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A Agência Nacional de Saúde Suplementar - ANS: onze anos de regulação dos planos de saúde

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Universidade de São Paulo

2012

A Agência Nacional de Saúde Suplementar

-ANS: onze anos de regulação dos planos de

saúde

Organ. Soc.,v.19,n.62,p.471-488,2012

http://www.producao.usp.br/handle/BDPI/40708

Downloaded from: Biblioteca Digital da Produção Intelectual - BDPI, Universidade de São Paulo

Biblioteca Digital da Produção Intelectual - BDPI

Departamento de Enfermagem Psiquiátrica e Ciências Humanas -EERP/ERP

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A A

GÊNCIA

N

ACIONAL DE

S

AÚDE

S

UPLEMENTAR

– ANS:

ONZE ANOS DE

REGULAÇÃO DOS PLANOS DE SAÚDE

Rachel Torres Salvatori*

Carla A. Arena Ventura**

Resumo

T

rata-se de um trabalho com objetivo de apresentar os principais resultados alcançados pela

regulação dos planos de saúde exercida pela Agência Nacional de Saúde Suplementar, au-tarquia instituída para promover o equilíbrio das relações entre operadoras e consumidores, tornando o mercado de planos de saúde mais efi ciente. Como avanços mais signifi cativos oriundos da regulação do setor podem ser citados: as barreiras à entrada e à saída das opera-doras no mercado, a ampliação das coberturas assistenciais contratuais, o monitoramento e o controle dos reajustes, a indução a práticas de promoção da saúde e à qualifi cação do setor, e a possibilidade da portabilidade de carências. Como desafi os a serem enfrentados, podem ser apontados: o monitoramento da qualidade da assistência prestada, a renúncia fi scal, a existência dos cartões de desconto, a operação de empresas como operadoras de planos de saúde sem o registro na ANS e a adoção de alguns mecanismos nocivos de regulação assistencial pelas operadoras de planos de saúde.

Palavras-chave: Saúde suplementar. Planos de pré-pagamento em saúde. Regulação e fi

sca-lização em saúde. Regulação governamental. Assistência à saúde.

The National Agency of Supplementary Health – ANS:

eleven years in regulating health insurance plans

Abstract

T

his study aims to present the main results achieved in the regulation of health insurance

plans through the National Agency of Supplementary Health, an agency set up to promote a balance in the relationship between health insurance plans and their consumers, making the health insurance market more effi cient. As examples of the important progress achieved in regulating the sector, the authors emphasize: greater control of the infl ow and outfl ow of service operators in the market; the widening of contractual coverage; monitoring and control of readjustments; encouragement of health promotion practices and increased training in the sector; grace period fl exibility. Examples of regulatory gaps however, include: problems moni-toring the quality of the care provided; tax breaks; the existence of discount cards; companies operating as health insurance plans without the ANS registration; the use of harmful mechanisms of assistance regulation by health insurance companies.

Keywords: Supplementary health. Health insurance. Health regulation and supervision.

Government regulation. Health care.

* Doutoranda em Enfermagem Psiquiátrica na Escola de Enfermagem de Ribeirão Preto da Universidade

de São Paulo – EERP/USP – Ribeirão Preto/SP/Brasil. Endereço: Rua Santo André, 177, Nova Jaboti-cabal. Jaboticabal/São Paulo. CEP 14887-030. E-mail: racsalvador@hotmail.com

** Pós-doutorado em Saúde Mental pela USP. Professora Associada na área de direito

internacio-nal da saúde, direitos humanos e dos pacientes da EERP/USP) – Ribeirão Preto/SP/Brasil. E-mail: caaventu@gmail.com.br

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Considerações Iniciais

E

m janeiro de 2011, a Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS) completou

onze anos. Durante esse período, cerca de 260 resoluções normativas e mais de 47 instruções de serviço foram publicadas. É por meio desses atos normativos que a ANS regula o sistema de saúde suplementar. Entretanto, a despeito do quan-titativo elevado de normas, cabe refl etir sobre o desempenho da ANS, uma vez que o excesso da regulamentação editada pode não ter se traduzido em equilíbrio do mercado.

Dessa forma, este artigo tem com objetivo apresentar os principais resultados atingidos pela regulação dos planos de saúde, exercida pela Agência Nacional de Saúde Suplementar, autarquia instituída para promover o equilíbrio das relações entre opera-doras e consumidores, bem como tornar o mercado de planos de saúde mais efi ciente. Por meio de uma revisão de literatura publicada sobre a temática, o presente estudo aborda a origem e a forma de atuação das agências reguladoras no Brasil, passando pelo cenário do sistema de saúde suplementar, anteriormente à publicação da Lei no

9.656, de 1998, pela criação da ANS, sua estrutura organizacional e procedimentos administrativos adotados, e chegando ao cenário do sistema suplementar de saúde após a criação da ANS, no qual são apresentados os principais avanços alcançados e os desafi os a serem enfrentados pela agência reguladora dos planos de saúde.

Origem e Atuação das Agências

Reguladoras no Brasil

Segundo Moraes (2002), a origem das Agências Reguladoras é inglesa, por meio da criação pelo Parlamento, em 1834, de diversos organismos autônomos, com o objetivo de aplicação dos textos legais. Mais tarde, os Estados Unidos implementa-ram um modelo administrativo estatal baseado no modelo de agências reguladoras.

De acordo com os estudos de Ventura (2004), a base jurídico-administrativa dos Estados Unidos foi estruturada, desde o seu início, pelo intervencionismo indireto do Estado por meio da atuação do poder normativo, mediador e fi scalizatório das agências reguladoras, com o objetivo de mediar interesses do setor, propor diretrizes públicas, tutelar e proteger interesses dos segmentos hipossufi cientes.

O modelo institucional regulatório brasileiro foi fortemente infl uenciado pelo modelo norte-americano, com inspiração, também, na experiência britânica pós-privatização (MASHAW, 1997), em formato e operacionalização que permitissem um sistema de procedimentos destinados a garantir sua transparência e a possibilidade de ampla manifestação e defesa das partes atingidas.

A regulação compreende o ato de sujeitar-se a regras, aproximando-se do sentido de normatizar (VENTURA, 2004). De acordo Salomão Filho (2001), o termo regulação refere-se à intervenção do Estado na atividade econômica, por meio da concessão do serviço público ou do exercício do poder de polícia. Portanto, a regulação está ligada à ideia de atividade intervencionista do Estado e, no Brasil, tal modelo se justifi cou em um momento no qual o Estado poderia perder o poder de interferir na prestação de determinados serviços.

Assim, as Agências Reguladoras surgiram em um contexto de desestatização e de uma proposta de Reforma do Estado nos dois mandatos do presidente Fernando Henrique Cardoso (1995-2002). A privatização crescente poderia trazer prejuízos ao Estado, caso não fosse possível o monitoramento e o controle das principais atividades econômicas privatizadas. Em 1995, o Plano Diretor da Reforma do Aparelho do Estado diagnosticou uma crise fi scal decorrente da perda de crédito estatal, do esgotamento da estratégia estatizante de intervenção do Estado e da forma político-burocrática da administração pública. Esses três elementos foram apontados como os principais problemas do Estado Brasileiro (NUNES; RIBEIRO; PEIXOTO, 2007).

