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O Parlamento federal e a cor dos eleitos: perfis sociais e políticos de brancos, pretos e pardos na Câmara dos Deputados

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O Parlamento federal e a cor dos eleitos: perfis sociais e políticos de

brancos, pretos e pardos na Câmara dos Deputados

João Victor Penha dos Santos1

Resumo: este subprojeto foi desenvolvido no Centro de Estudos em Instituições

Políticas e Democracia (CEDIP) e consiste num desdobramento do projeto “Composição, organização e desempenho legislativo do Senado brasileiro: complementação dos dados empíricos e aprimoramentos analíticos”, coordenado pelo prof. Paulo Magalhães Araújo. O principal objetivo deste subprojeto foi analisar comparativamente o perfil sócio-profissional e a trajetória política dos deputados federais brancos e negros da Câmara dos Deputados na 55ª legislatura (2015 -2019). Esta foi a primeira legislatura para a qual o Tribunal Superior Eleitoral exigiu auto-identificação racial no cadastro das candidaturas. Com base na literatura sobre representação política de minorias e sobre profissionalização política, e utilizando-se dados empíricos sobre os deputados federais, a pesquisa comparou os deputados brancos e negros em termos de seus perfis sociais e suas trajetórias políticas. Conforme o esperado, foi constatada a subrepresentação dos deputados negros em relação aos brancos; contraintuitivamente, porém, verificou-se que há poucas diferenças entre os deputados brancos e negros no tocante ao seu perfil social e suas trajetórias políticas. Quanto ao perfil social, ambos tendem a ter curso superior completo, na grande maioria são homens, têm idade em torno dos 50 anos e com um percentual expressivo de formados em direito; quanto ao perfil político, ambos apresentaram trajetórias com experiência nos diversos cargos e nas mais diversas instâncias do sistema federativo brasileiro, mostrando ser profissionalizados ao chegarem à Câmara dos Deputados.

1 Graduando em Ciências Sociais pela Universidade Federal do Espírito Santo, Vitória.

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1. Introdução

O Tribunal Superior Eleitoral (TSE), em 2013, após inúmeras manifestações, decidiu adotar na inscrição das candidaturas das eleições subsequentes, de 2014, o critério de autodeclaração racial. Com essa deliberação surgiu a principal fonte que permitiu a realização este trabalho: o banco de dados com a identificação racial dos candidatos e deputados eleitos (até então, as pesquisas nesse campo eram inviabilizadas pela simples falta de dados sobre os quais trabalhar).

Historicamente, o movimento negro e as forças progressistas da sociedade brasileira denunciam a carência ou a sub-representação dos negros nos cargos políticos eletivos, em especial no Congresso Nacional – no Senado e na Câmara dos Deputados, a chamada “casa do povo”.Entre os diversos trabalhos que evidenciaram a baixa presença de negros no Congresso – além do presente trabalho –, vale destacar o trabalho do Laboratório de Análises Econômicas, Históricas, Sociais e Estatísticas das Relações Raciais (LAESER), conduzido pelo professor Marcelo Paixão, que constatou, no biênio 2007-2008, um total de 11 parlamentares pretos e 33 pardos, compondo, assim, assim 44 parlamentares negros2entre 513 deputados que compõem a Câmara dos Deputados.Não obstante a especificidade metodológica da pesquisa, que adotou a

heteroclassificação baseada em fotos para identificar a raça-cor dos deputados, pode-se

considerar esta uma iniciativa pioneira e um marco para pensarmos a sub-representação dos negros no Brasil. A heteroclassificaçãoé um método de tipificação sujeito a críticas, mas nenhuma forma de classificação da raça-cor dos estudados está livre de problemas e polêmicas.

Outra importante pesquisa que também se debruçou na temática da sub-representação dos negros no Congresso foi realizada pela União de Negros pela Igualdade (UNEGRO),e apresentada durante o seminário “Sub-representação de negras e negras no parlamento brasileiro”, ·ocorrido em 2012. Na ocasião, foi informada a composição racial do parlamento brasileiro, mostrando-se o seguinte resultado: dos 513 deputados, apenas 43 se identificaram como negros (pretos e pardos). Diferentemente da pesquisa

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do LAESER, acima citada, a pesquisa da UNEGRO se pautou pela metodologia da

autodeclaração – ou autoidentificação –, outro método passível de críticas,

particularmente aquelas que marcaram e marcam o debate crescente, nos últimos anos,sobre falhas no funcionamento do sistema de cotas raciais nas universidades e nos concursos públicos.

