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O sistema investigativo brasileiro e os novos paradigmas da ciência: uma análise acerca da elaboração da perícia no inquérito policial

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Academic year: 2021

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UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO NORTE CENTRO DE CIÊNCIAS SOCIAIS APLICADAS

CURSO DE GRADUAÇÃO EM DIREITO

CAROLYNE NÁTHALY DA SILVA SANTOS

O SISTEMA INVESTIGATIVO BRASILEIRO E OS NOVOS PARADIGMAS DA CIÊNCIA: UMA ANÁLISE ACERCA DA ELABORAÇÃO DA PERÍCIA NO

INQUÉRITO POLICIAL

NATAL 2019

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CAROLYNE NÁTHALY DA SILVA SANTOS

O SISTEMA INVESTIGATIVO BRASILEIRO E OS NOVOS PARADIGMAS DA CIÊNCIA: UMA ANÁLISE ACERCA DA ELABORAÇÃO DA PERÍCIA NO

INQUÉRITO POLICIAL

Trabalho de Conclusão de Curso apresentado ao curso de graduação em Direito, da Universidade Federal do Rio Grande do Norte, como requisito parcial à obtenção do título de Bacharel em Direito. Orientador: Prof. Dr. Walter Nunes da Silva Júnior.

NATAL 2019

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Universidade Federal do Rio Grande do Norte - UFRN Sistema de Bibliotecas - SISBI

Catalogação de Publicação na Fonte. UFRN - Biblioteca Setorial do Centro Ciências Sociais Aplicadas - CCSA Santos, Carolyne Nathaly da Silva.

O Sistema investigativo brasileiro e os novos paradigmas da ciência: uma análise acerca da elaboração da perícia no inquérito policial / Carolyne Nathaly da Silva Santos. - 2019.

76f.: il.

Monografia (Graduação em Direito) - Universidade Federal do Rio Grande do Norte, Centro de Ciências Sociais Aplicadas, Departamento de Direito. Natal, RN, 2019.

Orientador: Prof. Dr. Walter Nunes da Silva Júnior.

1. Investigação - Monografia. 2. Perícia Criminal - Monografia. 3. Segurança Pública - - Monografia. I. Silva Júnior, Walter Nunes da. II. Universidade Federal do Rio Grande do Norte. III. Título. RN/UF/Biblioteca do CCSA CDU 343.1

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À minha mãe, titular de todas as minhas conquistas e merecedora de todas as homenagens.

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AGRADECIMENTOS

No decorrer dos últimos cinco anos, imaginei diversas vezes como seria finalizar esse ciclo. Em todos esses pensamentos estavam presentes as pessoas que tem compartilhado comigo as alegrias e angústias ao longo dos meus 22 anos.

É certo que eu não estaria aqui sem a compaixão e o amor de Deus na minha vida, que tem se manifestado de grandes formas, me ensinando a compreender tantas situações e crer que tudo posso através da fé. Pela força que me foi concedida, me sinto imensamente grata pela obra de Deus.

Sem dúvida, houveram passagens nebulosas em meio a caminhada percorrida no curso de Direito, mas tantos foram os dias de sol que me aqueceram a alma, trouxeram boas risadas e esperança no amanhã, ao lado dos meus companheiros de graduação e futuros colegas de profissão: João Paulo Brandão, Rick Oliveira, Mirelly Moura, Vanessa Lira, Mariana Fernandes e Shâmalla Jewur.

Não poderia deixar de externar meus agradecimentos também a dois colegas que me serviram de inspiração durante o período de estágio na JFRN, Flávia Veras e Tito Torres, que me ensinaram tanto e me acolheram com toda a ternura possível, própria de uma amizade que nunca será esquecida.

Pelo imenso aprendizado, jurídico e humano, agradeço, sobretudo, à equipe da Defensoria Pública da União - DPU/Natal, casa em que vivenciei tantas e fortes emoções, em especial à amiga Letícia Mesquita pela atenção que me dedicou no período de construção desse trabalho. Sem esquecer, jamais, da querida Lorena Costa e todas as lições sobre empatia que me foram ensinadas na prática.

Aos meus mestres, especialmente ao meu paciente orientador Walter Nunes, com quem tive a honra de poder contribuir enquanto estagiária da JFRN e na monitoria da Disciplina de Processo Penal II, pelos inúmeros ensinamentos preciosos que me acompanharão por toda a carreira profissional.

Aos meus amigos, tantos que nem poderia mencionar todos aqui, nas pessoas de Pedro Dias, Diane Caroline, Ianka Rayanne, Thaylson Rodrigues, Letícia Bias, Jesiely Fernanda e Maria Eduarda, meus mais sinceros agradecimentos por tonarem mais leve a caminhada e por toda compreensão e estímulos que me foram prestados durante o período de elaboração desse trabalho. Certamente não seria possível concluí-lo se não fosse o conforto prestado por cada um de vocês.

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Agradeço também, a minha amada família por todo cuidado e carinho, por sempre me incentivarem de todas as formas possíveis e por moldarem a minha educação, especialmente à Ana Glória e Francisco Carvalho, e aos meus pequeninos, Vinícius e Helissa, a quem agradeço por todo o amor.

Por último e, certamente, o mais importante agradecimento, dedico à minha mãe por ter travado tantas batalhas para que eu pudesse ter a oportunidade de concretizar esse sonho e por sempre acreditar em mim e no meu potencial, quando nem eu mesma acreditei. Obrigada por toda a doação, todo o amparo e por me sustentar em todas as vezes em que eu desmoronei, sem você essa jornada não teria o menor sentido.

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Não é o crítico que importa; o crédito pertence ao homem que encontra-se na arena, cuja face está manchada de suor e sangue; aquele que esforça-se bravamente; que erra, que se depara com um revés após o outro, pois não há esforço sem erros e falhas. (Theodore Roosevelt)

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RESUMO

Em diferentes épocas e contextos, a tecnologia tem sido forte aliada do processo penal. O avanço da ciência vem fornecendo ferramentas que possibilitam a descoberta de inúmeras espécies de crimes, cometidos sob as mais variadas circunstâncias. Todavia, de acordo com as estatísticas, a investigação brasileira é ineficiente, pois, não obstante a disponibilidade de novas técnicas, o que se tem constatado é o aumento da criminalidade, situação que nos convida a refletir sobre a aplicação de investimentos da Segurança Pública no setor de perícia. Indubitavelmente, a implementação de técnicas e o investimento de qualidade em produção pericial contribuem para o fortalecimento do arcabouço probatório no âmbito da instrução processual e a consequente redução da impunidade. O processo criminal brasileiro, da forma como é estruturado, tem suporte principal na produção de elementos na fase pré-processual, lastreando-se nas peças de informação contidas no Inquérito Policial. Nesse aspecto, se faz necessário um cuidado demasiado com a cadeia de custódia da prova e produção de um acervo completo e consistente, já que se trata, na maior parte das vezes, de provas irrepetíveis. Em razão das consequências irreparáveis que o mau procedimento poderá acarretar à instrução processual, o presente trabalho, através da análise do cenário da perícia criminal, bem como, de seus impactos na persecução penal, destaca a importância da implementação da investigação de qualidade. Examinando ainda as normativas que regulamentam o tema, incluindo o posicionamento dos poderes executivo e judiciário a respeito da temática, que cuida, em última análise, da proteção dos direitos humanos. Dessa forma o se verifica é que a investigação configura uma poderosa política de segurança pública e que além de ser priorizada pelo poder público, merece especial cuidado pela legislação, devendo também ser promovida pela defesa dos acusados e suspeitos.

Palavras-chave: Investigação. Produção de Provas. Perícia Criminal. DNA na Ciência Forense. Segurança Pública.

