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Influência de agentes de cross-linking nas propriedades de tecidos para biopróteses cardíacas

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Influência de Agentes de Reticulação nas Propriedades de

Tecidos para Biopróteses Cardíacas

Alessandra Poço Barge

Dissertação submetida à Faculdade de Engenharia da Universidade do Porto para candidatura à obtenção do grau de mestre em Engenharia Biomédica

Faculdade de Engenharia Universidade do Porto

(2)

INEB - Instituto Nacional de Engenharia Biomédica, Divisão de Biomateriais

Faculdade de Engenharia da Universidade do Porto

(3)

Ao Filipe, ao Vasco, aos meus pais, à Sílvia … e a todos os amigos que me deram motivação para a conclusão deste projecto

(4)

AGRADECIMENTOS

Neste trabalho tive o apoio incondicional dos meus pais, do Filipe e do Vasco, sem eles seria impossível frequentar o Mestrado em Engenharia Biomédica.

Ao professor Mário Barbosa que me deu a oportunidade de realizar este trabalho no INEB.

Ao meu supervisor Dr. Carlos Fonseca a quem devo todo o trabalho desenvolvido. Sempre optimista, acessível, disponível para qualquer dúvida ou problema, sempre pronto a ajudar a ultrapassá-los com as suas ideias de génio, que o é, sempre incansável, compreensivo, enfim, um chefe e tanto.

A realização deste trabalho só foi possível com a colaboração de todos os meus amigos do INEB: À Susana Sousa, por toda a sua imprescindível colaboração na digestão ácida das membranas, na realização da absorção atómica e apoio para a realização da microscopia óptica. À Manuela Brás, por toda a disponibilidade na absorção atómica. À Ana Cordeiro e ao Rui Azevedo, pela ajuda que me deram nas experiências de Potencial Zeta. À Sandrinha (Sandra Teixeira), a amiga a quem devo muito, quer pela bibliografia cedida, discussões sobre o trabalho, e também por alguns almoços. Ao Sidónio Freitas, o companheiro diário dos almoços, das dificuldades, dos desabafos, o amigo a que se pode recorrer. À Ana Ribeiro, que tantos miminhos deu à minha barriga, durante a gravidez, e tanto me ajudou a vários níveis. Ao Hugo Lopes, à Ana Ribeiro e à Silvia Bidarra, pela ajuda que me deram na realização da cadeira de Biomateriais. À Cristina Ribeiro, pela disponibilidade para a realização do FTIR. À Paula Sampaio, pela ajuda na observação das membranas através da Microscopia Confocal. Ao Hugo Lopes, pelo apoio prestado durante o trabalho experimental. À Cristina Martins, por me ter facultado o suporte com

(5)

inclinação, nos ensaios de digestão. À Maria Ascensão Lopes, pela ajuda no tratamento estatístico dos resultados. À Patrícia Cardoso e à Eliana Vale, por todo o apoio técnico e a nível de encomendas. Quero também agradecer à Alis Mateus, pelo companheirismo e ajuda em alguns trabalhos. À Dulce Carqueijo, a amiga de longa data, à Ana Paula Filipe, a nossa mãezinha e ao professor Fernando Jorge, pela sua sempre boa disposição. À Dona Rosa, pelas conversas e apoio com a lavagem do material, em particular, para a absorção atómica.

A todos os membros do INEB o meu muito obrigada.

“ Em momentos de crise, a imaginação é mais importante que o conhecimento” Albert Einstein

(6)

RESUMO

As propriedades físicas dos biomateriais colagenados são influenciadas pelo método e extensão do tratamento de reticulação. Neste estudo a influência de vários tratamentos de reticulação nas propriedades físicas de membranas tratadas de pericárdio bovino.

Três agentes de reticulação, Ga, DPPA e Aga (0,6% e 1%) foram usados para estabilizar o tecido.

O grau de inchamento, a resistência à degradação pela pronase foi determinado com o objectivo de avaliar as propriedades físicas do tecido.

O DPPA e o Ga foram os agentes de reticulação mais efectivos.

O tecido tratado com Aga 1% foi o mais resiatente à degradação pela pronase (com 38% de solubilização em 96 horas) enquanto que o Nat foi o menos resistente (com 62% de solubilização no mesmo período).

A determinação do coeficiente de difusão, do potencial zeta e a microscopia óptica foram realizados para determinar a carga superficial do tecido tratado e não tratado.

O tecido tratado com Aga1% revelou ser o mais resistente dos tecidos à degradação com pronase (com 39% de degradação) enquanto que o Nat foi o menos resistente (com 69% de degradação).

O menor valor de coeficiente de difusão foi observado par o tecido não tratado e a permeabilidade do mesmo tecido foi máxima enquanto que o máximo valor de coeficiente de permeabilidade foi observado para o Ga e a sua permeabilidade foi mínima.

Os resultados mostraram que o Ga apresenta uma carga eléctrica mais negativa ( -4,87262) enquanto o Nat e o DPPA exibiram as cargas menos negativas (-1,9462 mV e -1,94717 mV respectivamente).

Neste trabalho, o melhor agente para uso em folhetos de biopróteses de válvulas cardíacas foi o Aga 1%.

(7)

ABSTRACT

The physical properties of collagen-based biomaterials are influenced by the method and extent of cross-linking. In this study, the influence of various cross-linking treatments on the physical properties of reconstituted bovine pericardial membranes was assessed. Three cross-linking agents, Ga, DPPA and Aga (0,6% and Aga1% ) were used to stabilize the pericardial tissue.

The swelling ratio, resistance to pronase digestion, were determined to evaluate the physical properties of the tissue. DPPA and Ga were the most effective cross-linking agent. Aga1% treated tissue were the most resistant to pronase degradation (38% of degradation in 96 hours) while the Nat was the least resistant (62% of degradation in the same period).

Diffusion coefficient, zeta potential and optical microscopy were studied to determine the superficial charge of the treated and no treated tissue.

The lowest value of diffusion coefficient was observed for the untreated tissue and the permeability of the same tissue was maximum while the highest diffusion coefficient was observed for the Ga treated tissue and this permeability was minimum.

The results showed that the Ga treated tissue has the most negative charge (-4,87262) while Nat and DPPA exibited the least negative charges (-1,9462 mV and -1,94717 mV respectively).

In this work the best agent for use in leaflets of bioprosthetic cardiac valves was Aga 1%.

(8)

ÍNDICE

Agradecimentos v Resumo vii Abstract viii

CAPÍTULO I – INTRODUÇÃO

1

1. As válvulas cardíacas

1

1.1. As próteses mecânicas

4

1.2. As biopróteses

7

1.2.1. Materiais bioprotésicos dos folhetos 9

1.2.2. Calcificação em substitutos de biopróteses de válvulas cardíacas 10

1.2.2.1. Calcificação fisiológica e calcificação patológica 12

1.2.3. Mecanismo da calcificação em biopróteses de válvulas cardíacas 14

1.2.4. Facctores que provocam a calcificação 16

1.2.4.1. Factores relacionados com o paciente 16 1.2.4.2. Factores relacionados com o próprio implante 18

1.2.4.3. Factores relacionados com stress mecânico 23

1.3. Prevenção da calcificação em biopróteses de válvulas cardíacas

23

1.4. Extensão de inibição necessária em biopróteses de válvulas

cardíacas

24

1.5. Estratégias para a inibição da calcificação em biopróteses de

válvulas cardíacas

24

1.6. Inibição da calcificação em biopróteses pré tratadas com

(9)

1.7. Considerações gerais

26

CAPÍTULO II – ENQUADRAMENTO DO TRABALHO 29

CAPÍTULO III –MATERIAL E MÉTODOS

32

3. Preparação das Membranas

32

3.1. Grau de inchamento

32

3.2. Degradação enzimática

33

3.3. Potencial zeta

34

3.4. Difusão

37

3.5. Microscopia óptica

39

3.6. Mineralização in vivo

40

CAPÍTULO IV – RESULTADOS E DISCUSSÃO

41

4.1. Grau de inchamento

41

4.2. Degradação enzimática

41

4.3. Potencial zeta

42

4.4. Difusão

44

4.5. Microscopia óptica

45

4.6. Mineralização in vivo

48

CAPÍTULO V - CONCLUSÕES

49

BIBLIOGRAFIA

50

(10)

1. As válvulas cardíacas

O sangue, o fluído vital da vida, circula no corpo através de uma bomba especial - o coração. O coração é um órgão altamente especializado do sistema circulatório. É constituído por 4 compartimentos, a aurícula e o ventrículo esquerdos e a aurícula e o ventrículo direitos [3]

(figura 1). O lado direito lança o sangue para os pulmões, para ser oxigenado; o lado esquerdo lança o sangue para a circulação sistémica. A circulação pulmonar é uma circulação de baixas pressões, e a circulação sistémica é uma circulação de altas pressões [5].