Aqueles autores comentam, também, que a proposta de reforma apresentada pelo governo se sustentava, então, em quatro esferas: fi scal, previdenciária, adminis-trativa e patrimonial. A criação de um órgão independente, e não um departamento

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subordinado à administração direta, foi apresentada como uma inovação institucional, vinculando-se especialmente às reformas nas dimensões administrativa e patrimo-nial, para regular serviços públicos de energia e telecomunicações liberalizados ou privatizados de forma independente das infl uências político-partidárias dos governos.

Foi assim que, em 1996, foi criada a Agência Nacional de Energia Elétrica - ANEEL; em 1997, a Agência Nacional de Telecomunicações - ANATEL e a Agência Nacional do Petróleo - ANP; e, em 2000, a Agência Nacional de Saúde Suplementar - ANS, todas por meio de Leis federais.

Observa-se, neste contexto, que a proposta de criação de um órgão com inde-pendência administrativa, fi nanceira, patrimonial e de recursos humanos, ausência de subordinação hierárquica, sob o modelo de agência reguladora, tinha o principal objetivo de afastar a interferência política das decisões técnicas oriundas desses ór-gãos, mediante decisões tomadas por um colegiado de cinco diretores com mandatos fi xos e não coincidentes. Segundo Ventura (2004), preservar-se-ia a estabilidade dos dirigentes, a autonomia na gestão administrativa do órgão regulador, fontes próprias de recurso e a não vinculação hierárquica da agência a qualquer instância do governo. Entretanto, deve ser salientado que a escolha desses membros da Diretoria Colegiada obedece a critérios político-partidários, o que pode comprometer profundamente o processo regulatório, com recorrentes possibilidades de captura1 do órgão regulador

por parte de agentes econômicos com a exclusiva intenção de subverter os princípios do mercado a favor de interesses particulares.

Esse movimento de reforma regulatória tinha o objetivo de produzir efi ciência macroeconômica pela indução e regulação da concorrência em áreas de monopólios e criar mecanismos, conforme aponta Costa (2008), para implementar políticas no contexto da pós-reforma do Estado, buscando estimular a concorrência e diminuir a regulação formal e burocrática. Esse modelo de organismo público açambarcava o exercício de amplos poderes normativos, fi scalizatórios e conciliatórios, atuando na regulação dos monopólios, na regulação da competição e na regulação social (VEN-TURA, 2004).

Dessa forma, as Agências Reguladoras e, nesta seara, a ANS, foram instituí-das para combater as falhas de mercado, como a seleção adversa2, o risco moral3, a

assimetria de informação4 entre agentes econômicos e as externalidades negativas5

provenientes das relações econômicas entre agentes e, por conseguinte, assegurar a competitividade de setores da economia, universalizar serviços e promover interesses dos consumidores (PELTZMAN, 2004; POSNER, 2004).

É interessante ressaltar que, no desempenho de suas competências, as Agências Reguladoras exercem funções típicas dos três poderes. Atuam como poder executivo, quando fi scalizam atividades e direitos econômicos; como poder legislativo, quando publicam normas e procedimentos com força legal sobre o setor regulado; e como poder judiciário, ao julgar e impor sanções aos regulados. A atuação das Agências como quase-legislativo e quase-judiciário é criticada por especialistas da área do direito, uma vez que consideram que as agências não atuam sob um marco

1 O termo captura refere-se à condição em que o órgão regulador toma decisões técnicas baseadas no

atendimento aos interesses específi cos dos agentes econômicos regulados, numa afronta fl agrante à própria razão de existir de um órgão regulador.

2 Entende-se como seleção adversa, nesse contexto, a situação em que uma operadora de planos de

saúde seleciona, sem ter o conhecimento prévio, um indivíduo com problemas de saúde e que será um utilizador em potencial de seu plano de saúde.

3 Risco moral, aqui tratado, é a situação em que o benefi ciário de plano de saúde aumenta a utilização

dos serviços do plano sem uma necessidade de saúde que justifi que a sobreutilização do plano.

4 Assimetria de informação é quando, por exemplo, a operadora de planos de saúde detém mais

infor-mação a respeito das garantias contratuais do plano de saúde que está vendendo do que o benefi ciário que está comprando esse plano.

5 Externalidades referem-se ao impacto de uma decisão sobre aqueles que não participaram dessa

decisão. Por exemplo: a ANS estabelece, por meio normativo, o percentual de reajuste dos planos individuais em razão da variação de custo dos planos coletivos de saúde (que são decorrentes da in-corporação de tecnologia, aumento dos custos dos serviços médico-hospitalares, entre outros). Para o benefi ciário, o impacto é negativo, pois terá de pagar um valor maior de mensalidade de seu plano de saúde (TEIXEIRA, 2001).

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regulatório adequado que defi na claramente suas atribuições, e que isso confi gura uma evidente invasão aos campos de atuação exclusiva de outras instituições (WALD; MORAES, 1999).

Todavia, o poder normativo de uma agência reguladora é oriundo de sua atividade regulatória, uma vez que, no cumprimento legal de editar regras para o setor regulado, o faz por meio de normativos setoriais (resoluções e instruções nor-mativas). Sobre essa situação específi ca, Menezello (2002), Ventura (2004), Nunes, Ribeiro e Peixoto (2007) entendem que o poder regulador é proveniente da delegação de competências do Poder Legislativo e Executivo às agências reguladoras, para que possam, de fato, cumprir seu papel de agente regulador, atendendo às necessidades do setor específi co, de acordo com os princípios jurídicos vigentes.

Ao propor e executar políticas públicas referentes aos seus respectivos setores, as agências reguladoras ultrapassam os limites da regulação. Seu poder normativo é questionado, fundamentalmente, porque as normas expedidas pelas Agências não são elaboradas por representantes democraticamente eleitos pelo povo e, dessa forma, não possuem a representatividade necessária para serem válidas.

Entretanto, Oliveira (2002) entende que essa delegação de poderes é inevitá-vel, dada a limitação do conhecimento dos legisladores e a necessária abstração das leis. O mesmo autor defende a delegação, justifi cando que os custos do processo de decisão são menores nas agências, tornando possível uma fl exibilidade da atuação estatal frente às constantes transformações e desenvolvendo políticas e diretrizes para os setores regulados, formuladas por profi ssionais da área.

Ventura (2004, p. 144) expõe, também, que “esse poder legislativo das Agências é uma forma de aprofundamento da função normativa do Estado, visto que apenas leis gerais são insufi cientes para defender e regular o interesse público”. Nessa perspectiva e exatamente por esses motivos, ambiente em constante mudança e inefi cácia de leis gerais para a garantia do interesse público no mercado regulado pelas agências reguladoras, é que se torna justifi cável uma atuação normativa delegada pelo legisla-dor que cria e estipula os limites da atuação das agências regulalegisla-doras. Logo, pode-se dizer que a agência reguladora é um braço do poder legislativo, atuando nos limites da Lei que a criou, com a fi nalidade de gerar políticas e instrumentos normativos para o setor de sua competência, pautando-se nos princípios de efi ciência, celeridade e robustez técnica de suas decisões. Com um corpo funcional técnico e especializado, atuando somente em algumas áreas específi cas, é possível a consecução de diretrizes mais adequadas para o setor regulado.