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ABSTRACT

In different times and contexts, technology has been a strong ally of criminal prosecution. The advancement of science has provided tools that enable the discovery of countless kinds of crimes, committed under the most varied circumstances. However, according to statistics, Brazilian research is inefficient because, despite the availability of new techniques, what has been noted is the increase in crime, a situation that invites us to reflect on the application of Public Security investments in the sector of expertise. Undoubtedly, the implementation of techniques and the quality investment in expert production contribute to the strengthening of the evidential framework within the procedural instruction and the consequent reduction of impunity. The Brazilian criminal process, as it is structured, has main support in the production of elements in the pre-procedural phase, based on the pieces of information contained in the Police Inquiry. In this regard, too much care must be taken with the chain of custody of the proof and production of a complete and consistent collection, as this is often unrepeatable evidence. Due to the irreparable consequences that the bad procedure may trigger the procedural instruction, the present work, through the analysis of the criminal expertise scenario, as well as its impacts on the criminal prosecution, highlights the importance of the implementation of the quality investigation. Also examining the regulations that regulate the subject, including the position of the executive and judiciary powers on the issue, which ultimately takes care of the protection of human rights. Thus it is found that the investigation configures a powerful policy of public security and that besides being prioritized by the public power, deserves special care by legislation, and should also be promoted by the defense of the accused and suspects.

Keywords: Investigation. Evidence Production. Criminal Expertise. DNA in Forensic Science. Public Security.

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LISTA DE FIGURAS

Figura 1 - Percentual de unidades de medicina legal cujos profissionais participaram de cursos de capacitação ou atualização, por UF, 2011.

Figura 2 - Média salarial dos profissionais de perícia, em reais, 2011.

Figura 3 - Existência de plano de carreira para peritos criminais, por UF, 2012. Figura 4 - Existência e abrangência dos sistemas informatizados, em porcentagem, nas unidades pesquisadas, 2012.

Figura 5 - Percentual de atendimento da demanda de casos de 2011 nas unidades de medicina legal, por UF, 2011.

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LISTA DE SIGLAS

CPP Código de Processo Penal

DNA Ácido Desoxirribonucleico (em inglês Deoxyribonucleic Acid) IC Instituto de Criminalística

II Instituto de Identificação IML Instituto Médico Legal IPL Inquérito Policial

ITEP Instituto Técnico-Científico de Perícia SENASP Secretaria Nacional de Segurança Pública

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SUMÁRIO

1 INTRODUÇÃO... 11

2 AGENTES DA PRODUÇÃO DE PROVA PARA ALÉM DAS

NORMATIVAS DO CÓDIGO DE PROCESSO PENAL... 15 2.1 Da formação do condutor do inquérito: nulidades e provas

inservíveis à elucidação dos fatos... 16 2.2 Profissionais legistas e condições de trabalho sob a perspectiva

da literatura forense... 22 3 O DNA E A GENÉTICA FORENSE: A CIÊNCIA A SERVIÇO DA

JUSTIÇA PARA A SOLUÇÃO DE CRIMES VIOLENTOS... 29 3.1 O cenário brasileiro em estatísticas... 32 3.2 A face do sistema de perícias no Rio Grande do Norte 36

4 IMPLEMENTAÇÃO DE NOVAS FERRAMENTAS E TÉCNICAS

AOS PROCEDIMENTOS DE EXAMES CRIMINALÍSTICOS E SUAS IMPLICAÇÕES PRÁTICAS... 43 4.1 Investigação defensiva e produção de prova pericial: inovação e

dinamicidade ao processo de produção de provas... 44 4.2 Implicações da prova pericial na instrução processual e

decisões judiciais... 48 4.3 Investimento em política públicas de investigação versus

patrulhamento ostensivo e o combate à criminalidade... 53 4.4 Importância do aparelhamento dos institutos de perícia,

formação e capacitação de delegados e peritos e atualizações acerca do uso das novas técnicas... 58 5 CONSIDERAÇÕES FINAIS... 64 REFERÊNCIAS... 68 ANEXO A – PORTARIA N° 021/2019 - GDG NATAL/RN,30 DE

JANEIRO DE 2019... 73

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1 INTRODUÇÃO

O tema da segurança pública sempre se mostrou uma pauta social de extrema urgência. Não é à toa que o debate político centra-se, frequentemente, nessa questão e governantes são eleitos através do discurso de reforma desse setor, suscitando propostas para solucionar o problema da criminalidade.

Hodiernamente, a sensação de insegurança que permeia a sociedade tem se intensificado em razão dos elevados índices da criminalidade violenta, especialmente pelos crimes de homicídio e roubo.

Dados do Sistema de Informações sobre Mortalidade, do Ministério da Saúde (SIM/MS), apresentados no Atlas da Violência, produzido pelo Fórum Brasileiro de Segurança Pública (2019, p.5), apontam que no ano de 2017 foram registrados 65.602 homicídios no Brasil, o que corresponde a 31,6 mortes para cada 100 mil habitantes. Essa estatística representa a maior taxa de letalidade violenta da história do país.

Diante dessa realidade, a impunidade constitui um fator que contribui como incentivo à criminalidade. O Instituto Sou da Paz (2017, p.4), evidencia que menos de 15% das mortes violentas são denunciadas pelo Ministério Público, em razão da fragilidade das provas, ocasionada pela estrutura deficitária da perícia e, ainda, a excessiva duração na condução dos inquéritos policiais.

Países que investiram na produção de prova por meio do exame de DNA, a exemplo dos Estados Unidos, têm logrado elevados índices de eficiência na apuração de crimes de homicídio, inclusive fatos ocorridos em período anterior ao surgimento dessa técnica, o que foi possível graças a adequada conservação do material colhido à época dos acontecimentos.

Embora não seja indispensável, o inquérito policial constitui a gênese da expressa maioria das ações penais que tramitam no país. Em que pese a polícia judiciária, responsável pela condução do procedimento, atue em conjunto com o Ministério Público no desiderato de embasar a acusação, o inquérito não deve demonstrar seletividade na coleta de provas ou partir de uma concepção pré- estabelecida a respeito dos fatos.

Diante da forte tendência inquisitiva do procedimento em análise, se faz necessário conferir o máximo de garantias possível e assegurar o equilíbrio entre as intervenções da acusação e da defesa, uma vez que o inquérito deve estar a serviço da justiça e não em busca de uma condenação.

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É notório que diante de ações criminosas cada vez mais sofisticadas, há necessidade de técnicas de investigação que acompanhem esse avanço. Em cotejo com essa temática, afirma Soares (2014,p.206) que a criatividade, o dinamismo e a inovação tem caracterizado o fenômeno da criminalidade e que, dessa forma, se faz necessário que a repressão estatal também atue com criatividade, dinamismo e inovação, atentando-se para uma importante diferença, a de que a ação criminosa é seria completamente livre, enquanto a repressão estatal deve ser condicionada pelo ordenamento jurídico, especialmente pelos direitos fundamentais.

Neste interim, a investigação preliminar enquanto embrião da ação penal, tem sido, historicamente, subestimada, atribuindo-se a esta etapa menor importância do que o devido. Todavia, conforme será analisado, o inquérito policial exerce um papel relevante na instrução processual, já que, com frequência, recebe valoração na fase de julgamento.

Nesta senda, a fase pré-processual demanda certa atenção que, até o momento, não tem se observado por parte das autoridades responsáveis pelo aparelhamento do sistema policial e órgãos de investigação.

Isso ocorre, notadamente, em decorrência da expectativa de que a instrução processual possa suprir as lacunas e produzir provas robustas acerca dos fatos alegados. No entanto, de acordo com o que será explanado no decorrer deste trabalho, nem sempre é possível efetivar essa pretensão, embora fosse o ideal.

