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PROJETO: VIABILIDADE DA CONSERVAÇÃO DOS REMANESCENTES DE CERRADO DO ESTADO DE SÃO PAULO

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Academic year: 2021

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PROJETO: VIABILIDADE DA CONSERVAÇÃO DOS

REMANESCENTES DE CERRADO DO ESTADO DE SÃO PAULO

SUB-PROJETO: Florística, fitogeografia e estado de conservação dos

remanescentes

Coordenação do sub-projeto: Giselda Durigan, Inst. Florestal, SP Outros membros da equipe: Geraldo A. D. C. Franco, IF, SP.

Marinez F. de Siqueira, CRIA, Campinas 1. INTRODUÇÃO

A região de domínio do bioma Cerrado compreende uma extensa área contínua nos Estados de Goiás, Bahia, Minas Gerais e Mato Grosso e algumas penínsulas e áreas disjuntas que se estendem por outros estados (Eiten, 1972). No Estado de São Paulo, o Cerrado apresenta-se na forma de manchas dispersas, associadas a solos de baixa fertilidade, especialmente na Depressão Periférica e no Planalto Ocidental Paulista, além de algumas pequenas manchas surpreendentemente situadas no Vale do Paraíba, encravadas em pleno domínio da Mata Atlântica.

A área total coberta por essas manchas de cerrado correspondia, originalmente, a cerca de 14 % do território do Estado de São Paulo (São Paulo, 1997). Em 1962, segundo Borgonovi & Chiarini (1965), a vegetação de Cerrado, com todas as suas fitofisionomias, cobria 33.929 km2 (13,7% do Estado). Onze anos depois, Serra Filho et al. (1974) estimaram essa cobertura em apenas 10.388 km2 (cerca de 4,2%) e Kronka et al. (1998), com imagens de 1992, encontraram área total remanescente de apenas 2.379 km2 de Cerrado (cerca de 0,96%), comprovando a rápida destruição desse bioma no Estado. Em 30 anos, o cerrado paulista foi reduzido a menos de 7% de sua área original. A área protegida na forma de unidades de conservação representa apenas 0,51% do cerrado original do estado.

A vegetação de Cerrado compreende um gradiente de fitofisionomias correspondente a um gradiente de biomassa: campo sujo, campo cerrado, cerrado e cerradão. Mapear as fitofisionomias separadamente é difícil, seja por não haver nitidez na separação entre elas, seja porque as fitofisionomias se alteram ao longo do tempo em um mesmo local, em função da freqüência e intensidade de impactos como o fogo e o pastoreio.

Chiarini & Coelho (1969), através da interpretação de fotografias aéreas de 1962, mapearam a vegetação de Cerrado no Estado de São Paulo e encontraram predominância da fisionomia cerrado (75 %) sobre as fisionomias de campo (16 %) e

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cerradão (9 %). Kronka et al. (1998), mapeando as áreas remanescentes a partir de imagens de satélite, encontraram 68,9 % de cerrado, 30,5 % de cerradão e 0,6 % de campo cerrado.

A vegetação de Cerrado no Estado de São Paulo encontrava-se relativamente bem preservada até a metade do século XX, ocupada quase que exclusivamente pelo pastoreio extensivo e exploração de lenha.

Essas formas de exploração, embora não levassem à redução da extensão do domínio do cerrado no Estado, condicionavam o predomínio de fisionomias campestres (campo sujo a cerrado sensu stricto) sobre fisionomias florestais (cerradão, mata-galeria). O uso do fogo como forma de manejo das pastagens extensivas era comum e freqüente em praticamente todas as áreas de cerrado.

Hoje, sabe-se que as fitofisionomias da vegetação de cerrado são dinâmicas, estreitamente relacionadas com a forma de exploração e, principalmente, com a freqüência de queimadas, que pode conduzir a fisionomias mais ou menos densas, desde que a capacidade de suporte do meio admita fisionomias de maior biomassa.

