudanças
repentinas na expectativa e confiança dos agentes econômicos que teriam
sido a fonte principal não só do início, mas também da propagação e do
contágio da crise financeira. Assim, a crise não deveria ser atribuída a
uma deterioração dos fundamentos econômicos, mas sim ao pânico dos
agentes econômicos. Outro motivo da crise seria o reflexo das distorções
estruturais e políticas dos países afetados. Desajustes nos fundamentos
econômicos teriam sim iniciado a crise, mesmo que, uma vez iniciada, o
"comportamento de manada" e uma fortíssima reação do mercado
tenham causado uma depressão na atividade econômica e nos preços dos
ativos maior do que a justificada pelo estado dos fundamentos.
Um fato relevante alusivo à crise da Ásia é o forte "efeito de
contágio" que a crise asiática provocou em diversas economias bem
longe da Ásia, característica do modelo de segunda geração.
Em agosto de 1998, o governo Yeltsin desvalorizou o rublo e
decretou a reestruturação unilateral da dívida do governo russo, ou seja,
o evento mais temido desde a crise da Ásia acabara de ocorrer: um
"default" soberano.
Ainda em agosto daquele ano, o governo russo anunciou outras
medidas que viriam a ter efeitos bastante negativos sobre a economia
mundial: reestruturação unilateral da dívida do governo de curto prazo e
a suspensão da negociação no mercado doméstico de títulos; moratória
de 90 dias no pagamento de obrigações privadas denominadas em moeda
externa (incluindo pagamentos de contratos a termo), aumento do
controle sobre o fluxo de capitais e medidas para fortalecer o sistema
bancário, incluindo intervenções bancárias e o estímulo de fusões.
A crise financeira russa teve sua origem nos constantes e altos
déficits fiscais (agravados pela queda no preço do petróleo e na
incapacidade do governo de coletar impostos) bem como no conseqüente
aumento da detenção de títulos do governo russo por investidores
domésticos e externos. Na medida em que a situação fiscal russa era
agravada por choques externos (preço do petróleo, por exemplo) os
investidores relutavam em aceitar títulos atrelados ao rublo e o governo
se viu obrigado a colocar no mercado grandes volumes de Eurobonds
vinculados ao dólar e mesmo assim com um significativo prêmio.
III.2.5 – A CRISE NO BRASIL (1999)
O Plano Real se mostrou desde o seu início a mais bem sucedida
tentativa de estabilização monetária na economia brasileira moderna. A
a.m. em junho de 1994 (véspera do plano) para quase 1,02% am em
junho de 1999.
Com o Plano Real, a economia brasileira pôde apresentar para o
mercado bons indicadores jamais visto. Alguns dados, no entanto, não
se comportaram de maneira positiva desde o seu início. No caso da conta
corrente, por exemplo, houve uma reversão do sinal da conta corrente,
que passou de um superávit médio anual de 0,34% do PIB no período de
1991 a 1993 para um déficit de 0,31% do PIB em 1994. Em 1998 chegou
a um déficit de 4,50%. Os efeitos da estabilização monetária sobre as
contas externas da economia brasileira levantaram imediatamente
dúvidas e preocupações com relação à sustentabilidade e qualidade do
financiamento do déficit nas transações correntes e seus possíveis efeitos
adversos sobre o crescimento econômico.
Embora houvesse inúmeras melhoras nas condições do
financiamento dos compromissos externos brasileiros, como por
exemplo a queda dos “spreads” cobrados em relação aos bônus do
tesouro americano, o país sofreria restrições e dificuldades de
financiamento durante, e após, as crises da Ásia e da Rússia.
A crise russa em 1998 complicou de vez a situação dos países
emergentes - dentre eles, o Brasil - fazendo com que a estratégia de
defesa do regime cambial vigente no Brasil se tornasse cara e necessária
de apoio do FMI.
Com as pressões do mercado em 15 de janeiro de 1999 o Banco
Central brasileiro, pára de intervir no mercado de câmbio, deixando de
vender reservas. Em seguida a esta decisão a cotação do real despencou e
passou a uma vez que o Real passou a ser negociado à taxa de R$
1,43/US$, o que representava uma desvalorização de 9,16% em relação à
Em 29 de janeiro, a situação fica crítica e a cotação do Real já era
de 2,05 por dólar. Em 8 de março, o dólar estava cotado em R$ 2,16 -
representando uma desvalorização nominal do Real da ordem de 77%
em relação a sua cotação anterior à mudança de regime - R$ 1,22.
Embora a situação voltasse a melhorar (R$ 1,99/US$ em 20/08/99) o
Plano Real jamais voltaria a apresentar os indicadores bons da sua fase
inicial.
III. 3 – MODELOS DE CRISES CAMBIAIS
A despeito de a ocorrência de crises cambiais ser fato que
aconteça há bastante tempo, a elaboração de modelos teóricos que
permita a análise deste fenômeno é algo fenômeno relativamente recente.
O aumento no número das crises econômicas e a sua importância no
impacto da economia é que gerou o surgimento de uma grande
quantidade de pesquisa de suas causas.
A literatura convencional sobre estas referidas crises pode ser
organizada em três grandes blocos (gerações):
• Os modelos de “primeira geração” ou “modelos canônicos”. Estes
trabalhos utilizam a hipótese de mercados financeiros eficientes e,
grosso modo, a crise cambial é fruto de problemas na gestão de
política macroeconômica. Além do trabalho de Krugman (1979)
pode ser destacado, como exemplo representativos da literatura de
“primeira geração”, o trabalho de Flood & Garber (1984);
• Os modelos de “segunda geração”. Estes referidos modelos se
utilizam também da hipótese de mercados financeiros eficientes
bem como do fato de a crise cambial também ser fruto de