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Reflexões sobre o brinquedo na sociedade do capital

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V. 13, n. 1:2017.

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REFLEXÕES SOBRE O BRINQUEDO NA SOCIEDADE DO CAPITAL

RESUMO: Este texto consiste em uma análise do Brinquedo como um produto que se tornou

mercadoria. Partindo desta observação, pergunto sobre os resultados das relações culturais produzidas por meio da interação do sujeito com o brinquedo mercadoria. Para tanto, foram usados os textos de Walter Benjamin (2004, 2012, 2013) como principal aporte teórico. O texto consiste em três momentos: (a) apresenta uma discussão que tem como tese central expor a relação dos sujeitos com o brinquedo mercadoria; (b) demonstra os resultados desta relação, que culmina na perda da criatividade do sujeito e; (c) aponta a cultura popular como um viés possível de resgatar o brinquedo e suas potencialidades perdidas na sua transformação massiva em capital.

Palavras-chave: Brinquedo; Mercadoria; Improviso.

REFLECTIONS ON THE TOY IN THE CAPITAL SOCIETY

ABSTRACT: This text is an analysis of the toy as a commodity product became. From this

observation, ask about the results of cultural relations produced by the interaction of the subject with the toy merchandise. For this, they used the Walter Benjamin's texts (2004, 2012, 2013) as the main theoretical framework. The text consists of three stages: (a) presents a discussion whose central thesis expose the relationship of the subject merchandise to the toy; (b) shows the results of this relationship, culminating in the loss of the subject's creativity and; (c) points to popular culture as a possible to rescue the toy and its lost potential in massive conversion into capital.

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2 1 INTRODUÇÃO

O passado nos é estranho, as lembranças, muitas vezes nos chegam por experiências que causam perplexidade na sua comparação com o tempo atual. Esta experiência, por diversas vezes, é motivo de uma sensação de desconhecimento. A sensação de já ter pertencido a um mundo passado que hoje, coloca a minha perspectiva estrangeira às coisas desatualizadas. No mundo dos brinquedos, as pipas, os peões de rodar, os bonecos de madeira e sabugo, as cordas e as brincadeiras de roda, etc. para muitos de nós já caíram no esquecimento, quando não, no estranhamento. As próprias ações de produzir, fazer, criar, que antecedem o ato de brincar com estes brinquedos antigos, já não são comuns. As pipas já vêm prontas e possuem formas diversificadas, os peões de rodar já não são de madeira e barbante, são de plástico, produzidos em fábricas e podemos comprar vários de uma vez só. Os bonecos foram aperfeiçoados, estes possuem características estruturais mais complexas, são figuras prontas de monstros, mulheres, bebês que choram etc. Com estes bonecos não precisa imaginar muito, parece que a brincadeira vem pronta, junto com o pacote que o brinquedo carrega. Estes brinquedos que não nos são estranhos, permeiam o nosso mundo sociocultural, e são historicamente mais personalizados e desenvolvidos que os brinquedos antigos. Este é o referencial dominante de brinquedo que temos na sociedade do capital. Neste sentido, cabe perguntar qual o tipo de experiência sociocultural que este brinquedo que não nos é estranho nos proporciona?

2 DESENVOLVIMENTO

Os objetivos deste artigo constituem: Expor a relação dos sujeitos com o brinquedo mercadoria; demonstrar a perda da criatividade do brinquedo e da brincadeira como produto/mercadoria na sociedade do capital e; propor a relação entre o brinquedo e a cultura popular como um viés para a busca da criatividade nas brincadeiras.

É um trabalho que tem como base a revisão da literatura que, segundo Cardoso (2010), consiste em investigar minunciosamente os trabalhos precedentes do tema e então compreendê-los em sua disposição teórica de forma que seja possível relacioná-los com as intenções objetivadas do texto. Para tanto utilizei a pesquisa literária para localizar, revisar, interpretar e sintetizar os conceitos do filósofo Walter Benjamin (2004, 2012, 2013) e construir de forma teórica a explanação dos objetivos propostos.

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Em cada época, existiram diferentes tipos de brinquedos, hoje a maioria dos brinquedos são produzidos em série pelas indústrias e ganham a característica de mercadoria. Para Benjamin (2004, p.84) o aspecto do nosso estranhamento em relação aos brinquedos antigos, é retratado da seguinte forma:

“‘Já não se tem mais isso’, ouve-se com frequência o adulto dizer ao avistar brinquedos antigos. Na maior parte das vezes isso é mera impressão dele, já que se tornou indiferente a essas mesmas coisas que por todo canto chamam a atenção de uma criança.”