A rápida redução de área a que vem sendo submetido o cerrado paulista, ao longo das últimas três décadas, é decorrente, principalmente, da expansão de culturas geneticamente adaptadas ou tecnologias avançadas de cultivo, que permitem obter alta produtividade mesmo em solos de baixa fertilidade. Isso inclui a silvicultura (Pinus e

Eucalyptus), outras culturas, como a cana-de-açúcar e a laranja, e ainda pastagens com

gramíneas africanas. Além desses fatores, foram constatadas ao longo das visitas de campo deste projeto, duas outras causas importantes para o desmatamento recente de grandes áreas de cerrado no Estado de São Paulo: assentamentos para reforma agrária (Martinópolis e Promissão) e expansão urbana (Bauru). Constatou-se também a pressão para implantação de novos assentamentos em fragmentos de cerrado na região de Colômbia (próximo à divisa com MG).

Além da perda considerável de área, a vegetação de cerrado vem sofrendo alterações de natureza qualitativa, decorrentes da própria fragmentação (p. ex. a proliferação de

Brachiaria) ou decorrentes de modificações nas práticas de uso da terra. Com o

recrudescimento das leis ambientais, o uso do fogo como prática de manejo passou a ser proibido há alguns anos e a pecuária extensiva passou a ser anti-econômica, abandonada por iniciativa dos próprios pecuaristas. A exploração de lenha para carvão deixou de ser prática comum no estado e, assim, a fisionomia da vegetação dos poucos remanescentes de cerrado que sobrevivem tem se transformado lentamente, reduzindo-se a área de

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fisionomias campestres e aumentando a área de fisionomias florestais, tendendo a um clímax predominantemente de cerradão.

Paralelamente a essa alteração fitofisionômica, certamente estão ocorrendo modificações florísticas, impossíveis de se resgatar na inexistência de dados ao longo do tempo.

O Projeto Viabilidade da conservação dos remanescentes de cerrado do Estado de São

Paulo teve, entre seus objetivos, a caracterização dos principais remanescentes de

cerrado no Estado, como ferramenta básica para a definição de estratégias de manejo visando a sua conservação.

Este projeto tomou como base o mapa de áreas prioritárias para conservação, resultante do Workshop Bases para a Conservação e o uso Sustentável dos Cerrados do Estado

de São Paulo, realizado pelo PROBIO – SMA, em 1995.

Foram estabelecidas, na época, 23 manchas consideradas de prioridade máxima, contendo cada mancha uma ou diversas áreas que, pelo seu tamanho, conectividade ou localização no Estado, sugerissem alto valor para a conservação do Bioma Cerrado. Àquelas 23 manchas, no decorrer do projeto, foram acrescentadas outras duas: Angatuba e Vale do Paraíba, consideradas prioritárias pelos pesquisadores envolvidos neste projeto, com base nos resultados do workshop nacional (realizado em 1998),

Ações prioritárias para a conservação da biodiversidade do Cerrado e Pantanal

(Cavalcanti et al., 1999). Estas manchas estão localizadas fora do mapa-base utilizado no Workshop restrito ao Estado de São Paulo e, por isso, naturalmente, não foram incluídas como prioritárias naquela ocasião.

Verificou-se, durante o trabalho de campo, que algumas das manchas originais continham, na verdade, vegetação de floresta estacional semidecidual e não de cerrado. Destas manchas, algumas foram submetidas a diagnóstico e levantamento florístico em pelo menos um fragmento, outras foram simplesmente desconsideradas (p. ex. Sabino, Novo Horizonte), uma vez que o objeto de trabalho eram remanescentes de Cerrado. Muitos remanescentes, alguns de extensão considerável, continham vegetação ecotonal, com espécies de cerrado e floresta estacional semidecidual compartilhando o mesmo espaço. Estes fragmentos, considerados importantes por preservarem espécies de cerrado, foram incluídos na amostragem e nas análises.

A amostragem florística focalizou essencialmente espécies arbóreas e arbustivas, estendendo-se a outras formas de vida (ervas ou lianas) desde que fossem espécies com

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potencial de uso econômico, visando subsidiar o trabalho de outro grupo de pesquisadores dentro do projeto, relativo ao manejo sustentável dos remanescentes. Não foram incluídas no levantamento Unidades de Conservação legalmente existentes, presumindo-se que a conservação dessas áreas já está assegurada.