Para dar início à discussão a respeito da relevância do investimento em investigação é preciso partir de premissas como a função do inquérito e seu impacto na instrução processual. Neste compasso, acerca do referido instituto, Mirabette (2003, p. 76) sustenta que se rata de uma instrução provisória e informativa. No entanto, menciona que, por diversas vezes, são colhidos elementos difíceis de obter na instrução processual como auto de flagrante e exames periciais

Por conseguinte, é importante frisar que as peças de informação contidas em um inquérito policial não apenas se prestam a embasar uma denúncia, e que, em muitas situações, o material colhido nesta etapa não constitui apenas uma instrução probatória, mas, como bem assinalou Júlio Mirabete, serve como prova ao processo judicial.

Desse modo, se supera a visão de que o inquérito se configura como um elemento que serve tão somente à acusação para respaldar uma denúncia e fazer prova das imputações alegadas na exordial.

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Quanto à destinação do inquérito e sua utilidade para a instrução, assevera Nucci (2013, p.131) que o inquérito não se destina unicamente ao órgão acusatório, visando à formação da sua opinio delict, já que integra dos autos do processo, autorizando ao magistrado utilizá-lo para embasar sua decisão, quando as informações sejam ratificadas na instrução.

Em compasso com o que aponta Nucci, a eventual prova produzida em sede de inquérito, ao integrar os autos processo, serve à ambas as partes, inclusive ao juízo, não se destinando apenas à acusação.

O inquérito se reveste de suma importância para a instrução processual, seja para compô-la, seja para evitá-la, uma vez que é possível, diante da inexistência de indícios da ocorrência de um fato típico ou da impossibilidade de ligar um suspeito a uma cena criminosa, o arquivamento do inquérito sem que o mesmo culmine em uma ação penal.

Neste sentido, se estudará se como implicação prática de uma investigação preliminar eficaz, teríamos a minimização da possibilidade de condenações injustas e da instauração desnecessária de ações e ainda a redução de custos para a máquina judiciária.

Para que a investigação possa atingir resultados satisfatórios, o estado necessita de aprimoramentos, e de adequação às novas tecnologias, além de ajustar a legislação à prática investigativa, de modo a garantir a ocupação desse espaço pela defesa, compreendendo as nuances constitucionais de ampla defesa e devido processo legal que não podem ser exclusivas da fase processual.

Quanto às diversas inovações, que vem sendo constantemente inseridas no mercado da tecnologia, é possível citar as inegáveis contribuições das ciências do campo da tecnologia da informação e do ramo da biociência, dentre outros. Todavia, para fins de delimitação do objeto de análise e de um melhor aproveitamento desse estudo, será observada a estrutura atual da perícia no país no tocante à intervenção de novas ferramentas atreladas ao exame do perfil genético para a produção da prova pericial.

O presente trabalho se debruçará sobre o cenário das perícias no país, através de pesquisas desenvolvidas na área da segurança pública e da literatura acerca dos temas de perícia e investigação preliminar.

Se buscará apresentar os benefícios e as desvantagens da implementação do exame a partir do DNA, sopesando possíveis riscos, alinhados as necessidades

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dos institutos de perícia do Brasil, considerando os insumos físicos e recursos humanos disponíveis.

Nessa esteira, também será tratado de que forma a defesa de um suspeito ou indiciado poderá contribuir com a investigação, ainda na fase do inquérito, pois, embora esse não seja o foco dessa pesquisa, se demonstrou relevante mencionar a participação do defensor nesse momento pré-processual, levando em conta o exíguo espaço que lhe foi atribuído nessa etapa e os óbices que encontra para a efetivação plena do exercício das suas prerrogativas.

Ademais, por se verificar enquanto instrumento valioso ao processo, também será demonstrado de que forma a prova colhida no inquérito impacta na instrução e qual a pertinência que guardam com as decisões proferidas.

Será avaliada, também, a responsabilidade dos poderes estatais para a consecução de uma justiça efetiva que vise à redução da impunidade e o fortalecimento da área de segurança pública.

Para a elaboração desse trabalho será realizada pesquisa bibliográfica e jurisprudencial, de natureza qualitativa, através da consulta a livros, publicações acadêmicas, sites especializados, além de estudo de casos, bem como, da legislação correlata, analisando a doutrina e a jurisprudência pátria quanto ao tema escolhido.

O estudo também será pautado tanto em pesquisas relacionadas à perícia, desenvolvidas na área de planejamento da segurança pública, quanto em produções televisivas, quais sejam documentários que retratam o cotidiano da elaboração de perícias e que reportam a condução de alguns julgamentos emblemáticos que possuem ligação com a temática abordada.

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2 AGENTES DA PRODUÇÃO DE PROVA PARA ALÉM DAS NORMATIVAS DO CÓDIGO DE PROCESSO PENAL

A atividade recognitiva do juiz, segundo explica Lopes (2016)1, consiste em recriar, através da prova uma realidade mais aproximada possível dos fatos que se julga ocorridos num passado.

A respeito do verdadeiro objeto de julgamento no processo, nos ensina Nunes (2009, p. 163) que “parece óbvio asseverar que o juiz não julga os fatos in natura, tal como eles se verificaram no mundo fenomênico, mas apenas a versão desses fatos, de acordo com a prova carreada aos autos”.

Poder-se-á atribuir aos agentes produtores da prova a função de locutores, os quais emitem um parecer sobre determinado objeto ou situação destinado a convencer, ou ao menos induzir, o juiz nos termos da conclusão do seu relatório.

É elementar que tal produção se dê em consonância com a mesma legislação que cuida do processo, a despeito de ocorrer fora do mesmo, em etapa que antecede a ação penal, uma vez que, após o recebimento da ação, as peças de informação que embasaram o oferecimento da acusação passam a integrar o processo e, em se tratando de provas irrepetíveis, são únicas e decisivas para a elucidação dos fatos.

Todavia, o Código de Processo Penal, ao tratar dessa matéria não regulamenta os pormenores da produção da prova, qual seja, especificamente a prova pericial analisada no presente trabalho.

O que há, nesse sentido, é apenas a distinção entre elementos informativos e prova, na qual o art. 1552 veda, expressamente, que o juiz utilize elementos meramente informativos, que não constituem provas em si, como motivação das suas decisões.

1 “É a prova que permite a atividade recognoscitiva do juiz em relação ao fato histórico (story of the case) narrado na peça acusatória. O processo penal e a prova nele admitida

integram o que se poderia chamar de modos de construção do convencimento do julgador, que formará sua convicção e legitimará o poder contido na sentença.”

2 Art. 155. O juiz formará sua convicção pela livre apreciação da prova produzida em

contraditório judicial, não podendo fundamentar sua decisão exclusivamente nos elementos informativos colhidos na investigação, ressalvadas as provas cautelares, não repetíveis e antecipadas. (Redação dada pela Lei nº 11.690, de 2008)

Parágrafo único. Somente quanto ao estado das pessoas serão observadas as restrições estabelecidas na lei civil. (Incluído pela Lei nº 11.690, de 2008)

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De tal sorte, a disciplina, para não dizer escassa, é omissa no que tange às condições de produção da prova pericial, deixando a cargo da legislação infraconstitucional que o faça, e essa normatização se veicula, geralmente, por meio de portarias expedidas pelos órgãos do poder executivo que cuidam da perícia.

A problemática, cabe esclarecer, não reside na espécie legislativa utilizada para abordar a temática, mas sim no fato de incumbir ao poder executivo essa função, o qual irá implementar o serviço de investigação da forma que se afigure mais econômica, sem atentar para a qualidade dos resultados que serão obtidos.

Desta forma, primeiramente temos que, os profissionais que estão diretamente envolvidos com a análise e o tratamento da prova são admitidos no serviço público segundo exigências próprias da administração pública, que não necessariamente guardam pertinência com o diploma processual penal.

Neste compasso, situação mais complexa é a das condições de manejo das provas, quais sejam laboratórios e ferramentas utilizadas para perícia de coisas e pessoas, porquanto não há, ainda que breve, regulamentação do CPP que defina esses critérios, de modo a padronizar procedimentos ou de garantir a utilização da tecnologia disponível.

