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Elementos do teatro no ensino de língua inglesa em escolas públicas estaduais

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Academic year: 2021

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UNIVERSIDADE TECNOLÓGICA FEDERAL DO PARANÁ

DEPARTAMENTO ACADÊMICO DE LÍNGUAS ESTRANGEIRAS MODERNAS CURSO DE ESPECIALIZAÇÃO EM ENSINO DE LÍNGUAS ESTRANGEIRAS

MODERNAS

TASSIA RAFFO SETTI

ELEMENTOS DO TEATRO NO ENSINO DE LÍNGUA INGLESA EM ESCOLAS PÚBLICAS ESTADUAIS

MONOGRAFIA DE ESPECIALIZAÇÃO

CURITIBA 2016

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TASSIA RAFFO SETTI

ELEMENTOS DO TEATRO NO ENSINO DE LÍNGUA INGLESA EM ESCOLAS PÚBLICAS ESTADUAIS

Trabalho apresentado ao Curso de Especialização em Línguas Estrangeiras Modernas da Universidade Tecnológica Federal do Paraná, como requisito parcial para obtenção do título de Especialista. Orientadora: Profª Drª Marcia Regina Becker.

CURITIBA 2016

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FOLHA DE APROVAÇÃO

ALUNO (A): Tassia Raffo Setti

CURSO: ESPECIALIZAÇÃO EM ENSINO DE LÍNGUAS ESTRANGEIRAS

MODERNAS (Lato Sensu)

TÍTULO DA MONOGRAFIA: Elementos do Teatro no Ensino de Língua Inglesa

em Escolas Públicas Estaduais.

DATA DA DEFESA: 14 de setembro de 2016.

BANCA EXAMINADORA:

Profª Marcia Regina Becker (Profª Orientadora)

Profª Maristela Pugsley Werner

Curitiba, 14 de setembro de 2016.

Obs: A folha de aprovação assinada encontra-se na Coordenação do Programa.

Dep. Acadêmico de Línguas Estrangeiras Modernas – DALEM

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RESUMO

O presente trabalho constitui-se em uma pesquisa bibliográfica sobre o aumento da motivação de professores e alunos a partir da inserção de elementos do teatro no ensino/aprendizagem de língua inglesa em escolas públicas estaduais. À luz de Vigotski (2003), busca-se entender a importância de atividades lúdicas no desenvolvimento de crianças e adultos e quais empecilhos do ensino público podem ser contornados por metodologias que incluem o uso do teatro em sala de aula. Para tanto, são recolhidos relatos de professores com este tipo de experiência em diversas línguas estrangeiras modernas. Pretende-se, por fim, motivar professores de língua inglesa a experimentar metodologias baseadas no teatro em sala de aula, acreditando-se na sua eficácia.

PALAVRAS-CHAVE: Ensino de língua inglesa. Teatro em sala de aula. Motivação.

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ABSTRACT

This work is a bibliographic research on the increased motivation of teachers and students from the insertion of theater elements when teaching/learning English in public schools. In light of Vygotsky (2003), we seek to understand the importance of

play activities in the development of children and adults. We also aim to learn what

obstacles of public education the methods that include the use of theater in the classroom can overcome. Therefore, we collect several reports from teachers of modern languages who have had this type of experience. It is intended to motivate English-speaking teachers to experience methodologies based on theater in the classroom, since we believe in the effectiveness.

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SUMÁRIO

1 INTRODUÇÃO ... 5

2 A ESCOLA PÚBLICA ... 9

2.1 O SUJEITO E A FINALIDADE DA ESCOLA ... 9

2.2 A ORGANIZAÇÃO DA EDUCAÇÃO BÁSICA ... 11

2.2.1 Organização do Ensino Fundamental e do Ensino Médio ... 12

2.3 BASE TEÓRICA E ENCAMINHAMENTOS METODOLÓGICOS PARA A EDUCAÇAO BÁSICA NA DISCIPLINA DE LÍNGUA ESTRANGEIRA ... 13

3 O TEATRO NA APRENDIZAGEM ... 16

3.1 O PAPEL DO LÚDICO NO DESENVOLVIMENTO DA APRENDIZAGEM ... 16

3.2 JOGOS TEATRAIS X JOGOS DRAMÁTICOS ... 18

3.3 DRAMA X TEATRO ... 20

4 EXPERIÊNCIAS, TÉCNICAS E MÉTODOS ... 23

4.1 Dramatização a partir de poemas ... 24

4.2 TiLL MODEL ... 25

4.3 A literatura dramática como ponto de partida ... 27

4.4 Aplicando os jogos teatrais de Spolin ... 31

4.5 Minha experiência enquanto participante de um Drama Club ... 33

4.6 Sugestões para a sala de aula ... 34

5 MOTIVANDO O ALUNO ATRAVÉS DO TEATRO ... 38

CONSIDERAÇÕES FINAIS ... 43

REFERÊNCIAS ... 45

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1 INTRODUÇÃO

A partir do meu dia a dia em sala de aula como professora de língua inglesa, percebi que os professores de escolas públicas sentem-se desmotivados em sua profissão por diversas razões. Entre as principais, aparecem: baixo salário, descaso do governo/pouco investimento na educação, falta de interesse dos alunos, falta de acompanhamento familiar sobre a vida escolar dos alunos, salas superlotadas e desvalorização da profissão. Também estão desmotivados os alunos; muitos têm a sensação de que não se pode aprender inglês na escola, ou possuem dificuldade no conteúdo e não têm contato com o inglês no dia a dia. Os professores desmotivados acabam, muitas vezes, dando aulas cansativas e tradicionais, o que desmotiva, também, os alunos, como constatado por Gouveia (2012).

Para vencer alguns obstáculos de ensino, como aulas tradicionais, falta de recursos pedagógicos e alunos tímidos (que acabam por participar menos das aulas), muitos professores de língua inglesa têm apostado em atividades lúdicas para tornar mais divertido o aprendizado no dia a dia, tais como músicas, livros literários, filmes e jogos. Vigotski (2003) já apontava em seus estudos a importância do lúdico no desenvolvimento e na aprendizagem das crianças, afirmando que a arte pode estimular, simultaneamente, os aspectos cognitivo, afetivo, motor e social. Ainda assim, segundo Japiassu (1998), "o ensino das artes na educação escolar brasileira segue concebido por muitos professores, funcionários de escolas, pais de alunos e estudantes como supérfluo, caracterizado como lazer, recreação ou luxo" (p. 82-83). Partindo da visão da arte como grande ferramenta de desenvolvimento infantil, percebe-se, através de estudos, que o teatro, normalmente explorado apenas na disciplina de Artes nas escolas regulares, pode ser um grande motivador de aprendizagem. Japiassu (1998) traça um histórico de como se começou a estudar as inter-relações entre Teatro e Educação, a partir dos estudos de Vigotski:

A sistematização de uma proposta para o ensino do Teatro, em contextos formais e não-formais de educação, através de jogos teatrais, foi elaborada pioneiramente por Viola Spolin ao longo de quase três décadas de pesquisas junto a crianças, pré-adolescentes, adolescentes, jovens, adultos e idosos nos Estados Unidos da América. Utilizando a estrutura do jogo com regras como base para o treinamento de teatro, Viola Spolin ambicionava libertar a criança e o ator amador de comportamentos de palco mecânicos e rígidos. Seus esforços resultaram no oferecimento de um detalhado programa de oficina de trabalho com a linguagem teatral destinado a escolas, centros comunitários, grupos amadores e companhias teatrais. A

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base de sua proposta pedagógica em procedimentos do teatro improvisacional interagiu com o movimento de renovação cênica do Teatro (do qual participou ativamente Moreno e que teve inicio nas primeiras décadas deste século, em todo o planeta) repercutindo intensamente no meio educacional brasileiro sobretudo a partir dos anos setenta, após a experimentação de seu sistema de jogos teatrais pelo grupo de pesquisadores da ECA-USP em Teatro-Educação, liderados por Ingrid Koudela, responsável pela tradução brasileira de seu livro Improvisação para o Teatro, publicada pela editora Perspectiva (p. 85).