Cabe elucidar que, justamente, pela composição da direção das agências regula-doras não serem fruto de um processo democrático de eleição de seus representantes, todo ato normativo emanado por uma agência reguladora, para ser válido, deve passar por um processo de consulta pública. O processo de consulta pública, segundo Ventura (2004), nada mais é do que a democracia participativa no âmbito da Administração Pública, em complementação à tradicional democracia representativa, confi gurada pela manifestação pública de todos os agentes regulados na discussão, a apresentação de críticas e sugestões quanto aos atos normativos a serem publicados pela agência. Entretanto, é necessário salientar que o processo de consulta pública só tem valor na presença de uma sociedade forte, esclarecida de seus direitos. Uma sociedade frágil, que não está estruturada a ponto de participar desse processo, permitirá um debate desigual, em que os agentes do mercado disporão de todos os argumentos a favor da situação que desejam conquistar.

Dessa maneira, é necessária a formulação de políticas e diretrizes para os setores regulados. No setor da saúde suplementar, por exemplo, hoje, é inaceitável admitir-se que indivíduos com moléstias incuráveis sejam impedidos de participar de planos de saúde, ou que determinadas doenças, como o câncer ou a depressão, não tenham co-bertura contratual, o que era perfeitamente previsível em contratos anteriores à edição da Lei no 9.656, de 1998 – lei que regula a atuação dos planos de saúde (COSTA, 2008).

As agências reguladoras se confi guram, também, como espaços de mediação de confl itos entre os atores componentes do mercado regulado, buscando solucio-nar situações em que haja interesses regulados divergentes. Assim, ao mediarem

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ativamente esses confl itos, por meio de seus instrumentos regulamentadores, que permitem uma atuação legal e transparente durante todo o processo, surgiu a ideia de tal ação se confi gurar em uma prática quase judicial.

Com seu poder mediador, as agências reguladoras buscam a resolução do con-fl ito pelo consenso entre as partes, monitorando o processo de negociação, sem que uma das partes (o administrado) tenha de cumprir uma determinada decisão. Entre-tanto, quando essa mediação fracassa, diante de uma situação em que haja lesão a algum direito ou a alguma norma setorial, a agência reguladora, obrigatoriamente, deve posicionar-se no sentido de aplicar a sanção correspondente, de acordo com os regramentos setoriais vigentes.

Logo, observa-se que, não obstante ter a agência reguladora um papel impor-tante na composição dos confl itos dos entes que formam o setor regulado, também atua fi scalizando e punindo os administrados quando infringem as regras do setor regulado. A Agência Nacional de Saúde Suplementar é uma agência reguladora criada com a fi nalidade de regular o mercado de planos de saúde. Entretanto, ela só foi criada no ano de 2000, tendo permanecido o setor, durante quase 60 anos, sem nenhuma regulação estatal, o que será assunto do próximo tópico.

Cenário Anterior à Lei n

o

9.656, de 1998

No Brasil, uma característica do sistema de saúde, anteriormente ao marco constitucional de 1988, era a livre atuação entre iniciativas públicas e privadas no que tange ao oferecimento, fi nanciamento e operação dos serviços de saúde.

O desenvolvimento de um parque industrial, notadamente o automobilístico, no Brasil, por volta de 1940, transformou a organização privada dos serviços de saúde no País. Com o objetivo de recuperar a mão de obra adoecida, as montadoras estran-geiras contratavam prestadores de serviços de assistência médica para atender seus empregados (BAHIA et al., 2005).

Esse contexto, de crescente industrialização, fomentou a organização de empresas privadas, intermediárias do acesso aos serviços de saúde. Tais empresas eram contra-tadas pelas fábricas e outras empresas empregadoras, para atender seus funcionários. Assim, nasceram, sob a perspectiva da industrialização crescente e da necessidade da recuperação e da manutenção de um estado de saúde do trabalhador que permitisse o desenvolvimento do sistema capitalista, os primeiros planos privados de saúde.

Nota-se que, até os anos 80, os planos privados de saúde eram, fundamen-talmente, acessados por quem possuía vínculo trabalhista formal - planos coletivos. Posteriormente, houve a expansão para a contratação por clientes não vinculados a alguma pessoa jurídica - contratação individual (BAHIA, 1999).

Devido ao aumento crescente do setor privado no fi nanciamento e na oferta dos serviços de saúde, por meio de empresas que intermediavam o pagamento dos serviços dispensados às pessoas que os contratavam, o Estado, que acabou por se afastar, em parte, da prestação da assistência à saúde, passa a assumir novo papel, agora na regulação desse tipo de assistência prestada por meio de empresas privadas.

Com o objetivo de regulamentar as relações existentes neste setor da economia6,

Bahia (2001) relata que o Decreto-Lei no 73/66 foi o primeiro instrumento que

dispu-nha sobre a comercialização de planos e seguros de saúde. Todavia, deixou de fora empresas de medicina de grupo “não lucrativas” (e também cooperativas médicas), que operaram até o ano de 1998 sem nenhuma regulamentação Estatal.

Sato (2007) descreve que a expansão do setor suplementar de assistência à saúde - setor caracterizado pela operação de planos de saúde - foi acompanhada pelo aumento de distúrbios nas relações entre usuários e operadoras de planos de saúde, estando relacionados, principalmente, a negativas de coberturas assistenciais (mate-riais, medicamentos, limitação quantitativa de procedimentos, limitação do tempo de internação, inclusive em Unidade de Terapia Intensiva - UTI), ao aumento nos preços

6 Assim entendido porque gerava renda para o Estado, não só pela prestação de serviços de saúde,

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das mensalidades dos planos de saúde e à interrupção de atendimento. Nesse período, o poder judiciário, embasado no Código de Defesa do Consumidor, atuou no sentido de conceder liminares favoráveis ao atendimento dos usuários. Assim, entidades médicas, órgãos de defesa do consumidor e organizações não governamentais de usuários e con-sumidores aliaram-se, e, juntamente com o Conselho Nacional de Saúde, o Ministério Público e as operadoras de planos de saúde passaram a exercer uma pressão social para a existência de uma regulamentação para o setor (CARVALHO; CECÍLIO, 2007).

Sobre os marcos pontuais da regulamentação do setor suplementar de saúde, Sato (2007) acrescenta que, em 1993, começaram a tramitar no Senado Federal pro-jetos acerca da regulamentação de tal setor, os quais tinham dois objetivos principais: o ressarcimento ao Sistema Único de Saúde e a ampliação de cobertura assistencial. Em 1997, foi formada uma comissão para tratar da regulamentação e, em 1998, foi promulgada a Lei no 9.656, como resposta ao clamor de alguns segmentos

sociais pela regulamentação de um setor em crescente e desorientado crescimento. De imediato, a regulamentação trouxe alguns signifi cativos avanços que se traduziam em obrigações para as empresas que atuavam como operadoras de planos de saúde (BRASIL,1998a). Dentre os mais notórios, podem-se citar:

– obrigatoriedade de atendimento para todas as doenças relacionadas na

Classifi cação Internacional de Doenças (CID);

– garantia de cobertura integral de medicamentos e materiais durante a

in-ternação hospitalar;

– proibição da limitação quantitativa para realização de procedimentos; – proibição da negativa de cobertura a procedimentos relacionados com doenças

ou lesões preexistentes;

– limites para os reajustes nas mensalidades dos planos de saúde;

– limitação dos tempos máximos de carências;

– proibição da rescisão unilateral de contratos de planos de saúde; – proibição da seleção de risco7;

– garantia de internação sem limite de dias;

– ressarcimento pelas operadoras dos atendimentos prestados a seus

bene-fi ciários no Sistema Único de Saúde.