Figura 1. Imagem do coração.

Aorta

Artéria pulmonar

Veias

pulmonares

Válvula aórtica

Válvula bicúspide

ou mitral

Septo

interventricular

Veia cava

inferior

Válvula

tricúspide

Válvula

pulmonar

Veia cava

superior

(11)

Existem 4 válvulas no coração, a válvula aórtica e a mitral do lado esquerdo e a pulmonar e a tricúspide do lado direito [3]. As válvulas auriculoventriculares - A tricúspide e a

mitral – uma vez abertas permitem a passagem do sangue da aurícula para o ventrículo. Quando estão fechadas impedem o retrocesso do sangue dos ventrículos para as aurículas. A válvula aórtica, por exemplo, durante a expulsão do sangue está aberta, mas depois, durante a diástole está fechada, impedindo o retorno do sangue das artérias para os ventrículos [5].

Todas as válvulas, excepto a mitral, possuem três folhetos. A válvula mitral é constituída por 2 folhetos com uma espessura menor do que os folhetos da válvula aórtica.

Os folhetos são as partes móveis da válvula [3]. E possuem o mesmo peso específico do

sangue de modo que qualquer pequeno fluxo de sangue faz mover os folhetos das válvulas. Além disso, para fecharem bem, as válvulas auriculoventriculares estão ligadas aos músculos papilares por meio das cordas tendinosas, o que impede que a válvula abra para o interior da aurícula, quando o ventrículo está a contrair [5].

Uma válvula, no seu estado normal e com uma óptima dinâmica abre e fecha cerca de 103000 vezes por dia e cerca de 3,7 biliões de vezes durante a sua vida. Uma válvula suporta pressões variáveis, sofre uma curvatura completa e reversívele é sujeita a uma grande quantidade de flexões por biliões de ciclos a ainda “sobrevive” [4].

A eficiência do coração para bombear é perdida em condições de doença das válvulas. As doenças mais comuns são doenças reumáticas ou congénitas, obrigam a uma intervenção cirúrgica por [13].

As válvulas são constituídas por um tecido conectivo não vascularizado e denso [3],

formado por proteínas estruturais – o colagénio e a elastina, e estas estão intimamente ligadas a proteoglicanos e glicosaminoglicanos, criando uma estrutura que consegue sustentar facilmente milhões de ciclos. O colagénio que é o mais abundante componente da matriz, é fundamental para manter a integridade estrutural e funcional das válvulas.

(12)

camadas distintas, a fibrosa, a esponjosa e a ventricular (Figura 2).

Figura 2. Esquema da secção transversal de um folheto de uma válvula aórtica,

A camada fibrosa está em contacto com a aorta e a camada ventricular está em contacto com o ventrículo.

A camada fibrosa: é uma camada densa, composta por uma série extensa de fibras paralelas. As fibras de colagénio são essencialmente orientadas numa direcção radial. Esta camada confere a principal sustentação do folheto.

A camada esponjosa: é uma camada de tecido frouxo e conectivo, com espessura variável, constituída por fibras, glicosaminoglicanos e células. As fibras de colagénio e as células apresentam uma orientação radial. Esta camada possui uma resistência estrutural insignificante, mas parece desempenhar um papel essencial na minimização das interacções mecânicas entre as duas camadas fibrosas e na dissipação de energia durante a oclusão da válvula.

A camada ventricular: é uma camada elástica superficial com 2 ou mais camadas de espessura. Esta camada é menos organizada que a fibrosa, e permite que o folheto tenha uma área superficial mínima quando abre, e máxima (estica para formar uma vasta área) quando a pressão é novamente aplicada, e a válvula fecha [4].

Os substitutos valvulares cardíacos têm significativamente aumentado as perspectivas dos pacientes com desordens a nível das válvulas cardíacas. Têm ocorrido consideráveis evoluções nas técnicas cirúrgicas e no desenho das próteses valvulares, desde a primeira substituição da válvula aórtica por Harken et al. e da válvula mitral por Starr[14].

(13)

Existe uma variedade de processos patológicos que podem levar ao mau funcionamento de uma válvula cardíaca, o qual é geralmente associado a mudanças degenerativas do próprio tecido, tornando-se então necessário, recorrer a uma correcção cirúrgica ou à substituição com uma prótese. As próteses cardíacas têm sido usadas com sucesso desde 1960. Os tipos de próteses mais comuns são as próteses mecânicas e as de tecido. Um novo grupo de próteses de válvulas é o grupo das próteses com três folhetos, manufacturadas com polímeros sintéticos como o poliuretano ou o politetrafluoretileno. O interesse pelos poliuretanos é baseado nas suas propriedades físicas, que são ideais para o uso em biopróteses como componentes dos folhetos.

Quase 30 anos após a introdução das próteses valvulares, entre 100000 a 200000 pacientes do mundo recebem substitutos de válvulas cardíacas, por ano. Das válvulas cardíacas existentes no mercado, 70% são mecânicas, embora existam variações nos tipos de próteses, nos diferentes países. Os outros 30% dizem respeito a válvulas de tecido.

Após a substituição cirúrgica, o paciente pode levar uma vida quase normal. As válvulas ideais devem: ter boas características para o fluxo sanguíneo, ter durabilidade, ser compatíveis com o sangue, ser de fácil inserção em cirurgias, ser facilmente esterilizáveis, estar disponíveis numa variada gama de tamanhos e não devem ser demasiado dispendiosas [3].

1.1. As próteses mecânicas

As próteses mecânicas introduzidas em 1960 foram fabricadas com folhetos para imitar as válvulas verdadeiras [3]. As válvulas mecânicas, geralmente são fabricadas com componentes

de biomateriais rígidos e não fisiológicos, (constituem nas gaiola-bola, gaiola-disco e disco basculante) [4]. Na válvula de gaiola-bola (figura 3), a bola é constituída por silicone ou por um

metal oco, movendo-se para cima e para baixo dentro da gaiola, permitindo com este movimento a passagem ou não do sangue [15]. Por sua vez nas válvulas de gaiola-disco (figuras 4, 5 e 6), o

disco articula-se de um lado para o outro no interior da gaiola para dar ou não passagem ao sangue [16]. As válvulas de disco pivotante (figuras 7, 8 e 9), podem ter 1 ou mais folhetos [12].

Nas válvulas com 2 folhetos dois fragmentos de metal são articulados quer para um lado quer para outro, abrindo e fechando tal como as asas de uma borboleta [17].

(14)

As primeiras válvulas não conseguiam resistir à fadiga por mais do que 3 anos e por essa razão, foram fabricadas válvulas com vários designs de modo a aumentar as suas performances e durabilidade. As maiores desvantagens do uso de válvulas mecânicas são a sua enorme taxa de tromboembolismo e a necessidade de terapia permanente com anticoagulante. Devido a estas limitações, associadas às válvulas mecânicas, estão a ser feitos enormes esforços para preparar substitutos valvulares com enxertos de porco e de pericárdio bovino [3].

Figura 3 Válvula gaiola-bola de Starr-Edwards.

Figura 4 – Válvula de gaiola-disco de Harken (válvula fechada)

(15)

Figura 6 – Válvula de gaiola-disco de Harken (válvula aberta)

Figura 7 – Válvula de disco basculante com 1 folheto de Bjork-Shiley.

(16)

Figura 9 – Válvula de disco basculante com 2 folhetos de St. Jude.

