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Competição, colaboração, empatia e ruído: um olhar da natureza para as interações no ambiente organizacional

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Academic year: 2021

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proposta deste artigo é refletir sobre aspectos ecológicos e biológicos que influem na sociabilidade entre seres humanos, debatidos em estudos de Edgar Morin e Frans de Waal. Procu-rou-se relacionar questões como a competição, a colaboração, a empatia e o ruído à dinâmica das organizações contemporâneas, à luz das relações entre as pessoas que fazem parte desse ambiente. O objetivo é oferecer um olhar para o tema centrado na valorização do ser humano, dentro de sua vivência no trabalho.

Palavras-chave: ambientes organizacionais; humanização; natureza;

co-municação.

Carlos Phillipe Kelency

Mestre em Comunicação pela Faculdade Cásper Líbero E-mail: caphikel@gmail.com

um olhar da natureza para as interações

no ambiente organizacional

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Artigos

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Competition, cooperation, empathy and “noise”:

a look of the nature to the interactions in the

organizational environment

The purpose of this paper is to discuss ecological and biological aspects that influence the sociability between humans, discussed in the works of Edgar Morin and Frans de Waal. The objective is to relate issues such as competition, collaboration, empathy and noise to the dynamics of contemporary organizations in the light of the relationship between people who are part of this environment. The objective is to offer a look at the theme focused on valuing human life within its experience at work.

Keywords: organizational environments; humanization; nature; communication.

La competencia, la cooperación, la empatía y el

“ruido”: una expresión de la naturaleza de las

interacciones en el entorno de la organización

La propuesta de este artigo es reflexionar sobre aspectos ecológicos y biológicos que influyen en la sociabilidad entre los seres humanos, que fueron debatidos en los estudos de Edgar Morin y de Frans de Waal. Buscando relacionar las cuestiones como la com-petición, la colaboración, la empatía y el ruido en las dinámicas de las organizaciones contemporâneas, entre las personas que hacen parte de este ambiente. El objetivo es ofrecer una visión del ser humano, dentro de su vivencia en el trabajo.

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Uma abordagem mais natural

Assim como os organismos, as corporações são formadas por elemen-tos que, em conjunto, tornam-na viva e regem o seu funcionamento. Entre esses elementos, podemos destacar como o mais relevante as pessoas. Por-que os outros componentes desse ambiente só são possíveis com base, por meio ou tendo como fim as interações entre seres humanos.

As tecnologias empregadas no local de trabalho - sejam elas mecânicas, analógicas ou digitais - são um exemplo da importância que o ser humano tem dentro do contexto organizacional. Elas são maciçamente adotadas em diversos segmentos e em empresas de diferentes portes. Porém, foram desen-volvidas por gente de carne e osso e muitas vezes têm um nível de autonomia limitado, que as obriga, em alguma medida, a ter um usuário humano con-trolando-as. Algumas das mais notáveis máquinas, do ponto de vista produ-tivo no setor industrial, incluindo aquelas que funcionam de modo quase que completamente automatizado, necessitaram de engenheiros – pessoas que respiram, conversam, riem, choram, se espantam, sentem alegria, sofrem – para desenhá-las e irão precisar delas para fazerem sua manutenção. Aliás, não é raro que a tecnologia tenha como próprio fim a sua utilização por pes-soas (tome-se como exemplo o e-mail corporativo). Mesmo as tecnologias de inteligência artificial precisam de seres humanos que conduzem pesquisas e trabalhem nelas para que se tornarem realidade.

Dentro das organizações, pessoas relacionam-se constantemente. Re-lacionar-se é um ato essencial para os seres humanos, é o que torna possível sua vivência em sociedade e contribui para a criação de sentido para a sua existência como ser social. É nas relações que ocorrem trocas emocionais e psicológicas, as quais desempenham um papel fundamental para viabilizar as interações e conferir a elas significado e sentido.