Adverte-se, ainda, que as inovações produzidas pela Lei no 9.656, de 1998, não

se encerram nessas matérias, podendo serem mencionados, também, outros avanços alcançados, como a ênfase nas ações de promoção à saúde e prevenção de doenças, a priorização da utilização de sistemas de informação para melhor monitoramento do setor regulado e a exigência de contratos mais transparentes.

No mesmo ano de promulgação da Lei no 9.656, foi criado o Departamento de

Saúde Suplementar (DESAS), no Ministério da Saúde, sendo este o primeiro passo para a criação de um órgão com o objetivo de regular esse setor de saúde (ALBUQUERQUE

et al., 2008). De fato, o arcabouço engendrado por essa Lei acarretou mudanças nas

relações entre os agentes do setor microrregulado - operadoras, prestadores de serviços e benefi ciários de planos de saúde8 -, pois a relação entre esses agentes passou a estar

7 Seleção de risco é uma falha de mercado entendida como uma situação na qual a operadora de planos

de saúde rejeita a entrada de um indivíduo em um plano de saúde ao ter o conhecimento, por meio do preenchimento da declaração de saúde ou de realização de perícia médica neste benefi ciário, que o mesmo é portador de alguma doença ou transtorno e, por este motivo, provavelmente, utilizará mais vezes o plano de saúde, causando, assim, um ônus maior à operadora. Logicamente, a operadora procurava selecionar indivíduos sadios, com baixo risco para a utilização do plano, pois dessa maneira incorreria em menos gastos. Ao se tornar proibida a seleção de risco, os indivíduos que queriam ad-quirir um plano de saúde, mas não eram aceitos pelas operadoras em função de doenças ou condições prévias, passaram a ter o direito, defi nido em lei, de serem aceitos por qualquer operadora de planos de saúde, independentemente de suas condições de saúde (TEIXEIRA, 2001).

8 É conveniente esclarecer que, no setor suplementar de assistência à saúde, o benefi ciário de plano

de saúde é o indivíduo que assina um contrato de plano de saúde, com uma operadora de planos de saúde, que lhe dá o direito de utilizar os serviços de saúde descritos nesse contrato, a uma contra-prestação pecuniária (mensalidade) paga à operadora de planos de saúde. A operadora de planos de saúde, por sua vez, recebe essa contraprestação e paga aos prestadores credenciados os serviços de saúde utilizados por seus benefi ciários.

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baseada em instrumentos normativos que restringem a atuação das operadoras, esti-mulando a competição entre essas empresas, a qual está fundamentada, basicamente, nos preços e nos mecanismos de regulação do acesso dos benefi ciários aos serviços de saúde, uma vez que a cobertura mínima e essencial passou a ser determinada por lei.

A Agência Nacional de Saúde Suplementar – ANS

Seguindo uma proposta de reforma do Estado, em 2001, a Lei federal no 9.961

criou a ANS como uma autarquia sob regime especial, vinculada ao Ministério da Saúde, com atuação em todo o território nacional, como órgão de regulação, normatização, controle e fi scalização das atividades que garantem a assistência suplementar à saúde. Essa mesma lei conferiu à ANS a fi nalidade institucional de promover a defesa do inte-resse público na assistência suplementar à saúde, regulando as operadoras setoriais, inclusive quanto às suas relações com prestadores e consumidores, contribuindo para o desenvolvimento das ações de saúde no País (BRASIL, 2000).

A ANS surgiu, portanto, para regular um mercado de planos privados de assistên-cia à saúde que, até aquele momento (quase 60 anos após o surgimento das primeiras operadoras de planos de saúde), atuava sem qualquer intervenção do poder Estatal, operando por mecanismos bastante frágeis, sobretudo quanto ao nível de informação ao consumidor (COSTA, 2008). Além disso, o benefi ciário, ou seja, a pessoa que contratava um plano de saúde, ou a ele aderia, fi cava totalmente entregue a cláusulas contratuais abusivas, visto que, ao assinar o contrato, estava, tacitamente, de acordo com cláusulas que excluíam doenças e lesões preexistentes, enfermidades incuráveis e procedimentos de alta complexidade, e que, inclusive, limitavam os dias de internação hospitalar.

O marco regulatório introduzido pela Lei no 9.656, de 1998 – que dispõe sobre

os planos e seguros privados de assistência à saúde – e pela Lei no 9.961, de 2000

– que cria a ANS – transformou substancialmente o cenário de desrregulação, com a edição de um arsenal de normativos que tratavam desde regras para a entrada e saída de operadoras de planos de saúde no mercado, até a proteção de direitos dos benefi ciários de planos de saúde.

A atuação da ANS veio de encontro a algumas práticas abusivas, procurando garantir, mediante um arcabouço normativo, o desenvolvimento de contratos que ofertassem um rol mínimo assistencial, sem limites de consultas médicas e de in-ternação, reajustes fi nanceiros controlados e seguindo critérios predeterminados, acesso igualitário a portadores de doenças preexistentes, uma qualidade mínima nos serviços de saúde prestados, dentre outros avanços. Assim, nos novos contratos, as operadoras de planos de saúde são obrigadas a cobrir doenças como o câncer, a AIDS e transtornos psiquiátricos, e estão proibidas de negar assistência a benefi ciários que já ingressam no plano com uma doença prévia.

Dessa forma, as Leis n.o 9.656, de 1998, e n.o 9.961, de 2000, fazem

demons-trar que a atuação da ANS na regulação do setor suplementar de saúde tem como objetivos básicos: garantir aos benefi ciários de planos privados de assistência à saúde cobertura assistencial integral, de acordo com a segmentação do plano contratado; defi nir as regras de entrada, manutenção e saída das operadoras de planos de saúde; dar transparência e garantir a integração do setor de saúde suplementar ao Sistema Único de Saúde – SUS, e o ressarcimento dos gastos gerados por usuários de planos privados de assistência à saúde no sistema público; e defi nir o sistema de regulamen-tação, normatização e fi scalização do setor de saúde suplementar (BRASIL, 2003a; PIETROBON; PRADO; CAETANO, 2008).

Estrutura organizacional e procedimentos

administrativos da ANS

A ANS é constituída por cinco diretorias que, sucintamente, realizam as seguin-tes atividades, segundo a Resolução Normativa no 197, de 2009, e Pietrobon, Prada

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– Diretoria de Normas e Habilitação das Operadoras – responsável pela nor-matização, registro e acompanhamento das operadoras;

– Diretoria de Normas e Habilitação dos Produtos – responsável pela normatiza-ção, registro e acompanhamento da operação dos produtos (planos de saúde); – Diretoria de Fiscalização – responsável pelas atividades fi scalizatórias da

ANS e articulação com órgãos de defesa do consumidor;

– Diretoria de Desenvolvimento Setorial – responsável pela articulação com

o SUS e pela gestão da informação;

– Diretoria de Gestão – responsável pela gestão dos recursos-meio (fi nanceiro, humanos, patrimoniais, administrativos) que permitem o desenvolvimento das atividades-fi m da ANS.

Cada uma dessas diretorias é composta por gerências, de modo que a res-ponsabilidade de cada uma das diretorias é alcançada pelo esforço e conexão das gerências envolvidas.

