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LUIZ GUSTAVO DOS SANTOS FERREIRA *

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Academic year: 2021

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O Ensino de História como Aliado no Processo Identitário dos Remanescentes dos Índios Cariris na Comunidade Poço Dantas Distrito de Monte Alverne Crato-CE

LUIZ GUSTAVO DOS SANTOS FERREIRA*

Este estudo pretende analisar a importância do ensino de história no processo Identitário dos descendentes dos índios Cariris, residente na comunidade Poço Dantas localizada no distrito de Monte Alverne na cidade do Crato – CE. Tendo como possíveis fontes os depoimentos dos alunos, da professora e os livros didáticos utilizados. Buscamos compreender as práticas pedagógicas que foram desenvolvidas em uma sala de aula existente no local destinada ao ensino da EJA – Educação de Jovens e Adultos durante o período de 2008 a 2010.

No que diz respeito à temática indígena, podemos afirmar que, ao longo dos anos se criou um estereótipo do que é ser índio e de uma cultura indígena, imagina-se um sujeito de pele morena, cabelos lisos e poucas vestes, habitando a mata, vivendo da caça e da pesca e como detentores de ritos e costumes particulares aos seus semelhantes, além de serem vistos como algo do passado estando em fase de desaparecimento, esse imaginário social existente em torno do índio contribui para que este seja reconhecido perante uma parcela da sociedade pelas suas características físicas, o próprio termo índio, pode-se afirmar, faz referência a um grupo específico, distinto as demais camadas da sociedade.

Levando em consideração segundo dados do IBGE – Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística, que a população indígena encontra-se em mais de 800 mil, distribuídos em diversas etnias, cada uma com seus hábitos, ritos e crenças diferentes, além da mestiçagem de raças provenientes do período da colonização, podemos afirmar que é inviável a definição de índio por suas características físicas e culturais.

*Graduando da Universidade Regional do Cariri – URCA, Campus Pimenta, Crato –CE, Professor Orientador Dr. Francisco Egberto de Melo

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conceito proposto pela FUNAI – Fundação Nacional do Índio, presente no Estatuto do Índio (Lei n°. 6.001, de 19.12.1973, Art. 3°) atualmente responsável por promover a educação e assegurar os direitos básicos das comunidades indígenas pode-se dizer que:

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Art.3º Para os efeitos de lei ficam estabelecidas as definições a seguir

discriminadas:

I - Índio ou Silvícola - É todo indivíduo de origem e ascendência pré-colombiana que se indentifica e é intensificado como pertencente a um grupo étnico cujas características culturais o distinguem da sociedade nacional.

II - Comunidade Indígena ou Grupo Tribal - É um conjunto de famílias ou comunidades índias, quer vivendo em estado de completo isolamento em relação aos outros setores da comunhão nacional, quer em contatos intermitentes ou permanentes, sem, contudo estarem neles integrados.

Podemos afirmar que o índio ou comunidade indígena passa a ser aqueles que se auto identificam etnicamente como sendo pertencentes a um grupo étnico, este critério contribui consideravelmente com o aumento da população indígena do país nos últimos vinte anos, como mostram os dados do IBGE coletados no período de 1991 quando população indígena encontrava-se em média de 294.131 habitantes, a 2010 quando esta se encontrava em média com 817.936 habitantes, este critério de auto identificação é alvo de discussão por especialistas e governantes considerando a possibilidade de interesses políticos por trás desse processo de identificação.

Atualmente existem diversas comunidades que se auto identificam indígenas em busca de reconhecimento pelas autoridades vigentes, dentre estes, destacamos o qual se tornou objeto deste estudo, os remanescentes da tribo Cariri, residentes na comunidade Poço Dantas, que atualmente estão em processo de reconhecimento antropológico e outros direitos constitucionais.

Levando em consideração a comunidade do Poço Dantas e o processo pelo qual se encontram na busca pelo reconhecimento como índios, pretende-se com o estudo, compreender como o ensino de história e as práticas pedagógicas que foram aplicadas durante o período de funcionamento da sala de aula contribuíram com o processo Identitário da comunidade.