Os brinquedos e as formas de brincar com seus materiais e situações obsoletas já nos parecem sem graça, muitas vezes mais trabalhoso do que divertido porque precisam ser construídos e criados. O brinquedo mercadoria nos remete somente a ação imediata do brincar, não havendo contato com a criação e os materiais necessários para criar o brinquedo. Penso que a ação do brincar imediata, ou seja, a proporcionada pelo brinquedo mercadoria, muitas vezes se torna rotineira, repetitiva e seriada, há um paradoxo, que afirmo existir em toda essa relação: quanto mais brincamos com brinquedos mercadorias, menos contato tem-se com as possibilidades de significar a brincadeira de forma criativa. Tornamo-nos dependentes, não do brincar como pensamos que seja, mas desse novo brinquedo que traz consigo todo um aparato significativo já criado. Grande parte dos brinquedos mercadorias torna o sujeito passivo e dependente deles. Não à toa que, muitos brinquedos (àqueles direcionados ao consumo) são vendidos em versões que se completam, em que certas situações a brincadeira não progride se a criança não tiver a versão posterior e atualizada do seu atual brinquedo. O mundo do brinquedo, nesta perspectiva, torna-se externo às necessidades infantis que estão mais associadas à imaginação e a criação que ao prazer do brincar. O resultado é que o brinquedo como objeto mercadoria, se emancipa do sujeito da brincadeira, para Benjamin (2004, p.91): “Uma emancipação do brinquedo põe-se a caminho; quanto mais a industrialização avança, tanto mais decididamente o brinquedo se subtrai ao controle da família, tornando-se cada vez mais estranho não só às crianças, mas também aos pais.”

No século XIX, em que houve o avanço da indústria moderna, a produção do brinquedo já perdia seus elementos anteriores, que eram os materiais mais rústicos como, a madeira e o ferro, e também a sua característica singular que era dada pelo criador do brinquedo (não só o artesão, confeiteiro ou nossos pais, mas também as crianças). Os brinquedos se tornam repetitivos e toda sua produção é distante de quem os usa, assim, perdem o singular e sua localidade, perdem a parte minúscula que hoje olhamos com estranheza. A parte minúscula é a parte criativa, a que vinha de

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cada um de nós ao brincar, que tornava os brinquedos e as brincadeiras diferentes entre si, esta parte minúscula se torna uma experiência perdida. Segundo Benjamin (2004, p.93), a parte minúscula consiste no improviso e no significado que o sujeito da brincadeira dá aos brinquedos.

Hoje talvez se possa esperar uma superação efetiva daquele equívoco básico que acreditava ser a brincadeira da criança determinada pelo conteúdo imaginário do brinquedo, quando, na verdade, dá-se o contrário. A criança quer puxar alguma coisa e se cavalo, quer brincar com areia e se padeiro, quer esconder-se e torna-se bandido ou guarda.

O equívoco é pensar que o brinquedo define a situação imaginária, uma situação que determina a experiência do lúdico de forma totalmente alheia ao sujeito que brinca. Os brinquedos mercadoria, que trazem a situação imaginária totalmente pronta são os que nos tornam passivos, e que têm maior potencial de anular a criatividade. Tal ocasião nos faz perguntar: que tipo de brinquedo está-se construindo? Se é que construir brinquedos ainda pertença ao nosso mundo, pois, o nosso estranhamento está direcionado a uma parte criativa do brinquedo, ora, o fato de um cabo de vassoura tornar-se um cavalo, uma caixa de sapato virar um caminhão, a areia virar pão, parece não haver mais sentido em um mundo onde a parte da criação do brinquedo já fora completamente pensada e criada no seu processo de produção plastificada com um valor monetário e formas prontas. Por exemplo, o pão, o carrinho, o cavalinho, o caminhão comprados já vêm prontos, desde a forma e toda a situação imaginária. Não inventamos mais as cores, as formas ou os nomes dos brinquedos, a liberdade (se é que há?) só está na escolha destas características via prateleiras e pacotes quando compramos estes brinquedos. Na verdade, quando se pode comprar. O brinquedo é um produto do mercado que, como um dos bens culturais, seguindo a observação de Habermas (1984) sobre a indústria cultural, passou a orientar-se pelas regras do mercado, em função da viabilidade do consumo, das estratégias de venda e das necessidades de distração de quem o consome.