Mas estabelecer e cultivar relações não são privilégios exclusivamen-te reservados ao homo sapiens. Outras espécies – incluindo aquelas que vieram antes de nós – detêm uma dinâmica interacional própria. Por isso, acreditamos que podemos tirar lições valiosas quando observamos a natu-reza, tomando-a como fonte de aprendizado sobre aspectos que encontram correspondência com os relacionamentos e a vivência no contexto das or-ganizações contemporâneas.

A proposta deste artigo, portanto, é observar as relações no contexto organizacional sob a perspectiva da natureza, no que poderíamos chamar de um olhar naturalizado. Procuramos mostrar como alguns aspectos eco-lógicos e bioeco-lógicos têm ligação com a experiência das pessoas no seu coti-diano na empresa e podem contribuir para humanizar as interações dentro

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desse cenário. Para isso, iremos propor reflexões em torno de três temas principais: a dinâmica entre competição e colaboração; a empatia; e o ruí-do, utilizando como base, primordialmente, as obras A era da empatia:

lições da natureza para uma sociedade mais gentil, de Frans de Waal, e O enigma do homem, de Edgar Morin.

Cabe destacar que não temos a pretensão de esgotar ou mesmo li-mitar unicamente esses pontos o debate acerca das interações humanas nas organizações. Antes, nosso objetivo é estimular a reflexão em tor-no do tema, uma vez que entendemos que podem existir outros fatores ecológicos, biológicos, culturais e sociais que podem e merecem ser estudados e aprofundados.

Organizações como ecossistemas

Procurar conferir um olhar mais natural para a dinâmica organizacio-nal pode parecer algo estranho à primeira vista. Mas essa percepção pode ser dissipada, se pensarmos o ambiente das companhias segundo um viés pautado pela ecologia, uma vez que essa é “uma ciência natural, fundada por Haeckel em 1873, que se propõe estudar as relações entre os organismos e o meio onde eles vivem” (Morin, 1979, p. 29). Mais especificamente, podería-mos estudar o contexto das organizações como um ecossistema, “pelo fato de que o conjunto das sujeições, das interações, das interdependências, no seio de um nicho ecológico, constitui, apesar e através de eventualidades e de incertezas, uma auto-organização espontânea” (Morin, 1979, p. 29).

As pessoas, nas empresas, estão em relação entre si e com o seu meio, ou seja, com a estrutura organizacional, aqui entendida por um conjunto de elementos como a hierarquia, as políticas, os valores, as práticas e os processos, entre outros componentes de uma companhia. Daí nasce a nos-sa proposta de estudar as organizações sob uma perspectiva ecológica e com uma abordagem mais natural, pois que “a natureza já não é desordem, passividade, meio amorfo: é, sim, uma totalidade complexa. O homem não é uma entidade estanque em relação a essa totalidade complexa: é um sis-tema aberto, em relação de autonomia/dependência organizadora no seio de um ecossistema” (Morin, 1979, p. 31). Ou seja, da mesma forma que as organizações exercem algum poder sobre as pessoas que dela fazem parte, os comportamentos dessas mesmas pessoas também influem entre si e na organização, afetando-se mutuamente, já que “(...) a relação ecossistê-mica não é uma relação externa entre duas entidades estanques; trata-se de uma relação integrativa entre dois sistemas abertos em que cada um é parte do outro, constituindo um todo” (Morin, 1979, p. 30).

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As pessoas não são máquinas programadas para exercer tarefas. Elas pensam, sentem, percebem a realidade organizacional e respondem a isso. A empresa, então, precisa procurar entender os empregados – que são, antes de tudo, seres humanos – e buscar lidar com seus anseios, preocupações, desejos, os quais influem nos relacionamentos organizacionais.

“Homem primata, capitalismo selvagem”?