1.2. As Bio-próteses

As maiores vantagens das válvulas de tecido relativamente às próteses mecânicas são o fluxo central pseudo-anatómico e a ausência relativa de superfície percursora da formação de trombos, usualmente sem terapia com anticoagulante [4].

Existem dois tipos de bio-próteses, as de tecido animal (hetero-enxertos) e as de transplantes humanos (homo-enxertos ou auto-enxertos). Os hetero-enxertos podem ser de tecido valvar de suíno ou de tecido não valvar de pericárdio bovino. Os homo-enxertos são transplantes de tecido de outro indivíduo, enquanto que os auto-enxertos são auto-transplantes, ou seja tecido transferido de um local para outro no mesmo indivíduo, por exemplo, o procedimento mais comum é o procedimento de Ross e consiste na substituição da válvula pulmonar pela aórtica

[12].

Neste trabalho as válvulas de interesse são os hetero-enxertos.

As próteses de tecido animal podem ser subdivididas em válvulas com e sem anel, figura 10.

(17)

Figura 10 - À esquerda, válvulas sem anel; no centro, válvulas de suíno com anel; à direita válvulas com anel de pericárdio (St. Jude Medical Inc.) [12].

As válvulas com anel são montadas num anel de polipropileno, e têm uma estrutura, geralmente de dracon. Esta estrutura tem um anel de sutura que rodeia o orifício da válvula na

base. As válvulas sem anel contêm usualmente uma parte de tecido na parede da aorta à qual os folhetos estão fixados e além disso possuem um ligeiro revestimento de dracon. Estas válvulas

promovem uma hemodinâmica superior[4].

Com apenas 1 único fragmento de pericárdio é possível obter 3 folhetos similares, figura 11.

Figura 11. Bioprótese cardíaca aórtica de pericárdio bovino - Sorin™.

folhetos

revestimento

Estrutura ou anel de poliéster

(18)

Figura 12. Bioprótese cardíaca aórtica de porco - Medtronic™.

♦A bioprótese da aórtica de suíno nativa (figura 12) é extraída da válvula aórtica e é

montada numa estrutura polimérica flexível. É constituída por 3 folhetos, sendo um deles de maior dimensão.

Figura 13. Bioprótese cardíaca aórtica de suíno - Medtronic™.

♦A cor azul do tecido (figura 13) deve-se a um tratamento químico adicional de

reticulação.

1.2.1. Materiais bioprotésicos dos folhetos

(19)

ser um homo-enxerto usando tecido retirado de um cadáver ou hetero-enxerto usando tecido retirado de um animal. A dura-máter humana ou as válvulas aórtica ou mitral de vítimas, não doentes, podem ser utilizadas como substitutos valvulares. Correntemente, os folhetos das válvulas bioprotésicas, disponíveis no mercado, são constituídos por válvulas aórticas de porco e de pericárdio bovino. O colagénio é o principal componente estrutural destes dois materiais.

A estrutura do pericárdio humano parietal é basicamente similar à do pericárdio bovino. A principal diferença é que a espessura do tecido do pericárdio bovino é maior do que a espessura do pericárdio humano. O pericárdio bovino é um material relativamente isotrópico, constituído por camadas quase semelhantes de colagénio denso, disposto em lâminas, paralelamente à superfície. O arranjo do colagénio na camada fibrosa do pericárdio é caracterizado por dois traços, nomeadamente feixes com orientação multidireccional e ondas de fibrilas de colagénio em cada feixe.

O insucesso prematuro das biopróteses é a maior desvantagem das válvulas protésicas feitas através de válvulas aórticas de porco e de pericárdio bovino. Os factores que contribuem para este rápido insucesso incluem factores biológicos e metabólicos designadamente reacções imunológicas, invasão por macrófagos e reacção de corpo estranho. Factores metabólicos tais como a insudação da proteína plasmática, deposição de fibrina, calcificação e infecção também podem acelerar o rápido insucesso [3].

1.2.2. Calcificação em substitutos de biopróteses de válvulas cardíacas

A calcificação é a principal causa das falhas das válvulas cardíacas.

A degeneração do tecido de válvulas aórticas de porco ocorre devido à calcificação. Vinte a vinte e cinco por cento dos adultos, e mais de 50% das crianças (que têm estes problemas) requeremuma segunda cirurgia ou morrem,num período entre 7 a 10 anos [3].

Os pontos-chave para a ocorrência da calcificação em biopróteses de válvulas cardíacas estão apresentados na tabela 1.

(20)

Substrato Tecido de colagénio tratado com glutaraldeído

composto de cálcio Hidroxiapatite pouco cristalina

localização Áreas de flexão do folheto, imperfeições da superfície determinantes Idade, tipo de reticulação, stress mecânico

locais de nucleação Células mortas, espaços entre as fibras de colagénio

eventos 1. Nucleação

2. Deposição do cálcio

3. Acumulação de cálcio até à ruptura modelos de animais utilizados para

estudar a calcificação

Subcutâneos (ratos, coelhos, ratinhos) Circulatório (carneiros, vitelos)

A calcificação geralmente resulta na estenose (constrição) da bioprótese, quer pelo aumento da espessura do folheto, quer pela diminuição da sua flexibilidade. Os depósitos de cálcio também são responsáveis pela fragmentação do folheto, com rasgões, resultando na regurgitação da válvula [3].

Biopróteses de pericárdio bovino também se comportam da mesma forma e a calcificação ocorre frequentemente (Figura 14).

Figura 14. Biopróteses cardíacas calcificadas (Fotos gentilmente cedidas por EJ Herrero).

(21)

1.2.2.1. Calcificação fisiológica e calcificação patológica

A calcificação consiste na deposição de cálcio, sob a forma de apatite mineral. Este fenómeno pode ser fisiológico ou patológico (figura 15).

A calcificação fisiológica é um processo normal que ocorre durante a formação do osso, da dentina e do esmalte dos dentes. Por vezes, a acumulação de cálcio, sob a forma de apatite, ocorre no tecido necrótico, doente ou alterado, e este tipo de calcificação é chamada calcificação patológica. Estes dois tipos de calcificação têm algumas semelhanças. Em ambos, os depósitos de apatite mineral, formados inicialmente, são pouco cristalinos e altamente insolúveis nos fluidos do corpo, a um pH fisiológico. Estes cristais são capazes de se desenvolver em concentrações de cálcio e fosfato iguais às do soro fisiológico, com a precipitação de novos cristais, promovida pelos depósitos iniciais.

Calcificação

Fisiológica Patológica

formação do osso, Acumulação de cálcio

dentes e dentina no tecido necrótico,

doente ou alterado

Distrófica Metastática (calcificação de biopró-

teses de válvulas cardíacas) Figura 15 - Esquema dos diferentes tipos de calcificação

(22)

Em todas as formas de células percursoras da calcificação ocorre a formação de cristais na membrana celular, geralmente sob a forma de vesículas da matriz extracelular. As vesículas da matriz acumulam elevados níveis de cálcio, através da ligação entre o cálcio e os fosfolípidos. No desenvolvimento ósseo a formação da parte mineral resulta na deposição de cristais de apatite através das vesículas da matriz. O processo de calcificação patológica conduz à degeneração de válvulas aórticas envelhecidas por calcificação e mineralização da placa aterosclerótica está também associada a fragmentos celulares tais como as vesículas da matriz (Figura 16) [18]e[19].

A calcificação patológica pode ser distrófica ou metastática. A calcificação distrófica é definida como um processo em que o cálcio é depositado em tecidos desvitalizados do corpo, mesmo em níveis normais de cálcio no sangue [3].

Na calcificação metastática, os sais de cálcio são depositados mesmo em tecidos vivos, Fase intracelular Fase extracelular

Calcificação de uma válvula cardíaca Deposição de cálcio nas

fibrilas de colagénio Vesículas da matriz calcificadas Vesículas da matriz não calcificadas

(23)

ocorrendo apenas quando os níveis de cálcio no sangue se encontram acima dos valores normais. A calcificação de válvulas cardíacas artificiais é descrita como sendo do tipo distrófico e pode ser um processo intrínseco ou extrínseco ao biomaterial envolvido [3].

