M UDANÇA DE P ARADI GM AS P OP ART E M I NI M AL ART
Objetivos
Analisar o contexto social que proporcionou espaço para o desenvolvimento da Pop Art e da Minimal Art.
Tópicos
1. Da Seg und a Guerra à P op A rt
2. M inim al A rt – N ad a m ais q ue o m ínim o
1 . Da Segunda Guerra à P op Art
A Segunda Guerra Mundial mudou para sempre os rumos da História. Milhões de mortos em batalhas e nos campos de extermínio foram uma experiência que, mesmo hoje, passados mais de 60 anos, exige um grande esforço de compreensão. E a conclusão frustrada: por mais que racionalizemos (e é necessário racionalizar, é necessário analisar, e mais necessário ainda não esquecer, para que esses erros não voltem a ser cometidos), é impossível entender o motivo de tamanha violência e caos. Os artistas, de modo geral, não fingiram tentar entender. Eles simplesmente transmitiram esse caos para suas obras, numa tentativa (supomos) de dar um pouco de ordem àquilo que não pode ser ordenado. Ou, como propôs Aristóteles, buscar a catars e , ou seja, a purgação, uma limpeza interior através de uma nova vivência dessas experiências. Esse caos pode ser vislumbrado na obra, entre outros, de Jackson Pollock, criador do Expressionismo Abstrato: um caos tão literal que hoje seus quadros começam a ser estudados pelo Massachussetts Institute of Technology, o MIT, em busca de pistas sobre a Teoria do Caos. Pollock, entretanto, buscou um caminho difícil de afastamento de influências anteriores e uma libertação cada vez maior dos métodos convencionais de pintura (costumava, por exemplo, colocar as telas no chão e respingar tinta sobre elas). Sua quebra das “regras da arte”, como poderíamos dizer, não o levou em nenhuma direção crítica além da arte pela arte. Embora outros artistas, como De Kooning e Rothko, continuassem a produzir durante as décadas de 1950 e 1960, foi Pollock (morto precocemente em 1956, aos 44 anos, num acidente) quem deu o tom dessa corrente abstracionista norteamericana do pósguerra, primordialmente durante os anos 1940. O começo da década de 1950 assistiu a uma mudança de paradigma na arte. Buscando a abstração, Pollock e os expressionistas abstratos ainda estavam vinculados aos artistas modernos – ainda que os tivessem superado. Entretanto, surgiram outros grupos de artistas cujo foco estava mais voltado para outras questões. No caso da arte pop, uma crítica de conteúdo. No caso da minimal art (ou minimalismo), uma crítica da funcionalidade.P op art : s up erb acana
Toda essa gente se engana Ou então finge que não vê que eu nasci Pra ser o superbacana Eu nasci pra ser o superbacana Superbacana Superbacana Superbacana Superhomem Superflit, Supervinc Superhist, Superbacana
Estilhaços sobre Copacabana O mundo em Copacabana Tudo em Copacabana Copacabana O mundo explode longe, muito longe O sol responde O tempo esconde O vento espalha E as migalhas caem todas sobre Copacabana me engana Esconde o superamendoim O espinafre, o biotônico O comando do avião supersônico Do parque eletrônico Do poder atômico Do avanço econômico A moeda número um do Tio Patinhas não é minha Um batalhão de cowboys Barra a entrada da legião dos superheróis E eu superbacana Vou sonhando até explodir colorido No sol, nos cinco sentidos Nada no bolso ou nas mãos Um instante, maestro Superhomem Supervinc Superflit, Superhist Superviva, Supershell Superquentão (Caetano Veloso, Superbacana )
A letra desta canção de 1967 dá o tom do zeitgeist (que, em alemão, significa espírito do tempo): os anos 1960 foram um momento da história em que, culturalmente, valia de tudo, um pouco de cada coisa, uma mistura de referências formando um caldo saboroso, uma geléia geral (para usar uma expressão criada nessa época, música de Gilberto Gil, mas cujo nome remete a uma coluna de jornal que o poeta Torquato Neto tinha no jornal Última Hora, no Rio de Janeiro, em que falava de toda a efervescência cultural da época).