No organograma principal da ANS, estão previstas outras estruturas, como a procuradoria federal junto à ANS, a ouvidoria, a corregedoria, a auditoria interna, a câmara de saúde suplementar e os Núcleos de Atendimento - unidades descentra-lizadas da ANS, existentes nas cidades de Salvador, Belém, Recife, Ceará, Distrito Federal, São Paulo, Ribeirão Preto, Cuiabá, Curitiba, Rio de Janeiro, Belo Horizonte e Porto Alegre - cuja fi nalidade é o exercício de uma fi scalização pró-ativa e reativa nos mercados de planos de saúde em suas áreas de atuação.

O exercício do dever legal da ANS é baseado em normativos editados por esta agência reguladora para estabelecer regras, dentre as quais, podem-se citar: resoluções do Conselho Nacional de Saúde Suplementar (entidade que normatizava os regramentos do setor anteriormente à criação da ANS), portarias da Secretaria de Assistência à Saúde, do Ministério da Saúde (também relativas ao período pré--agência), resoluções da Diretoria Colegiada (RDC), resoluções normativas (RN), súmulas normativas (expressam o entendimento da Diretoria Colegiada da ANS sobre aspectos vagos da legislação), resoluções operacionais (RO), instruções normativas (IN) e resoluções de diretoria (RE) das várias diretorias que compõem o organograma institucional (SANTOS; MATLA; MERHY, 2008).

Os normativos emanados pela Agência visam a regulamentar os artigos das Leis no 9.656, de 1998, e no 9.961, de 2000, que, por serem genéricos e abstratos,

carecem de uma devida regulamentação específi ca. Assim, a ANS edita RNs e INs (principais normativos com impacto regulatório), estabelecendo regras para serem observadas pelos atores do setor suplementar de saúde.

Todas as Resoluções Normativas são submetidas à diretoria colegiada da ANS, que decide sobre a aprovação de tais regras. Uma vez aprovado, o normativo está pronto para entrar em vigor e produzir seus efeitos. Dessa forma, as operadoras têm o dever de seguir e de se adequar a tais diretrizes e, quando deixam de observá-las, podem estar sujeitas às penalidades previstas na legislação setorial. Ainda sobre os normativos emanados pela ANS, deve-se dizer que, não necessariamente, signifi cam um ponto positivo, já que podem ser resultado de uma sociedade frágil, na qual é necessário o excesso de regulamentação pela expedição de normas para regular as atividades econômicas e os confl itos existentes nesse setor. Outra questão é que o excesso de regras pode prejudicar a interpretação das mesmas pelo agente regulado.

Contudo, essa discricionariedade técnica nos textos normativos da ANS deve respeitar os limites da Lei que a criou. Etapa anterior à publicação de normativos é a realização das consultas públicas pela Agência. A consulta pública é um procedi-mento que permite a participação da sociedade na elaboração dos atos (normativos) emanados pela Agência, sendo obrigatória, visto que os normativos só poderão existir com legitimidade e efi cácia se a sociedade civil for consultada, pois os dirigentes da Agência não são representantes eleitos pelo povo, mas, sim, indicados por represen-tantes democraticamente eleitos pelo povo.

Toda a atividade institucional da ANS materializa-se por meio de processos

administrativos. A Lei Federal no 9.784, de 1999, bem como algumas resoluções

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O poder conciliatório exercido pela ANS confi gura-se em uma mediação ativa dos interesses das operadoras de planos de saúde, benefi ciários, prestadores e Estado, com o objetivo, quase sempre, de viabilizar o atendimento do benefi ciário de plano de saúde. O modo mais fácil de se visualizar a ação mediadora de confl itos da ANS é por meio do procedimento de Notifi cação de Investigação Preliminar - NIP. Após a denúncia formalizada à Agência pelo benefi ciário acerca da negativa de cobertura, a operadora tem cinco dias para se manifestar à ANS quanto ao denunciado. Se o procedimento for de cobertura obrigatória e a operadora cobri-lo, a demanda é arqui-vada, motivada pelo cumprimento dos requisitos do instituto da reparação voluntária e efi caz.9 Caso a operadora não cubra o procedimento, a demanda transforma-se em

um processo administrativo fi scalizatório.

O poder fi scalizatório da ANS objetiva verifi car o cumprimento da legislação setorial, o que, em última instância, de acordo com Ventura (2004), está diretamente relacionado com os interesses da sociedade. Quando uma demanda fi scalizatória se transforma em processo administrativo fi scalizatório, a Agência deverá proceder aos ritos legais do devido processo administrativo, apurando a denúncia, comprovando a infração e autuando a operadora, por meio da capitulação da conduta infringida. Como consequência, a ANS pode aplicar sanções (advertências ou multas) contra os administrados que violem o ordenamento vigente. Nesse caso, tem-se um processo administrativo sancionador que, para ser legal, deve respeitar os princípios do direito ao contraditório e da ampla defesa.

Apesar da permanência de inúmeros problemas no cenário do mercado dos pla-nos de saúde, a publicação da Lei no 9.656, de 1998, e a criação da ANS acarretaram

importantes transformações positivas nesse setor.

Cenário Posterior às Leis n

o

9.656, de 1998, e

n

o

9.961, de 2000 - principais avanços alcançados

É possível perceber, por meio dos instrumentos normativos da ANS e da efeti-vação de suas ações, que a maior preocupação regulatória ao longo desses onze anos de existência tem sido com os aspectos econômico-fi nanceiros das operadoras. A Lei no 9.656, de 1998, trouxe muitas regras para a constituição das operadoras (BRASIL,

1998a). No entanto, somente após o ano de 2000, é que passou a ser obrigatório, para a obtenção do registro na ANS, o cumprimento de certas exigências, como constituição de reservas fi nanceiras, registro de produtos e inscrição nos conselhos profi ssionais, o que explica o declínio de novos registros a partir desse ano, em comparação aos dois anos anteriores (SANTOS; MALTA; MERHY, 2008). Dessa forma, pode-se dizer que a ANS começou um movimento de saneamento do mercado, colocando barreiras à entrada de novas operadoras, o que resultou na permanência e na entrada de ope-radoras mais sólidas, com maiores condições econômicas de arcar com os custos da assistência suplementar à saúde. Ao mesmo tempo, sob essa mesma lógica de sane-amento, a ANS procedeu à liquidação de inúmeras operadoras que não se adequaram às novas diretrizes do setor. Em alguns casos, as próprias operadoras solicitaram o cancelamento de seus registros.

Como exemplos de avanços, citam-se os benefícios trazidos pela obrigatoriedade do atendimento a todas as doenças listadas na Classifi cação Internacional de Doenças e de cobertura de todos os procedimentos do rol de procedimentos editado pela ANS; a proibição de exclusão de qualquer tipo de doença; e atendimento integral durante a internação, incluindo materiais e todos os procedimentos necessários (desde que constantes em contrato ou no rol de procedimentos), sem limitação de dias de inter-nação ou de quantidade de procedimentos.

O surgimento do rol de procedimentos, mais do que a ampliação das cobertu-ras ofertadas pelas operadocobertu-ras de planos de saúde, signifi cou uma possibilidade de

9 O instituto da reparação voluntária e efi caz é defi nido pela Resolução Normativa da ANS no 142, de

21 de dezembro de 2006, como a ação comprovadamente realizada pela operadora em data anterior à lavratura do auto de infração e que resulte no cumprimento útil da obrigação.