O brinquedo e a criança estão inseridos em uma sociedade, e a própria brincadeira acaba sendo um instrumento de diálogo social, pertencendo às formas e estruturas ideológicas sociais nas quais vivemos. Nesta perspectiva, considero o brinquedo um instrumento ideológico. De acordo com Bakhtin (2006, p.29)

Tudo que é ideológico possui um significado e remete a algo situado fora de si mesmo. Em outros termos, tudo que é ideológico é um signo. Sem signos não existe ideologia. Um corpo físico vale por si próprio: não significa nada e coincide inteiramente com sua própria natureza. Neste caso, não se trata de ideologia.

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Os brinquedos são signos que dependem do conteúdo simbólico que damos a eles, neste sentido, cada brinquedo tem uma representação social. Esta representação, ou seja, o signo possui sua especificidade na forma como ele é comunicado no meio social. O brinquedo não é somente engendrado pela consciência infantil, pois, possui relação com os fatores sociais constituem o seu espaço ideológico, ou seja, as ideias do que é bom e mau, belo e feio, certo e errado, verdade e mentira. Neste sentido, a criança aprende os valores e regras sociais pelo brincar também, e se constituem como parte social quando brincam, já que se relacionam com os signos ideológicos que os brinquedos e brincadeiras trazem consigo. Assim, é preciso considerar que este é um caminho dialético em que a criança participa da criação do brinquedo e do brincar, e também que o brinquedo é sempre um instrumento ideológico com signos determinados pelo contexto sociocultural. Como bem salienta Benjamin (2004, p.94)

...a criança não é nenhum Robinson Crusoé, assim também as crianças não constituem nenhuma comunidade isolada, mas antes fazem parte do povo e da classe a que pertencem. Da mesma forma, os seus brinquedos não dão testemunho de uma vida autônoma e segregada, mas são um mudo diálogo de sinais entre a criança e o povo.

Partindo do pressuposto de que o brinquedo é um diálogo entre a criança e a sociedade, faz-se importante a faz-seguinte pergunta para este caso em específico: Que tipo de experiência o brinquedo do nosso contexto social proporciona ao sujeito? Primeiramente, quero salientar que tenho consciência da diversidade de brinquedos e brincadeiras que existem e que não gostaria de generalizar, contudo, quero chamar a atenção para os brinquedos comprados, este ato que sim, generaliza à vista da diversidade de brinquedos que podem existir. Estes brinquedos trazem consigo a situação imaginária pronta, tornando o sujeito da brincadeira passivo em relação ao próprio brinquedo. O resultado desta passividade pode acarretar a diminuição do espaço imaginário e das situações criativas. Neste sentido, o brinquedo como um produto do capital, ganha autonomia em relação ao sujeito, valendo mais que o próprio ato de criar a brincadeira, fato que substitui as especificidades culturais do brinquedo, afinal, o que importa para os produtos do capital, é a sua necessidade atrelada à utilidade e eficiência de produzir lucro e não a sua capacidade cultural de desenvolver o sujeito.

O brinquedo como objeto ideológico no contexto do capital, não dá importância para as questões lúdicas, a aprendizagem (questões pedagógicas) ou as potencialidades do conteúdo cultural de quem brinca. Para tal constatação, gostaria de refletir o pensamento de Benjamin (2013), quando

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este diz que no mundo capitalista, as coisas só adquirem significado quando possuem relações de culto (o capitalismo entendido como uma forma de religião), cujo ídolo de adoração é o dinheiro. Neste caso, defendo que não só o brinquedo passa a ser uma mercadoria, mas a brincadeira também. Além de o produto ter um preço, a imaginação também necessita de valores monetários. Se não fosse assim, não haveria sentido no choro e na apelação dos sujeitos aos brinquedos de prateleiras ou a constatação do estranhamento em relação aos brinquedos mais antigos. Neste contexto, as outras formas de brincar, as antigas de preferência, com seus materiais rústicos ou inúteis (àqueles que geralmente vão ao lixo), se tornaram estranhas aos adultos e as próprias crianças. Brincar, mais do que situações imaginárias, se tornou um jogo, no qual, a regra é imitar, os brinquedos produzidos em série, precisam ser comprados em série, então é comum estranharmos o peão de madeira e barbante, os carrinhos de caixinhas de papel ou o sabugo de milho que ganhou vida em relação aos brinquedos de refinada estética e modernidade, estes nos fazem quere-los, quando os compramos não precisamos criá-los, por isso é mais importante imitar do que criar. Para a indústria moderna que produz estes brinquedos, imitar está no ato da compra, mesmo as crianças incorporam este sentido, é uma espécie de ritual religioso, como que se para brincar fosse preciso, necessariamente comprar o ato da brincadeira. Em alguns casos, o ato de brincar só é materializado na compra, depois, o próprio brinquedo acaba sendo descartado.