Foram visitadas 86 áreas, nas quais foi efetuado o diagnóstico fitofisionômico e do estado de conservação, além do inventário florístico expedito.

O objetivo dos levantamentos efetuados foi identificar as espécies vegetais que caracterizam os cerrados do Estado de São Paulo, conhecer a área de ocorrência de cada espécie, encontrar possíveis padrões fitogeográficos e avaliar as áreas visitadas segundo o seu valor para a conservação. Com esta amostragem ampla dentro do Estado, pretendeu-se dar um “zoom” no trabalho que vem sendo desenvolvido por outros pesquisadores para conhecer e mapear a flora dos cerrados de todo o Brasil, apresentados por Ratter et al. (1996), Ratter et al. (2000a e 2000b) e por Castro et al. (1999).

Além das atividades voltadas à análise da flora e fitogeografia, desenvolveu-se um protocolo de avaliação dos fragmentos segundo o seu valor para a conservação, que foi aplicado às 86 áreas visitadas no Estado de São Paulo. O método aplicado baseia-se, essencialmente, nos chamados métodos de pontuação (‘scoring procedures’), dicutidos por Morsello (2001). O objetivo foi a eleição de ‘hot spots’ para a conservação, em uma escala mais fina que aquela gerada pelos workshops, indicando áreas individuais (fragmentos) com maior valor biológico e sob maior grau de ameaça dentro do Estado de São Paulo.

2. METODOLOGIA

2.1.Levantamentos de campo

Ao longo de dois anos, utilizando-se de GPS e mapas fitofisionômicos gerados a partir de imagens de satélite recentes, localizaram-se os fragmentos em campo, os quais foram alvo de estudo.

2.1.1. Inventário florístico

Em cada uma das áreas visitadas foi realizado inventário florístico expedito, com registro de ocorrência das espécies em intervalos cronometrados de 15 minutos, até que fosse atingida a estabilização da curva espécies x tempo. Este método foi originalmente

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empregado para levantamento florístico em áreas de cerrado de todo o Brasil por Ratter et al. (2000a). Registrou-se a ocorrência de todas as espécies arbustivas e arbóreas e também de espécies sub-arbustivas e algumas herbáceas com potencial de utilização econômica. Espécies cuja identificação no campo não era possível foram coletadas para identificação posterior.

2.1.2. Diagnóstico do estado de conservação

Cada um dos fragmentos visitados foi submetido a um diagnóstico fitofisionômico e do estado de conservação, com documentação fotográfica, envolvendo os seguintes aspectos: área, coordenadas geográficas, fisionomias presentes, altura do dossel, cobertura de copas, presença de gado, invasão por gramíneas exóticas, evidências de fogo, presença de lixo, indícios de desmatamento, uso do solo no entorno, proteção de mananciais. Na medida do possível, averiguou-se o status legal da área e identificou-se o proprietário.

2.2. Análise dos dados

2.2.1. Flora e fitogeografia

Os dados obtidos a partir do inventário florístico resultaram em uma listagem das espécies associadas às fitofisionomias em que ocorrem. Obteve-se a partir daí as espécies mais freqüentes, melhor distribuídas, assim como espécies raras ou de distribuição geográfica restrita.

A matriz de ocorrência das espécies por fragmento foi submetida a análises multivariadas, buscando-se identificar padrões fitogeográficos distintos para a vegetação de cerrado dentro do Estado de São Paulo.

2.2.2. Conservação

Com base nos dados gerados pelas análises florísticas e fitogeográficas, associados às informações obtidas a partir de imagens de satélite e GIS, avaliou-se cada fragmento, considerando as teorias e princípios da ecologia e da biologia da conservação, segundo os critérios relacionados a seguir:

Atributos biofísicos:

• Tamanho

• Representatividade fitogeográfica (com base nas UCs já existentes) • Conectividade

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• Proteção de mananciais • Diversidade de fisionomias • Riqueza de espécies

• Número de espécies raras

• Número de espécies de ocorrência restrita

Integridade dos recursos naturais

• Presença de espécies invasoras • Presença de gado

• Lixo

• Corte seletivo

Influências externas

• Uso do solo no entorno

• Relação perímetro / superfície (efeitos de borda)

3. RESULTADOS

3.1. Flora e fiotogeografia

Os resultados obtidos dos estudos de flora e fitogeografia transcritos a seguir, foram publicados em Durigan et al (2002).