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mudança do paradigma de atenção à saúde praticado na saúde suplementar, uma vez que abarcou alternativas terapêuticas, como o trabalho multidisciplinar, o desenvolvi-mento de ações de promoção da saúde e prevenção de doenças, além de se constituir um instrumento para a regulação da incorporação tecnológica na saúde suplementar (SANTOS; MALTA; MERHY, 2008).

O projeto de qualifi cação do setor de saúde suplementar, iniciado em 2004, foi uma medida para induzir e acompanhar a mudança de paradigma idealizada pela ANS para o setor. Baseado na avaliação de quatro dimensões do funcionamento do setor (estrutura e operação, assistencial, econômica e satisfação dos benefi ciários) (BRASIL, 2009a), o programa foi planejado em etapas, de modo que se incorporaram outros indicadores aos hoje existentes. A dimensão assistencial representa 50% do peso das quatro dimensões totais e é calculada por meio de um indicador composto, constituído de indicadores da qualidade dos serviços prestados referente às linhas de atenção: materno-infantil, doenças crônicas, oncologia, odontologia, dentre outras (BRASIL, 2009a). O resultado apurado no ano de 2005 mostrou que mais de 60% das operadoras avaliadas obtiveram avaliação superior a 50% da performance esperada (SANTOS; MALTA; MERHY, 2008).

Deve ser salientado, também, que todas as mudanças foram acompanhadas por um incremento no número de benefi ciários desse setor de saúde. Em dezembro de 2000, o percentual de benefi ciários era de 18,7%, aumentando para 19,8% em dezembro de 2006. Esse percentual representa cerca de 44,7 milhões de vínculos de benefi ciários, sendo a maior parte destes residentes nas principais capitais das regiões Sudeste e Sul do País - Rio de Janeiro, Vitória, São Paulo e Florianópolis (AL-BUQUERQUE et al., 2008).

Observa-se, ainda, nas pesquisas de Santos, Malta e Merhy (2008) e Albuquerque

et al. (2008), que a participação das crianças e de jovens menores de 19 anos na

população de benefi ciários de planos de saúde foi reduzida proporcionalmente, en-quanto aumentou a participação de benefi ciários com idade superior a 20 anos. Essa ocorrência pode ser explicada pelas medidas regulatórias de fi xação de faixas etárias e de critérios de reajustes. A Resolução CONSU no 6, de novembro de 1998, e a RN

no 63, de dezembro de 2003, defi niram o reajuste de, no máximo, seis vezes entre

a primeira e a última faixa etária (BRASIL, 1998b; BRASIL, 2003b). Essa medida forçou a diluição do custo dos planos de saúde entre as faixas etárias anteriores à última e, por conseguinte, fez aumentar o valor das contraprestações pecuniárias da primeira faixa etária, de 0 a 19 anos. Vale destacar que, embora tenha ocorrido um decréscimo da participação da população mais jovem nos planos de saúde, o objetivo dessa ação regulatória era evitar o impedimento do acesso da população idosa aos planos de saúde, bem como permitir a manutenção de seus vínculos aos mesmos, na medida em que as operadoras não poderiam mais concentrar os reajustes na última faixa etária do plano.

O aumento da participação da população adulta pode, também, ser explicado pela expansão dos planos coletivos de saúde, o que, por sua vez, está relacionado ao crescimento econômico do País, traduzido, de uma das formas, na geração de empre-gos. Santos, Malta e Merhy (2008) ainda comentam que esse crescimento dos planos coletivos foi de 36,4% entre 2000 e 2006, e que se deve, basicamente, à precifi cação excessiva dos planos individuais novos e pelo crescimento dos planos coletivos por adesão, no qual o risco individual é divido por um número maior de pessoas.

A portabilidade de carências, normatizada pela RN no 186, de 14 de janeiro

de 2009, trouxe uma grande oportunidade aos benefi ciários de planos de saúde de contratação individual/familiar e coletiva por adesão, fi rmados após a Lei no 9.656,

de 1998, ao dispensá-los do cumprimento de novos períodos de carência na época de contratação de novo plano de saúde, na mesma ou em outra operadora (BRASIL, 2009b). Essa medida trouxe mobilidade aos benefi ciários de planos de saúde, visto que eles passam a adquirir a capacidade de migrar para outro plano de saúde quando não estiverem satisfeitos com o que possuem, sem o ônus da carência. Isso, natu-ralmente, aumenta a concorrência no setor, o que é um fator muito positivo para a regulação setorial.

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Quanto à época de contratação dos planos, temos que os mesmos podem ser antigos, anteriores à Lei no 9.656/1998, ou novos, posteriores a ela. Atualmente, a

quantidade de vínculos a planos posteriores à Lei supera o número de benefi ciários vinculados aos planos antigos. Ocorreu uma inversão progressiva desses planos, já que, em 2000, os planos novos representavam apenas 30% do total de vínculos a planos de saúde e, em 2006, chegaram a 63,7% (SANTOS; MALTA; MERHY, 2008). Essa hegemonia dos planos de saúde posteriores à Lei traz a possibilidade de redução dos confl itos judiciais e extrajudiciais, ao mesmo tempo em que fornece um campo de atuação mais seguro para a ANS, trazendo maior possibilidade de efi ciência regulatória. Isso porque os direitos diferenciados dos benefi ciários de planos novos e antigos são causas recorrentes de controvérsia no âmbito administrativo e judicial, difi cultando a atividade regulatória da ANS no que diz respeito aos planos antigos. A Ação Direta de Inconstitucionalidade Pública no 1931, de 1998, deferida sob a forma de liminar

judicial pelo Supremo Tribunal Federal, restringiu a aplicação da Lei no 9.656/1998

a questões genéricas, não especifi cadas nos contratos anteriores a ela, em respei-to ao princípio do direirespei-to adquirido e do arespei-to jurídico perfeirespei-to (SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL, 2003). Logo, nem todos os artigos da referida lei podem ter sua inter-pretação expandida para os planos antigos, visto que o sistema de justiça brasileiro considera inconstitucional tal conduta, o que gera inúmeras dúvidas e discussões no âmbito da regulação dos planos novos e antigos.

Cenário Posterior às Leis n

o

9.656,

de 1998, e n

o

9.961, de 2000 – principais

desafios a serem alcançados

Não obstante ter a regulação, ao longo destes 13 anos da Lei dos planos de saúde e de 11 anos de existência da Agência Nacional de Saúde Suplementar, apre-sentado inequívocos avanços, o esforço regulatório deve concentrar-se na resolução de desafi os que ainda se fazem presentes.

Nessa seara, devem ser lembrados alguns aspectos importantes, como o moni-toramento da qualidade da assistência prestada pelas operadoras de planos de saú-de; a renúncia fi scal; a existência dos cartões de desconto; a operação de empresas como operadoras de planos de saúde sem o registro na ANS e; a adoção de alguns mecanismos nocivos de regulação assistencial pelas operadoras de planos de saúde.

Sem dúvida, o segmento econômico-fi nanceiro é parte primária e fundamental para a existência saudável de uma empresa que objetiva operar no mercado de pla-nos de saúde e, por esse motivo, deve ser monitorado com certa prioridade. Porém, a agência não pode renunciar ao seu papel de regulador da assistência, visto que essa é uma característica defi nida em Lei e de essencial execução para a garantia do interesse público.