Diante desse cenário, a intenção deste capítulo é a de apontar algumas falhas identificadas na fase pré-processual que compreende o inquérito e a produção da prova pericial, apresentando e analisando as condições de trabalho dos agentes que protagonizam essa etapa.

2.1 Da formação profissional do condutor do inquérito: nulidades e provas inservíveis à elucidação dos fatos

A atividade investigativa sofre a incidência de limitações que ditam as balizas da atuação estatal. Nas palavras de Soares (2014, p.65), denomina-se direito probatório o subsistema de normas jurídicas que, direta ou indiretamente, regulamentem a reconstrução dos fatos sob julgamento.

Partindo da compreensão de que o inquérito policial é, também - mas não apenas-, um dos principais elementos informativos que norteiam a acusação e instruem a ação penal, é necessário um olhar cauteloso para a fase pré-processual e a produção de provas nesse momento.

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De acordo com Ritter (2018, p.16) sendo o inquérito policial um meio de preparação para eventual propositura de ação penal, a investigação realizada nessa fase pode evitar a instauração de uma ação que, venha a se mostrar infrutífera por ausência de provas ou de materialidade do delito, após todo um desgaste para o acusado e movimentação da máquina estatal, situação que poderia ter sido concluída ainda na fase pré-processual.

É possível, então, perceber que a função da investigação preliminar não é meramente informativa e não se configura apenas como procedimento burocrático que se presta a integrar uma denúncia. Mais do que isso, o inquérito é meio idôneo e capaz de obstar a persecução criminal, quando não observadas as hipóteses autorizadoras para início de uma ação penal.

No ordenamento jurídico brasileiro a função de operar a fase pré-processual foi atribuída à polícia judiciária, embora sem exclusividade, salvo exceções consignadas no texto constitucional, conforme acentuado por Walter Nunes (2015, p.398).

Tal estrutura foi pensada com o intuito de que não houvesse participação do órgão julgador no momento de produção da prova, já que esse contato tende a interferir na convicção do juiz. Em consonância com esse pensamento, afirma Almeida (2016, p. 217) que não é sem razão que a polícia judiciária, não integra a estrutura do Poder Judiciário, e sim pertence ao Poder Executivo, pois explica que tal estrutura constitucional se dá para prevenir a possível contaminação do Estado-juiz, na medida em que pudesse controlar a atividade policial, no que diz respeito às suas investigações.

Nas palavras de Nunes (2015, p. 413), o juiz só deve atuar na fase investigatória, para resolver questões acerca da adoção de medidas ou da produção de provas, às quais a lei e a Constituição imponham restrição, de tal sorte que ao judiciário não cabe substituir a polícia ou o Ministério Público nessa função.

Nesta toada, para desempenhar suas funções, a polícia necessita dispor de certa independência e autonomia, pois, como é evidente, a investigação não pode estar a serviço de interesses particulares, mas da coletividade.

Neste sentido, Almeida (2016, p. 225) se filia a esse posicionamento ao pontuar que a investigação criminal preliminar deve ser realizada por órgão independente e descomprometido com as etapas posteriores da persecução, com o intuito de evitar a contaminação decorrente da cumulação de funções distintas, para

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que o material produzido na investigação preliminar seja fornecido em igualdade de condições à acusação e a defesa, para que sejam melhor elaboradas durante a fase judicial.

A Constituição Federal de 1988, pautada nas garantias do indivíduo, consignou a exigência de que devem ser observados os direitos da pessoa que se ache submetida à persecução penal, podendo tal imposição ser entendida como extensão da garantia do devido processo legal. Embora o inquérito, por constituir a fase pré-processual, em tese, não compreenda as imposições destinadas ao processo acusatório, entendemos que as mesmas garantias devem ser estendidas à fase preliminar.

O Código de Processo Penal3 dita que o inquérito será conduzido pela autoridade policial a quem será incumbido o dever de fornecer as informações necessárias à instrução e ao julgamento do processo.

O conceito de autoridade policial, nada obstante venha sendo objeto de discussão4 no âmbito da carreira policial, civil e federal, culturalmente, está atrelada ao cargo de Delegado de Polícia, tal como pretendeu o legislador ao utilizar essa expressão para fazer referência ao responsável pela condução dos procedimentos de investigação, embora não haja definição desse termo no Código de Processo Penal.

Ora, não se trata de excluir os agentes policiais das atividades de investigação, mas de estabelecer o comando dessas operações, pois ao instituir essa liderança se admite a participação dos agentes nos procedimentos investigativos, uma vez que se há comandante, pressupõe-se que hajam também comandados.

3 Art. 4º A polícia judiciária será exercida pelas autoridades policiais no território de suas

respectivas circunscrições e terá por fim a apuração das infrações penais e da sua autoria.

Art. 13. Incumbirá ainda à autoridade policial:

I - fornecer às autoridades judiciárias as informações necessárias à instrução e julgamento dos processos;

II - realizar as diligências requisitadas pelo juiz ou pelo Ministério Público; III - cumprir os mandados de prisão expedidos pelas autoridades judiciárias; IV - representar acerca da prisão preventiva.

4 A Federação Nacional dos Policiais Federais – FENAPEF elaborou a NOTA TÉCNICA Nº

003/2016-FENAPEF, na qual vincula o posicionamento de que o termo “autoridade de policial” não deve ser restrito ao cargo de delegado de polícia, uma vez que é inerente a todos os agentes públicos policiais que integram os órgãos de polícia definidos pela Constituição da República Federativa do Brasil.

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Em relação à atribuição de tal competência, o Ministro do Supremo Tribunal Federal, Gilmar Mendes, em decisão ao Recurso Extraordinário 593.727/MG5, adotou entendimento de que a polícia militar possui competência para lavratura de Termo Circunstanciado de Ocorrência (TCO) em casos de crime de menor potencial ofensivo, sob a afirmação de que a conferência dessa atribuição não estaria deslegitimando nenhuma das corporações envolvidas (polícia civil e militar).

A respeito da trajetória do delegado de polícia em nosso ordenamento pátrio, nos informa Lucena (2014)6 que o cargo de Delegado de Polícia nem sempre existiu

no ordenamento jurídico brasileiro e que nos primórdios da atividade contava com a feição de função policial comum, de modo que, a carreira veio a ser estruturada apenas em 1808, havendo período em que a profissão já foi extinta e momento em

que as autoridades policial e judicial. Atualmente, temos o Código de Processo

Penal de 1941 e a Constituição da República de 1988 como marcos da retomada desta carreira jurídica e para a definitiva distinção entre essas autoridades.

Deste modo, não ocasiona espanto o fato de que muitas das nulidades observadas nos processos judiciais são provenientes de ocorrências verificadas durante o inquérito policial, de acordo com o que pontua Cardoso (2012, p.159), o trabalho investigativo vem sendo realizado em condições inapropriadas, com estruturas comprometidas e escassez e deficiência dos instrumentos. Menciona ainda a ausência de suporte psicológico preventivo, além da má remuneração da categoria, aliada à extrema dependência financeira do Estado, bem como chama atenção para o déficit de profissionais.

Aliado a este cenário, o fator burocrático agrava essa situação. A rotina de cartório e remessas infindáveis entre Delegacia e Ministério Público pulveriza a investigação, em vários sentidos. O principal deles é o da duração do inquérito, pelo que se excede – e muito – os prazos estabelecidos pelo CPP. Além disso, na prática, as formalidades se sobressaem ao exame acurado dos fatos, e o simples acúmulo e envio de papéis, que nada explicam, se torna suficiente.