Não é segredo que o ambiente empresarial é marcado por um forte sen-so de competição. As empresas competem entre si por participações de mer-cado, por maiores lucros, pelos profissionais mais qualificados. Dentro das companhias, o cenário se espelha. Parece sempre haver disputas entre áreas e profissionais por mais espaço e reconhecimento (que por vezes podem ser traduzidos em promoções e bônus financeiros).

Pode-se argumentar que a competição não é um fenômeno contempo-râneo, mas, sim, que sempre esteve na base biológica dos seres. Como mos-tra Frans de Waal em sua obra A era da empatia, esse é um raciocínio que parece servir mais para justificar certos interesses do que para oferecer uma perspectiva para entender o fenômeno da competição. O autor usa o exem-plo da política americana para ilustrar como os políticos estadunidenses se valem da teoria evolucionista para tornar mais aceitáveis certos comporta-mentos que, analisados de maneira mais detida, nada têm de aceitáveis. As-sim, vivem convenientemente sob as regras do chamado “darwinismo social”:

O darwinismo social é bem aquilo que Gordon Gekko chamou de “espírito evolucionário”. Ele descreve a vida como uma luta em que os mais fortes não devem se permitir atrapalhar pelos mais fracos. Essa ideologia foi introduzida pelo filósofo inglês Herbert Spencer, que, no século 19, traduziu as leis da natureza para a linguagem dos negócios, cunhando a expressão “sobrevivência dos mais bem adaptados”, muitas vezes atribuída, indevidamente, a Darwin (Waal, 2010, p. 47).

Como se vê, muitas vezes enxergamos o que queremos ver e não aquilo que se apresenta a nós. Por isso, é preciso cautela quando adotamos a natu-reza como fonte de aprendizado para a vida dentro das empresas.

O problema é que não se pode deduzir os objetivos da sociedade dos objetivos da natureza. A tentativa de fazer isso é conhecida como a falácia naturalista. A falácia naturalista é cometida sempre que se confunde “o que é” com “o que deve ser”. Se os animais se matassem uns aos outros

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em grande escala, isso não significaria que deveríamos fazer o mesmo. Do mesmo modo, caso os animais vivessem em perfeita harmonia, isso também não significaria que temos a obrigação de fazê-lo. A natureza pode nos oferecer informações e inspiração, mas não nos oferece prescrições (Waal, 2010, p. 49).

Se levássemos tudo tão “a ferro e fogo” assim, por que não seguirmos um exemplo melhor? Por que não nos inspirarmos no coletivo em detrimen-to do egoísmo? Afinal de contas, as espécies animais e a natureza também podem nos dar incontáveis amostras disso. Mais uma vez, Waal nos ajuda a materializar nosso ponto de vista. Ele cita o caso de uma tigresa de Bengala que vivia em cativeiro e adotou filhotes de porco. Em vez de responder aos instintos da cadeia alimentar, a tigresa preferiu dar vazão a outros impulsos, aqueles voltados à criação da prole, zelando pelos pequenos suínos. Tanto uma como a outra não deixam de ser reações naturais para ela e, no entanto, o animal fez uma escolha que trazia mais vantagem para os filhotes.

Talvez a primeira lição que podemos aprender aqui é que, se o ambiente organizacional pode ser um lugar hostil, ele não obrigatoriamente precisa ser.

Colaboração como opção

Mas vamos assumir que o ambiente organizacional seja mesmo uma selva. Será que não temos opção a não ser nos rendermos ao lema do mais forte sobrevive? Se a competição é algo tão intenso, inevitável – e, como dis-seminam os defensores do darwinismo social – natural, então não há saída para relações mais humanas no mundo do trabalho?

O fato das pessoas serem competitivas, tanto no ambiente corporativo quanto fora dele, não é um fim ao qual estamos irremediavelmente destina-dos. Como abordamos, a natureza pode servir de exemplo para ações guia-das por outros critérios.