A ANS possui, dentre suas competências legais relativas à assistência à saúde, a elaboração do rol de procedimentos, a fi xação de critérios para procedimentos de credenciamento e descredenciamento de prestadores de serviços às operadoras, o estabelecimento de parâmetros e indicadores de qualidade e de cobertura assisten-ciais, o estabelecimento de critérios de aferição e controle da qualidade dos serviços oferecidos pelas operadoras de planos de saúde, a fi scalização das atividades das operadoras, o controle e a avaliação dos aspectos relacionados à garantia de acesso, à manutenção e à qualidade dos serviços prestados, direta ou indiretamente, pelas operadoras, a avaliação da capacidade técnico-operacional das operadoras para ga-rantir a compatibilidade da cobertura oferecida com os recursos disponíveis na área de abrangência geográfi ca e o zelo pela qualidade dos serviços de assistência à saúde suplementar (BRASIL, 2000).

Observa-se que todas essas atribuições deixam clara a obrigação da ANS em defi nir, controlar e avaliar a qualidade dos serviços assistenciais oferecidos pelas ope-radoras de planos de saúde, principalmente no que se refere a sua rede prestadora. Todavia, apesar de já existir há mais de dez anos, a Agência pouco avançou no que

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diz respeito à defi nição de critérios de qualidade, e seu monitoramento, relativos aos serviços de saúde. Uma análise minuciosa do Contrato de Gestão - CG revela esse quadro, pelo fato de não serem encontrados indicadores que intencionem medir a qua-lidade dos serviços que estão sendo prestados pelas operadoras de planos de saúde. O CG “é um instrumento de monitoramento e avaliação do desempenho da agência a partir de conjuntos de indicadores determinantes das dimensões mais re-levantes dos projetos desenvolvidos” pela ANS (BRASIL, 2010a, p. 2), bem como é o documento que contém as metas regulatórias pactuadas entre a ANS e o Ministério da Saúde. Sua fi nalidade consiste em avaliar processos, resultados e impactos, e em propor medidas corretivas para o alcance dos objetivos estratégicos da ANS. Para isso, são estabelecidos no CG indicadores cuja medida deve refl etir o desempenho da instituição. O relatório de execução anual do contrato de gestão de 2010 apresentou o resultado de 24 indicadores, correspondentes aos quatro eixos direcionais da ANS - qualifi cação da saúde suplementar, sustentabilidade do mercado, articulação institu-cional e desenvolvimento instituinstitu-cional. A medida-resumo desses indicadores, isto é, a soma dos resultados dos eixos direcionais, atingiu 94,52%, superando a meta prevista para o ano de 2010, de 80%. Dos 24 indicadores do contrato de gestão, 21 tiveram desempenho superior à meta prevista e somente três não ultrapassaram a meta. Entretanto, nenhum indicador fi cou abaixo da meta estabelecida (BRASIL, 2010a).

É necessário fazer algumas refl exões sobre esses resultados apresentados pela ANS. O próprio relatório de execução anual do contrato de gestão de 2010 admitiu a realização de ajustes nos indicadores em função de “princípios constitucionais” e de “fundamentos da Nova Gestão Pública” (BRASIL, 2010a, p. 5), de forma a garantir maior aproximação dos indicadores às estratégias utilizadas pela ANS para a regulação do mercado, buscando medir os resultados das ações do órgão regulador. Todavia, ao fazer-se a análise de alguns desses indicadores, é possível verifi car que os métodos de cálculos empregados não estão apropriados para o que eles pretendem medir. Um bom exemplo é o indicador do monitoramento da rede assistencial de operadoras do segmento médico-hospitalar, cujo conceito é medir a quantidade de operadoras de planos de saúde classifi cadas em maior risco, de acordo com os parâmetros de Ris-co Assistencial/Perfi l Assistencial e Ris-com o procedimento de monitoramento de rede assistencial desenvolvido por gerência competente. O indicador expressa, apenas, uma medida da quantidade de operadoras que estão com sua rede “em risco”, mas não explica qual risco é esse, e também não expressa nenhum monitoramento da rede dessas operadoras, o que incluiria métodos que, efetivamente, acompanhassem o desempenho das redes assistenciais e a sufi ciência relacionada à quantidade e à qualidade do acesso pelos benefi ciários.

O mesmo ocorre com o índice de respostas no prazo às demandas da Central de Relacionamento, que mede o percentual de resposta ou encaminhamento das de-mandas, que chegam por telefone ou e-mail durante o ano (a maioria, consultas ou denúncias formuladas pelos benefi ciários de planos de saúde), aos núcleos de fi scali-zação ou outras áreas competentes, no prazo de 15 dias úteis. Contudo, o indicador não avalia se os demandantes (os benefi ciários, por exemplo) tiveram a sua dúvida ou o seu problema resolvido, visto que encaminhar demandas a outras área da ANS pode signifi car a postergação de uma solução para o problema apresentado e não a resolução do problema propriamente dito.

Deve ser ressaltado, também, que os indicadores mencionados integram o eixo de sustentabilidade do mercado de saúde suplementar que, na visão da própria ANS, é a “dimensão do cliente” (BRASIL, 2010a, p. 7), devendo tal eixo estimular ações que contribuam para o equilíbrio do mercado. Porém, se os métodos não estão adequados ao que se pretende medir, os resultados não indicarão a realidade que se precisa conhecer. Outra questão igualmente importante se refere à produção, coleta e processamento dos dados para o cálculo dos indicadores. Todas essas etapas são conduzidas pela ANS, o que pode enviesar a interpretação dos indicadores.

A renúncia fi scal aqui tratada refere-se à possibilidade de dedução, no cálculo do Imposto de Renda, das despesas com planos de saúde. Esse abatimento é uma forma, mesmo que indireta, de o Estado fi nanciar um setor de saúde que, por sua

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própria defi nição, deveria ser opcional e autofi naciável (SANTOS; MALTA; MERHY, 2008). Entretanto, em que pese o texto constitucional sobre a saúde, deve-se consi-derar que, se o próprio Estado fi nancia e ao mesmo tempo estimula, sob essa forma, o setor de assistência suplementar à saúde, é porque reconhece a inefi ciência e as limitações do sistema público de saúde. Se, realmente, a população tivesse acesso a um sistema público universal, integral, hierarquizado, com uma rede regionaliza-da integraregionaliza-da e resoluta, a coexistência de um subsistema privado estaria faregionaliza-daregionaliza-da à insignifi cância ou ao insucesso. Longe de propor uma solução para essa questão, o fortalecimento do Sistema Único de Saúde, com base no exercício de seus princípios fundadores, forneceria subsídios para a sustentação de que o sistema privado atua de forma suplementar às necessidades de saúde de quem o contrata e que, dessa maneira, deixa de ser uma necessidade para ser uma opção.

Os cartões de desconto são formas de comercializar produtos ou serviços por meio de uma empresa que atua como intermediária entre o prestador e o consumidor, concedendo descontos a este último. Na área de saúde, essas empresas, geralmente, têm uma lista de prestadores credenciados (médicos, clínicas, laboratórios) com os quais têm acordos de descontos, de forma que, quando um associado (consumidor) dessas operadoras de cartão de desconto necessita de um atendimento de prestadores que compõem a lista de credenciados dessas empresas, o prestador procurado pelo associado tem de dar o desconto previsto no contrato entre o associado e a empresa. Essa relação de intermediação, que, à primeira vista, parece muito boa para o con-sumidor, que paga uma mensalidade de muito baixo custo e, posteriormente, paga o atendimento, com desconto, é, na realidade, perigosa e prejudicial para o mercado de planos de saúde. É perigosa porque, no momento em que o consumidor necessitar de assistência, como algum tipo de exame mais sofi sticado ou uma internação, que não esteja prevista nesse contrato, ele não terá direito; e é prejudicial ao mercado porque compete com os planos de saúde, pois estes últimos necessitam cumprir uma série de exigências, inclusive fi nanceiras, impostas pela Lei dos planos de saúde e pelos regramentos infralegais emanados pela Agência Reguladora. Os cartões de desconto não são regulados pela ANS e por nenhum outro órgão. Constituem-se em práticas proibidas para as operadoras de planos de saúde. Medidas urgentes precisam ser tomadas no sentido de proibir a operação desses cartões de desconto.