5 O RE foi julgado pelo plenário em 14 de maio de 2015, teve como relator o Ministro Gilmar

Mendes, que teve seu voto acompanhado pelos ministros Celso de Melo, Ayres Britto, Joaquim Barbosa, Luiz Fux, Rosa Weber e Cármen Lúcia; vencidos Cezar Peluso, Ricardo Lewandowski, Dias Toffoli e Marco Aurélio. Nos termos do voto do relator, se afirmou a tese de que o Ministério Público dispõe de competência para promover investigações, por autoridade própria e em prazo razoável.

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Relativamente ao aspecto da duração do inquérito, Silveira (2013, p.50) explica que a eficiência do instituto implica na conclusão da atividade em tempo razoável, ainda que se trate da constatação pela negatória de autoria ou pela impotência das forças policiais em apontar a materialidade e autoria para certos casos. Relata que isso não necessariamente constitui uma falha, sendo um resultado passível de se obter.

Ainda com relação a este ponto, Silveira também defende que é inimaginável a dilação do inquérito sem que se estabeleçam parâmetros temporais de duração bem delimitados, sob a mera e corriqueira justificativa de a investigação encontrar-se em andamento. Destaca que a manutenção de um inquérito em aberto por extenso período de tempo, sendo remetido da Delegacia para o Ministério Público e vice-versa, revela a sua própria ineficiência como peça capaz de justificar um indiciamento consistente.

No que toca a função atribuída ao delegado, Silveira pontua que o cargo conta com poucas permissões e proibições designadas pela legislação, o que abre margem para uma atuação muito mais pautada na prática forense do que nos atos formais emanados pelo legislador, o que nem sempre resulta na forma correta de realização das ações.

Ademais, merece destaque o fato de que, apesar de veiculada na Constituição de 1988, é possível considerar recente a exigência do título de bacharel em direito para o ingresso na carreira de delegado. Tínhamos, portanto uma investigação comandada por um profissional destituído de conhecimentos básicos acerca dos direitos e garantias dos investigados. Tal realidade que perdurou por tanto tempo não pode ser ignorada, tampouco pode-se esquecer o impacto originado em razão disso e o ranço de diversas práticas, impregnado até os dias atuais.

Hodiernamente, o diploma legal que regulamenta a atividade de investigação criminal conduzida pelo delegado de polícia é a lei n° 12.830 de junho de 2013, na qual se estabelece, em seu art. 2°7, que as funções exercidas pelo delegado de

7 Art. 2º As funções de polícia judiciária e a apuração de infrações penais exercidas pelo

delegado de polícia são de natureza jurídica, essenciais e exclusivas de Estado.

§ 1º Ao delegado de polícia, na qualidade de autoridade policial, cabe a condução da investigação criminal por meio de inquérito policial ou outro procedimento previsto em lei, que tem como objetivo a apuração das circunstâncias, da materialidade e da autoria das infrações penais.

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polícia são de natureza jurídica, de onde se extrai a exigência do título de bacharel em direito para o ingresso na carreira.

É possível concluir que tal exigência deriva do mandamento constitucional de que a investidura em cargo público depende da demonstração de competências específicas das quais demande o cargo, mediante a aprovação em concurso público de provas e títulos.

Desta feita, é indiscutível que tal condicionamento foi inserido pela Constituição e legislação infraconstitucional com o intuito de conferir a aplicação das garantias inerentes aos acusados, também, na fase pré-processual. No entanto, cabe salientar que essa transição entre profissionais ainda não foi totalmente efetivada, tendo em vista ser recente a referida imposição.

Para se lograr êxito na fase inquisitorial, de acordo com os moldes constitucionais, deve-se capacitar os agentes da investigação para que promovam, além da busca pela verdade dos fatos, as garantias necessárias para os envolvidos, acusados, vítimas e demais possíveis afetados.

Todavia é preciso abandonar também os estigmas que descredibilizam as instituições policiais e a figura do delegado de polícia que, costumeiramente são bombardeados pela sociedade e pela mídia sensacionalista, devendo receber também o devido espaço dentre as demais carreiras jurídicas.

Conforme expressa Barilli (2018, p. 286), o Delegado de Polícia não pode receber tratamento depreciativo em comparação com as demais carreiras jurídicas, tendo em vista ser integrante de carreira técnica, com expertise específica, cuja função é sobremaneira relevante na fase preparatória da persecução criminal. Orienta o autor que, não é concebível que o inquérito policial sirva como instrumento de garantias sem que o seu condutor tenha autonomia e independência funcional imprescindíveis para efetivá-las.

As garantias não podem ser encaradas como óbice à investigação, pois consubstanciam a sua razão de ser. Ademais, o compromisso do investigador é com a prova, embora seja um compromisso eivado de subjetividade, uma vez que, previamente se formulam hipóteses, que tentaram ser verificadas no decorrer das atividades de perquirição.

§ 2º Durante a investigação criminal, cabe ao delegado de polícia a requisição de perícia, informações, documentos e dados que interessem à apuração dos fatos.

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Desse modo, a procura seletiva por informações possui a tendência de confirmar a hipótese originária que haja sido aceita pelo menos uma vez, o que normalmente ocorre quando se obtém informações que ratificam uma preconcepção, daí onde reside a preocupação quanto à imparcialidade da investigação preliminar, que exige um comprometimento por parte do comandante da operação de não formular posições que possam interferir na coleta de provas.

2.2 Profissionais legistas e condições de trabalho sob a perspectiva da literatura forense

Segundo a inteligência do art. 158 do Código de Processo Penal8, a perícia é obrigatória nos casos em que haja vestígios. O mencionado artigo está localizado topograficamente no Capítulo II que cuida do exame de corpo de delito e das perícias em geral, inserido no Título VII que se refere à prova.

Sobre a definição da prova pericial, Nunes (2009, p.216) traz a lume a existência de uma discussão quanto ao tipo de prova pericial, se seria meio de prova, tal como as demais espécies previstas no ordenamento jurídico; ou uma espécie de prova testemunhal, já que se trataria de um testemunho prestado em juízo por pessoa especialista em área específica do conhecimento; e ainda, que a perícia seria mais do que prova, na medida em que consiste em uma análise técnica, confeccionada por profissional expert em determinada matéria.

De toda sorte, a perícia, lato senso, pode ser desenvolvida por experts de diversas áreas do conhecimento a depender do objeto periciado e da situação que se pretenda revelar. Os profissionais pertencem desde a categoria das ciências exatas, como as engenharias e ciências da informação e tecnologia até ciências biomédicas, além de outras formações. Nesta breve análise, o enfoque está sobre os agentes que realizam a perícia de crimes violentos, especificamente o perito Criminal, o perito médico legista, o papiloscopista e o agente de necropsia.

8 Art. 158. Quando a infração deixar vestígios, será indispensável o exame de corpo de

delito, direto ou indireto, não podendo supri-lo a confissão do acusado.

Parágrafo único. Dar-se-á prioridade à realização do exame de corpo de delito quando se tratar de crime que envolva: (Incluído dada pela Lei nº 13.721, de 2018)

I - violência doméstica e familiar contra mulher; (Incluído dada pela Lei nº 13.721, de 2018)

II - violência contra criança, adolescente, idoso ou pessoa com deficiência. (Incluído dada pela Lei nº 13.721, de 2018)

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Trata-se, pois, do trabalho de tornar algo tangível (material colhido) em algo de natureza intangível (prova/convencimento). Isso porque, de um lado se tem as evidências coletado na cena do crime e do outro lado da esteira, findado o processamento, estão as interpretações e conclusões compactadas em um parecer. Acerca do trabalho a ser desenvolvido pela área de perícia específica da medicina legal, nos valemos dos ensinamentos de Rodrigues, Silva e Truzzi, (2010, p.3) os quais explicam que a medicina-legal é composta, principalmente, por médicos-legistas, que realizam os exames de necropsias em cadáveres, nos casos de morte violenta, a exemplo de homicídios, suicídios e acidentes, e que também procedem a exames de corpo delito em pessoas vivas, que foram submetidas a algum ato de violência, ou acidente, bem como testes de alcoolemia, por exemplo.