Assim, acredita-se que a finalidade do teatro na educação escolar é o desenvolvimento cultural e pessoal dos participantes através do domínio da comunicação e do uso interativo da linguagem.

Esta monografia constitui-se em pesquisa bibliográfica, cujo objetivo é pesquisar quais elementos do teatro podem ser inseridos no dia a dia de aprendizes de inglês como língua estrangeira, especialmente no contexto de escolas públicas, para motivar os alunos a aprender e a sair da sua zona de conforto. A fim de atingir este objetivo, é necessário:

1. entender o contexto da escola pública e como ocorre o ensino de língua estrangeira moderna, buscando em documentos oficiais o que se espera do papel do professor e quais o resultados a serem alcançados em cada etapa dos ensinos fundamental e médio, bem como as habilidades que os alunos precisam desenvolver ao longo dos seus estudos.

2. pesquisar o papel da motivação no processo de ensino/aprendizagem de uma segunda língua ou LEM, buscando, também, dados que revelem a influência que as atividades lúdicas (dentro de sala de aula) exercem sobre este processo em crianças e adolescentes.

3. pesquisar como o teatro pode contribuir para a melhora no ensino/aprendizagem em escolas públicas, observando quais foram os resultados de professores que tenham inserido elementos do teatro no seu dia a dia em salas de aula.

Nelly Zafeiriadou (2009) aponta que o uso de atividades espontâneas e tarefas improvisadas intensifica o engajamento dos alunos e favorece o crescimento pessoal e a expressão criativa. Gouveia (2014b), após seu estudo e a aplicação de jogos teatrais no ensino de inglês em salas de aula de escola pública, relata diversas melhoras nos seus alunos submetidos a atividades como jogos dramáticos e

teatrais. E, ao pensar o ensino de teatro, faz-se necessário também incluir o ensino

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Vários são os fatores comportamentais que impedem os alunos de assimilarem o que é ensinado em sala de aula. Inibição e dispersão são problemas que se sobressaem e notavelmente prejudicam o relacionamento professor-aluno. Pensando nisso, acreditamos na inserção didática de atividades ligadas ao teatro como recurso facilitador estratégico da aprendizagem da língua estrangeira, no caso, inglês. O texto de teatro e sua leitura interpretada, ou

dramatizada, conceito aqui entendido como a busca de

aprofundamento na interpretação que possibilite ler com sentimento, constituem-se em ferramenta de grande relevância, quando se pensa nos benefícios obtidos na leitura, na dicção e clareza da fala, competências e habilidades tão necessárias ao futuro docente, assim como no favorecimento da explicitação de ideias subjetivas quanto aos sentidos das obras, entre outros benefícios. Sabemos que os alunos precisam exercitar a socialização do seu pensamento. Este tipo de atividade otimiza as possibilidades dos discentes se perceberem como seres sociais no relacionamento com seus semelhantes, tanto os colegas como o/a professor/a. [...] A utilização da leitura dramatizada na aula de língua inglesa representa potencial auxílio para os que desejam se aperfeiçoar, mas ainda não conseguiram vencer a inibição da fala. Aprender inglês encenando certamente pode ser uma experiência nova, que venha auxiliar a superar o incômodo bloqueio da oralidade, talvez a maior dificuldade de quem busca o bom conhecimento de um idioma estrangeiro. [...] Dessa forma, atenuam-se barreiras e abrem-se caminhos para um aprendizado espontâneo e real (Ibid, p. 1)

Fonseca (2013) ressalta, ainda, que aulas dadas desta maneira são mais dinâmicas e, por isso, podem gerar mais resultados do que aulas formais/tradicionais, e que não têm como foco a formação de atores, e sim o favorecimento da "espontaneidade, a desinibição, a tomada de decisão, a prática da pronúncia, da leitura, da expressão corporal e da expressão comunicativa como um todo". (Ibid, p. 2)

Os resultados obtidos com a inserção do teatro no ensino de língua estrangeira dependem, no entanto, de que metodologia é utilizada em sala: qual é o objeto de ensino que o professor estabelece, qual é a sequência de atividades designada, quais habilidades prévias são exigidas dos alunos e quais serão trabalhadas no processo e, finalmente, qual (is) objetivo (s) se pretende atingir. Os objetivos, especialmente, é que guiarão todo o processo de ensino, e influenciarão na escolha da ferramenta de aprendizagem.

O teatro, por si só, apresenta um grande número de ferramentas. Quatorze (2014) elenca algumas delas:

Há cinco conceitos-chave importantes a ter em conta no

desenvolvimento desta temática – o jogo dramático, a mímica, a

improvisação, a interpretação de papéis e a simulação. No decurso das minhas leituras por diversas vezes estes conceitos me pareceram ambíguos e contraditórios, parecendo retratar as mesmas

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técnicas didáticas, sobretudo pelo facto de partilharem uma mesma característica: os aprendentes são convidados a representar um papel e a fingir ser alguém ou alguma coisa, colocando-se numa situação hipotética e imaginária de forma a atingirem um determinado objetivo linguístico e pedagógico. (QUATORZE, 2014, p. 27)

A autora diferencia em seu trabalho cada um destes 5 elementos, que são apenas algumas formas de se trabalhar com teatro em sala de aula. A partir de outros relatos lidos, percebemos que muitas vezes não há uma preocupação em se diferenciar e enumerar elementos do teatro. A maioria dos autores que propõem atividades com teatro em aulas de língua estrangeira o fazem de uma maneira generalizada, não distinguindo etapas como leitura de textos dramáticos, observação de representações de peças, realização de jogos usados em salas de aula de cursos regulares de teatro, atividades de role-play e ensaios e apresentações de peças na língua alvo.

Por causa desta falta de diferenciação, esta pesquisa destina-se a descobrir quais atividades dentre as citadas já foram inseridas em contextos reais de sala de aula de escolas regulares e quais foram os resultados decorrentes, especialmente os efeitos sobre a motivação dos alunos. Para tanto, veremos, ao longo do capítulo 2, o que dizem as Leis de Diretrizes e Bases da educação nacional e as Diretrizes Curriculares Nacionais da Educação Básica a respeito da estrutura da escola pública brasileira, do seu papel social, das leis que regem o ensino público e de como a língua estrangeira moderna está inserida neste meio. Já no capítulo 3, estabeleceremos alguns conceitos que dizem respeito ao papel do lúdico na aprendizagem, buscando justificar o teatro como ferramenta enriquecedora do processo de ensino em escolas públicas estaduais. No capítulo 4, serão mostradas experiências de diversos autores com o uso do teatro, dentro e fora de sala de aula, no ensino de língua estrangeira moderna. Por fim, no capítulo 5, escreveremos sobre a importância da motivação em aulas de língua estrangeira moderna, dando sugestões de como usar o teatro para motivar os alunos da denominada geração y.

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2 A ESCOLA PÚBLICA

Para um melhor entendimento de como o teatro poderia (ou não) se encaixar no processo de ensino e aprendizagem de inglês no contexto das escolas públicas, será feito, no decorrer deste capítulo, um apanhado das leis e diretrizes que regem o ensino no estado do Paraná, especialmente no que concerne à disciplina de língua estrangeira moderna, nos anos finais do ensino fundamental e no ensino médio.

2.1 O SUJEITO E A FINALIDADE DA ESCOLA

O conhecimento dos princípios gerais que regem as escolas, públicas ou privadas, e quais são os sujeitos que nelas estão, é o que permite que os educadores estabeleçam, em seus planos de ensino, quais conteúdos devem priorizar em cada disciplina e etapa de ensino. Só então poderemos refletir se o uso do teatro é viável e eficaz ao ser introduzido no ensino de língua estrangeira moderna.

Nesta seção veremos o que dizem dois dos principais documentos oficiais sobre a educação: as Leis de Diretrizes e Bases da educação nacional (doravante LDBs), de 1996, e as Diretrizes Curriculares Nacionais da Educação Básica (DCNs), de 2008. Estas referem-se principalmente ao ensino público estadual, apesar de pautarem-se nas LDBs.