1.2.3. Mecanismo da calcificação em biopróteses de válvulas cardíacas

O mecanismo da calcificação é ainda mal compreendido e várias teorias têm sido postuladas para explicar a calcificação distrófica de biopróteses de válvulas cardíacas (Tabela 2).

Embora a iniciação da calcificação em biopróteses de válvulas cardíacas ainda não seja bem conhecido, existe uma forte evidência que sugere que o processo pode ter origem ao nível da vesícula da matriz. Boskey, [20] e [21] realizou experiências que evidenciam que os fosfolípidos,

que são constituintes da membrana celular, promovem a precipitação do fosfato de cálcio, sugerindo que este e outros factores relacionados, podem iniciar e promover a formação de hidroxiapatite na matriz extracelular; isto é baseado na presença de fosfolípidos em aortas calcificadas.

Tabela 2. Mecanismo de calcificação proposto

S. No. Agentes indutores Mecanismos de calcificação

1 Fosfolípidos Precipitação do fosfato de cálcio

2 Tecido danificado Células mortas como locais de nucleação do cálcio 3 Acido γ-glutâmico Ligações com o cálcio

4 Glutaraldeído Criação de espaços no tecido expondo locais activos para a biocalcificação

Outra hipótese para a nucleação da calcificação, é a danificação do tecido já que a calcificação distrófica geralmente ocorre em tecidos que se tornam fibrosos e necrotizados.

A calcificação em xeno-enxertos, tal como uma normal mineralização, é provavelmente regulada por proteínas ligantes do cálcio. Uma série de proteínas contendo cálcio ligado a um aminoácido, o ácido carboxi-γ-glutâmico (GLA), tem sido encontrado em depósitos calcificados

(24)

em válvulas de porco calcificadas extraídas de pacientes, o que sugere que esta proteína está associada ao processo de calcificação. O GLA é também encontrado em locais de calcificação patológica tal como as pedras renais, placa aterosclerótica, válvulas aórticas estenóticas e homo-enxertos aórticos calcificados. O GLA, contendo proteínas que possam estar associadas às válvulas, podem desempenhar algum papel no processo de calcificação. A origem destas proteínas não é clara, mas pensa-se que a origem possa estar nos macrófagos circulantes que invadem os folhetos [3].

Embora o mecanismo não seja muito conhecido, outros factores, de maior relevância, têm sido identificados para a calcificação do material das biopróteses de válvulas cardíacas (Figura 17). Os factores ligados ao próprio implante e ao paciente ( figura 18) levam à deposição de cálcio nas fibras de colagénio e por sua vez os factores mecânicos em simultâneo com a calcificação conduzem à degeneração estrutural do tecido por rompimento das fibrilas de colagénio. Degeneração estrutural Moléculas de colagénio Factores mecânicos Bioprótese cardíaca Deposição de cálcio Factores ligados ao próprio implante e hospedeiro Fibrilas de colagénio Calcificação intrínseca

(25)

Figura 17. Mecanismo possível para a falha de biopróteses de válvulas cardíacas.

1.2.4. Factores que provocam a calcificação

Os factores essenciais agrupam-se em 3 importantes categorias (Figura 15). Estes são:

1. factores relacionados com o paciente,

2. factores relacionados com o implante,

3. factores relacionados com o stress mecânico.

1.2.4.1. Factores relacionados com o paciente

O principal factor é a idade do paciente, as condições do metabolismo do cálcio e a medicação.

Factores que causam a calcificação

Hospedeiro Implante mecânicos

Idade Metabolismo Medicação do cálcio

alterado

proteoglicanos fosfolípidos glutaraldeído Colagénio

(26)

- Idade do paciente

A ocorrência da calcificação é acelerada em pacientes mais jovens. O tecido de válvulas explantadas de animais jovens são mais calcificadas do que as de animais mais velhos, devido à maior actividade metabólica naqueles indivíduos.

A degeneração do tecido devido à calcificação necessita de re-operação ou causa morte em 20 a 25% dos adultos, em 7 a 10 anos e em 50% das crianças em igual período. As razões atribuídas para a calcificação acelerada de biopróteses em animais jovens e crianças são os elevados níveis de fosfato e osteocalcina no soro, aumentando a hormona paratiróide e o metabolismo da vitamina D. Odell [22] , sugeriu que o aumento do stress mecânico pode ser um

factor responsável pela aceleração da calcificação em biopróteses de válvulas em crianças.

- Alteração do metabolismo do cálcio

Outro factor importante responsável pelo aumento da calcificação de biopróteses é a alteração do metabolismo do cálcio durante a gestação e em pacientes com distúrbios renais. Durante a gravidez, a calcificação de biopróteses de válvulas cardíacas aumenta devido à alteração dos níveis de cálcio no sangue. A calcificação também aumenta em situações de doença, tal como problemas renais, onde a concentração de cálcio no sangue não é mantida nos níveis normais.

- Medicação

A administração intravenosa de cálcio provoca o aumento da calcificação. Terapias hormonais que afectam o metabolismo do cálcio e a administração de vitaminas, como por exemplo a vitamina D, que é responsável pela absorção do cálcio, podem influenciar a calcificação nas biopróteses de válvulas cardíacas.

(27)

1.2.4.2. Factores relacionados com o próprio implante

Os principais factores relacionados com o implante são o pré-tratamento com glutaraldeído, o colagénio, os fosfolípidos e os proteoglicanos [3].

O tecido de colagénio, obtido de um animal num matadouro não pode ser directamente usado em biopróteses porque este é degradado muito rapidamente porém, existe o interesse em prolongar a estrutura original do tecido e manter a sua integridade mecânica. É necessário remover, ou pelo menos, neutralizar as propriedades antigénicas atribuídas a este tipo de material. Estão a ser estudadas ligações adicionais, entre as moléculas de colagénio, de modo a tornar o tecido mais resistente, preservando a sua forma original. Idealmente, o tratamento de biomateriais deve manter, tanto quanto possível, as características originais do tecido, tais como a flexibilidade e as propriedades mecânicas [4].

a) Fosfolípidos

Implantes subcutâneos de tecido, sem lípidos, implantados em ratos, revelaram muito menores níveis de cálcio do que o tecido controlo. Alguns autores associam a fosfotidil serina, a qual está presente no pericárdio bovino, com certos tipos de calcificação in vivo. A acumulação do cálcio devido à presença de fosfolípidos pode ter uma origem essencialmente electrostática.

b) Proteoglicanos

Estabelecem ligações covalentes com a proteína central dos proteoglicans através de estruturas oligossacáridas específicas. com uma dimensão elevada, sintetizadas no tecido conectivo. São constituídos por uma proteína, em que as cadeias de glicosaminoglicanos são ligadas covalentemente. Devido ao elevado número de grupos sulfato nesta estrutura, os glicosaminoglicanos apresentam um carácter ácido. O mecanismo de acção primário dos proteoglicanos, na inibição da formação de hidroxiapatite é devido à elevada extensão da configuração espacial destas macromoléculas, interferindo com a formação de cristais de hidroxiapatite [60]. A remoção de proteoglicanos produz alterações morfológicas significativas,

(28)

formação e aglomeração de hidroxiapatite. Os proteoglicanos são removidos do tecido durante o processo de comercialização [3].

c) Pré-tratamento com glutaraldeído

O agente químico que tem sido primordialmente investigado para o tratamento de tecidos colagénicos é o glutaraldeído [7], [24], [34] e [35].Este agente dá origem a materiais com

um elevado grau de reticulação, quando comparado com outros, tais como o formaldeído, compostos epoxi, cianamida e acil azida [24], [36], [37] e [38].

Por outro lado, tem-se verificado que o glutaraldeído manifesta efeitos citotóxicos. Além disso, é sabido que o pré-tratamento com glutaraldeído leva à calcificação de tecido bioprotésicos e ainda que a calcificação é proporcional ao grau de reticulação. Existem evidências de que as válvulas da aorta do porco e de pericárdio bovino tratadas com glutaraldeído, são mineralizados quando implantados a nível da subderme, em ratos. Já no caso de implantes frescos, sem fixação, estes são sujeitos ao ataque inflamatório e à digestão parcial, sem mineralização. Tem-se verificado que a calcificação do colagénio tipo I, em implantes subcutâneos, é proporcional ao grau de reticulação.