Para a realização deste estudo, torna-se imprescindível a abordagens de conceitos como o de cultura, identidade e do próprio índio como também a coleta de depoimentos com intuito de analisar como o ensino proposto nessa sala de aula contribuiu na evocação de uma memória coletiva e consequentemente com o fortalecimento da identidade dos sujeitos. Como afirma Joel Candau:

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(...) é a memória, podemos afirmar que vem fortalecer a identidade, tanto no nível individual quanto no coletivo: assim, restituir a memória desaparecida de uma pessoa é restituir a sua identidade (...) o trabalho de memória atua na construção da identidade do sujeito. (CANDAU, 2012, p.16).

Sendo assim podemos afirmar que, a memória é de fundamental importância na construção da identidade. É partindo deste conceito, que buscaremos compreender a pedagogia trabalhada nesta sala de aula e sua contribuição na elaboração de representações responsáveis por restituir a memória - identidade dos habitantes da comunidade.

A sala de aula que falamos encontra-se localizada na comunidade de Poço Dantas, Distrito de Monte Alverne a mais de 20 km de distância do centro da cidade do Crato-CE. A comunidade abriga cerca de cinquenta famílias de remanescentes dos índios Cariris. No que diz respeito ao aspecto habitacional, em sua maioria, as casas são de tijolos, salvo alguns casos em específico em que ainda encontram-se casas de taipa, todas dispõe de energia elétrica, devido à localização se torna difícil à comunicação por aparelhos telefônicos.

Levando em consideração a situação da comunidade, vale salientar a importância do ensino no local, em especial o da EJA, para os sujeitos em questão, detendo-se ao fato de que, a maioria deles, anterior ao funcionamento da sala de aula no local eram analfabetos. No entanto, cabe ressaltar que por trás de um projeto de alfabetização indígena a sala de aula desempenhou um papel fundamental no processo de auto reconhecimento

O período de funcionamento da sala de aula vai do ano de 2008 a 2010, durante este período recebeu apoio pedagógico da prefeitura da cidade do Crato – CE e da Universidade Regional do Cariri através da PROEX – Pró Reitoria e Extensão. Em relação à estrutura, esta era feita de tronco de árvores recoberta com palhoça, construída pelos próprios moradores da comunidade, recebeu o nome de Luís Felipe Cariri, em homenagem ao garoto símbolo para os habitantes do Poço Dantas, falecido aos 15 anos de idade após um mal estar durante uma partida de futebol. Segundo depoimentos coletados foi o garoto incentivador dos adultos a frequentarem a sala de aula, como podemos observar a seguir: “(...) por causa dele que começamos a estudar, ele sempre dizia: era bom uma escola aqui para esse povo mais velho estudar, aprender pelo menos a assinar o nome”. (Evânia Pereira da Silva Cariri, remanescente indígena habitante do Poço Dantas).

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Logo, a escolha desse tema visa evidenciar no tocante da problemática, a importância do ensino de história a comunidades indígenas, e como este pode contribuir nos processos de fortalecimento da identidade étnica dos diversos grupos existentes.

Com base nos depoimentos coletados até o momento, constatamos que não existiu uma disciplina história no currículo da escola do Poço Dantas, no entanto se evidencia o ensino desta através de práticas que remetem a memória dos habitantes pré-colombianos, eram perpassados aos alunos os costumes, as técnicas de sobrevivência na mata, em geral, a forma como viviam os índios no período anterior a colonização.