As Diretrizes Curriculares Nacionais afirmam que todos os sujeitos da educação básica devem ter acesso ao conhecimento produzido pela humanidade, veiculado pelos conteúdos das disciplinas escolares, e que um dos papéis da escola é, portanto, ser lugar de socialização do conhecimento, o qual deve ser tratado de modo contextualizado. Dá-se ênfase também à importância dos conteúdos serem tratados de maneira interdisciplinar, e à proposição de que os conhecimentos adquiridos sirvam para tornar os sujeitos críticos "às contradições sociais, políticas e econômicas presentes nas estruturas da sociedade contemporânea". Deve-se propiciar a compreensão da "produção científica, a reflexão filosófica, a criação artística, nos contextos em que elas se constituem" (DCNs, 2008, p. 14). O documento propõe que se englobe, neste projeto, todos os sujeitos da escola

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pública, o que inclui, historicamente - justificando a existência desta -, estudantes oriundos de classes populares.

Um projeto educativo, nessa direção, precisa atender igualmente aos sujeitos, seja qual for sua condição social e econômica, seu pertencimento étnico e cultural e às possíveis necessidades especiais para aprendizagem. Essas características devem ser tomadas como potencialidades para promover a aprendizagem dos conhecimentos que cabe à escola ensinar, para todos. (DCN, 2008, P. 15)

Segundo a lei nº 9.394, de 20 de dezembro de 1996, artigo 1º, "A educação abrange os processos formativos que se desenvolvem na vida familiar, na convivência humana, no trabalho, nas instituições de ensino e pesquisa, nos movimentos sociais e organizações da sociedade civil e nas manifestações culturais." A lei estabelece que a educação deve ser direito de todos, independente da idade — caso o sujeito não tenha cursado o ensino regular na idade própria.

No artigo 2º, entre "os princípios e fins da educação nacional", está "o pleno desenvolvimento do educando, seu preparo para o exercício da cidadania e sua qualificação para o trabalho". De acordo com o artigo 3º,

Art. 3º O ensino será ministrado com base nos seguintes princípios:

I - igualdade de condições para o acesso e permanência na escola;

II - liberdade de aprender, ensinar, pesquisar e divulgar a cultura, o pensamento, a arte e o saber;

III - pluralismo de idéias e de concepções pedagógicas; IV - respeito à liberdade e apreço à tolerância;

V - coexistência de instituições públicas e privadas de ensino; VI - gratuidade do ensino público em estabelecimentos oficiais; VII - valorização do profissional da educação escolar;

VIII - gestão democrática do ensino público, na forma desta Lei e da legislação dos sistemas de ensino;

IX - garantia de padrão de qualidade; X - valorização da experiência extra-escolar;

XI - vinculação entre a educação escolar, o trabalho e as práticas sociais.

Ou seja, o artigo 3º estabelece uma série de princípios nos quais o ensino de qualquer disciplina escolar deve estar pautado. A língua estrangeira moderna se insere, aí, como elemento importante para a garantia do pluralismo de ideias e da igualdade de condições para o acesso e permanência na escola, pois, embora ainda seja vista por muitos como uma disciplina "extra" (um diferencial, e não uma necessidade), ela já está se tornando tão fundamental quanto as outras matérias escolares.

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Para entendermos melhor como a língua estrangeira moderna foi implantada entre tantas outras disciplinas escolares mais antigas, veremos como se organizam, de maneira geral, as escolas públicas paranaenses. Com isso, poderemos verificar a possibilidade real (prática) de se usar determinadas metodologias baseadas no teatro no processo de ensino/aprendizagem de inglês ou de outras línguas.

2.2 A ORGANIZAÇÃO DA EDUCAÇÃO BÁSICA

De acordo com a Lei 9394, 1996, art. 22,

a educação básica poderá organizar-se em séries anuais, períodos semestrais, ciclos, alternância regular de períodos de estudos, grupos não-seriados, com base na idade, na competência e em outros critérios, ou por forma diversa de organização, sempre que o interesse do processo de aprendizagem assim o recomendar. (LDB, art. 22)

Hoje vemos, nas escolas públicas do estado do Paraná, um maior número de escolas divididas em séries anuais, nas quais os alunos são matriculados por idade ou rendimento escolar. O ano letivo é normalmente dividido em bimestres ou trimestres. As aulas ocorrem de segunda a sexta-feira, com alguns sábados letivos, por cerca de 4 horas e meia, compreendendo a carga mínima anual de 800 horas distribuídas em um mínimo de duzentos dias de efetivo trabalho escolar, como consta no art. 24 da Lei 9394. A língua estrangeira moderna só é obrigatória a partir da quinta série do ensino fundamental, e sua escolha fica a cargo da comunidade escolar.

No que compreende o ensino de língua estrangeira moderna, é interessante mencionar o item IV do art. 24 da Lei 9394: "poderão organizar-se classes, ou turmas, com alunos de séries distintas, com níveis equivalentes de adiantamento na matéria, para o ensino de línguas estrangeiras, artes, ou outros componentes curriculares". No entanto, nas escolas públicas estaduais, percebemos uma grande resistência a este tipo de divisão. Usualmente, uma turma permanece organizada da mesma maneira em aulas de língua estrangeira ou de outra disciplina. Uma das razões é que o quadro de professores de uma escola é decidido pelo número de turmas existentes - o qual, por sua vez, é definido pelo número de alunos matriculados naquela série. Isto dificulta, de certa forma, uma organização por níveis de adiantamento na matéria. Esta falta de divisão é um fator que pode desestimular

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professores e alunos da rede pública, e será mencionado novamente no capítulo 3 e nas considerações finais deste trabalho.

Os currículos do ensino fundamental e médio têm uma base nacional comum, que é complementada, em cada estabelecimento de ensino, por uma parte diversificada - a qual inclui uma língua estrangeira moderna. Os conteúdos curriculares seguem as seguintes diretrizes:

I - a difusão de valores fundamentais ao interesse social, aos direitos e deveres dos cidadãos, de respeito ao bem comum e a ordem democrática;

II - consideração das condições de escolaridade dos alunos em cada estabelecimento;

III - orientação para o trabalho;

IV - promoção do desporto educacional e apoio às práticas desportivas não-formais. (LEI 9394, 1996, art. 27)

A proposta do currículo da educação básica é, portanto, fornecer ao estudante uma formação que lhe permita transformar a realidade social, econômica e política de seu tempo (Paraná, 2008). Veremos, na seção 2.3, o que propõe o currículo de Língua Estrangeira Moderna, e de que maneira ela se adéqua à Lei de Diretrizes e Bases.

2.2.1 Organização do Ensino Fundamental e do Ensino Médio

Segundo o art. 32 da Lei 9394, 1996, o ensino fundamental tem duração mínima de oito anos, e é obrigatório e gratuito na escola pública. Deve ser ministrado em língua portuguesa (exceto dentro das comunidades indígenas). O objetivo é desenvolver um cidadão: na sua capacidade de aprender e de ter domínio da leitura, da escrita e do cálculo; na sua compreensão do ambiente natural e social, do sistema político, da tecnologia, das artes e dos valores em que se fundamenta a sociedade; na sua capacidade de aprendizagem, tendo em vista a aquisição de conhecimentos e habilidades e a formação de atitudes e valores; no fortalecimento dos vínculos de família, dos laços de solidariedade humana e de tolerância recíproca em que se assenta a vida social. (Lei 9394, 1996, art.32)

Por sua vez, o ensino médio, que constitui a etapa final da educação básica, tem a duração mínima de três anos. Nele será consolidado e aprofundado o conhecimento adquirido no ensino fundamental. O educando também será

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preparado para o trabalho e a cidadania e aprimorará sua formação ética e autonomia intelectual e de pensamento crítico, podendo ainda compreender os fundamentos científico-tecnológicos dos processos produtivos, relacionando a teoria com a prática, no ensino de cada disciplina. (Lei 9394, 1996, art. 35)

Para o ensino médio, é afirmado, na lei, que a iniciativa dos estudantes será estimulada através de metodologias específicas para este fim. De acordo com o artigo 26,

§ 1º Os conteúdos, as metodologias e as formas de avaliação serão organizados de tal forma que ao final do ensino médio o educando demonstre:

I - domínio dos princípios científicos e tecnológicos que presidem a produção moderna;

II - conhecimento das formas contemporâneas de linguagem; III - domínio dos conhecimentos de Filosofia e de Sociologia necessários ao exercício da cidadania.