De modo geral, em uma escala ampla, os resultados comprovam resultados de pesquisas anteriores (Castro, 1994, Castro & Martins, 1999), que mostram a flora de cerrado do Estado de São Paulo dividida em dois grandes grupos: o primeiro, localizado do centro para o norte-nordeste do Estado de São Paulo (predominante fisionomias campestres), que, mediante análise regional, assemelha-se à flora das áreas de cerrado do sul de Minas Gerais e do Mato Grosso do Sul. O segundo grupo corresponde às áreas de cerrado do oeste de São Paulo (predominantemente cerradão e ecótono cerrado / floresta) e é distinto da flora do restante do Estado e de estados vizinhos.

Dentro desses dois grandes padrões, encontram-se grupos menores, floristicamente distintos, embora em menor grau de dissimilaridade, certamente relacionados com condições ambientais particulares. As análises efetuadas apontam como fatores possíveis para explicar diferenças florísticas entre regiões dentro do estado: fisionomia da vegetação (reconhecidamente associada à fertilidade do solo), condições climáticas (especialmente duração do período seco e temperatura) e ainda uma tendência a maior similaridade florística entre áreas localizadas em uma mesma bacia hidrográfica. Aparecem nas análises como grupo distinto, por exemplo, as áreas

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do extremo nordeste do Estado, municípios de Rifaina e Pedregulho (alto Rio Grande), únicas áreas em que se amostraram espécies como Mauritia flexuosa L.f., Vochysia rufa Mart., Xylopia sericea A. St. –Hil, Neea theifera Oerst. e Macairea radula (Bonpl.) DC., entre outras.

Da mesma forma, os remanescentes de cerrado do Vale do Paraíba possuem flora bastante distinta do restante do Estado, com espécies peculiares, como Memora

pedunculata Miers, Mandevilla coccinea (Hook e& Arn.) Woods., Ouratea confertiflora (Pohl.) Engl., Miconia ferruginata DC.

Registraram-se, no total, 549 espécies vegetais no Estado de São Paulo, incluindo árvores, palmeiras, arbustos e subarbustos. Uma vez que foram amostrados fragmentos com vegetação ecotonal (transição com floresta estacional semidecidual e floresta ombrófila densa), encontram-se na listagem espécies que não ocorrem em vegetação de cerrado sensu lato. De todas as espécies amostradas, apenas 167 são árvores típicas de cerrado sensu lato.

Algumas espécies destacaram-se pela ocorrência em grande parte dos fragmentos. São espécies de alta plasticidade ecológica, muitas vezes não associadas a um bioma específico, podendo ocorrer em floresta estacional semidecidual ou em cerrado. Casearia sylvestris Sw., Byrsonima intermedia A. Juss., Copaifera

langsdorffii Desf., Gochnatia barrosii Cabrera, Tabebuia ochracea (Cham.) Standl., Siparuna guianensis Aubl., Bromelia balansae Mez e Machaerium acutifolium Mart.

ex Benth. foram as espécies mais freqüentes, ocorrendo em pelo menos 80% das áreas amostradas.

Ironicamente, logo a seguir, nesta ordem, encontra-se Roupala montana Aubl., presente em 79% das áreas e, no entanto, incluída na lista oficial de espécies ameaçadas de extinção no Estado de São Paulo (D.O.E., 1998). Desta mesma lista, constatou-se a ocorrência de Byrsonima subterranea Brade & Markgr., citada entre as espécies presumivelmente extintas no Estado.

Por outro lado, há um grande número de espécies (19%) que foram observadas em somente uma das áreas visitadas. Muitas delas são espécies de outros biomas, ocorrendo em áreas ecotonais ou áreas erroneamente mapeadas como cerrado. Porém, boa parte das espécies com uma única ocorrência são espécies típicas de cerrado, como Annona cornifolia A. St.-Hil., Bauhinia purpurea Wall., Eriotheca

pubescens Schott & Endl., Eugenia klotzchiana Berg, Harpalyce brasiliana Benth., Memora pedunculata Miers, Riedeliella graciliflora Harms, Xylopia sericea A.