Partindo desta lógica, percebemos a existência de um ensino de história independente á grade curricular, que age no processo de elaboração de representações dos sujeitos da comunidade sobre seus antepassados, possibilitando o fortalecimento da identidade étnica, esta que se constrói no âmbito das interações sociossituacionais como afirma Candau:

(...) as identidades não se constroem a partir de um conjunto estável e objetivamente definível de “traços culturais” – vinculações primordiais -, mas são produzidas e se modificam no quadro das relações, reações e interações sociossituacionais – situações, contexto, circunstâncias, de onde emergem os sentimentos de pertencimento, “de visões de mundo” identitárias ou étnicas. ( CANDAU, 2012 p.27)

Nota-se que inexiste uma identidade cultural imóvel, particular a um sujeito, esta se encontra em constante mudança, e se modifica a partir do momento que o indivíduo interage com o seu meio social, produzindo como afirma Stuart Hall (1992) o sujeito pós-moderno, aquele que não possui uma identidade fixa. Essa variação no processo de identificação dificulta o auto reconhecimento do indivíduo como podemos analisar:

Esse processo produz o sujeito pós-moderno, conceptualizado como não tendo uma identidade fixa, essencial ou permanente. A identidade torna-se uma "celebração móvel": formada transformada continuamente em relação às formas pelas quais somos representados ou interpelados nos sistemas culturais que nos rodeiam. E definida historicamente, e não biologicamente. O sujeito assume identidades diferentes em diferentes momentos, identidades que não são unificadas ao redor de um "eu" coerente. (HALL, 2006 p.2).

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Como vimos anteriormente, este caráter mutável pertencente à identidade dificulta o processo de auto reconhecimento do sujeito, da comunidade em si, é neste ponto que podemos ressaltar a importância do ensino de história e as práticas desenvolvidas em sala de aula no processo de fortalecimento Identitário e restituição da memória coletiva.

O grande desafio está em como se passam das formas particulares as coletivas de identidade e memória, tendo em vista que se faz fundamental para uma busca identitária dos moradores do Poço Dantas a restituição de uma memória coletiva de um conjunto de lembranças comuns ao grupo e que os identifiquem como pertencentes a uma comunidade indígena. Podemos inicialmente afirmar que, as práticas desenvolvidas em sala de aula, o ensino da história indígena, abordando as crenças, comportamentos e costumes, atuam como aliado neste percurso de elaboração de uma identidade coletiva e da construção de um núcleo memorial.

(...) a identidade cultural ou coletiva é certamente uma representação. Exemplos não faltam para mostrar que, de maneira constantemente renovada, os indivíduos percebem-se, imaginam-se, membros de um grupo e produzem diversas representações quanto á origem, história e natureza desse grupo. (CANDAU, 2012 p.25)

É a partir desta história que foi perpassada aos alunos do Poço Dantas que se constituem as reflexões e representações a respeito de seus antepassados indígenas, esta contribui para evocação do sentimento de pertencimento e a formação de uma nova visão de mundo partindo do seio da comunidade, será a memória ali compartilhada que formará a identidade deste grupo, neste aspecto nota-se o quão importante é o ensino de história como aliado na restituição da memória e formação da identidade.

Considerando as constantes transformações pelo qual estão sujeitas a sociedade moderna, vemos o ensino de história nesta comunidade como um artifício modelador das práticas sociais e constituinte de um caráter Identitário dos moradores do local.

Atualmente, o conceito de cultura é amplamente discutido por estudiosos, antropólogos, e pode-se dizer que ainda não se chegou a uma compreensão exata deste conceito, enfim, podemos afirmar que a cultura é dinâmica encontra-se em constante estado de mutabilidade, e é resultado do aprendizado e de experiências compartilhadas por membros

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de determinados grupos. No entanto, inexiste uma cultura única, particular a um determinado grupo, pois esta muda de acordo com o tempo, mudanças estas provenientes do contato com outros padrões culturais, sendo assim podemos afirmar que:

(...) cada sistema cultural está sempre em mudança. Entender esta dinâmica é importante para atenuar o choque entre as gerações e evitar comportamentos preconceituosos. Da mesma forma que é fundamental para a humanidade a compreensão das diferenças entre povos de culturas diferentes, é necessário saber entender as diferenças que ocorrem dentro do mesmo sistema. Este é o único procedimento que prepara o homem para enfrentar serenamente este constante e admirável mundo novo do porvir. (LARAIA, 1986 p.101).