O que perdemos? Ora, esta é uma pergunta que gostaria de responder no sentido pedagógico, e o que perdemos é justamente parte daquilo que nos faz desenvolver, ou seja, a parte criativa. Perdemos o diferente, o minúsculo, a parte que não se preocupa em imitar. Por exemplo, perdemos a possibilidade de construir um brinquedo e de dar a brincadeira algo do nosso universo cultural. Em alguns casos, brinquedos comprados sequer dão a possibilidade da escolha do nome, pois, já possuem nomes. De certa forma, perdemos o que chamarei de improviso nas brincadeiras, em contrapartida, a questão de não saber o que fazer para brincar, os brinquedos mercadoria trazem consigo um manual dizendo exatamente o que fazer na brincadeira e, quando a brincadeira acabar é possível comprar a versão seguinte deste brinquedo com um manual atualizado. Perdemos as perguntas e ganhamos as respostas no mundo dos brinquedos. A perda do improviso se consolida na falta do gesto criador. Benjamin (2004) ao citar o livro ‘Escritos sobre arte’ de Konrad Fiedler, irá concordar que a criatividade não se encontra de fora para dentro, mas sim de dentro para fora, é a forma de o sujeito expressar e construir a sua visão de mundo é um espaço no qual o sujeito é maior que o objeto. No caso do brinquedo, é onde o brinquedo é definido e não somente definidor da brincadeira. O

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improviso é um gesto, é um instante da brincadeira, esmaecido pelos brinquedos produzidos em série pela moderna indústria com seu ideológico capitalista. O improviso na brincadeira é o que nos parece estranho, não os materiais obsoletos dos brinquedos antigos ou o trabalhoso ato de produzir um destes brinquedos. No mundo infantil, segundo Benjamin (2004) não é o produto o mais importante, mas sim o instante do gesto de improvisação da brincadeira.

5 CONSIDERAÇÕES FINAIS

Segundo Benjamin (2012, p.269) a “... simplicidade dos brinquedos se encontra na transparência do seu processo de produção”. Gostaria de ressaltar, com esta afirmação, que os brinquedos mais simples, os de antigamente, possuíam esta transparência. Havia a necessidade de desenvolver técnicas para que se pudesse produzi-los, algo que fazia parte do contexto cultural e que hoje podemos encontrar em forma de arte popular, na qual, se usa de materiais grosseiros e técnicas primitivas na criação de determinados brinquedos e brincadeiras. Para citar alguns exemplos, brinquedos como: o peão de madeira, carrinhos de madeira, bonecas feitas de pano, etc. Este contexto cultural foi sendo substituído gradativamente pelo cenário moderno da produção de mercadorias, no qual, todo objeto como parte do culto capitalista se massifica em forma de reprodução para potencializar sua utilidade de acumular capital, esse brinquedo massificado é o novo objeto de consumo e que precisa suscitar desejo, necessidade no contexto social. O brinquedo ganhou a necessidade de massificação, e com isso perdeu sua singularidade, ou seja, a sua parte criativa e característica da cultura local. A perda de uma característica encontrada em sociedades pré-capitalistas que, segundo Benjamin (2012), tinha no trabalho, na produção de seus bens materiais, o olhar para a coletividade e o artesanato como fonte da produção, elementos que necessitavam do trabalhador que conhecesse e participasse da cultura local (entendida como a singularidade da produção). Na sociedade capitalista e industrial (a que deu o pontapé inicial ao capitalismo) os produtos ganham impessoalidade e se massificam na intenção de acumular capital. O brinquedo de hoje, não estranhos e nem saudosos do mundo adulto, demonstram essas características de massificação nas prateleiras de supermercado quando, não importando nem a forma como foi produzido e nem o que representa à cultura local, produzem todo o contexto da brincadeira sem referência alguma à totalidade de sua produção, ou seja, não há a preocupação de que material foi feito, para quê foi feito, quem o fez ou qual o seu objetivo, enfim, qual a sua história? A singularidade