§ 2º O ensino médio, atendida a formação geral do educando, poderá prepará-lo para o exercício de profissões técnicas.

§ 3º Os cursos do ensino médio terão equivalência legal e habilitarão ao prosseguimento de estudos.

§ 4º A preparação geral para o trabalho e, facultativamente, a habilitação profissional, poderão ser desenvolvidas nos próprios estabelecimentos de ensino médio ou em cooperação com instituições especializadas em educação profissional. (LEI 9394, 1996, art. 26).

2.3 BASE TEÓRICA E ENCAMINHAMENTOS METODOLÓGICOS PARA A EDUCAÇAO BÁSICA NA DISCIPLINA DE LÍNGUA ESTRANGEIRA

Como consta nos documentos oficiais, o conteúdo estruturante do ensino de língua estrangeira moderna na educação básica é o discurso como prática social, que engloba uma série de questões linguísticas, sociopragmáticas, culturais e discursivas. Aqui, a língua é vista como interação verbal, que se dá por meio das práticas de leitura, oralidade e escrita. Doravante, o ensino de uma língua estrangeira não deve se dar através de exercícios para compreensão da sua gramática estrutural, mas sim por intermédio do estudo dos gêneros do discurso, com o objetivo de desenvolver a competência comunicativa do aluno. O objeto de estudo da disciplina de língua estrangeira moderna é, portanto, o texto.

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De acordo com Marcuschi (2008)1, todo trabalho em sala de aula deve partir de textos orais e escritos, tendo objetivo interativo. A enunciação, para o autor, é um ato social; por isso, a língua vive e evolui na comunicação verbal concreta. O texto, por sua vez, é uma unidade de sentido ou de interação, e a compreensão deste é uma atividade de construção de sentido: ou seja, o gênero é sempre uma ação social. Embora o autor se refira à língua portuguesa, o mesmo é solicitado pelos documentos oficiais já mencionados.

Os gêneros do discurso, para Bakhtin (2003), são formatações (enunciados) relativamente estáveis que possibilitam a compreensão e a produção de textos, além de qualquer forma de comunicação. Cada gênero sofre modificações de acordo com o contexto histórico e social em que está inserido. Sendo assim, bem como são infinitas as situações sociais possíveis, são também infinitos os gêneros do discurso. Para cada gênero há uma função diferente (informar, solicitar, vender, etc.). Essas funções determinam os tipos textuais: tipo injuntivo, argumentativo, informativo, entre outros. Por serem muitos, os gêneros costumam ser didaticamente distribuídos em esferas do conhecimento, ou domínios discursivos.

As esferas delimitam os gêneros segundo uma temática em comum e uma intenção enunciativa; isto é, são separados principalmente de acordo com sua função (científica, técnica, ideológica, oficial, cotidiana), seu tipo de enunciado e outras especificidades. A relativa estabilidade do enunciado permite que os gêneros transitem entre os domínios discursivos. Encontramos entre os gêneros textuais, por exemplo, aqueles que se situam na esfera acadêmica, fazendo parte especialmente do domínio discursivo universitário - dentre eles, há os de natureza oral e os de escrita, como resumo, resenha, fichamento, relatório, tese, dissertação, conferência, congresso, verbete, palestra, etc.

O que os documentos oficiais propõem tanto para a língua materna quanto para a língua estrangeira moderna é que, no ensino em sala de aula, seja gerada uma reflexão sobre diferentes gêneros textuais (verbais ou não verbais), pensando na sua composição, suporte, autor, objetivo e outras características que possibilitem

1

Embora Marcuschi seja reconhecidamente um escritor que fala do ensino de língua materna, ele pauta seus estudos em Bakhtin, que é o aporte teórico dos documentos oficiais sobre ensino/aprendizagem de língua estrangeira. A proposta dos documentos é similar, se não idêntica, à proposta de ensino de gêneros organizada por Marcuschi.

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o letramento do aluno. A reflexão sobre os gêneros discursivos permite que profissionais da área de letras sistematizem o conhecimento, tornando-se capazes de elaborar modelos e sequências didáticas passíveis de serem aplicados em sala de aula. Ensinar gêneros na escola parece ser uma forma eficaz, portanto, de promover o letramento dos alunos, uma vez que estar letrado implica o domínio dos gêneros discursivos em suas mais variadas situações sociais de uso, tanto orais quanto escritas.

Tendo em vista orientar o trabalho do professor com os gêneros do discurso, as Diretrizes Curriculares (Paraná, 2008) oferecem uma tabela com os conteúdos básicos a serem trabalhados dentro de cada exemplar de texto, estabelecendo uma abordagem teórico-metodológica a ser utilizada e o que deve ser avaliado dentro de cada conteúdo.

Como conteúdos básicos, são destacados os gêneros discursivos e seus elementos composicionais. As habilidades desenvolvidas durante o processo de ensino/aprendizagem são leitura, escrita e oralidade.

Com base na tabela, é possível verificar que qualquer gênero pode ser usado em sala de aula, desde que seja feito um planejamento de atividades adequado, contemplando as habilidades acima mencionadas. A sua escolha, no entanto, depende do nível de complexidade de cada série e do trabalho a ser feito. Ao pensarmos no teatro, entendemos que é possível trabalhar em sala tanto um texto dramático escrito quanto uma dramatização oral, já que ambos são gêneros do discurso. Entretanto, é necessário avaliar, primeiramente, quais seriam as vantagens em trazer o teatro como objeto de estudo de aulas da disciplina de língua estrangeira moderna, como veremos a seguir, no capítulo 3.

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3 O TEATRO NA APRENDIZAGEM

Ao pensarmos no uso do teatro como ferramenta de aprendizado de línguas estrangeiras, percebemos que o universo teatral é muito rico em elementos que podem ser levados à sala de aula. Em primeiro lugar, há o texto dramático, um gênero da esfera literária que pode ser trabalhado incansavelmente - desde os seus elementos composicionais até a análise linguística de características da segunda língua, passando obrigatoriamente pelos aspectos culturais desta. Em segundo lugar, é possível pensar num plano de ensino cuja etapa final seja uma performance teatral dos alunos.

Entretanto, a performance de qualquer peça teatral e a preparação de um ator exigem sempre um processo. Nas escolas de formação de atores, por exemplo, é comum que o ensino se dê por meio de jogos teatrais e dramáticos, os quais serão definidos na seção 3.2. De maneira geral, os jogos são atividades que, embora possam ser sequenciais e desenvolverem-se em termos de complexidade, não visam um espetáculo teatral, tornando-se ferramentas interessantes de trabalho com uma língua estrangeira. Veremos, no capítulo 4, o relato de implementação de jogos teatrais em aulas de língua inglesa de Gouveia (2012). Antes, porém, é necessário justificar o uso de atividades lúdicas em sala de aula.

3.1 O PAPEL DO LÚDICO NO DESENVOLVIMENTO DA APRENDIZAGEM

Os desafios no ensino e aprendizagem de uma língua estrangeira em salas de aula de escolas estaduais vão além da falta de recursos financeiros do Estado. Podemos citar aqui inúmeros outros empecilhos, além dos citados na introdução do trabalho: desde professores mal preparados e o uso de abordagens de ensino já consideradas pouco eficazes até a falta de motivação de alunos que por vezes não enxergam no próprio futuro a utilidade de uma segunda língua.

No entanto, percebe-se que a realização de atividades lúdicas pode facilitar no aluno a apreensão de conhecimentos, proporcionando nele uma "abertura" maior, promovendo seu relaxamento e maior interação com colegas. Vigotski (2003) dá suporte a esta ideia quando fala da zona de desenvolvimento proximal e do papel do

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"brinquedo" no desenvolvimento e na aprendizagem. O desenvolvimento de uma criança, para Vigotski, ocorre nos aspectos cognitivo, afetivo, motor e social. Estes aspectos podem ser estimulados simultaneamente por intermédio da arte. O teatro, enquanto uma das manifestações possíveis da arte, pode ser trabalhado na escola — desde os jogos teatrais, que são comumente praticados pelos atores no decorrer de sua aprendizagem sobre corpo, voz e expressão, até a leitura de textos literários e os ensaios e apresentações de espetáculos.

