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A Mentalidade Vencedora

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Academic year: 2021

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A Mentalidade Vencedora

Marcelo Augusto Antonelli

Parte 3: Aplicando a mentalidade de crescimento no desenvolvimento de um

atleta

Na primeira parte desta série expliquei o conceito da mentalidade fixa e da mentalidade de crescimento (DWECK, 2006)

(http://www.universidadedofutebol.com.br/Artigo/15676/A-Mentalidade-Vencedora). Na segunda parte, discutimos algumas forma de se transformar a mentalidade fixa em

mentalidade de crescimento (http://www.universidadedofutebol.com.br/Artigo/15688/A-mentalidade-vencedora-parte-2). Nesta terceira parte, irei focar no jogador de futebol e nas consequências de cada uma das duas das mentalidades no dia a dia do treinamento e na elaboração de um plano de desenvolvimento.

Assim como tantos outros brasileiros, eu cresci sonhando em ser jogador de futebol. Ir ao estádio, assistir aos profissionais, cantar o hino do clube e admirar o que eles faziam com a bola era o ritual. A pergunta que nunca saia da cabeça era: “será que eu tenho talento suficiente para virar um jogador profissional?”. Enquanto criança, com uma visão

diferente de mundo, a pergunta era “fechada”, ou seja, simplesmente existia uma resposta simples, “sim ou não”, que eu teria que descobrir.

Mais de 30 anos após meus primeiros treinos em uma “escola de futebol”, minha visão de mundo, do que é ser um “jogador profissional” e do que é “talento” mudou

completamente. Afinal, o que é esse talento? É realmente esse “talento” que faz um jogador ser profissional ou não? Tenho certeza de que cada leitor tem suas próprias opiniões, assim como eu tenho as minhas e adoraria escrever sobre elas, mas para não fugir ao tema desta série o fato mais importante dessa reflexão é o de que o jogador brasileiro é escravo de nossa cultura, que supervaloriza o talento.

Após seis anos jogando futsal na Itália e outros sete como treinador nos Estados Unidos, foram diversas as vezes em que vi um brasileiro assistindo pela primeira vez uma partida no exterior (muitas vezes não da divisão de elite) fazer o comentário: “pô, os caras não são bons não.” Até hoje não me lembro de escutar como primeiro comentário de um brasileiro chegando: “estou ansioso para aprender”.

Afinal, somos parte da nação que comanda o futebol e o futsal (além de outras variedades) em títulos mundiais. Temos um número muito grande de jogadores e

treinadores por todos os cantos do mundo. Boa parte dos maiores jogadores da história do futebol são brasileiros. É fácil de compreender o efeito “basking in reflected glory”

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(BIRG) (BREHM et al., 2005), ou seja, quando associamos ao sucesso de outros e fazemos com que esse sucesso se torne o nosso próprio.

Muitos desses jogadores brasileiros tinham realmente alguma condição superior aos atletas que eles observaram jogando pela primeira vez. Para citar um exemplo,

frequentemente, o drible era a característica que distinguia o brasileiro dos europeus ou americanos. No entanto, outros problemas apareceram: o jogador tinha dificuldade de movimentação sem a bola ou dificuldade no domínio, já que a bola vinha de forma diferente da qual o jogador estava acostumado no Brasil ou o jogador sofria uma marcação diferente da habitual em nosso país e não conseguia conectar os passes. Tenho consciência de que nem todos os brasileiros têm esses problemas e de que, praticamente, toda equipe de elite da Champions League (Liga dos Campeões) tem pelo menos um brasileiro fazendo a diferença. Mas, novamente, não vamos deixar que a glória de outros reflita em nossos próprios desafios. O ponto chave na situação apresentada nesse exemplo é: o jogador de futebol brasileiro, em geral, está mentalmente pronto para buscar incessantemente novos desafios e desenvolver qualidades que não foram bem trabalhadas na sua formação? Por causa da mentalidade fixa implantada em nossos jogadores desde pequenos, muito comumente a resposta é não.

Trabalhar para sanar as próprias deficiências, de acordo com a mentalidade fixa, é uma forma de derrota, já que o talento não é suficiente. Então, o jogador focaliza em manter a imagem de que tem talento, acaba por recusar-se a encarar o desafio de

adaptação/aprendizado utilizando o máximo de seu empenho e, como resultado, boa parte dos brasileiros que vão jogar no exterior (nas mais variadas ligas e divisões) retornam no primeiro ano. Claro que, como já discutimos anteriormente, outros brasileiros

experimentam o sucesso imediatamente e outros conseguem mudar de mentalidade e se dedicam para sanar as próprias deficiências, se adaptam às exigências do jogo e acabam por alcançar sucesso pelos campos do mundo.

Estamos nos utilizando do exemplo de atletas brasileiros chegando ao exterior. Porém, desafios semelhantes enfrentam nossos atletas nas categorias de bases das equipes

profissionais por todo o Brasil, estudantes nas escolas, garotos e garotas nas escolinhas de futebol. Cada um seguindo seu sonho, cada um defendendo a própria estima e procurando descobrir se “são bons ou não”. Em todos os casos, a mentalidade de crescimento irá ajudá-los a desenvolver melhor seu potencial.

O que procuramos responder neste artigo é: como utilizar-se da mentalidade de crescimento para otimizar o desenvolvimento de um atleta?

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Pedagogicamente, podemos dividir esta resposta em dois passos: primeiro, deixar o atleta ciente da mentalidade de crescimento e, segundo, mostrar para ele como essa mentalidade oferece resultados práticos.