Como é racional inferir, a atividade do perito não pode ser pautada em subjetivismos ou concepções pessoais acerca do objeto periciado. É cautela a ser tomada pelo médico perito, também de acordo com Rodrigues, Silva e Truzzi (2010, p. 50, destaques dos autores), não basear suas conclusões em suposições, probabilidades ou possibilidades, pois na atividade médico-pericial não há lugar para achismos, sendo dever ético do médico-legista fundamentar seus pareceres em fatos concretos e situações objetivas, de modo a não deixar qualquer margem para interpretações inconsistentes.

Também cumpre ressaltar que tais profissionais necessitam de constante aprimoramento das técnicas das quais se utilizam e, para isso, demandam de treinamento e capacitação periódicas, de acordo com o que nos explica a literatura em perícia médica.

O Conselho Federal De Medicina (2012, p.41-42) explica que o curso de Medicina é o de maior carga horária entre os cursos da área da saúde. Nada obstante esse fato, a constante evolução científica impõe aos profissionais médicos a periódica necessidade de aprimoramento, de modo que o tempo regular da graduação proporciona sólida base ao médico, mas que não o possibilita atuar como perito em todos os campos da Medicina, por isso se faz necessário treinamento específico voltado para o ramo da medicina legal.

No entanto, em descompasso a esse pensamento, o Conselho Regional de Medicina do estado do Ceará (2005)9 editou parecer n° 9/05 estabelecendo que

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concurso público para médico perito não está autorizado a exigir título de especialização em perícia médica como pré-requisito para investidura no cargo. No mesmo sentido, o Conselho Federal de Medicina (1998)10, por meio do parecer n° 33/98, dispõe que a perícia médico-judicial prescinde do título de especialista.

Ora, se é sabido que os conhecimentos básicos em medicina carecem de complementação para a atuação em perícia forense, é contraditório estabelecer vedação a exigência de nível de especialização desses profissionais, principalmente tendo em vista que, em muitos casos, não recebem algum tipo de capacitação quando ingressam no serviço.

Em relação ao plano de aperfeiçoamento dos servidores que trabalham com a perícia, o Diagnóstico de Perícia no Brasil realizado pela Secretaria Nacional de Segurança Pública (SENASP, 2011) verificou que o percentual de unidades pelo país, nos quais há oferta de capacitação para o seu quadro de profissionais é exíguo, sendo que algumas dessas unidades fornecem treinamento apenas para alguns setores, como unidades de chefia:

Figura 1 - Percentual de unidades de medicina legal cujos profissionais participaram de cursos de capacitação ou atualização, por UF, 2011.

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Fonte: Brasil (2012, p.69).

Fator que também contribui sobremaneira para o cenário de escassez de profissionais é a remuneração percebida pelos agentes, que indicam a desvalorização das categorias, elemento responsável pela deflagração de greves ao redor do país.

De acordo com o Diagnóstico de Perícia da SENASP (2012) a média salarial dos peritos criminais e médicos legistas é de pouco mais de R$ 5.000,00 (cinco mil reais) e papiloscopistas, pouco mais de R$ 2.000,00 (dois mil reais), havendo estados que remuneram em valor bem abaixo da média, conforme os gráficos a seguir:

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Fonte: Brasil (2012, p. 64-66).

Atrelada a essa realidade também se depara o profissional da perícia com a inexistência de plano de carreira em muitos estados do país, de acordo como também apontado pelo referido diagnóstico, muitos estados não contam com esse tipo de progressão:

Figura 3 - Existência de plano de carreira para peritos criminais, por UF, 2012.

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A partir de um olhar superficial, a atividade desenvolvida por um perito criminal já demonstra certo grau de complexidade, pois lida diretamente com situações naturalmente indigestas como mortes, variados tipos de violência física e abusos diversos.

Contudo, além da tortuosa missão de identificar a ocorrência de um crime e reconstituí-lo na tentativa de decifrar sua execução, a realidade enfrentada pela equipe de perícia nos institutos técnicos-científicos pelo país revela que a profissão pode ser ainda mais fatigante.

Estudo do Conselho Federal de Medicina (2012) que se dedicou a análise do trabalho desenvolvido por peritos apontou que a carga de estresse a que se submetem esses profissionais tem desencadeado um quadro de sintomas de ordem psicológica.

Contudo, de acordo com o Ministério da justiça (2014, p.10), 63% das unidades de medicina legal não disponibilizam assistência psicológica aos profissionais do setor, o que sugere que a condição desses profissionais, embora dentre as hipóteses com alto risco de incidência de doenças psicológicas, não recebe a atenção necessária.

Ademais, as condições precárias de labor desses técnicos em nada favorecem, tanto a elaboração de pareceres de qualidade que sejam conclusivos, quanto um ambiente minimamente salubre do ponto de vista físico e psicológico.

Neste tocante, o Conselho Federal de Medicina (2012, p.64) traça algumas considerações e recomendações sobre o tema, no intuito de tornar mais proveitoso o exercício da profissão dos médicos legistas. Pontua sugestões como condições de segurança nos locais de trabalho, de modo a aumentar a confiança e reduzir o estresse do profissional; melhoria na estrutura do ambiente de trabalho, como equipamentos e insumos necessários à atuação médico-pericial; remuneração digna, além de treinamentos e atualizações constantes a serem fornecidos pelas próprias instituições em que o perito exerça suas atividades.

Conforme evidenciado neste capítulo é possível concluir que os profissionais que realizam perícia no Brasil necessitam de melhor estrutura para o desenvolvimento satisfatório de suas funções, tais como melhoria na remuneração, criação e revisão de planos de carreira e ofertas de capacitação e atualização

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periódicas, além de ambiente salubre e acompanhamento psicológico à disposição nas unidades de perícia.

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3 O DNA E A GENÉTICA FORENSE: A CIÊNCIA A SERVIÇO DA JUSTIÇA PARA A SOLUÇÃO DE CRIMES VIOLENTOS

O direito, como é sabido, não possui condições de, isoladamente, oferecer respostas a todas as situações jurídicas observadas no contexto das relações humanas. Para tal mister, o jurista busca amparo em diversas ciências, as quais emprestam seus pressupostos e critérios próprios aos operadores do direito.

Conforme demonstrado no capítulo anterior, não seria possível ao judiciário, sem a contribuição de experts pertencentes aos mais variados ramos do saber, enfrentar grande parte das demandas propostas, especialmente no âmbito criminal, em que, na quase totalidade dos casos, não se discute matéria de direito e sim fática.

Neste capítulo será abordado como atuam a biologia e a química forense no exame de crimes cometidos sob violência física, com foco em uma técnica não tão recente, mas ainda pouco explorada no Brasil, especialmente pelos institutos de perícia menos modernos, e que vem, cada vez mais, sendo protagonista da investigação criminal.

Trata-se da análise de perfil genético, consistente na extração de DNA e comparação com padrões existentes, por meio da qual é possível a identificação da autoria de crimes, ou ao menos, fornece indícios para se chegar ao agente suspeito. Tal técnica está atrelada à ciência da química forense, a qual compreende a análise de alguns campos temáticos, tais como a toxicologia, a tanatologia, a asfixiologia, a hematologia, bioquímica, dermatoglifia, semenologia e análise físicoquímica instrumental de acordo com Miranda (2007, p.115).

A tipagem do DNA pode ser um auxiliar poderoso da ciência forense. De acordo com o Conselho Nacional de Pesquisa (1999, p.1), o método foi usado pela primeira vez em 1985 no Reino Unido, nos Estados Unidos no fim de 1986 por laboratórios comerciais e em 1988 pelo Federal Bureau of Investigation (FBI).