Em sua já citada obra A era da empatia, Waal descreve as descober-tas feidescober-tas pelo naturalista russo Piotr Kropotkin, o qual observou que os animais são capazes, sim, de esforços em conjunto. Kropotkin viu ao vivo essa capacidade quando, na gélida região da Sibéria, testemunhou ani-mais se aconchegando para enfrentar, juntos, o frio. Em vez de lutarem individualmente contra um problema, eles buscaram uma alternativa que trouxesse benef ícios a todos.

Se percebemos que os seres humanos e outras espécies têm um com-ponente competitivo, também podemos identificar no comportamento das pessoas um potencial para a união em torno de objetivos comuns.

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Como outros primatas, os humanos podem ser descritos como animais altamente cooperativos que precisam se esforçar para manter sob controle seus impulsos egoístas e agressivos ou como animais altamente competitivos que, a despeito disso, são capazes de se entender com os outros e de participar de relações de troca (Waal, 2010, p. 71).

Não por acaso, a capacidade de trabalhar em equipe é uma das com-petências comportamentais frequentemente requeridas pelas empresas na busca de profissionais. Poder-se-ia argumentar que, em algumas situações, as pessoas irão se mostrar colaborativas por interesse próprio, buscando al-cançar objetivos que são importantes somente para elas. Isso pode ser espe-cialmente verdadeiro na vida dentro do mundo empresarial. Não são raros os exemplos de profissionais que se colocam sempre dispostos a contribuir em algum projeto ou com alguma área da companhia apenas para, na sema-na seguinte, cobrar o favor que fez ou pedir que se “quebre um galho”. Mas, novamente, não é porque existem casos assim que essa tem de ser a regra. No ambiente de trabalho, os seres humanos também são capazes de dispor seus esforços a pessoas ou causas sem que, necessariamente, isso traga benefícios diretos ou imediatos a si próprios.

A meu ver, os homens devem ser incluídos entre os primatas mais agressivos. Ao mesmo tempo, porém, estou convicto de nossa maestria em estabelecer vínculos com nossos semelhantes e que esses laços sociais limitam a competição entre nós. Em outras palavras, não somos obrigatoriamente agressivos (Waal, 2010, p. 71).

Embora o ambiente organizacional seja um local de trabalho, as pes-soas acabam se relacionando e estabelecendo ligações que vão além de uma simples relação fria. E o que, a princípio, era um relacionamento de negó-cios pode vir a se tornar um vínculo. São esses vínculos que nos ajudam a sermos menos egoístas.

Existe uma série de fatores que contribui para o estabelecimento de vínculos, que vão desde compartilhar o mesmo ponto de vista sobre como fazer as atividades de trabalho até a identificação entre valores e princípios de vida das pessoas. É comum o coleguismo entre os profissionais de uma empresa se transformar em companheirismo e até mesmo em uma amizade que transcenda os muros da companhia. E o contato físico, por meio da con-vivência diária, tem um papel significativo nisso, porque “somos interligados aos nossos semelhantes, tanto do ponto de vista corporal quanto do ponto de vista emocional. (...) A prontidão com que o homo sapiens é impelido numa

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ou noutra direção emocional pelos seus companheiros é verdadeiramente impressionante” (Waal, 2010, p. 75). Um dos meios mais importantes para estabelecer vínculos fortes é a empatia.

A presença da empatia nos relacionamentos organizacionais

Nosso olhar sobre a empatia encontra alicerces na definição alemã do termo, Einfühlung, usado pelo psicólogo alemão Robert Vischer, que quer dizer “sentir em” e “transmite a ideia do movimento de um indivíduo proje-tando-se no interior de outro” (Waal, 2010, p. 98).

As emoções são cruciais para se estabelecer a empatia, uma vez que “a visão das emoções de nosso semelhante desperta as nossas próprias emo-ções e, a partir daí, seguimos construindo um entendimento mais avançado da situação do outro. As conexões corporais vêm primeiro – a racionaliza-ção vem depois” (Waal, 2010, p. 108).