As reacções bioquímicas do glutaraldeído com o tecido de colagénio são complexas e ainda não foram totalmente compreendidas [3]. Uma solução aquosa de glutaraldeído contém

uma mistura de aldeídos livres e glutaraldeído mono e di-hidratado e hemiacetais monoméricos e poliméricos. Devido à complexidade das reacções em solução, muitas reacções podem ocorrer, durante a reacção de reticulação. Cheung et al. [25], sugere que a impregnação das moléculas de

glutaraldeído no tecido, que é denso, como o caso do pericárdio bovino, é lenta e inicialmente este fixa-se à superfície das fibras. Em geral, os grupos aldeído reagem com os grupos amina dos resíduos (hidroxi) da lisina do colagénio, formando as bases de Schiff [23].

O mecanismo pelo qual o reticulação entre colagénio e o glutaraldeído promove a calcificação de implantes ainda não é conhecido. Pensa-se que a reticulação com glutaraldeído de tecidos provoca a ruptura no mecanismo regulador do cálcio, a nível celular. As células vivas intactas têm baixa concentração de cálcio livre, enquanto o nível de cálcio extracelular livre é

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muito maior. O nível de cálcio na célula viva é mantidoenergeticamente, requerendo um processo metabólico. No caso de células desvitalizadas pelo glutaraldeído, o processo metabólico não se verifica, e deste modo, a difusão passiva do cálcio ocorre sem impedimento. Então, o cálcio reage ligando-se ao fósforo presente na célula, conduzindo à formação de apatite. Por isso, estas células servem como locais de nucleação para a calcificação.

Por outro lado, a relação entre a quantidade de glutaraldeído incorporado, o número de ligações cruzadas e a estabilidade do tecido também ainda não está completamente compreendida.

A figura 19 apresenta um esquema da reticulação com glutaraldeído.

Figura 19 – Esquema do tratamento do tecido com Glutaraldeído. Glutaraldeído

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também envolve fibrilas de colagénio. Um colagénio acelular do tipo I, que é a mais abundante proteína no tecido de pericárdio bovino, está sujeito à calcificação. Assim, torna-se evidente que a reticulação com glutaraldeído afecta não só as células, mas também o próprio tecido, o qual apresenta locais de afinidade para a calcificação sob a forma de hidroxiapatite [3].

Tem-se também verificado que a despolimerização das ligações poliméricas de glutaraldeído, libertam monómeros de glutaraldeído altamente citotóxicos [4].

Outro postulado é que a reticulação com glutaraldeído cria espaços vazios no tecido, expondo os locais activos ou nichos para a biocalcificação. (Os grupos aldeído livres também estão envolvidos no processo da biocalcificação).

Outros estudos indicam que a significativa redução na quantidade de aminoácidos alcalinos, devido à reacção com glutaraldeído, resulta num balanço ímpar entre aminoácidos com carga positiva e negativa no colagénio, expondo locais do grupo carboxilo carregados negaivamente que atraem os iões Ca2+.

Qualquer que seja o mecanismo envolvido, o papel da reticulação com glutaraldeído tem sido aceite, como um dos principais factores responsáveis pela calcificação de tecido, utilizado em substitutos de válvulas cardíacas [3].

d) O Colagénio

As cadeias individuais polipéptidicas de colágeno contêm 20 aminoácidos diferentes e a sua composição varia entre os vários tipos de tecido. A variação na sequência específica de aminoácidos dá lugar aos diferentes tipos de colagénio, como Tipo I, Tipo II, até XIX. Os mais abundantes são do tipo I e III. O colagénio tipo I é o colagénio mais abundante na pele, tendões e osso. As fibras de colagénio apresentam elevada resistência. O colagénio possui baixa extensibilidade, antigenicidade mínima, é um bom substrato para o crescimento celular e a sua estabilidade é controlável, através de reacções de reticulação, quer químicas quer físicas.

Durante aplicações in vivo, o colagénio é sensível ao ataque enzimático o que pode resultar na rápida degradação do material, e por essa razão, os materiais colagénicos são

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frequentemente estabilizados através da reticulação, de modo a minimizar a biodegradação. Adicionalmente, a reticulação é efectiva na supressão da antigenicidade do colagénio e, por outro lado, pode melhorar as suas propriedades mecânicas.

Contudo, tecidos colagénicos com tratamentos de reticulação possuem uma maior tendência para calcificar e a calcificação é a principal causa das falhas das válvulas cardíacas [4].

Strates e Neuman [26] e [27], Strates, Neuman e Levinskas [28] e Glimcher, Hodge e

Schmiff [29], demonstraram que o colagénio pode actuar como um núcleo para a formação de

apatite em solução não saturada de cálcio e fosfato. As fibras de colagénio reconstituídas são locais de nucleação heterogénea catalizada por cristais de apatite em solução de cálcio e fosfato metastável, em condições fisiológicas. E que o colagénio pode desempenhar um papel na nucleação de cristais de apatite. [4].

Para a realização deste trabalho, pensou-se estudar se essa influência estaria ou não relacionada com a carga eléctrica superficial do próprio tecido. E se essa carga fosse electricamente negativa, poderia promover a atracção dos iões cálcio, electricamente positivos, que por sua vez atrairiam os aniões fosfato, dando origem a sais de fosfato de cálcio ou hidroxiapatite.

Além da carga eléctrica do tecido não tratado, existe a carga eléctrica conferida ao tecido pelo agente de reticulação. E deverá ser estudado se existe diferenças nas cargas de tecidos tratados com diferentes agentes de reticulação.

Um dos objectivos deste trabalho é estudar a carga superficial do pericárdio bovino nativo e do mesmo tecido reticulado com três agentes químicos diferentes, para utilização em folhetos de biopróteses de válvulas cardíacas, relacionando este parâmetro com a tendência para a mineralização dos tecidos.

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1.2.4.3. Factores relacionados com stress mecânico

O stress mecânico tem sido envolvido na calcificação de válvulas cardíacas artificiais. Não é muito claro se, os danos causados pelo stress mecânico potenciam a iniciação da calcificação, ou se, a calcificação provoca o aumento do stress, resultando na ruptura do tecido, ou se ambos os processos estão envolvidos neste fenómeno. Tem sido demonstrado que a calcificação ocorre em regiões de elevado stress – a tensão que provoca a quebra do colagénio pode ser desencadeada pelo excessivo desgaste causado pelo stress mecânico. A relação entre o stress mecânico e a calcificação é suportada ainda por relatos de que, implantes no lado direito do coração, são menos sujeitos à calcificação do que implantes do lado esquerdo [30]e [31] e, que os

níveis de stress em válvulas fechadas são maiores na válvula mitral, do que na aórtica [32] [33].

Tem-se verificado ainda que a calcificação se concentra mais em áreas em que os folhetos da válvula são submetidos ao esforço de compressão nas fibras de colagénio. Em geral, todas as partes mais móveis dos folhetos calcificam mais do que as áreas mais estáticas, indicando portanto, a importância da tensão no processo de calcificação [3].

1.3. Prevenção da calcificação em biopróteses de válvulas cardíacas

Geralmente considera-se que a calcificação de biopróteses de válvulas cardíacas de tecido colagénico fixadas com glutaraldeído, não pode ser prevenida em pacientes jovens. Mas esforços constantes estão a ser feitos, para manipular os factores que conduzem à biocalcificação de tecidos nos implantes. Alterações no desenho e no fabrico têm sido feitas para aumentar a durabilidade das válvulas cardíacas. Outras aproximações incluem a preservação dos grupos não aldeídos, supressão da iniciação por sais metálicos [39] e [40], extracção dos fosfolípidos [41], [42] e [43], tratamento com inibidores da calcificação [44], [45] e [46] e terapia com agentes

anti-calcificantes [47] e [48]. Outra aproximação é bloquear potenciais locais de ligação com space

fillers (enchimento), reduzindo deste modo o número de potenciais locais de nucleação para a calcificação [3].