Não obstante suas limitações e as polêmicas que geraram, pode-se considerar essas duas iniciativas supracitadas como centrais no acumulo de dados e na discussão em torno da temática da sub-representação dos negros na política brasileira. Essas iniciativas se destacaram como marcos importantes nas discussões sobre a presença de negras e negros no Congresso Nacional brasileiro e expuseram figuras centrais na elaboração de uma agenda nacional sobre representação política, com o protagonismo dos negros. Entre outros nomes, podem ser mencionados: Abdias Nascimento (primeiro deputado federal e senador negro), Benedita da Silva (primeira mulher negra deputada federal e senadora), Paulo Paim (ex-deputado federal, senador negro e defensor das causas dos negros, incluindo a questão da representação política). Esses atores políticos ousaram propor a criação de mundos diaspóricos antirracistas, anticoloniais e antigenocidas. O fato é que toda essa movimentação, quer no âmbito da academia, quer no âmbito da sociedade e da política em geral, serviu para tencionar o campo de debate sobre a representação política das minorias – particularmente minorias raciais e de gênero –, tema que, embora tenha recebido um tratamento cada vez mais amplo, é ainda pouco explorado pela ciência política.

Na ciência política, o campo que discute a representação política tem colocado em evidência a importância da representação das minorias – de gênero, raciais, e diversas outras clivagens – para o aprimoramento da democracia. Essa discussão no campo da academia tem implicações sociais e subsidia lutas de minorias sociais por maior igualdade política. Hanna Pitkin (1983) e Anne Phillips (2001) são pioneiras nessa discussão.

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Hanna Pitkin (1983) se destaca por discutir a dimensão descritiva3 da representação, segundo a qual a representação política é vista como uma dinâmica que promove o espelhamento da sociedade nas arenas deliberativas representativas. Representar, nesse sentido, é espelhar, é tornar o parlamento um microcosmo refletido da sociedade em geral. Em outros termos, representar é reproduzir, no âmbito do parlamento, as configurações sociais que marcam a sociedade como um todo – a representação proporcional das categorias sócio-políticas no âmbito do poder legislativo seria uma forma de espelhamento, seria uma forma de representação descritiva.

Anne Phillips (2001), por sua vez, defende a política da presença (combinada com a política das ideias). Categoria por meio da qual a autora defende que a presença cidadã no âmbito dos espaços de ação e decisão política, viabilizando a política das ideias,é essencial para a emancipação e realização política dos mais diversos segmentos sociais – não apenas como coletividades mas como agregado de individualidades. A autora afirma e defende a necessidade da presença física dos atores nos espaços da representação de forma a combinar a presença física dos agentes políticos com a defesa vigorosa das ideias para a realização plena da democracia representativa.

Como se vê, ambas – Pitkin (2001) e Phillips (1983) – permitem um diagnóstico por ora pessimista da realidade da representação em sociedades como a brasileira, em que o parlamento não reflete a sociedade, uma vez que distorce a representação, sub-representando algumas categorias (mulheres,negros, LGBT’s4) e sobrerrepresentando outras (homens, brancos, heterossexuais). O fato é que as deficiências que marcam a representação política em muitos países, entre eles o Brasil, impedem – para usar os termos das autoras – que uma política da presença ou uma representação descritiva se desdobre num exercício vigoroso de uma política das ideias (como quer Phillips) ou de uma representação substantiva (como quer Pitkin).

Essa discussão sobre a defasagem da representação na política brasileira traz à tona outra questão: a da profissionalização. Nas sociedades democráticas modernas, a

3A autora discute ainda as dimensões institucional, substantiva e simbólica da democracia. Embora

importantes na discussão sobre a representação desenvolvida pela autora, uma abordagem dessas dimensões vai além do escopo do presente trabalho.

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profissionalização é uma condição indispensável à representação, tendo em vista a complexidade da sociedade e, por consequência, a complexidade do ato de representar. Nas sociedades contemporâneas, modernas e complexas, os políticos devem ser profissionais. No sentido de Weber (1974), devem viver para a política, mas também viver da política. A ausência de mulheres, bem como de negros ou LGBT’s, nos espaços de poder, pode tanto refletir como causar a falta de representação política e comprometer a profissionalização. Cria-se, assim, um círculo vicioso, no qual a representação deficitária leva a baixos níveis de profissionalização política que, por sua vez, inviabiliza uma maior (e melhor) representação.