Assim, no processo empático, nossa expressão corporal tem relevância. Isso porque “a linguagem corporal da outra pessoa afeta o nosso próprio corpo, criando uma reverberação emocional que nos leva a experimentar sentimentos condizentes com os dela” (Wall, 2010, p. 120).

Para Emmanuel Lévinas, essas ligações entre corpos, emoções e vín-culos, que existem por trás da empatia, são bastante claras e significativas. Segundo ele, o rosto permite um contato profundo entre as pessoas, que nos possibilita demonstrar nossa humanidade e também ver a humanidade daquele com quem nos relacionamos, desenvolvendo uma relação que se pauta pela compreensão.

Rosto de outrem que – sob todas as formas particulares da expressão em que outrem, já na pele do personagem, cumpre um papel – é expressão pura, extradição sem defesa, sem cobertura: retidão extrema, precisamente, do em face de... que nesta nudez é exposição à morte: nudez, indigência, passividade e vulnerabilidade pura. Rosto como a própria mortalidade do outro homem (Lévinas, 2010, p. 193).

Nas relações entre as pessoas, o rosto e as emoções têm influência marcante. Esse conjunto formado pelo diálogo entre os corpos e permeado pelas emoções cria as condições para o processo de empatia. Desse modo, nos parece claro que “(...) a empatia necessita de um rosto. O empobreci-mento da expressão facial traz com ele o empobreciempobreci-mento da compreen-são empática, levando a uma interação fria, desprovida da reverberação corporal que normalmente faz parte das relações entre as pessoas” (Waal,

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2010, p. 122). Quem nunca escolheu com mais cuidado as palavras a serem proferidas a um colega na organização, quando ele tem uma expressão facial de tristeza ou mesmo de irritação? Da mesma forma, é comum nos percebermos contagiados pela felicidade do sorriso de alguém com quem trabalhamos e nos damos bem, quando recebe uma boa notícia, como, por exemplo, um resultado satisfatório em um projeto.

Contudo, como pondera Waal, a empatia precisa ser entendida sob uma perspectiva que contrabalanceie a expressão e absorção da emoção com a tomada de ação.

A adoção da perspectiva empática depende dessa combinação entre o alerta emocional, que desperta a nossa preocupação com os outros, e uma abordagem cognitiva, que nos ajuda a avaliar a situação. É preciso haver equilíbrio entre esses dois lados. Se as emoções falarem alto demais, a adoção de perspectiva pode se perder (...) (Waal, 2010, p. 146).

Isso é particularmente importante nos relacionamentos no âmbito organizacional. Embora sejamos humanos, as relações de trabalho fre-quentemente são pautadas por critérios que não priorizam nossos impul-sos emocionais. Se deixarmos nos levar apenas por aquilo que estamos sentindo, podemos, por exemplo, falar algo que pode ser mal interpretado, ocasionando situações desconfortáveis – especialmente se a pessoa a quem nos dirigirmos for um executivo de relevância na hierarquia da companhia ou alguém com quem temos contato diariamente. Por isso é importante que a empatia seja entendida como um processo que exige consciência do que ela implica. Do contrário, o local de trabalho seria um ambiente total-mente desgastante emocionaltotal-mente.

Nem tudo é o que parece

Outro aspecto que interfere nos relacionamentos entre as pessoas nas organizações e pode ser pensado pela abordagem natural que estamos pro-pondo está relacionado ao conceito de ruído.

Frequentemente, o ruído é interpretado como um entendimento distor-cido em uma comunicação realizada entre a empresa e os empregados ou no diálogo desses entre si. Logo, é tido como algo negativo e a ser minimizado a todo custo, sendo considerado, “em termos de comunicação, toda perturba-ção que altera ou perturba a transmissão de uma informaperturba-ção” (Morin, 1979, p. 119). No entanto, o ruído não é necessariamente algo prejudicial. Ele pode ser uma porta para a compreensão de fenômenos que são pertinentes para as

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pessoas em sua vivência laboral e que não se apresentam de forma tão clara. Ou para identificar novos pontos de vista acerca de algo.