Com atividades lúdicas, a escola pode criar a zona de desenvolvimento proximal, despertando processos internos de desenvolvimento da criança (especialmente entre 11 e 14 anos) para que ela "aja para aprender" (VIGOTSKI, 2003). O contato com a arte desperta sentimentos e integra a cognição e a afetividade. Pelo teatro, a criança, além de externar sentimentos e imitar situações que vive, terá ainda contato com novas situações e novos sentimentos. Ao tocar no lado afetivo da criança, propicia interesse pelo conhecimento, assim como as brincadeiras também o fazem. Segundo Fino (sem data), a zona de desenvolvimento proximal consiste na

distância que medeia entre o nível actual de desenvolvimento da criança, determinado pela sua capacidade actual de resolver problemas individualmente e o nível de desenvolvimento potencial, determinado através da resolução de problemas sob a orientação de adultos ou em colaboração com os pares mais capazes.

Segundo Koudela (apud SPOLIN, 2015), teóricos como Piaget falam da importância dos jogos teatrais em sala de aula. Para Piaget, a criança cria consciência de si a partir da avaliação do outro. Koudela (ibid) também cita o conceito de zona de desenvolvimento proximal de Vigotski, alertando para a importância do lúdico na aprendizagem. Para ela, a parte de avaliação dos jogos teatrais (que entram no conceito de "brinquedo" de Vigotski) é propulsora do processo de aprendizagem porque deixa de ser retrospectiva para se tornar prospectiva (ibid, p. 24 e 25).

Para Spolin (2015), além dos benefícios já vistos, o uso do texto dramático nos jogos teatrais muda a forma como o texto é ensinado na escola, pois passa a ser introduzido com leveza: as crianças dramatizam e brincam com situações e diálogos. O exercício espontâneo com a fala do corpo e da voz, por sua vez, promovem processos colaborativos que nascem no plano sensório-corporal. Desta

(20)

forma, o teatro propicia aprendizado através da experiência, e o aprendizado artístico é transformado em processo de produção de conhecimento.

A obra de Spolin (2015) destina-se, como a autora relata, a professores com pouca experiência no teatro que desejam dar oficinas de jogos teatrais como complemento da aprendizagem escolar. O jogo, para Spolin, é "um conjunto de regras que o jogador aceita compartilhar. As regras não restringem o jogador, elas fazem com que o jogador permaneça no jogo. Atuar é fazer." (Ibid, p. 29). Isto quer dizer que o jogo teatral é uma atividade orientada pelo professor na qual o aluno se depara com uma situação-problema e precisa resolvê-la por intermédio da improvisação, de maneira livre, porém direcionada pelas regras. Uma das vantagens dos jogos e do ato de brincar, neste contexto, é aprimorar no aluno habilidades como concentração, interação e resolução de problemas, que são necessárias para o desenvolvimento do jogo. Ao mesmo tempo, o jogo, com suas regras e "crises", desenvolve a intuição através da experiência adquirida em contato livre com o ambiente.

Ao longo da pesquisa, percebeu-se que alguns dos autores que escrevem sobre educação e teatro têm uma grande preocupação em diferenciar termos como

drama de teatro, ou jogos dramáticos de jogos teatrais, indicando que os termos

estão relacionados a diferentes metodologias de ensino e teorias de aprendizagem. Pretende-se, aqui, diferenciar tais termos, de maneira que se possa perceber as implicações específicas da aplicação de cada um.

3.2 JOGOS TEATRAIS X JOGOS DRAMÁTICOS

Koudela (SPOLIN, 2015) menciona que Spolin2 diferencia o jogo dramático (dramatic play) do jogo teatral (theater game). O jogo teatral é um jogo de regras, e "pressupõe um conjunto de princípios pedagógicos que constituem um sistema educacional específico" (SPOLIN, 2015, p. 22). Koudela ressalta que o jogo dramático constitui-se em uma brincadeira de faz-de-conta, enquanto o jogo teatral é socializado. "O material do teatro são gestos e atitudes, e ele é experimentado

2

Koudela é a tradutora desta e de outras obras de Spolin, e autora do prefácio da versão brasileira do livro. Por isto, Koudela menciona a autora e alguns dos seus conceitos a fim de facilitar o entendimento do leitor.

(21)

concretamente no jogo [teatral], sendo que a conquista gradativa da expressão física nasce da relação que deve ser estabelecida com a sensorialidade." (Ibid, p. 23).

Bastos et al. (2015) diferencia de maneira clara os termos jogo dramático e

jogo teatral ao buscar as definições de teóricos como Spolin, Slade e Japiassu e

tecer um paralelo entre os dois tipos de jogos com as fases de desenvolvimento infantil traçadas por Piaget. Para Bastos,

O jogo dramático, que detém elementos lúdicos relacionados à linguagem teatral, é conceituado por Slade em seu estudo O Jogo Dramático Infantil (1978, p.18), em que mostra que, “[...] no drama, i.e., no fazer e lutar, a criança descobre a vida e a si mesma através de tentativas emocionais e físicas e depois através da prática repetitiva, que é o jogo dramático [...].” Ele possui duas características importantes: a sinceridade (momento de pura verdade e espontaneidade infantil em relação ao jogo que se está jogando) e a absorção (envolvimento total por parte da criança naquilo que está fazendo). Mas para que essas características sejam alcançadas é preciso que o adulto ofereça espaços agradáveis para que as crianças criem, explorem sua individualidade e o mundo que as cerca. Esse tipo de jogo é importante para a criança, pois ele a auxilia no exercício de solução de problemas por meio do improviso e do desempenho de papéis. (BASTOS; MORAIS; CORDEIRO, 2015, p. 77)

Ou seja, no jogo dramático a criança encontra, através do improviso, uma oportunidade de expressar-se, exteriorizando emoções e vontades e estabelecendo vínculos com os demais indivíduos da brincadeira. A partir deste momento, ocorre, segundo Bastos; Morais; Cordeiro (2015), uma evolução do jogo dramático para o

jogo teatral.

De acordo com Japiassu (2001, apud BASTOS; MORAIS; CORDEIRO, 2015), Na ontogênese, o jogo dramático (faz de conta) antecede o jogo teatral. Diferentemente do jogo dramático, o jogo teatral é intencional e explicitamente dirigido para observadores, isto é, pressupõe a existência de uma platéia. Todavia, tanto no jogo dramático como no jogo teatral, o processo de representação dramática ou simbólica no qual se engajam os jogadores desenvolve-se na ação improvisada e os papéis de cada jogador não são estabelecidos a priori, mas emergem das interações que ocorrem durante o jogo. (JAPIASSU3,

2001, p. 21, apudBASTOS; MORAIS; CORDEIRO, 2015, p. 79).

Desta forma, retornamos ao que Spolin defende como jogos teatrais, nos quais as crianças precisam improvisar para resolver os problemas propostos utilizando o seu repertório cultural. Apresenta-se ao participante uma situação a ser resolvida, estabelecendo-se um onde esta situação ocorre, quem a realiza e de que

3

(22)

se trata a ação, deixando-o resolver como desenrolá-la. (BASTOS; MORAIS; CORDEIRO, 2015).

Bastos, Morais e Cordeiro (2015) consideram que tanto os jogos dramáticos quanto os teatrais, sendo estes um desenvolvimento daqueles, são importantes no desenvolvimento infantil, pois para Piaget4 os jogos são parte constituinte e

fundamental na aprendizagem de crianças. Nesta pesquisa, no entanto, ao focarmos no uso de elementos do teatro nos anos finais do Ensino Fundamental e no Ensino Médio, fugindo da faixa etária estabelecida por Piaget (que menciona apenas o ensino infantil), fazemos o seguinte questionamento: quais jogos devem ser ensinados?

Para tentar responder a esta pergunta, observaremos, no capítulo 4 deste trabalho, relatos de experiências de professores que aplicaram diversos jogos em salas de aula de língua inglesa e tentaremos identificar, através de seus resultados, quais possuem mais vantagens. Mas já é possível ter uma noção de que ambos são válidos - dependendo do objetivo que se tem em sala de aula.