Mas essa coisa toda na verdade surgiu muito antes, na Londres de 1952, com a criação do I nd ep end ent Group . Formado por Richard Hamilton, Lawrence Alloway e Reyner Banham, entre outros, o Independent Group surgiu depois de uma série de encontros entre seus membros e de um desejo de trabalharem juntos para discutir (cada um à sua maneira) questões como a produção industrial dos Estados Unidos no seu caráter técnico e analisar a emergência da cultura do consumismo popular nesse país – e que logo se espalhou pelo mundo. É preciso lembrar que a situação dos EUA pósSegunda Guerra não era das melhores. Depois de ter enviado a maior parte da sua força de trabalho para lutar no exterior e de modificar a produção de sua indústria para o esforço de guerra (e conseqüentemente aumentando muito a capacidade de produção de bens, que não poderia ser reduzida sob pena de falência das empresas, inchadas com o aumento da produção durante a guerra), o governo dos Estados Unidos percebeu que não bastava ter ganho a guerra: era preciso agora conquistar corações e mentes em seu próprio quintal. Uma das estratégias usadas para isso foi a publicidade. Os anos 1950 foram de grande expansão para o mercado publicitário e para a venda de eletrodomésticos, que começaram a ser fabricados em massa logo após a guerra. Segundo Rafael Cardoso, em seu livro Uma Introdução à História do Design, o públicoalvo da venda desses bens de consumo era a mulher, que passou a ser “imbecilizada”, tratada como uma dona de casa cuja vida deveria girar em torno do cuidado do lar, do marido e dos filhos – mas sempre auxiliada por fabulosos dispositivos elétricos que supostamente tornariam sua lida doméstica muito mais fácil. Surge aí o conceito de mulher como “rainha do lar”. Os membros do Independent Group não estavam alheios a essas estratégias. Em 1956, na Whitechapel Art Gallery, em Londres, eles inauguram oficialmente sua atividade para além das discussões teóricas na Exposição This is Tomorrow. Ali, tendo como inspiração o trabalho de precursores como Eduardo Paolozzi (autor de quadroscolagens como É um Fato Psicológico que o
Prazer Melhora Sua Disposição, de 1948, que mostra mulheres lindas fazendo alegremente o trabalho de limpar a casa com vassouras e aspiradores de pó) e as colagens de Picasso e Braque, Richard Hamilton expôs O Que Exatamente Torna os Lares de Hoje Tão Diferentes, Tão Atraentes? Esse quadro de nome tão grande é uma colagem ainda mais “malcomportada” que a de Paolozzi, apresentando uma crítica aos corpos “sarados” e bonitos, à televisão, aos produtos industrializados e – evidentemente à propaganda de eletrodomésticos. Rejeitando a chamada “alta cultura” do modernismo (que jamais aceitaria uma vinculação com a publicidade, por exemplo, mesmo que essa vinculação fosse para criticála), o pessoal do Independent Group começava ali a buscar inspiração para suas obras na cultura popular, ou popular culture. Da abreviação da palavra popular (e, segundo um dos teóricos do grupo, Lawrence Alloway, da marca do pirulito que aparece no quadro de Hamilton) surgiu o termo pop, que o próprio Alloway utiliza em seus escritos para classificar o movimento que estava surgindo. Em seu livro Theory and Design in the First Machine Age (1960), Reyner Banham cunha o termo “estética do descartável” para descrever todo esse processo. Para Banham, a Primeira Era das Máquinas foi o m od ernis m o. A Segunda Era estaria sendo vivida agora, e seria “a era da eletrônica doméstica e dos produtos químicos sintéticos”. E foi nessa segunda era que um outro grupo, do outro lado do Atlântico, começou a ficar bastante interessado no que o Independent Group fazia. Esse grupo (na verdade vários artistas que se conheciam, mas não compunham nenhum coletivo ou grupo formal de teoria ou mesmo prática) era formado por nomes como Andy Warhol, Claes Oldenburg e Roy Lichstenstein, entre outros. Contudo, foram necessários cerca de dez anos até que eles começassem a mostrar seu trabalho. Em 1963, no estado norteamericano da Filadélfia, foi realizada a mostra Art 1963: A New Vocabulary. Em seguida, uma mostra semelhante foi feita em Nova York, chamada The New Realists. Mas que novo vocabulário era esse que os chamados “novos realistas” estavam apresentando? Era uma nova linguagem que tinha como base materiais encontrados no meio comercial, cores vivas e desenho simplificado. No caso de Andy Warhol, serigrafias que copiavam fotos de astros como Elvis Presley e Marilyn Monroe. Já para Roy Lichstenstein, a inspiração vinha diretamente das histórias em quadrinhos, especialmente as românticas, feitas “para moças”, então em voga nos EUA. É a cultura de massa tomando conta do espaço da arte. David McCarthy define muito bem isso com o seguinte comentário: “As imagens eram localizadas o bastante em seu tempo para que não se precisasse de uma formação clássica ou religiosa para reconhecer a iconografia”. Ou seja: nada de abstracionismo que (segundo eles) as pessoas não conseguiam entender, e nem imagens de uma cultura mais sofisticada, que só uma pessoa com formação acadêmica poderia apreciar. O fundamental agora era dar ao povo aquilo que o povo conseguia entender. Devolver os produtos da cultura de massa sob a forma de arte. Em vez de um modernismo elitista acessível a poucos, o que a pop art queria era propor uma nova arte, aberta às massas.