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que se perde no brinquedo e consequentemente na arte popular e na cultura local é a sua originalidade atendendo ao contexto generalizado do capital e de seus brinquedos descartáveis. Não à toa, que os brinquedos mais rústicos apelam para a estranheza e o saudosismo social, afinal esses brinquedos guardam a marca daquele que produziu e de quem o usou. Qualquer um de nós, se não for muita pretensão do autor, terá um brinquedo especial na infância que continha em sua composição elementos pré-capitalistas marcando assim a nossa memória.

A tendência da massificação do brinquedo está no seu valor de mercadoria, só tem sentido quando reproduzida com a intenção de acumular capital. É a perda do improviso e do uso de materiais rústicos, que, se torna estranha à própria constituição do brinquedo. Sendo assim, o brinquedo é como uma mesa, uma televisão, um carro, um sapato ou uma roupa, nenhum destes objetos como mercadoria, possui singularidade, pois, são todos reproduzidos distantes dos sujeitos que irão usá-los, só sabemos que chegam prontos e acreditamos que possuem as respostas para nossas necessidades. O que todos estes produtos mercadorias têm em comum é a perda da simplicidade e ao mesmo tempo a submissão ou indiferença com a cultura popular designada e destinada à produção obsoleta, inadequada, rústica e ‘desestilizada’ desses objetos. A sociedade do capital e das mercadorias faz com que o brinquedo, no sentido ‘benjaminiano’ da palavra, perca a sua aura ou sua autenticidade. Ou seja, o brinquedo comprado (o brinquedo mercadoria),nos proporciona a perda da noção de autenticidade. Segundo Benjamin (2012, p.182), isso acontece com a obra de arte, para nós, há relativa inclusão do brinquedo neste contexto. Sendo assim:

A autenticidade de uma coisa é a quintessência de tudo que foi transmitido pela tradição, a partir de sua origem, desde sua duração material até o seu testemunho histórico. Como este depende da materialidade da obra, quando ela se esquiva do homem através de sua reprodução, também o testemunho se perde.

A perda de autenticidade do brinquedo estaria empobrecendo a narrativa das brincadeiras? Enfraquecendo a narrativa e o testemunho histórico das brincadeiras proporcionadas pelo brinquedo massificado? O valor mercadoria do brinquedo faz perder seu valor autêntico, ou seja, sua originalidade? Qual a sua originalidade? Possivelmente, uma das soluções ou caminhos que poderíamos pensar o brinquedo e a brincadeira como situações criativas e significativas para o desenvolvimento da criança, seria inicialmente, olhar para a cultura popular em sua forma diversificada e tentar reviver alguns dos elementos da sociedade pré-capitalista, como a preocupação com a experiência coletiva do brincar. O brinquedo mercadoria só é possível em troca do dinheiro,

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portanto, a possibilidade do novo, pode ser encontrada com mais facilidade onde há menos culto ao dinheiro, se é que é possível. Defendo um olhar para a cultura popular, para os lugares onde existe a necessidade de inventar brinquedos e brincadeiras. Não é na cultura dominante que encontraremos elementos de autenticidade, já que esta, como vários autores demonstraram, está ideologicamente baseada nas premissas do capital onde o brinquedo não passa de um bem de consumo.

6 REFERÊNCIAS

BENJAMIN, Walter. Magia e técnica, arte e política: ensaios sobre literatura e história da cultura. Trad: Sérgio Paulo Rouanet. 8 ed. São Paulo: Brasiliense, 2012.

BENJAMIN, Walter. O capitalismo como religião. Trad: Nélio Shneider e Renato Ribeiro Pompeu. São Paulo: Boitempo, 2013.

BENJAMIN, Walter. Reflexões sobre a criança, o brinquedo e a educação. Trad: Marcus Vinicius Mazzari. São Paulo: Ed 34, 2004.

CARDOSO, T. Revisão da literatura e sistematização do conhecimento. Porto: Porto Editora, 2010. HABERMAS, Jürgen. Mudança estrutural da esfera pública: investigações quanto a uma categoria de sociedade burguesa. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 1984.

PALHARES, Taísa Helena Pascale. Aura: a crise da arte em Walter Benjamin. São Paulo: Ed. Barracuda, 2006.

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