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1.4. Extensão de inibição necessária em biopróteses de válvulas cardíacas

Antes da discussão dos vários métodos de tratamento de anticalcificação, é indispensável conhecer a extensão da inibição necessária. As biopróteses de suíno implantadas num período entre 3 a 4 anos são totalmente calcificadas, mas a extensão da calcificação varia largamente entre diferentes indivíduos. Válvulas calcificadas têm em média 113µg de cálcio/mg

de tecido seco, após 87 meses de duração. Quase todas as válvulas removidas, tanto com folhetos calcificados e endurecidos, como com rupturas secundárias devido à mineralização têm mais do que 34 e 67 µg de cálcio/mg de tecido seco na válvula mitral e aórtica, respectivamente. Embora

a completa prevenção da calcificação seja desejável, a inibição da mineralização abaixo destes valores terá um grande impacto no prognóstico dos doentes [3].

1.5. Estratégias para a inibição da calcificação em biopróteses de válvulas cardíacas

Está claramente estabelecido, que o pré-tratamento com glutaraldeído facilita a calcificação do tecido bioprotésico. Parece haver uma relação íntima entre o grau de reticulação com glutaraldeído e a biocalcificação. O caminho mais óbvio para prevenção da calcificação de biopróteses de válvulas cardíacas será a substituição do glutaraldeído por outro agente de reticulação. Por esse motivo, existe uma procura contínua de agentes de reticulação alternativos para a preservação de materiais para biopróteses. Compostos epoxy [49] e[50] ácido amino oleico [51], difenilfosforil azida [52], acil azidas [53] e cianamida [54] têm sido estudadas como

agentes alternativos de reticulação. Métodos físicos tal como a irradiação ultravioleta e a desidratação também são novos métodos de estabilização. Os métodos físicos têm a vantagem de que não se recorrer ao uso de substâncias estranhas, mas estes métodos, geralmente promovem uma baixa densidade de reticulação [55].

Têm sido feitos esforços, por alguns grupos de investigação, no sentido de utilizar certos iões metálicos para a prevenção da calcificação em materiais fixados com glutaraldeído para

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pericárdio, fixado com glutaraldeído (TPFG) através de soluções de AlCl3 e FeCl3. Estes investigadores descobriram também que a iniciação da calcificação é prevenida pela inibição da actividade da fosfatase alcalina, pelo tratamento com estes sais metálicos. Barnacca et al. [57],

estudaram as propriedades de anticalcificação do TPFG tratado com citrato de Ferro (III). Contudo, o uso de iões metálicos como agentes de reticulação para a estabilização de materiais bioprostéticos, ao invés do glutaraldeído, não tem sido muito estudado. Uma tentativa foi feita usando catiões de metais pesados, tais como o Al (III), o Fe (III) e o Zr (III) como agentes de reticulação. Contudo, alguns destes iões metálicos não são considerados bons agentes de reticulação, quando comparados com o glutaraldeído. Por esta razão, existe a necessidade de mascarar estes iões metálicos, para estabilizar a reticulação com o pericárdio. O mecanismo de reacção que envolve a estabilização do tecido de colagénio pelos iões metálicos encontra-se descrito na literatura [58] e [59].O crómio (III) é o metal mais usual para a produção de

revestimentos (leather) de válvulas e outros metais iónicos tais como o Al (III), Zr (IV) e Ti (IV) também são usados, embora com uma menor frequência e com algumas modificações. Pensa-se que estes iões metálicos conferem estabilidade ao tecido colagénico pela reacção de complexação com as cadeias dos grupos carboxilos [58].

Contudo, as vantagens do glutaraldeído como agente de reticulação são muitas. E a sua solubilidade em água, a sua reactividade com o tecido de colagénio e a estabilidade das reacções de reticulação formado a pH fisiológico, têm favorecido a sua continuada utilização como agente de reticulação, na preparação de biopróteses de válvulas cardíacas. Por isso, o controlo da calcificação em tecidos biológicos tratados com glutaraldeído, continua a ser uma opção preferencial, relativamente a qualquer outro produto, em biopróteses de válvulas cardíacas [3].

1.6. Inibição da calcificação em biopróteses pré tratadas com glutaraldeído

A maior parte das estratégias de anticalcificação envolvem terapia sistémica ou localizada, com agentes farmacológicos ou tecido pré-tratado, de forma a modificar as características químicas, físicas ou ambas, dos folhetos. Reacções de reticulação com glutaraldeído com pré-tratamento prévio com SDS (Sodium Dodecyl Sulfate) tem revelado inibir

(35)

a calcificação, embora incompletamente, no sistema circulatório de modelos animais, a nível da subderme. Embora o mecanismo de anticalcificação com detergente como o SDS ainda não esteja totalmente compreendido, o mesmo efeito pode ser obtido através da extracção de fosfolípidos ou da modificação de carga superficial.

Uma estratégia alternativa emprega inibidores da calcificação tanto no pré-tratamento do biomaterial como através da administração sistémica ou administração controlada e localizada ou da combinação dos dois tipos. Os difosfonatos são considerados inibidores potentes da calcificação [3]. Estudos in vitro revelam que estes inibem a precipitação do fosfato de cálcio,

inibem a transformação do fosfato cristalino amorfo em hidroxiapatite e crescimento, agregação e dissolução da hidroxiapatite [3].

1.7. Considerações gerais

Embora a mineralização seja um fenómeno normal e fisiológico da formação do osso, dentina e esmalte do dente, a calcificação em tecidos funcionais moles não é usual. A calcificação é a principal causa das falhas de uma vasta gama de dispositivos médicos quer cardiovasculares quer não-cardiovasculares. As causas para a calcificação não são claras mas uma origem multifactorial deve ser considerada. Alguns dos factores importantes a ter em conta são a composição química do tecido, os tratamentos químicos a que o tecido é sujeito, a resposta imune do paciente, o stress mecânico e a deposição de proteína e células circulantes. Os proteoglicanos e os lípidos têm sido directamente implicados como substâncias indutoras da mineralização fisiológica. O pré-tratamento com glutaraldeído facilita a mineralização do tecido bioprotésico, mas a explicação bioquímica para a dependência das ligações cruzadas entre as fibras colagénio e a mineralização ainda é desconhecido.Várias hipóteses têm vindo a ser testadas para controlar a biocalcificação, contudo nenhum método isolado é ainda perfeito para eliminar completamente este fenómeno. Para seleccionar os agentes anticalcificantes é necessário ter em consideração alguns aspectos.

As modificações do implante podem alterar a resistência mecânica ou afectar a biocompatibilidade das próteses. No caso da inibição da calcificação através de difosfonatos, uma

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cristais pode conduzir à rápida acumulação de cálcio. Devido ao problema associado ao uso de fosfonatos, várias tentativas foram feitas para identificar novos inibidores da calcificação [3]. A

remoção de proteoglicanos e glicosaminoglicanos pode provocar o aumento da calcificação. Os glicosaminoglicanos são inibidores naturais da calcificação. A remoção selectiva de fosfolípidos da matriz parece ser muito eficaz na redução da calcificação. E a remoção de todas as substâncias celulares resulta na quase prevenção completa da calcificação [4]. Polímeros sintéticos tal como

os poliacrilatos e outros materiais polianiónicos foram estudados [3]. Além disso, os biopolímeros

e os polímeros sintéticos biocompatíveis parecem ser melhores candidatos do que os fosfonatos. Os biopolímeros tais como o quitosano e o alginato apresentam actividades favoráveis como substâncias reguladoras da cristalização e também oferecem outras vantagens, como por exemplo não serem tóxicos e além disso, serem biocompatíveis.