3.3 DRAMA X TEATRO

Para Zafeiriadou (2009), o uso do drama no aprendizado de línguas é um processo criativo e desafiador. Ela diferencia e define os conceitos de theater (teatro) e drama (drama), indicando as dificuldades da aplicação de ambos em sala de aula e quais recursos são mais interessantes no contexto educacional.

Como Zafeiriadou (2009) alega, os termos teatro e drama diferenciavam-se, de início, no que concerne ao meio: o teatro referia-se à performance e o drama à parte escrita designada à apresentação. Hoje, contudo, no contexto educacional,

teatro é entendido como o contato/comunicação entre atores e plateia, ao passo que drama alude mais à experiência dos participantes, sem a preocupação com uma

apresentação final. As duas abordagens não estão necessariamente separadas nem são antagônicas, mas a segunda surgiu nos anos 50 como reação à primeira, sendo embasada na perspectiva teórica da Humanistic School of Psychology (id).

4

PIAGET, Jean. A representação do mundo na criança. Tradução de Adail Ubirajara Sobral. Aparecida, SP: Ideias e Letras, 2005. (Originalmente publicado em 1947).

(23)

Para ilustrar a evolução do termo, Fleming (2009, apud ZAFEIRIADOU, 2009, p. 5) organizou o seguinte gráfico:5

Os termos drama e theater ao centro do gráfico referem-se à sua concepção mais tradicional. Theater 1, a partir de uma abordagem favorável ao drama 1, era visto de maneira negativa: um produto para poucos, centrado no professor, estático e com a finalidade de "exibição". Enquanto isso, o drama 1 era um processo dinâmico, para todos, que favoreceria a autoexpressão e o crescimento pessoal através de jogos dramáticos. Numa abordagem menos "autoritária" e mais contemporânea, como traz Zafeiriadou, Theater 2 e Drama 2 convergem para um mesmo ponto: a visão do drama como uma forma de arte. Ambos passam a

5

(24)

considerar a importância de elementos que anteriormente os distinguiam/separavam.

Ao pensarmos no uso do teatro como estratégia de ensino de uma segunda língua, é necessário considerar que as diferenças mostradas acima têm implicações diferentes na prática. Como acrescenta Zafeiriadou (2009), algumas abordagens de

teatro podem não trazer o dinamismo que os participantes esperam, enquanto o drama pode não ser uma atividade tão natural: assim como o teatro, precisa de

grande intervenção do professor e há técnicas dramáticas que precisam ser aprendidas/ensinadas.

De qualquer forma, abordagens dramáticas podem misturar elementos associados aos conceitos de drama e teatro apontados, incluindo, por exemplo,

performances/apresentações, de acordo com a disposição dos alunos, embora o drama não precise envolver narrativas complexas ou apresentações maiores.

(ZAFEIRIADOU, 2009). Ainda assim, a autora aponta diversos desafios ao se adotar uma técnica de ensino baseada no drama (e aqui pode-se eliminar a distinção entre os dois termos):

com aprendizes mais jovens, o entusiasmo e a exuberância produzidos pelo engajamento no drama podem se transformar em problemas de disciplina. Com aprendizes mais velhos, pode haver problemas de inibição e vergonha. Apesar do enorme potencial do drama em motivar e engajar os participantes, o efeito pode, na prática, ser raso e falhar em inspirar. No contexto do ensino de uma segunda língua, as possibilidades são inevitavelmente limitadas pela fluência e facilidade dos estudantes. Não é necessário dizer que uma pedagogia da linguagem que insista em resultados em lugar do processo pode ter um efeito negativo na motivação e envolvimento dos estudantes.6 (ibid, p. 5)

Ao adotar uma metodologia mais centrada no aluno ou no resultado final (no

produto teatro), o professor de língua inglesa terá diferentes resultados e trará

diferentes benefícios aos seus alunos com relação ao aprendizado de língua inglesa. Veremos, no capítulo 4, relatos de professores que realizaram montagens de peças teatrais com seus alunos e verificaremos quais foram os resultados, e se houve, no processo de montagem, o trabalho com os jogos teatrais, dramáticos ou o uso de

6

Tradução livre. Original: "With younger learners the enthusiasm and exuberance produced by engaging in drama can turn into problems of discipline. With older learners there may be problems of inhibition and embarrassment. Despite the enormous potential for drama to motivate and engage the participants, in practice the outcome can sometimes be flat and fail to inspire. In the context of teaching a second language, the possibilities are inevitably limited by the fluency and language facility of the learners. Needless to say that a language pedagogy insisting on results instead of process may have a negative effect on students' m o t i v a t i o n a n d i n v o l v e m e n t . "

(25)

literatura dramática em sala de aula. A partir deste momento, não se distingue, nesta pesquisa, os termos drama e teatro: pensamos o teatro em seu sentido amplo, com atividades mais ou menos espontâneas, centradas, porém, mais no aluno e seu processo de aprendizado do que no resultado de uma performance teatral.

4 EXPERIÊNCIAS, TÉCNICAS E MÉTODOS

Durante a pesquisa para o presente trabalho, foram encontrados diversos relatos de professores de línguas estrangeiras que participaram de projetos de ensino de língua estrangeira através do teatro. Tais projetos, entretanto, usaram ferramentas distintas em contextos também diferentes. Enquanto alguns professores tiveram a oportunidade de reunir alunos, fora do horário de aula, para montar espetáculos teatrais, outros dispunham apenas do tempo de 2 horas/aula de língua estrangeira por semana, precisando conciliar o teatro com outras atividades e conteúdos programados. Ao passo que alguns professores focaram no estudo e representação de peças teatrais na escola, outros incluíram na sua prática docente diária uma rotina de realização de jogos dramáticos ou teatrais. Outros, ainda, limitaram-se à leitura de textos dramáticos.

Para este capítulo, desejava-se reunir um corpus composto por experiências que aconteceram dentro de salas de aula de escolas regulares, com 2 horas/aula por semana, para que se pudesse, a partir desta pesquisa bibliográfica, tirar conclusões acerca da aplicabilidade de elementos do teatro ou do drama nestas condições. Todavia, não foram encontrados tantos trabalhos como se esperava: muitos são relatos de experiências ocorridas em turmas de faculdade, por exemplo, ou em cursos de língua estrangeira (como o Espanhol e o Francês), e muitos não citam a carga horária destinada às atividades teatrais/dramáticas. Por isso, com o objetivo de complementar o capítulo, são citados, além dos artigos e teses encontrados sobre tais experiências, alguns artigos cujos autores sugerem técnicas de ensino baseadas no uso de elementos teatrais no ensino de uma segunda língua, previamente aplicadas ou não em sala de aula. Espera-se, com isso, reunir o máximo de informações possíveis sobre o tema para que outros professores possam tentar utilizar elementos do teatro em sala de aula.

(26)

4.1 Dramatização a partir de poemas

Gasparro e Falletta (1994) sugerem, em seu artigo "Creating drama with poetry", que uma atividade dramática partindo da leitura de poemas pode envolver os aprendizes de segunda língua emocionalmente, cognitivamente e fisicamente, criando uma experiência motivadora, na qual os alunos não estão focados em entender a mecânica da língua - este aprendizado é internalizado, pois a situação de uso da língua é real7:

Os estudantes usam língua alvo para o propósito específico da comunicação. Eles experimentam aspectos comunicativos não verbais (linguagem corporal, gestos e expressões faciais), bem como aspectos verbais (entonação, ritmo, stress, gírias e expressões idiomáticas) enquanto interpretam os poemas. Os estudantes começam a sentir a língua e a ganhar confiança para interagir fora de

sala usando a língua alvo. (GASPARRO E FALLETTA, 1994).8

Para esta técnica, as autoras sugerem a preparação, pela turma, de mini-dramas baseados em poemas, às vezes escritos em forma de diálogos, curtos e com um tema central simples e voltado às emoções humanas. O aprendizado, por sua vez, está muito mais centrado no aluno do que no professor. Este tem a responsabilidade de guiar o processo de aprendizado nos seguintes aspectos: ajudar na pronúncia, entonação, stress, ritmo e expressão oral; facilitar a compreensão vocabular, aspectos culturais e roteiro do poema; estimular interesse e conversação, interagindo com os alunos; estabelecer uma atmosfera de workshop; criar uma experiência de aprendizagem na qual o estudante participe (GASPARRO; FALLETTA, 1994).