Para aplicar esse primeiro e importante passo podemos aplicar as técnicas descritas no artigo “Como desenvolver a mentalidade de crescimento” (link no início deste artigo), para que o jogador/aluno comece a compreender que seu sucesso não é uma questão pura de ter ou não ter talento. O jogador/aluno deve compreender que seu próprio esforço e dedicação serão a longo prazo um fator determinante no nível de performance que irá alcançar.

No entanto, imersos em nossa cultura do talento e com um conhecimento bastante

limitado das teorias do treinamento e desenvolvimento, psicologia, metodologia e mesmo das capacidades necessárias dentro de campo para desempenhar efetivamente a própria função, a missão de um treinador em convencer um atleta de que seu treinamento poderá ser mais importante do que a carga genética não será fácil, mesmo com os exemplos do artigo anterior. Imagino que o mesmo pensamento esteja nesse momento na cabeça de grande parte dos leitores.

Se pensarmos somente na imagem final de um Neymar, um Ronaldo, um Romário, um Pelé, com certeza iremos chegar à conclusão de que foi necessária uma carga genética muito especial, misturada a um meio ambiente que proporcionou um grande

desenvolvimento e a própria dedicação e persistência do atleta para chegar onde

chegaram. Mas vamos pensar nos outros 99,9% dos jogadores profissionais. O que faz a diferença?

A mais conhecida divisão pedagógica dos esportes divide-os nas capacidades técnicas, táticas, físicas e psicológicas. Por muitos anos essa divisão foi muito aceita e seguida. Nos últimos anos, aqui mesmo na Universidade do Futebol, uma série de artigos vêm criticando essa divisão e o excesso do tecnicismo no futebol brasileiro. Recentemente, passou-se a discutir mais a periodização tática, os princípios e subprincípios de um sistema de jogo.

Pessoalmente, gosto de trabalhar com meus atletas algo similar aos subprincípios de um sistema de jogo: as capacidades de jogo. Por exemplo, a capacidade de um jogador receber a bola no meio de campo e conectar passes com eficiência. Um jogador

“inteligente” será capaz de encontrar os espaços disponíveis para sair da pressão e fazer as conexões com qualidade.

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O que seria essa inteligência? Muitos artigos já foram escritos sobre inteligência de jogo, mas um dos fatores para medir a inteligência nesse caso especifico, será a capacidade de olhar em volta antes de receber a bola.

Essa capacidade é uma capacidade inata, genética? Seguramente, muitos jogadores desenvolveram essa capacidade sem nenhum treinador ou metodologia para facilitar seu aprendizado. No entanto, uma metodologia eficiente poderá fazer com que jogadores “menos predispostos geneticamente” se tornem “mais inteligentes” a partir do momento que eles passem a jogar olhando para os lados a todo momento.

Jogadores não olham para os lados antes de receber a bola por dois motivos principais: nunca refletiram na importância desse processo e ao tentarem olhar para os lados podem perder o tempo da bola e o domínio será defeituoso.

Assim sendo, fica claro que o treinador: terá que fazer o jogador compreender a importância de se olhar em volta antes de receber a bola e terá que criar uma

metodologia, partindo de estágios com pouca ou nenhuma pressão, até estágios similares ou mais difíceis do que a realidade do jogo, que incentive o jogador a trabalhar o olhar para os lados antes de receber a bola e tire a pressão dos erros do domínio enquanto se desenvolve tal capacidade. Cabe ao treinador, de acordo com o seu próprio grupo, aplicar atividades que sejam coerentes e motivantes, facilitando ao jogador vencer neste

processo.

Como resultado, depois de alguns meses, um jogador que se considerava “burro” por não conseguir ver o jogo, experimentará um sucesso maior na distribuição da bola. O

treinador tem aí a oportunidade perfeita de mostrar ao jogador e ao grupo que o trabalho e dedicação podem ser tão importantes quanto a carga genética e que o mesmo tipo de conceito/metodologia pode ser usado para uma infinidade de capacidades de jogo. Dessa forma, estamos fornecendo um exemplo prático do segundo passo, em como se utilizar da mentalidade de crescimento no dia a dia de um atleta: fazer com que este perceba a evolução de seu “talento” como consequência de treinamento.

É importante ressaltar que esta evolução se dará de forma mais rápida em aspectos do jogo que o atleta não está acostumado a treinar. Por exemplo, a evolução do passe com a parte de dentro do pé – algo que a grande maioria dos jogadores treina desde pequeno e utiliza no dia a dia – será muito mais lenta do que com driven balls (passes com o peito do pé), caso o jogador nunca o tenha treinado.

O importante é o atleta (e o treinador) perceberem que um grande número de capacidades de jogo podem ser desenvolvidas como consequência de um treinamento que use uma

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metodologia eficiente e que treine de fato o jogadores para situações que se apresentam na realidade do jogo. A mentalidade de desenvolvimento é uma das bases para se criar um “ambiente de desenvolvimento” que permita aos atletas desenvolverem de forma ideal suas capacidades.

A criação desse ambiente de desenvolvimento é a quarta e última parte desta série de artigos “A Mentalidade Vencedora”.

Referências bibliográficas

BREHM, Sharon S.; KASSIN, Saul; FEIN, Steven. Social Psychology. Boston, MA: Houghton Mifflin Company, 2005.

DWECK, Carol S. (Ph.D). Mindset, The New Psychology of Success. New York, NY: Random House, 2006.

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