É possível preencher os espaços entre as moléculas de colagénio com polímeros sintéticos e naturais. E pensa-se que estas macromoléculas não têm nenhum efeito adverso nas propriedades mecânicas das próteses de válvulas modificadas. Embora existamvários agentes de reticulação alternativos tais como a radiação UV, tratamento dehidrotermal, reacção com cianamida, tratamento de reticulação com acil diisocianida [3]. Estes métodos não produzem as

ligações cruzadas desejadas, não resultam em próteses duradouras, estáveis nem com boas propriedades mecânicas. Mediante estes factos pensa-se que uma hipótese possível será tratar as biopróteses de válvulas cardíacas com glutaraldeído e subsequentemente fazer reagir os resíduos de aldeído com vários reagentes. É também possível usar agentes de reticulação metálicos tais como o alumínio, o zircónio e o ferro e subsequentemente tratar o material com polímeros sintéticos para reforçar o tecido da prótese. Alternativamente, é possível usar biopolímeros como agentes de reticulação tal como o alginato e subsequentemente fixarcom um polímero sintético. Também é possível incorporar difosfonatos nestes polímeros e provocar a sua libertação lenta. Biopolímeros tais como o quitosano também podem ser introduzidos [3].

A fixação com glutaraldeído resulta na formação de grupos aldeído reactivos livres que parecem ser os propulsores iniciais para a calcificação. A fixação do tecido também provoca alterações a nível da morfologia e das cargas das moléculas de colagénio, o que podem ser parâmetros importantes para a complexação dos iões cálcio [4].

(37)

Finalmente é evidente que o conhecimento ganho acerca dos mecanismos fundamentais envolvidos na calcificação do tecido seja agora aplicado com sucesso para a investigação de tratamentos anticalcificantes [3].

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2. Enquadramento do trabalho

Neste trabalho, utilizou-se tecido de pericárdio bovino não tratado ou nativo (Nat) e tecido modificado com 3 tipos de agentes de reticulação, Difenilfosforil azida (DPPA), Glutaraldeído (Ga) e Acil azida a concentrações diferentes, 0,6% e 1% (Aga 0,6% e 1%).

Os tratamentos químicos ao tecido foram efectuados por Eduardo Jorge Herrero, em Madrid (Espanha), na Clínica Puerta de Hierro, que teve a gentileza de facultar para este trabalho os esquemas que se seguem.

Tratamento com Ga:

Figura 20 – Esquema do tratamento do tecido com Glutaraldeído. Glutaraldeído

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Tratamento com Aga:

Acetais de Glutaraldeído

Figura 21- Esquema do tratamento do tecido com Aga.

Este tratamento, representado no esquema da figura 21, tem uma dupla estratégia de protecção, a reacção do glutaraldeído com o etanol forma acetais, ocorrendo ainda a protonação da lisina devido às condições ácidas, pela formação do acetal. Desta forma evita-se a polimerização imediata permitindo que o acetal se difunda até ao interior do tecido, criando-se assim condições para uma reticulação homogénea. Como se pode ver na última parte do esquema, tem-se a reacção: Ga + colagénio (NH2 da lisina), o mesmo que se obtém no tratamento com Ga.

Tratamento com DPPA:

Neste caso, utiliza-se um ajuste de reticulação alternativo ao Ga. A reacção ocorre entre um aminoácido (Asp ou Glu) e um grupo COOH livre. O DPPA formará uma acil azida que

H C C H2 H2 C C H2 H C O O glutaraldehído H2 C CH3 HO etanol 4 H H OCH2 OCH2 OCH2 OCH2 CH3 CH3 CH3 CH3 1,1,5,5-Tetraetoxi-pentano H+ H H OCH2 OCH2 OCH2 OCH2 N CH2 H3C H2C CH3 H2C H3C trietilamina + H C C H2 H2 C C H2 H C O O H2N COLAGENO CH3 CH3 CH3 CH3 + Glutaraldeído etanol 1,1,5,5-tetraetoxi-pentano Colagénio

(40)

reagirá com o NH2 do colagénio. Neste caso, obtém-se um grupo amida CONH (ao invés de um grupo amina ou uma base de Schiff do Ga + NH2) (figura 22).

Figura 22 - Esquema do tratamento do tecido com DPPA.

Aminoácido Asp ou Glu

L-Lis ou HO-Lis Acil azida Reticulação Colagénio Colagénio Colagénio Colagénio Colagénio Colagénio

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3. Preparação das membranas

As membranas foram conservadas em glicerol e antes de iniciar cada experiência foi necessário a sua remoção, para isso foi feita uma lavagem com NaCl 0,9%. As amostras foram mergulhadas em gobelés, com 40 mL de solução de NaCl 0,9%, durante 2 horas, com agitação, período durante o qual a solução foi trocada várias vezes.

A água utilizada foi água analítica de grau tipo II.

As espessuras das membranas foram determinadas em 5 pontos.

3.1. Grau de inchamento

Estes ensaios permitem estudar, de uma forma qualitativa, o grau de reticulação das amostras. A reticulação reduz a % de líquido que pode ser incorporada [8]. Foram estudadas 4

amostras para estes ensaios.

PROTOCOLO - Grau de inchamento

As amostras foram colocadas a equilibrar numa solução de PBS (pH = 7,4), durante 2 horas, à temperatura ambiente, com agitação.

Foi retirado o excesso de solução à superfície das membranas. Os tecidos foram pesados imediatamente a seguir, numa balança analítica centesimal.

Para remoção dos sais, colocou-se em água durante 10 minutos. Depois foram retiradas e secas ao ar até o peso ficar constante. As 2 últimas pesagens deverão ter uma diferença de peso menor que 5%.

O grau de inchamento foi calculado pela razão entre o peso da membrana mais líquido por peso seco de membrana.

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3.2. Degradação enzimática

A influência das reacções de reticulação na degradação do colagénio têm sido estudadas in vitro e in vivo. A degradação do colagénio é promovida por enzimas químicas e de origem bacteriana. A colagenase (proveniente de culturas de Clostridium histolyticum) é aplicada para determinar a estabilidade dos materiais após reticulação, enquanto que as enzimas não específicas como a pronase e a tripsina têm sido ocasionalmente utilizadas [4]. A pronase foi a enzima

utilizada neste trabalho, pela sua não especificidade para com os tecidos, ou seja é uma protease não específica.

Foram estudadas 5 amostras de cada tratamento.

PROTOCOLO – Degradação enzimática

A enzima utilizada para estes ensaios foi a pronase (protease, colhida de culturas S. griseus), proveniente da Sigma-Aldrich.

Por cada 15 mg de tecido foram utilizados 6 mL de solução enzimática.

Preparação de 25 ml de solução enzimática:

Pesou-se 13,9 mg de CaCl2, 1,3 mg de NaN3, 151.4 mg de Tris Base e juntou-se 1 ml de HCl 1M.

Adicionou-se a alíquota de pronase, contendo 3,3 mg de pronase/ml de solução enzimática [7]. Ajustou-se o pH a 7,4. Transferiu-se a solução para um gobelé e acertou-se o pH [2]. Acertou-se o volume a 25 mL. Colocou-se a solução a incubar durante 1 hora, a 37ºC.

Removeu-se a água superficial do tecido com ajuda de papel de filtro. Em seguida pesou-se numa balança analítica centesimal.

Colocou-se 1 membrana por cada recipiente contendo a quantidade correspondente de solução de enzima e incubou-se a 37ºC, com uma agitação de 175 r.p.m..

Os recipientes foram colocados num suporte com inclinação, para uma agitação mais eficaz e uniforme.

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Ao fim das 24, 48, 72 e 96 horas retiraram-se as membranas, removeu-se o excesso de solução de acordo com o procedimento habitual e pesaram-se.

3.3. Potencial Zeta

Os sólidos em contacto com uma solução electrolítica possuem uma distribuição de cargas à superfície diferente das fases sólidas e líquidas no seu interior. O excesso de uma espécie iónica e a escassez de outra leva à formação da dupla camada electroquímica (figura 23). A dupla camada é constituída por:

♦Uma camada de carga na superfície do material;

♦Uma camada de carga de sinal contrário do lado da solução. Esta camada é formada

por:

- uma camada imóvel ou rígida – onde as cargas estão fixas à interface sólido/líquido; - uma camada móvel ou difusa – onde as cargas são sujeitas a um movimento térmico.

Figura 23- Representação esquemática do Potencial Zeta [61].