2 . Minimal Art – Nada mais que o mínimo
Mas é importante notar uma coisa: a história da arte não acontece com um movimento de cada vez, ocupando um espaço organizado e bem definido. Para fins de explicação historiográfica, divisões são necessárias, mas muitas vezes alguns movimentos bem diferentes uns dos outros ocupam o mesmo lugar no tempo e no espaço. Foi o caso, por exemplo, da Minimal Art, ou simplesmente Minimalismo. Quase ao mesmo tempo em que a pop art começou sua trajetória bemsucedida nos EUA, surge um outro grupo, mais voltado para a tridimensionalidade, e com pouca ou nenhuma preocupação com os aspectos da cultura de massa que o pop abraçara. Na verdade, esses artistas, embora tenham realizado várias exposições juntas, não constituíram um grupo de estudos e pesquisas, também ao contrário do Independent Group. Os novaiorquinos Carl André, Dan Flavin, Donald Judd, Sol LeWitt e Robert Morris tinham em comum o uso de materiais industriais, unidades modulares, ausência de artesanato ou ornamentação e arranjos regulares, simétricos ou em grade. Tinham também em comum uns com os outros a identificação com a proposta de uma arte mais simples, reducionista sem ser imbecilizante, uma arte com muito a dizer mas poucos elementos a revelar. Essa proposta seria publicada no ensaio “Minimal Art”, de Richard Wollheim, escrito em 1965, e muito bem resumida por outro artista que, embora mais eclético que os cinco citados acima, também pode ser considerado um minimalista: Frank Stella. Minha pintura se baseia no fato de que só o que pode ser visto está ali. Frank Stella No mesmo ano do ensaio de Wollheim, é publicado outro texto fundamental: “Specific objects”, de Donald Judd. Ali, além de ressaltar pontos semelhantes aos do outro artigo, ele assume uma postura crítica não muito diferente da levantada anos antes por Abraham Palatnik, ao declarar que “mais da metade dos melhores trabalhos novos dos últimos anos não foi nem pintura nem escultura”. Como classificar essas obras, então? Cada um dos cinco rotulava seus trabalhos de uma maneira. Judd se referia à suas obras como “trabalhos tridimensionais” ou “objetos”. LeWitt chamava seus trabalhos de “estruturas”. Flavin, de “propostas”. Andre foi o único que continuou a se referir às suas obras com o termo “escultura”. Robert Morris manifestase contra os termos “estrutura” e “objeto” em uma série de ensaios na revista Artforum, “Notes on Sculpture”, publicados em 1969. Nessa série, ele declara: “A escultura morreu e começaram os objetos”. Os objetos minimalistas, além de industriais, têm como característica comum a repetição de unidades. As composições modulares de Judd, por exemplo, se notabilizam pelas estruturas de caixa aberta, os materiais planos e lisos e o uso de cor inerente (ou seja, já pertencente previamente ao objeto) ou aplicada (pintada pelo próprio artista). Morris criticava o uso da cor e do relevo na escultura, e desprezava o uso de “unidades modulares repetidas”. Usava quase sempre madeira compensada, pintada em cinzaclaro uniforme (não considerava o cinza uma cor) e acreditava numa relação triangular objetoespaçoespectador. Suas obras eram feitas para serem visitadas e percorridas pelos espectadores dentro de um espaço específico. Carl Andre é o único do grupo que tem sua origem numa tradição de escultura Apóiase no uso repetido de uma unidade básica e um padrão diagonal. Além disso, usa materiais modernos ou que foram processados por meios industriais. Outra característica interessante do trabalho de Andre é que os materiais por ele usados são “simplesmente juntados”: o resultado é o que chamamos de escultura de disposição. Dan Flavin é o único dos cinco que trabalhava exclusivamente com luz. Segundo Donald Judd, Flavin usava a luz “como um objeto industrial”. A composição das suas “propostas” assumem o lugar de pinturas e lembram molduras. O uso de produtos industriais (como lâmpadas
fluorescentes) coloca suas obras com um pé no conceito de readymade de Marcel Duchamp, deslocandoas de seu lugar como mero elemento de iluminação e fazendoas atingir o status de arte. Sol LeWitt era o “matemático” do grupo. Trabalhava com Superfícies de aspecto “duro e industrial”, quase sempre de madeira ou metal. Eram sempre estruturas repetitivas de cubos modulares (sólidos até 1965; após essa data, vazados), seguindo padrões matemáticos de repetição (como a famosa série de múltiplos de 1, 2 e 3). É LeWitt que, em 1967, cunha o termo “arte conceitual”. E o minimalismo, mais do que a maioria dos grupos anteriores, é conceitual no sentido mais estrito do termo: trabalha em função de uma idéia quase obsessiva: menos é mais. Mas sempre com conteúdo.
3 . Bibliografia
BATCHELOR, David. M inim alis m o. São Paulo: Cosac & Naify, 2001.
CARDOSO, Rafael. U m a I ntrod ução à H is tória d o Des ig n. Edgard Blucher, 2004. MACCARTHY, David. A rte P op . São Paulo: Cosac & Naify, 2001.