Tomemos o seguinte exemplo: uma companhia comunica a seus em-pregados que irá desativar uma instalação pelo fato de ela estar obsoleta e os profissionais que nela atuam serão transferidos para outras unidades. Para alguns empregados é um acontecimento sem maiores repercussões. Para outros, isso pode ser percebido como um indício de que a organização está com problemas financeiros – o que pode resultar em demissões. A falta de uma explicação mais completa, uma cultura de omissão de informações por parte da empresa ou a ausência de relações de confiança entre uma compa-nhia e seus empregados podem ser a origem deste ruído. Mais que isso, são sinalizadores de que há algo errado nos relacionamentos organizacionais. O ruído, nesse caso, em vez de ser somente uma distorção, pode ser tomado como um caminho para melhorar as interações dentro da empresa.

O ruído está ligado não só ao funcionamento, mas ainda mais à evolução do sistema vivo. A mutação é uma perturbação que pode ser assimilada a um ruído no momento da transmissão da mensagem genética por duplicação, ruído esse que provoca um erro em relação à informação emitida, erro esse que deveria provocar uma degenerescência no novo sistema vivo. Ora, em certos casos, o ruído provoca o aparecimento de uma inovação e de uma complexidade mais rica (Morin, 1979, p. 120).

A inovação da qual fala Morin, no contexto do tema deste artigo, pode ser tanto um novo ponto de vista sobre uma questão quanto uma percepção ainda não considerada sobre um acontecimento ou mensagem comunicados dentro da organização.

Assim, mais produtivo do que tentar eliminar o ruído, é dar-lhe atenção, ou-vi-lo. Se soubermos fazer isso, ele pode passar de um problema a um insumo para aprimorar os relacionamentos e as dinâmicas comunicativas nas companhias.

Considerações finais

Tentar enquadrar a experiência humana dentro do ambiente organiza-cional em simplificações ou reducionismos dicotômicos entre bom e ruim não contribui para a sua compreensão. Como pondera Waal (2010, p. 71), “é tudo uma questão de equilíbrio. A confiança e a cooperação puras e incon-dicionais são ingênuas e prejudiciais, ao passo que a ganância sem limites só pode levar ao ‘salve-se quem puder’ (...)”.

As organizações e as interações que nelas ocorrem têm uma dinâmica

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própria e complexa. Um dos fatores que contribuem para essa complexidade é o mesmo que apontamos no início desse trabalho como a razão de ser das organizações: as pessoas. Assim, é preciso entender o ambiente organizacio-nal por meio da compreensão da própria complexidade do ser humano: seus sentimentos, suas percepções, suas construções de sentido.

Ao propor um olhar natural para o cenário das empresas e das intera-ções nele inscritas, nossa intenção foi buscar um entendimento mais huma-nizado do tema. O que norteou e motivou a produção desse artigo foi ajudar aqueles que pesquisam sobre o assunto a ter mais uma perspectiva, dentre as tantas e instigantes possibilidades existentes para o estudo da temática das organizações e de seus processos comunicacionais.

Acreditamos genuinamente que a natureza tem muito a nos ensinar quando se trata de competição, colaboração, empatia e ruído, elementos com forte presença no dia a dia das organizações e, por isso, no cotidiano das pessoas que fazem parte delas. “A natureza é sábia”. Essa é uma frase usada nas mais diversas oportunidades, mas, em se tratando de humanização nas organizações, ela não poderia ser mais adequada.

Referências

LÉVINAS, E. Entre nós: ensaios sobre a alteridade. Petrópolis: Vozes, 2010. MORIN, E. O enigma do homem. Rio de Janeiro: Zahar, 1979.

WAAL, F. A era da empatia: lições da natureza para uma sociedade mais gentil. São Paulo: Companhia das Letras, 2010.

Referências

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