Em que:

Potencial no plano intermédio

Camada difusa C am ad a im óv el

Distância da partícula à superfície 1

2 3

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1 – potencial à superfície; 2 - potencial na camada imóvel 3 – potencial zeta

Quando é aplicada uma força externa, paralela à interface sólido/líquido, um movimento relativo entre as fases sólida e líquida ocorre. Enquanto as camadas imóveis se mantêm na superfície sólida e na fase líquida, a camada móvel é varrida juntamente com o seio da solução. A posição do plano intermédio entre as 2 camadas, difusa e imóvel, é determinado pelo equilíbrio entre as forças de atracção externas e as forças da superfície.

O potencial no plano intermédio (interface entre as camadas móvel e imóvel) é conhecido como potencial electrocinético ou potencial zeta.

A acumulação de carga na interface sólido/líquido (formação de uma dupla camada electroquímica) é baseada na adsorção de iões ou polielectrólitos na superfície sólida, na dissociação de grupos moleculares à superfície, por exemplo grupos ácido/base, e na dissolução de iões de certos sólidos inorgânicos.

A extensão deste processo depende da composição química e da estrutura física do sólido e da composição do líquido envolvente. A formação da dupla camada e a magnitude e o sinal do potencial zeta é, no entanto, determinada tanto pelas propriedades do sólido quer do líquido.

Numa superfície, a dissociação de grupos funcionais provoca uma acumulação de cargas. A dissociação de grupos ácidos numa superfície carregada negativamente provoca o aumento das cargas negativas. A dissociação de grupos alcalinos dá origem ao aparecimento de cargas positivas.

É obvio que o grau de dissociação e o potencial zeta são fortemente dependentes do pH da solução aquosa.

Neste trabalho, a determinação do potencial zeta é feita através do Electro Kinetic Analyser (EKA) da Anton Paar e é baseado no método da queda de potencial electroquímico. Este método é classificado como um método para análise das propriedades da interface de um material sólido em contacto com um líquido, em que existe movimento do líquido em contacto com a superfície.

A solução electrolítica é bombeada através da célula contendo a amostra a analisar, provocando uma queda de pressão. A amostra sólida é colocada na célula entre 2 eléctrodos e, havendo movimento de cargas, vai existir também uma queda de potencial. O potencial zeta é

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dado pela equação de Smoluhowski, a qual relaciona a queda de pressão com a queda de potencial na passagem pela amostra.

ζ = dU/dP × η/(ε×ε0) × L/(Q×R)

em que:

ζ = potencial zeta

dU = queda de potencial electroquímico P = queda de pressão na célula

η = viscosidade da solução electrolítica

ε = constante dielétrica da solução electrolítica ε0 = permitividade no vácuo

L = comprimento da amostra Q = corte de secção da amostra R = resistência na célula

Desde que sejam utilizadas soluções aquosas diluídas para determinação da queda de potencial electroquímico, a viscosidade e a constante dieléctrica da água são aceitáveis.

O EKA permite medir a queda de potencial electroquímico, e alternativamente a corrente de potencial electroquímico, a diferença de pressão, a condutividade do electrólito e a resistência da amostra. Os valores de viscosidade e as constantes dieléctricas são obtidos através de tabelas contidas no software do equipamento. Além disso, a temperatura e o pH do electrólito também são determinados pelo EKA.

Para a determinação do potencial zeta é essencial usar um electrólito diluído, com efeito, uma baixa concentração corresponderá à camada difusa que se estende mais para o interior do electrólito, obtendo-se então valores de potencial zeta mais correctos. Com o aumento da concentração do electrólito, a camada difusa é comprimida, e ocorre um acelerado declínio do

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potencial com a dupla camada electroquímica. A diferença entre os valores de potencial zeta é reduzida e verifica-se uma diminuição na sensibilidade das medições [11].

Foram estudadas 6 amostras de Ga, 8 amostras de Nat e 5 amostras de DPPA, de Aga 0,6 % e Aga 1%.

PROTOCOLO - Potencial zeta

As membranas ficaram a equilibrar numa solução de PBS diluída de 1:100, durante 2 horas com agitação. Depois foram cortadas em pedaços, o mais pequenos possível, de modo a simular um pó.

Após as 3 lavagens com água da torneira e as 4 lavagens com água destilada o equipamento foi lavado 2 vezes com o electrólito, o PBS 1:100.

A célula utilizada foi a célula cilíndrica que é constituída por eléctrodos de disco perfurados de Ag/AgCl.

3.4. Difusão

Nestes estudos utilizou-se a célula de difusão com dois compartimentos de igual volume [10]. Uma hipótese para um dos passos mais importantes da calcificação de válvulas

bioprotésicas de pericárdio bovino tratadas com glutaraldeído é o fluxo de iões cálcio para o interior do tecido bioprotésico imediatamente a seguir à cirurgia.

Foi estudada a difusão dos iões cálcio através de amostras de tecido tratado e não tratado.

O coeficiente de permeabilidade foi calculado a partir da Lei de Fick:

Coef. de permeabilidade = (dm/dt)/A . x/C

em que:

dm/dt = Variação de massa por unidade de tempo (mg/min) A = Área de difusão (constante) = 90,8mm2

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C = Concentração inicial de cálcio na solução dadora (constante) = 100 mg/L [9].

Foram estudadas 6 amostras de Ga e de DPPA e 3 amostras de Nat, Aga 0,6% e Aga 1%.

PROTOCOLO – difusão

Preparou-se uma solução de CaCl2 a 0,2% (18 mmol/L).

Numa célula de difusão (figura 24) constituída por 2 compartimentos separados pela amostra em estudo (membrana com dimensões 2×2 cm), foram colocados 35 mL de solução de

CaCl2 a 0,2%, e no outro foram colocados 35 mL de água.

Os ensaios decorreram numa estufa orbital a 37ºC e com uma agitação de 150 r.p.m. e a célula de difusão foi sempre colocada com a mesma disposição.

As amostras foram retiradas nos intervalos de tempo seguintes (em minutos): 0, 10, 20, 30, 40, 60, 80, 100 e 120, sendo retirados em cada tempo, 10 mL de solução do compartimento que inicialmente continha apenas água. Esse volume retirado é rectificado com 10 mL de água destilada.

Figura 24 - Fotografia esquemática da célula de difusão.

(48)

Depois seguiu-se a determinação do teor de Ca das soluções. Para isso foi utilizado um espectrofotómetro de absorção atómica, com atomização por chama de protóxido/acetileno, da marca GBC, modelo 904AA [2] e [10].

As soluções foram analisadas directamente, sem qualquer outro tratamento adicional, procedendo-se a diluições quando necessário. O branco e os padrões possuíam matrizes idênticas às das amostras.

Depois efectuaram-se os respectivos cálculos para as diluições efectuadas.

3.5. Microscopia óptica

Com o objectivo de avaliar a permeabilidade do tecido recorreu-se à microscopia óptica.

Efectuaram-se cortes longitudinais e perpendiculares ao tecido de modo a visualizar a estrutura das fibras e a permeabilidade do tecido das camadas mais externas às camadas mais internas. O tecido não requer o uso de corantes, já que este possui auto-fluorescência.

PROTOCOLO – Microscopia óptica

As membranas foram fixadas durante 5 horas em formaldeído a 4%.

Depois efectuou-se a desidratação que consiste na imersão do tecido em séries crescentes de etanol (1 hora em etanol 70º, 1 hora em etanol a 96º e 3 vezes durante 1 hora em etanol absoluto).

Após a desidratação, o etanol é removido e substituído por xilol, que tem a capacidade de tornar o tecido mais translúcido, e prepará-lo para a impregnação posterior em parafina. Esta etapa é efectuada colocando-se o tecido 2 vezes, durante 45min em xilol (São 2 vezes para que a remoção seja total e não reste nenhuma mistura de etanol que não é miscível em parafina. Finalmente a impregnação é efectuada através de 3 banhos consecutivos de parafina fundida, cujo ponto de fusão é de cerca de 56-58ºC. (Os 3 banhos serve para que o xilol acabe por ficar dissolvido nas primeiras parafinas e a impregnação seja só feita com parafina). A parafina com vestígios de xilol impede a correcta solidificação da parafina após o arrefecimento e impede o

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