Partindo desta afirmação proposta por Laraia (1986), podemos afirmar que é imprescindível compreender as dinâmicas culturais, tendo em vista que, as culturas indígenas não se perdem, pelo contrário estão em um processo de reconstituição identitária de uma forma diferenciada. Nota-se que é neste aspecto que o ensino de história veio a auxiliar a comunidade do Poço Dantas, pois possibilitou os moradores o acesso a informações sobre as práticas e costumes de seus ascendentes contribuindo para elaboração de uma identidade coletiva, de um sentimento de pertencimento dos moradores ao grupo dos índios Cariris.

Tendo em vista que é o trabalho da memória que atua na construção da identidade dos sujeitos, e que são as relações com os diversos grupos da sociedade que vão moldar seus comportamentos e práticas culturais, podemos destacar que a história ensinada e as práticas pedagógicas desenvolvidas na comunidade do Poço Dantas, não se reterão somente ao ensino em sala de aula, se construíram processos educativos através do contato com outros grupos remanescentes dos índios Cariris, como os que residem na cidade de Crateús, estes passaram pelo processo de reconhecimento antropológico e atualmente são considerados índios pelas autoridades competentes.

Na interação entre estes grupos, os remanescentes habitantes de Crateús visitaram a comunidade e desenvolveram com eles, atividades antes vistas pelos habitantes do Poço Dantas somente em sala de aula através do conteúdo perpassado pela professora. Dentre as atividades desenvolvidas com os moradores estão o artesanato, característico da cultura indígena, lhes foram ensinados o trato e a utilização de sementes na fabricação de colares e do instrumento que eles chamam de maracá, feito com uma cabaça e no seu interior composto por sementes, utilizado nas danças e rituais, o manejo do couro e das penas na fabricação do cocar, além de rituais como o toré, este símbolo para os indígenas é praticado de maneiras

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diferentes de acordo com o grupo, mas em geral possui significado tanto religioso como festivo, no caso específico, consiste em uma dança com passos organizados em círculo e com o tom frequente das pisadas, além do som produzido pelo maracá.

É notória nesta prática, a presença de um ensino de História que ultrapassa os limites do livro didático e do cotidiano em sala de aula. Tendo em vista que a identidade cultural se constrói a partir das representações produzidas pela memória e se modifica constantemente através das relações sociais, podemos afirmar que são essas experiências de contato com outros grupos étnicos que contribuem para um fortalecimento de uma identidade coletiva, do sentimento de pertencimento dos moradores ao grupo indígena, é essa memória que será compartilhada pela comunidade do Poço Dantas que agirá como meio de formação de uma identidade.

Vale ressaltar que o ensino de história encontrado na sala de aula da comunidade do Poço Dantas vai além de um ensino sobre a história indígena, ele atua como um meio de consolidar a memória e fortalecer a identidade de um grupo remanescente de índios que buscam o reconhecimento antropológico, sendo assim como afirma CANDAU (2012, p.19) “Não há busca identitária sem memória e, inversamente, a busca memorial é sempre acompanhada de um sentimento de identidade, pelo menos individualmente”.

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REFERÊNCIAS BIBLIOGRAFICAS

CANDAU, Joel. Memória e Identidade; Tradução Maria Leticia Ferreira. – 1. ed., 1° reimpressão. – São Paulo: Ed. Contexto, 2012.

HALL, Stuart. A Identidade Cultural na Pós-Modernidade – 11. Ed. – Rio de Janeiro: DP&A Ed., 2006.

LARAIA, Roque de Barros. Cultura: Um Conceito Antropológico -14. ed.- Rio de Janeiro: Jorge Zahar Ed., 2001.

Lei 6.001- 19 de Dezembro de 1973 disponível em:

http://www.funai.gov.br/quem/legislacao/estatuto_indio.html acesso em 09.02.2014 ás 16:28:09 horas.

População, segundo a situação do domicílio e condição de indígena- Brasil 1991/2010

disponível em: http://indigenas.ibge.gov.br/graficos-e-tabelas-2 acesso em 09.02.2014 ás 18:03:09 horas.

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