Mesmo após muitos anos de regulamentação dos planos de saúde, ainda é levado ao conhecimento da ANS empresas que, de fato, atuam como operadoras de planos de saúde, mas que não possuem o respectivo registro na ANS. Essas empresas atuam na clandestinidade e ofertam, a preços muito abaixo do mercado, planos de saúde para a população. Mais uma vez, o prejuízo aqui identifi cado é duplo: para o benefi ciário - na necessidade de um procedimento de alto custo, a operadora pode não ter reserva fi nanceira sufi ciente para arcar com esse custo e negar o referido procedimento, e para o mercado, já que a competição gerada por essas “falsas operadoras” é desleal, dado que as últimas não incorrem nos vultosos custos com ativos garantidores e reservas técnicas exigidos das operadoras registradas. A ANS, quando, após instauração de processo administrativo sancionador, comprova o exercício de atividade de operadora de planos de saúde sem a obtenção do registro, multa a operadora de fato, diariamente, até a dissolução da mesma ou interrupção das atividades de operadora.

Os mecanismos nocivos de regulação assistencial referem-se a certas práticas recorrentes adotadas pelas operadoras de planos de saúde com o objetivo de postergar ou impedir o acesso dos benefi ciários ao sistema de saúde suplementar. Atendimentos agendados por call-centers e desmarcados nas vésperas, tendo como justifi cativa a ausência de horário para atendimento na agenda de médicos de uma determinada especialidade - o benefi ciário agenda uma consulta com antecedência, sendo que, na véspera do atendimento, a operadora entra em contato informando que a consulta foi desmarcada porque o médico estaria de férias ou não poderia atender naquele horário, por qualquer outro motivo, não oferecendo ao benefi ciário outra data ou outro profi ssional para o seu atendimento e disponibilização da consulta ou do procedimento apenas para 90 dias (por exemplo) após a solicitação - tem como fi nalidade adiar, ao máximo, a realização do procedimento pelo benefi ciário, por acreditar que, se o

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benefi ciário esperar muito, pode ser que se canse e faça o exame por outros meios, são os exemplos mais comuns desses mecanismos nocivos utilizados pelas operadoras

Outras condutas envolvem pedidos reiterados de laudos médicos circunstan-ciados para autorização de cirurgias ou de outros procedimentos mais onerosos, com a justifi cativa de que o profi ssional solicitante não possui a especialidade médica necessária para a solicitação do exame - argumento muito utilizado pela operadora para restringir o acesso assistencial, fazendo o benefi ciário entregar ou enviar vários documentos, não exigidos pelo contrato ou pelas normas da ANS, e a alegação de que o benefi ciário tem uma doença pré-existente e que a omitiu na declaração de saúde. Ao invés de autorizar a cobertura e abrir procedimento administrativo na ANS, conforme estatui a Resolução Normativa no 162, de 2007 (BRASIL, 2007), a operadora

simplesmente nega o procedimento, justifi cando-se com o argumento da pré-existência da doença. Nesse caso, o benefi ciário, se não conheçer a legislação setorial, fi cará sem cobertura para o procedimento requerido. Essas práticas são motivos de abertura de inúmeros processos administrativos sancionadores na ANS, que culminam, muitas vezes, na autuação da operadora por infração aos normativos setoriais. Contudo, a ANS precisa investir em estratégias que impeçam essas práticas; do contrário, o be-nefi ciário continuará sem o acesso assistencial.

Considerações Finais

A ANS vem empreendendo esforços na direção de um acompanhamento pró-ativo das condutas das operadoras, podendo, inclusive, utilizar-se de dispositivos legais, como termos de ajustamento de conduta e regimes especiais de direção, para atingir o fi m último da garantia do interesse público na assistência suplementar à saúde.

No entanto, é necessário refl etir sobre o tempo de existência da Agência, sua atuação no período e sobre os resultados alcançados. A ANS nasceu sob um contexto de reforma do Estado, objetivando ser um órgão cujas decisões técnicas estivessem afastadas das interferências político-partidárias. Para isso, a seus diretores foram dadas autonomia e estabilidade. Além de ser um órgão do Executivo, atua por meio de atividades típicas dos poderes Legislativo e Judiciário. A Lei que a criou defi ne cla-ramente suas competências. Tem um corpo técnico qualifi cado, sendo a maior parte constituída por servidores públicos de carreira.

Após 11 anos de atuação da ANS, tendo no último ano superado a meta prevista em seu contrato de gestão de 80% do desempenho esperado, é necessário fazer uma leitura do cenário social e avaliar se realmente esse percentual refl ete a realidade encontrada.

Sem dúvida, muitas mudanças positivas para o equilíbrio de mercado de planos de saúde ocorreram. As empresas passaram a ter de seguir algumas normas para exercerem atividade de operadoras, como a constituição de reservas fi nanceiras e registros de seus produtos na ANS; a cobertura de todas as doenças da CID-10 tornou--se obrigatória, bem como de todos os procedimentos listados em um rol elaborado pela ANS; houve o controle dos reajustes dos planos de saúde, tanto os individuais, quantos os coletivos; foi proibida a exclusão das doenças pré-existentes; a possibi-lidade de portabipossibi-lidade de carências, dentre outras medidas adotadas que levaram a balança a pender mais para o lado do benefi ciário (consumidor de planos de saúde). Tais medidas permitiram o acesso de mais pessoas aos planos de saúde e com mais segurança quanto à prestação do serviço ora contratado. Nesse contexto, a regulação da qualidade assistencial, uma importante competência atribuída à ANS, tem sido buscada pelo órgão, mas poucos avanços foram, de fato, atingidos nessa seara.

Da mesma forma, a renúncia fi scal; a permanência dos cartões de desconto; a existência de operadoras sem registro, e a utilização de mecanismos nocivos pelas operadoras de planos de saúde, para impedir o acesso do benefi ciário às coberturas contratadas, são grandes obstáculos para regulação setorial alcançar sua visão ins-titucional que é a “de construção de um setor de saúde suplementar, cujo principal interesse seja a produção da saúde” (BRASIL, 2010b, p.22), observados os princípios

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de qualidade, de integralidade e de resolutividade. A regulação da rede assistencial e da qualidade do acesso são etapas fundamentais para a realização desses objetivos. Sem o monitoramento das mesmas, não é possível avançar na visão institucional da ANS. Assim, deve a ANS empreender, também, esforços na superação de seus desafi os e, no que se relaciona a seus indicadores de gestão, acompanhar medidas que mostrem a realidade assistencial dos benefi ciários de planos de saúde, para que a garantia do interesse público seja, efetivamente, alcançada.

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Artigo recebido em 03/10/2010.

Última versão recebida em 01/08/2011. Artigo aprovado em 12/12/2011.

Referências

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