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St.-Hil., que, embora possam ser comuns em outros estados, são verdadeiramente raras em São Paulo.

Os trabalhos já publicados sobre a flora de cerrado do Estado de São Paulo, quase na sua totalidade, tratam de áreas com fisionomias campestres, localizadas na porção centro-nordeste do Estado. Por isso, os estudos baseados nesses trabalhos podem sugerir que a flora do cerrado paulista forma um bloco único, floristicamente indistinto, dentro de uma visão panorâmica dos cerrados de todo o Brasil, conforme apresentado por Ratter et al. (1996). Os cerradões e a vegetação ecotonal do oeste do Estado são praticamente desconhecidos do ponto de vista florístico e também pouco representados na forma de unidades de conservação.

3.2. Estado de conservação dos fragmentos remanescentes

Surpreendentemente, existem ainda fragmentos relativamente extensos e em excelente estado de conservação, especialmente na região oeste do estado, onde predominam fisionomias florestais (cerradão e vegetação ecotonal cerrado - floresta estacional semidecidual).

Foram amostrados 26 fragmentos considerados grandes (nove com mais de 800 ha e 17 com área entre 400 e 800 ha). Alguns fragmentos que eram grandes quando foram indicadas as manchas prioritárias para conservação, pelo Workshop de 1995, foram desmatados antes deste estudo, principalmente para assentamento de trabalhadores rurais (Martinópolis e Promissão) ou para a expansão de canaviais (Agudos e Pederneiras).

As ameaças mais sérias à conservação dos remanescentes de cerrado de São Paulo têm sido relativas ao uso do solo no entorno. Alguns fragmentos biologicamente importantes encontram-se praticamente inseridos na zona urbana de grandes cidades, fortemente pressionados pela especulação imobiliária e com lixo abundante e disperso (10% dos fragmentos). Várias áreas são cortadas ou delimitadas por rodovias, que colocam em risco a fauna e aumentam tremendamente o risco de incêndios.

Assim mesmo, verifica-se que, de modo geral, a proteção contra incêndios tem sido bem sucedida, com apenas 9% das áreas com evidências de fogo freqüente. Em 79% das áreas, nenhum indício de fogo recente, sequer pontual, foi observado.

Corte seletivo ou desmatamento parcial foi constatado em apenas 5 das 86 áreas.

A ameaça mais freqüente à biodiversidade dos remanescentes de cerrado tem sido a invasão por gramíneas africanas, quase que invariavelmente Brachiaria decumbens.

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Além de dominar o estrato inferior, dificultando a sobrevivência e reprodução das espécies nativas, a Brachiaria forma imensa quantidade de matéria seca no inverno, aumentando o risco e a intensidade de incêndios. Das áreas visitadas, apenas 24 (28%) não tinham gramíneas invasoras, principalmente áreas circundadas por reflorestamentos ou pomares de Citrus. Do restante, 32 (37%) tinham gramíneas invasoras apenas nas bordas, 19 (22%) estavam com parte da área invadida e 11 fragmentos (13%) tinham o estrato inferior totalmente dominado por gramíneas invasoras.

A presença de Brachiaria torna questionável se a presença de gado (observou-se a presença de gado no interior de 27 áreas) é uma ameaça ou um benefício à conservação do cerrado. Em áreas invadidas, o gado controla a biomassa das gramíneas invasoras, diminuindo o seu impacto negativo pela competição e pelo risco de incêndios. Porém, o gado pode agir como dispersor das gramíneas invasoras, agravando a invasão, além de causar impacto sobre o ecossistema pelo pisoteio.

4. PERSPECTIVAS DE MANEJO SUSTENTÁVEL

Depois de termos visitado todas as manchas consideradas prioritárias para a conservação do cerrado no Estado de São Paulo, mapeando a ocorrência das espécies, avaliando o estado de conservação dessas áreas e conhecendo um pouco da realidade de uso da terra no Estado, constatamos que:

• Poucas espécies que permitem exploração direta ocorrem no Estado de São Paulo em populações de tamanho tal que permita o manejo sustentável.