Sua utilidade não se limita a inspeção de tipos específicos de crimes, podendo se aplicar ao exame de qualquer caso de delito que apresente vestígios. Todavia, é possível verificar o emprego dessa técnica, principalmente, em casos de homicídio, agressão física e, sobretudo, em casos de estupro. Segundo o Conselho Nacional de Pesquisa dos Estados Unidos (1999, p.20) “entre os crimes com taxa

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elevada de recidiva, o caso mais comprovado é o de estupro, porque os criminosos deixam material biológico (sêmen) que pode permitir sua identificação”.

O procedimento de extração e análise demanda a observância de uma rotina específica de procedimentos a ser executada. Conforme nos explicam Dolinsky e Pereira (2007, p.9) “o procedimento inclui sete etapas: Coleta da amostra; Isolamento do DNA; Corte do DNA; Separação dos fragmentos; Transferência do DNA; Hibridização de sondas; e perfil do DNA”.

Neste compasso, é possível observar que não se trata de um processo simples e exige a capacitação dos profissionais ainda que estes possuam, em tese, qualificação acadêmica para tal.

Outra questão que merece realce é a forma como a sociedade percebe essa ferramenta, pois, não raras vezes, é atribuída a esta tecnologia uma carga demasiada de expectativas quanto à apresentação de resultados inequívocos e à resolução de crimes. Quanto a este ponto, é preciso se atentar para algumas limitações enfrentadas por toda e qualquer técnica.

Com efeito, Dolinsky e Pereira (2007, p.12) consideram as técnicas de identificação através da análise do DNA a maior revolução científica na esfera forense desde o reconhecimento das impressões digitais como uma característica pessoal. Os autores apresentam duas vantagens dessa técnica em relação aos métodos convencionais de identificação, a estabilidade química do DNA, em razão da resistência de sua composição, mesmo após longos períodos; bem como a sua existência em todas as células nucleadas do organismo humano, fator que permite identificar um suspeito por meio de uma única gota de sangue ou de um único fio de cabelo encontrado na cena do crime.

Todavia, é possível discordar de alguns apontamentos apresentados na produção supramencionada. De fato, é inegável a contribuição revolucionária prestada à justiça criminal, não só pela análise do DNA, como pela ciência em geral, todavia há que se ter cuidado com afirmações de que a prova produzida através do exame do perfil genético tem o condão de, por si só, condenar ou absolver suspeitos. Tal questão será melhor examinada adiante.

Além de representar uma inovação enquanto método que permite a realização de perícias mesmo diante de casos com exígua quantidade de material encontrado, o perfil genético apresenta algumas vantagens particulares. Em compasso com o que expressa a obra de Luciana Dolinsky e Lissiane Pereira (2007,

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p.7), o DNA é resistente às muitas condições que destroem a maioria dos outros compostos biológicos, como as proteínas, e são necessárias apenas pequenas quantidades de DNA.

Apesar dessas vantagens, que podem ser obtidas através de técnicas que ampliam e conservam o material coletado, a análise de perfil genético não oferece resultados inquestionáveis em razão da possibilidade de degradação e contaminação pelo material biológico de outrem, podendo conter ainda material de pessoa estranha ao crime, de forma natural ou propositalmente plantada.

A respeito dessa possibilidade, interessante mencionar a situação ocorrida com o norte-americano Steven Avery11, condenado a pena de dezoito anos por um crime que não cometeu, em razão da manipulação das provas e condução da acusação pela promotoria e o xerife do distrito de Manitowoc, no Wiscosin, EUA. O caso foi contado no ano 2015 pela produtora de entretenimento Netflix através do documentário em formato de série ‘Making a murderer’, ganhando ainda mais visibilidade.

Há uma série de cautelas que devem ser adotadas e há que se considerar o alto risco de atribuir completo crédito a essa prova tendo em vista as variáveis que cercam seu pleno êxito em apontar uma conclusão.

Contudo, o fato de uma técnica não oferecer o máximo grau de confiabilidade não é razão para se descartar essa ferramenta, até porque não há meio algum que proporcione uma conclusão que possa ser infalível, completamente confiável e verificável. De todo modo, a extração e análise do material genético remanesce se apresentando uma solução útil e exitosa para a investigação criminal.

Isso porque tem contribuído decisivamente para a resolução de diversos casos emblemáticos. Além de que a perícia brasileira não pode furtar-se de trilhar os caminhos da evolução, permanecendo com o mesmo modo arcaico de investigação.

E aqui não se está a afirmar que a prova por DNA deva ser mais ou menos acreditada ou que possua um maior valor probatório, posto que seria uma pretensão incompatível com o sistema do livre convencimento motivado em que se abandona a ideia de prova tarifada, cujo valor é pré estabelecido. Todavia, o juiz está livre para fundamentar sua decisão exclusivamente nessa análise, em razão de constituir uma

11 “Steven Avery foi condenado em 1985, pelo tribunal de Manitowoc, no Wiscosin, pelos

crimes de violação e homicídio de uma mulher. Depois de cumprido 18 dos 32 anos de pena, Avery foi exonerado graças a exames de DNA e libertado.”

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prova técnica, que apresenta mais confiabilidade do que outros meios, a exemplo do reconhecimento pessoal feito pela vítima.

O que se pretende afirmar é que a prova genética é de fundamental importância e configura meio idôneo se cercada de segurança na sua produção, e é exatamente o que se reitera, pois antes da disseminação dessa tecnologia é preciso fornecer qualidade a ela, sendo necessário gerar protocolos de confiabilidade.

Portanto, é preciso sempre se atentar para a necessidade de análise dessa prova em cotejo com todas as demais provas coligidas na instrução.

3.1 O cenário brasileiro em estatísticas

No desiderato de mapear e identificar a realidade da produção de perícias criminais no Brasil, a Secretaria Nacional de Segurança Pública. Vinculada ao Ministério da Justiça, realizou uma pesquisa que culminou na produção intitulada Diagnóstico da perícia criminal no Brasil (2011). O documento foi elaborado com o propósito de fornecer subsídio para o implemento de ações de fortalecimento da perícia forense, visando a diminuição da criminalidade violenta através da redução da impunidade, com foco no aprimoramento da produção da prova técnica.

Na pesquisa se buscou mapear como os Estados e o Distrito Federal se organizam para executar as análises periciais. Para isso foram divididas em três grandes áreas, sendo elas a Criminalística, a Medicina Legal e a Identificação. O estudo constatou que cada unidade federativa possui estruturas organizacionais distintas e que, em linhas gerais, a maior parte delas atua nessas três áreas. Também revelou-se latente a necessidade de desenvolvimento da técnica de análise do DNA, que sequer é aplicada em, pelo menos, seis estados, de acordo com BRASIL (2011, p.18).

É certo que não basta a existência de aparato de alta tecnologia para a produção de uma prova confiável. O método empregado no exame e o manuseio do material impactam sobremaneira no produto final. É preciso instituir uma padronização dos processos de coleta e armazenagem, de forma a minimizar riscos de contaminação e perda de material. Desse modo, um protocolo meramente formal indicando a abertura do procedimento de perícia não supre essa necessidade de cuidado que deve ser de trato prático por parte do agente que realiza a coleta e do profissional que avalia a amostra. Neste sentido, constatou o Diagnóstico da Perícia

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Criminal no Brasil (2012, p.70) que, em mais da metade das unidades centrais de Criminalística, de Medicina Legal e de Identificação, os vestígios não são lacrados quando coletados no local de crime e nem guardados em local seguro para a preservação de suas características, e que também não há rastreabilidade dos vestígios na maior parte dessas unidades. Atrelado a esse aspecto, os dados apontam, ainda, para a inexistência de procedimentos de cadeia de custódia na Criminalística, funcionando apenas a parte burocrática relativa ao protocolo de recebimento e encaminhamento dos vestígios dentro das unidades.