As autoras sugerem que, para aplicar esta técnica, o professor apresente ao aluno o contexto do poema a ser lido, bem como novo vocabulário, fazendo, depois, uma leitura em voz alta. A classe deve discutir o poema e então o professor o lerá novamente, para só então lerem todos, em coro, ou em turnos, individualmente. Em seguida, é preparada, pelos alunos, a dramatização do poema: eles devem escolher

7

Ver seção 4.3

8

Tradução livre do original: "The students use the target language for the specific purpose of communication. They experiment with non-verbal communicative aspects of language (body language, gestures, and facial expressions), as well as verbal aspects (intonation, rhythm, stress, slang, and idiomatic expressions), while interpreting the poems. The students begin to feel the language and gain the confidence to interact outside the classroom using the target language."

(27)

seus papéis (personagens), cenário, elementos de cena, iluminação e figurino, ensaiando a dramatização e, depois, fazendo uma improvisação baseada no poema.

É possível antecipar benefícios da prática proposta. Como os alunos ouvem e lêem o poema diversas vezes, o listening e a pronúncia são favorecidos, bem como o entendimento do texto em si. A dramatização guiada pelo professor é uma boa ferramenta de internalização de aspectos linguísticos, desde que se permita que o aluno seja levado pelo poema ou pelo ato da encenação, sem o objetivo primordial de memorizar regras gramaticais. Todavia, as autoras não demonstram uma preocupação, no artigo, em sistematizar o processo de dramatização e do que chamam de improviso. Isso nos leva a pensar que a experiência do professor com teatro não deve ser nula: para guiar uma atividade de improviso, é preciso indicar aos alunos o foco e a instrução, como afirma Spolin (2015). O foco constitui num "problema que pode ser solucionado pelos participantes." Ou ainda: "O foco coloca o jogo em movimento. Todos se tornam parceiros ao convergir para o mesmo problema a partir de diferentes pontos de vista." (ibid, p. 32-33). A instrução, por sua vez, é o que mantém o jogador com o foco, gerando interação, movimento e transformação. Gasparro e Falletta (1994) relatam sucesso com a aplicação desta técnica em turmas de diferentes "níveis" de conhecimento da língua alvo.

De qualquer forma, uma atividade guiada de natureza dramática, cujo ponto de partida seja um texto literário (o poema não é a única opção), pode, sempre, envolver os alunos de maneira profunda, o que parece ser necessário numa época em que se trabalha com jovens nascidos em meio à tecnologia e que precisam de mais elementos, em sala de aula, para sentirem-se motivados (como veremos no capítulo 5).

4.2 TiLL MODEL

Ao vivenciar novas situações no teatro, as pessoas têm a sua criatividade estimulada. O ator e pesquisador Sean Aita (2009) discorre sobre uma metodologia que já foi usada em algumas escolas europeias que levam até o aluno uma peça teatral em língua estrangeira, a qual é posteriormente estudada e pode até ser reencenada por eles. A língua estrangeira é então usada como ferramenta para trazer peças de assuntos que toquem na afetividade do aluno.

(28)

Aita (2009) apresenta um esboço do modelo The theatre in language learning (TiLL), que combina estudos de texto, atividades de role play e perfomances profissionais para estudantes de segunda língua. O modelo TiLL foi primeiramente usado pelo Vienna’s English Theatre e seus parceiros educacionais em 1966, sendo depois adotado e desenvolvido por companhias de teatro. Aita possui mais de 25 anos de experiência em atuação, escrita e direção para estudantes de L2, e o seu artigo é baseado na interpretação que ele teve de seu próprio trabalho enquanto diretor de estudantes austríacos, de 12 a 14 anos, de Inglês como segunda língua. Segundo ele, a metodologia aplicada foi um estudo qualitativo que valoriza a experiência subjetiva, autodeterminação e interdependência de todos os participantes.

De acordo com o autor, o teatro não requer apenas, como foco principal, o uso da língua falada – transcende-se o nível da linguagem e comunica-se também por intermédio de entonação de voz, gestos e expressões faciais. Por isso, há uma multiplicidade de ferramentas no teatro que o tornam um forte meio de aprendizagem. No entanto, Aita (2009) menciona que ainda há poucos estudos publicados no que concerne a este modelo específico de aquisição de língua estrangeira.

Aita (2009) faz um panorama da introdução do uso do teatro como ferramenta educacional, e apresenta ainda uma pesquisa que evidencia o potencial do teatro de influenciar as atitudes de jovens. Quando o autor refere-se à questão de motivação do estudante, comenta que um dos principais objetivos do TiLL é gerar motivação, de forma que os alunos adquiram e mantenham interesse na L2; para tanto, Aita destaca a necessidade de diversão durante o aprendizado de uma língua e de se trabalhar sentimentos dos alunos sobre o país ou as pessoas que falam a língua estudada.

O pesquisador (Ibid) mostra que o processo de aplicação do modelo no ensino inclui várias etapas. Elas vão desde a entrega prévia de roteiros de peças aos alunos até a concretização destes no palco, podendo ser seguidas de interação entre alunos e atores. Precisa existir ainda uma escolha de peças apropriada a cada contexto e a provisão de materiais suporte baseados nelas ou nas performances. Os resultados pedagógicos do modelo TiLL incluem a construção de conhecimento intercultural, uma maneira divertida de estudar o inglês (ou outra língua alvo), o

(29)

estudo fora do contexto de sala de aula, a oportunidade de ouvir a língua de falantes nativos e a promoção de conversas entre estudantes e nativos.

O modelo é, portanto, originalmente baseado em três princípios, que podemos traduzir como: a leitura, a visão e a escuta. A parte de leitura é tanto ativa quanto passiva, podendo ser feita parcialmente em casa, quando o estudante pesquisa aquilo que lhe interessa (sem a estrutura da sala de aula), e parcialmente em sala de aula, em voz alta - proporcionando assim uma maior consciência quanto à fluência e à pronúncia. É sugerido ainda que os alunos atuem partes da peça em sala de aula, como exercício. Já a parte que inclui assistir e ouvir a peça prioriza muitas vezes uma performance centrada na audiência, ou que a considere como

espectatores9, quer dizer, que mostre ao espectador que ele não só assiste e ouve a peça como também dela participa enquanto ser crítico. Ou seja: o modelo TiLL foca, neste momento, na interação entre ator e espectador.

A pesquisa de Aita nos mostra a importância e evidência de que um modelo de aprendizado ainda pouco estudado - embora tenha sido, de acordo com o autor, largamente utilizado - é capaz de gerar motivação nos estudantes de uma segunda língua e talvez até transformá-los, à medida que as peças selecionadas podem trazer temáticas importantes e de interesse dos alunos.

4.3 A literatura dramática como ponto de partida

Há algum tempo, graças ao surgimento de novas abordagens de ensino que priorizam o uso de textos autênticos em sala de aula (como o Communicative

Approach), aos estudos sobre gêneros textuais e também ao Plano Nacional do

Livro Didático10, os textos literários têm sido incluídos com mais frequência no dia a dia das salas de aula de escola pública. De acordo com Pereira (2008):

O uso de textos literários nas nossas aulas de Inglês é muito importante não apenas para a literatura, mas também para o

9

Termo cunhado por Augusto Boal, teatrólogo brasileiro. Para ele, todos os seres humanos são atores porque atuam e espectadores porque observam, surgindo assim o que ele intitulou espect-atores. É um espectador que assume a função de interlocutor ativo, interagindo na ação dramática. (BOAL, 1975).

10

O PNLD é um regulamento que determina como devem ser os livros didáticos distribuídos em escolas públicas. Com relação à língua estrangeira moderna, o PNLD segue os Parâmetros Curriculares Nacionais, exigindo, entre outros elementos, a presença de gêneros textuais autênticos a serem trabalhados em sala. Prezam pelo texto como ponto de partida para o ensino da língua (ou seja, a língua em uso), diferentemente dos livros que priorizam o ensino de regras gramaticais ou de declinações verbais, por exemplo.