• Há um grande número de espécies com potencial de utilização econômica, mas de outras formas que não o manejo sustentável. Para essas espécies, o uso comercial dependeria, por exemplo, do desenvolvimento de processos industriais ou de domesticação e cultivo em larga escala.

• As pessoas que moram junto das áreas de cerrado geralmente desconhecem o uso das plantas (não se sabe se esse conhecimento foi perdido ou se nunca teve importância no Estado de São Paulo, colonizado em boa parte por imigrantes). • Os remanescentes maiores e melhor conservados localizam-se geralmente em

grandes propriedades, nas quais não há interesse algum em exploração do cerrado, que muitas vezes é Reserva Legal averbada.

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5. COMENTÁRIOS FINAIS

A vegetação de cerrado no Estado de São Paulo vem sendo rapidamente destruída, em um processo ainda mais acelerado do que no restante do país, a despeito dos dois workshops que foram realizados indicando zonas prioritárias para a conservação do bioma no estado.

Alçar a bandeira da exploração econômica sustentável das plantas do cerrado como estratégia para assegurar a conservação dos últimos remanescentes nos parece um caminho equivocado.

Há uma incompreensível dicotomia nas ações governamentais em relação aos remanescentes de cerrado, que precisa ser solucionada: enquanto a Secretaria do Meio Ambiente luta para assegurar a preservação e conter o desmatamento, outros órgãos do Governo (estadual e federal) têm desapropriado grandes áreas de cerrado para implantação de assentamentos de trabalhadores sem terra.

Parte das áreas remanescentes pode ainda ter legalmente autorizado o seu desmatamento, uma vez que a legislação vigente não dispõe de mecanismos para evitá-lo.

Diante de todas essas constatações, considera-se que o melhor caminho para a conservação efetiva dos remanescentes de cerrado no Estado de São Paulo é transformá-los em unidades de conservação, ao menos aqueles de maior valor biológico ou sob maior ameaça.

5. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

Borgonovi, M. & Chiarini, J.V. 1965. Cobertura vegetal do Estado de São Paulo. I -Levantamento por fotointerpretação das áreas cobertas com cerrado, cerradão e campo, em 1962. Bragantia 24:159-172.

Castro, A.A.J.F. & Martins, F.R. 1999. Cerrados do Brasil e do nordeste: caracterização, área de ocupação e considerações sobre a sua fitodiversidade. Pesquisa em Foco 7:147-178.

Castro, A.A.J.F. 1994. Comparação florístico-geográfica (Brasil) e fitossociológica (Piauí-São Paulo) de amostras de cerrado. Universidade Estadual de Campinas, Campinas. 520pp. Tese de Doutorado.

Cavalcanti, R. B. ed. (1999). Ações prioritárias para a conservação da biodiversidade do Cerrado e Pantanal. Belo Horizonte: Conservation International do Brasil.

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Chiarini, J.V. & Coelho, A.G.S. (1969). Cobertura vegetal natural e áreas reflorestadas do Estado de São Paulo. Secretaria da Agricultura do Estado de São Paulo. Instituto Agronômico. Boletim 193. Campinas, Brazil.

D.O.E. 1998. Espécies da flora ameaçadas de extinção no Estado de São Paulo. Diário

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Durigan, G.; Siqueira, M.F.; Franco, G.A.D.C.; Bridgewater, S. & Ratter, J.A. (no prelo). The vegetation of priority areas for cerrado conservation in São Paulo State, Brazil. Edinburgh Journal of Botany.

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Eiten, G. 1972. The cerrado vegetation of Brazil. Botanical Review 38(2):201-341.

Kronka, F.J.N., Nalon, M.A., Matsukuma, C.K., Pavão, M., Guillaumon, J.R., Cavalli, A.C., Giannotti, E., Iwane, M.S.S., Lima, L.M.P.R., Montes, J., Del Cali, I.H. & Haack, P.G. 1998. Áreas de domínio do cerrado no Estado de São Paulo. São Paulo: Secretaria de Estado do Meio Ambiente, Instituto Florestal.

Morsello, C. 2001. Áreas protegidas públicas e privadas: seleção e manejo. São Paulo. Anablume / FAPESP. 344p.

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