Neste interim, é possível citar, como sendo um dos principais cuidados, de observância fundamental, a cadeia de custódia da prova, que revela a cronologia dos acontecimentos, pelo que se torna imprescindível a sua preservação, pois, do contrário estará eivada de vícios a conclusão final dessa prova. Vejamos o que foi verificado pelo Diagnóstico da Perícia Criminal no Brasil em relação a este aspecto:

Um dos elementos fundamentais para se compreender os processos de trabalho da atividade pericial é a existência e o funcionamento da cadeia de custódia dos vestígios. Ela é essencial para a validação da prova técnica uma vez que possibilita a rastreabilidade do vestígio, ou seja, assegura o vínculo entre o material periciado e o fato investigado. A cadeia de custódia também possibilita documentar a cronologia da evidência e quem foram os responsáveis por seu manuseio. O Brasil não tem uma normativa geral sobre cadeia de custódia e o mesmo ocorre na grande maioria dos Estados, que ainda encontram fragilidades na gestão da atividade pericial (BRASIL, 2012, p.81).

Portanto, em face da ausência de normatização que discipline o processo de cadeia de custódia da prova, se faz necessário que os institutos de perícia operacionalizem protocolos que tratem da rotina desses procedimentos, evitando, assim, o rompimento dessa cadeia.

É interessante ressaltar que, hodiernamente, as corporações adotam sistemas de gestão informatizado para otimizar fluxos de processos de trabalho, essa ferramenta permite o alcance de resultados mais satisfatórios ao final da cadeia produtiva. Todavia, conforme demonstrado pela pesquisa que culminou no Diagnóstico da Perícia Criminal no Brasil (2012), diversos estados ainda não adotam esse tipo de gerência:

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Figura 4 - Existência e abrangência dos sistemas informatizados, em porcentagem, nas unidades pesquisadas, 2012.

Fonte: Brasil (2012, p.39).

É possível atribuir, em parte, o déficit da perícia criminal brasileira, em termos de resolutividade de casos e índices de produção ao fato de não haver, na estrutura organizacional, a padronização de processos, por meio de uma rotina institucional de procedimentos e de um sistema informatizado de gestão.

Outro aspecto preocupante e que merece destaque é a carência de recursos materiais12 nas unidades de perícia, que vão desde insumos básicos, como reagentes químicos, até equipamentos de custo mais elevado, como câmaras frigoríficas para acondicionamento de corpos.

Ainda com relação ao aludido diagnóstico13, também foi constatado por ocasião do estudo que não há, na maioria das unidades federativas, rotina de

12 Segundo a Secretaria Nacional de Segurança Pública, a regularidade no fornecimento de

reagentes é de suma importância para a realização dos exames e a pesquisa desenvolvida aponta que as unidades de medicina legal e de identificação, núcleos componentes dos institutos de perícia não recebem esses reagentes de forma contínua (BRASIL, 2012, p.43).

13 “A avaliação interna dos laudos periciais é um item importante para assegurar sua

qualidade, uma ve que é executada por meio de um processo de revisão em que os próprios profissionais de perícia repassam o trabalho sistematizado por seus colegas, visando identificar eventuais incorreções” (BRASIL, 2012, p.91).

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avaliação interna para aferir critérios de qualidade, e parte das unidades que realizam esse controle avaliam somente aspectos formais.

Outro quesito observado foi a produtividade, no qual se considerou a quantidade de requisições realizadas às unidades e a quantidade de laudos expedidos, no intuito de compreender a capacidade dos órgãos de atender às demandas.

Neste aspecto, surpreende o fato de que as informações coletadas em relação ao atendimento de requisições realizadas no ano de 2011 sugeriram um panorama de alta capacidade de atendimento das demandas, o que chega a ser, no mínimo, incongruente com o cenário evidenciado a partir dos demais fatores analisados, tais como materiais e métodos de produção da perícia.

Isso se explica pelo fato de que tais informações foram fornecidas pelas próprias entidades, que, ante a ausência de vistoria por parte da SENASP para verificar a procedência dos dados alusivos à produtividade, podem ter repassado dados incompatíveis com a realidade vivenciada nas unidades, ocorrência que pode, inclusive, ser originada pela inexistência de sistema informatizado de requisições e confecção de laudos.

Ademais, conforme se verá no item seguinte deste trabalho, restou constatada a incapacidade de atendimento às requisições por parte do instituto de perícia do estado do Rio Grande do Norte, que conta com um número expressivo de demandas atrasadas e ausência de suporte para dar seguimento ao trabalho dentro de prazo regular, mas que, ao revés dessa situação, declarou à pesquisa promovida pela SENASP (2012) ter alcançado o percentual de 100% (cem por cento) de atendimento de requisições, de acordo com a ilustração adiante:

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Figura 5 - Percentual de atendimento da demanda de casos de 2011 nas unidades de medicina legal, por UF, 2011.

Fonte: Brasil (2012, p.109).

Deste modo, os dados relativos à perícia no estado do Rio Grande do Norte, constantes na pesquisa da Secretaria Nacional de Segurança Pública, se encontram em descompasso com a situação relatada pelas inspeções promovidas pelo Ministério Público desse estado, que originaram a abertura de inquéritos civis, bem como de reportagens que também registraram a situação.

3.2 A face do sistema de perícias no Rio Grande do Norte

A temática das condições da perícia no Brasil, em razão da extrema precariedade verificada, recebeu destaque pela mídia nacional através da produção do documentário “Desafios da Segurança Pública no Brasil”, exibido pelo programa Fantástico14, da Rede Globo de Televisão.

A produção partiu do relato de aumento vertiginoso da taxa de homicídios na capital do estado do Rio Grande do Norte, que passou de 10 para 70 mortes por

14FANTÁSTICO - Desafios da Segurança Pública no Brasil, exibido em 29/04/2018 consistiu

em uma reportagem em que se evidenciou a situação da perícia criminal e a atuação da polícia ostensiva em alguns estados do país, como fatores preponderantes para os crescentes níveis da criminalidade.

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cada 100 mil habitantes, observadas, principalmente, em virtude da disputa de facções criminosas pelo mercado do tráfico ilícito de entorpecentes.

O documentário demonstra que no Instituto Técnico de Perícia do Estado não há laboratório de DNA e nem programa de computador para análise de impressões digitais, de modo que as digitais coletadas nas cenas de crime são comparadas manualmente pelos peritos que somam, em todo o estado, a quantidade de 23 profissionais.

A reportagem ainda mostrou a situação de peritos que se sujeitam a laborar em suas residências, devido à ausência de infraestrutura nas unidades do ITEP/RN, os quais relatam a insatisfação em executar suas funções dadas as referidas condições.

Ainda em torno da temática da Segurança Pública, há outra reportagem elaborada pelo Fantástico, alusiva a mesma realidade já explanada, na qual também se narra as condições em que se desenvolve a investigação no país. O relato se intitula “Situação da perícia criminal no Brasil”15.

A produção retratou a atuação de peritos que trabalham in loco, ou seja, que colhem, na cena do crime, o material a ser periciado, sem o subsídio de auxiliares de perícia e muitas vezes até sem motorista para efetuar a condução do perito ao local da ocorrência.

Foi relatado, também, o posicionamento da Associação Brasileira de Criminalística, que considera o número de peritos no Brasil insuficiente, apontando que deveria haver, no mínimo, 38 mil profissionais em atividade, no entanto, o país conta apenas com 6,5 mil agentes, quantidade quase seis vezes menor que o ideal, que seria de perito 01 para cada 30 mil habitantes.

A situação chega a ser extrema quando se observa que perante a ausência de equipamentos básicos, tais como uma câmera fotográfica, não é possível dar cumprimento às diligências indispensáveis à investigação, paralisando o curso de inquéritos que resultam em casos sem solução, sendo arquivados pois insuficientes para embasar uma denúncia.

O mais preocupante é que não se está diante apenas da ausência de maquinário moderno e ferramentas avançadas, mas da carência de recursos

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