(30)

processo de aprendizagem de uma língua alvo. Trabalhos literários deveriam ser usados como uma fonte de aprendizado de línguas, possibilitando aos estudantes uma melhora no processo de aprendizagem de uma língua estrangeira. Carter e Long (1991:7) mencionam três grandes tendências quando se usa textos literários para ensinar uma língua estrangeira: os modelos cultural, linguístico e de crescimento pessoal. [...] Em relação ao modelo linguístico, Carter e Long (Ibid.) referem-se a esta abordagem como "abordagem baseada na língua", que possibilita a estudantes trabalhar com um texto literário de maneira metódica e sistemática, focando especialmente em traços linguísticos como vocabulário, gramática, sintaxe e etc.11 (PEREIRA, 2008, p. 194)

Em outras palavras, é possível usar a literatura em sala de aula com diferentes propósitos. Um texto literário pode ser rico por trazer a língua em uso - isto é, ao lê-lo, o estudante está construindo uma nova experiência de contato real com a língua estrangeira. De acordo com Brumfit (1986, apud Riverol, 1991)12, os

textos literários são construções orais ou escritas designadas às necessidades comunicativas humanas, e qualquer trabalho literário "é um ato linguístico que explora os recursos do tempo e lugar em que é escrito." (Ibid, p. 65). Enquanto pensa-se na literatura como duradoura e não efêmera, seu significado não permanece estático, já que "um trabalho literário pode transcender tempo e cultura para falar diretamente com um leitor de outro país ou um diferente período da história" (COLLIE; SLATER, apud RIVEROL, 199113). Ou seja, a literatura é uma fonte de linguagem autêntica.

Embora uma gama de gêneros literários sejam passíveis de utilização em salas de aula, a leitura do texto teatral ou dramático, no entanto, parece ser pouco aplicada, já que foram encontrados, ao longo desta pesquisa, poucos relatos de seu uso em salas de aula regulares. A maioria dos trabalhos encontrados refere-se à prática de leitura texto dramático em cursos universitários da área das Letras. Todavia, o objetivo principal de tal prática em qualquer contexto parece ser o mesmo: melhorar o processo de ensino/aprendizagem de uma língua estrangeira. Como aponta REIS (2008):

11

Tradução livre: "The use of literary texts in our English classes is very important not only to literature, but also to the learning process of a target language. Literary works should be used as a language learning resource enabling students to improve their learning process of a foreign language. Carter and Long (1991: 7) mention three major tendencies when using literary texts to teach a foreign language. They are the cultural, the language and the personal growth models. [...] In relation to the language model Carter and Long (Ibid.) refer to this approach as the “language based approach” which enables students to work with a literary text in a methodical and systematic way focusing specifically on linguistics features such as vocabulary, grammar, syntax, etc."

12

Brumfit, C. J.; R. A. Cárter. Literature and Language Teaching. Oxford: Oxford UP, 1986.

13

(31)

Favorecer a comunicação de alunos de nível intermediário sempre foi uma preocupação do ensino de língua estrangeira. [...] Dentre as estratégias mais utilizadas pelos professores para "fazer comunicar" o aluno de FLE [Francês Língua Estrangeira] encontram-se abordagens com temas ligados ao cotidiano ou à vivência profissional dos alunos, através do trabalho com documentos extraídos da imprensa televisiva ou escrita Paralelamente, como recursos mais lúdicos, temos a música, a culinária e a história em quadrinhos. Não se observa, contudo, nesta área, um uso muito frequente do teatro, ou, mais especificamente, do texto teatral em conjunto com o jogo dramático. (Ibid, p. 2)

A autora, embora se refira ao contexto de ensino do Francês, aproxima-se muito das constatações que foram feitas, até aqui, sobre o ensino da língua inglesa. Além disso, ela menciona claramente a busca por uma didática baseada no ensino de textos teatrais escritos em conjunto com jogos (a partir daquele momento, em seu trabalho, especificados como jogos de papéis ou jogos dramáticos), que acreditamos ser a ideal para o ensino público.

Reis (2008) relata, em sua tese, dois cursos de francês ministrados na Universidade de São Paulo, durante os quais aplicou sua metodologia baseada em leitura de texto dramática e jogos dramáticos. Ela conta que trabalhou com turmas bastante diferentes entre si e, em cada uma delas, chegou a um resultado diferente, mostrando que não há uma única maneira de se trabalhar com o teatro em sala. O seu objetivo geral era melhorar a comunicação em língua estrangeira entre os estudantes, e ela diz ter se deparado com algumas dificuldades. Uma delas foi o tempo dedicado ao projeto (que, em sua opinião, poderia ter sido mais espaçado, distribuído durante o semestre). Outra foi lidar com algumas situações às quais estamos sujeitos ao realizarmos atividades que "tocam os sujeitos em seus afetos e emoções" (Ibid, p. 185), como alunos com ansiedade, que respondiam aos exercícios teatrais de maneira diferente da esperada. A autora destaca, porém, que uma das coisas interessantes de se trabalhar com o teatro é mostrar ao aluno que "mostrar um personagem através de si mesmo é como falar uma língua estrangeira", buscando uma voz diferente, uma entonação diferente, um corpo diferente, sem, ao mesmo tempo, perder a própria identidade (Ibid, p. 186).

Seguindo a mesma linha, temos o relato de Rempel e Cardoso (2012). Rempel, professora de escola pública estadual, estabeleceu uma metodologia com seus alunos de Ensino Médio que incluía a leitura e discussão da obra Otelo, de Shakespeare. Segundo as autoras, os alunos estavam desmotivados:

(32)

Diante disso, este trabalho se justifica tendo em vista, o desinteresse dos educandos do Colégio Estadual Pe. Réus - Ensino Fundamental e Médio, Pérola D´Oeste, pois os mesmos durante as aulas ficam alheios aos conteúdos repassados, reclamam e não se interessam em adquirir conhecimentos da disciplina, argumentando que não precisam deles paras suas vidas. Por isso, ofereço uma metodologia diferenciada através de outras culturas, acreditando que assim desperte um interesse maior em estudar melhor a Língua Inglesa. A problemática deste estudo é a seguinte: como trabalhar a Língua Inglesa por meio da literatura estrangeira e encenação da peça Otelo? (Ibid, p. 3)

Rempel e Cardoso (2012) descrevem todo o processo de leitura da obra da Shakespeare, pesquisas sobre o autor, apresentação de seminários pela turma e, por último, montagem e encenação da peça.

Os alunos ao organizarem a apresentação da obra Otelo na escola e cuidarem de todos os detalhes, (montar o cenário, dividir os personagens, visitar o local da apresentação, fazer cronograma do horário dos ensaios...), se envolveram nos tarefas, desde os ensaios até a apresentação, de modo que pudessem desenvolver a prática comunicativa e assim obtiveram um resultado positivo. Uma vez que todos se dedicam ao processo de aprendizagem este tem um resultado mais efetivo. A apresentação foi feita no saguão da escola em duas seções de manhã e duas a tarde devido ao grande número de alunos da escola. O teatro foi um sucesso, todos os alunos da turma participaram. Essa prática de representação teatral teve como finalidade despertar o desejo de aprender dos alunos, que muitas vezes se apresentam mais tímidos e inseguros, desenvolvendo a expressão oral, opinando sobre várias situações de apresentação e participando ativamente de todas as atividades. (Ibid, p. 13)

Ao concluírem o relato de maneira tão positiva quanto outros autores vistos até aqui, não nos resta dúvidas de que o trabalho com a literatura - mesmo com um autor com linguagem tão difícil para a nossa época, como Shakespeare - e apresentações teatrais pode ser muito bem sucedido, dentro de suas limitações. Não podemos deixar de assinalar, aqui, a importância da motivação, sobre a qual falaremos no capítulo 5, a qual pode ser mais fundamental em um processo de aprendizado do que a efetiva "apreensão de conteúdos" tão visada nas escolas. Isto quer dizer que, embora o professor não consiga sempre "medir quanto conteúdo o aluno aprendeu", o envolvimento em tarefas em grupo relacionadas à arte pode ter um resultado muito notório sobre a autonomia do aluno e seu interesse em aprender.

Referências

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