Pelo acima exposto, o presente trabalho visa avaliar, com base em dados empíricos sobre o perfil social e a trajetória política de deputados federais brasileiros, o caráter descritivo da representação política com foco na representação dos negros: afinal, o quanto os negros estão presentes na Câmara dos Deputados? Quais as suas origens sociais e quais os seus perfis políticos? Pelos estudos já feitos e alguns deles acima citados, sabemos que os negros são poucos nos espaços representativos em geral e na Câmara dos Deputados em particular, mas ainda sabemos pouco ou nada sobre seus perfis políticos. Afinal, são os negros “profissionais” da política? Quando chegam ao Congresso Nacional, eles demonstram o mesmo nível de profissionalização que seus pares brancos? Respondendo a essas questões, poderemos saber um pouco mais sobre a representação dos negros – homens e mulheres – na principal arena de representação popular da federação brasileira – a Câmara dos Deputados.

2. Objetivo Geral:

Com base em dados sobre a 55ª Legislatura, (fev. 2015 a jan. 2019), este artigo se propõe a comparar os perfis sociais e as trajetórias políticas de brancos e negros (pretos e pardos), de modo a identificar semelhanças e diferenças entre esses dois segmentos étnico-raciais. Esta legislatura foi a escolhida porque é uma das únicas sobre as quais se tem informações sobre a autoidentificação racial dos eleitos.Atualmente, a 56ª Legislatura, iniciada em 2019, também conta com os mesmos dados. No entanto, eles não estavam disponíveis no momento da proposição do projeto desta pesquisa.

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2.1. Objetivos Específicos:

Analisar comparativamente o perfil social dos brancos e não-brancos tendo em vista, além da variável raça-cor, as variáveis idade, sexo, nível de escolaridade, área de formação universitária, profissão e região que representa.

Analisar comparativamente as trajetórias políticas dos parlamentares, tendo em vista as experiências políticas acumuladas previamente à chegada na Câmara dos Deputados. Além da filiação partidário-ideológica, serão consideradas experiências em cargos ocupados no Poder Legislativo, no Poder Executivo e no alto escalão da administração pública nos municípios, nos estados e na federação.

Avaliar se a variável raça-cor está associada a padrões distintos de profissionalização política e perfil social dos representantes.

3. Metodologia

Foi feito um levantamento da literatura especializada, na busca de teorias e autores que serviram como base para o estudo desenvolvido no projeto. Colocou-se foco no que foi necessário à pesquisa, isto é: representação política, elites parlamentares, representação de minorias, profissionalização política.

Adicionalmente, elaborou-se um banco de dados com informações sobre perfis sociais e trajetórias políticas dos deputados federais da 55ª Legislatura, por meio de coleta de informação nos sites da Câmera dos Deputados e do TSE. Com base nos dados, foi possível mensurar quantitativamente as diferenças e similaridades entre brancos e não-brancos no tocante aos seus perfis sociais e experiências políticas adquiridas antes da ocupação da cadeira Câmara dos Deputados, na legislatura em foco. Constam do banco de dados informações sobre o perfil social, tais como idade, sexo, raça-cor, profissão, nível de escolaridade, área de formação universitária, região que representa. No tocante às variáveis políticas, foram incluídos no banco informações sobre cargos políticos ocupados previamente nos três níveis da federação (cargos municipais, estaduais e federais) e nas três instâncias de poder político (legislativo, executivo e administração pública). Também foram levantados dados sobre a senioridade dos parlamentares, isto é,

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sobre os mandatos anteriores (se algum) que os parlamentares acumularam na própria Câmara dos Deputados.

Por fim, foram feitas análises estatísticas dos dados, com o uso do SPSS. Foram priorizadas análises estatísticas descritivas, por meio de tabelas cruzadas, cálculo de médias e análises de frequência, de modo a permitir uma comparação que revelasse as diferenças e similaridades entre brancos e não-brancos (pretos e pardos) em relação às variáveis consideradas.

4. Resultados

Na 55ª Legislatura (2015-2018), temos o universo de dados coletados de 624 parlamentares, sendo 105 suplentes e 519 titulares5. Para designação da raça-cor dos parlamentares, foi utilizada a declaração de pertencimento étnico-racial que os próprios parlamentares informaram ao Tribunal Superior Eleitoral, no ato de inscrição à candidatura. O foco desse trabalho são os parlamentares pretos e pardos, a serem comparados com os parlamentares brancos. Por esse motivo, os autodeclarados amarelos e indígenas seriam, em princípio, desconsiderados. No entanto, vale informar que apenas um deputado se declarou amarelo e nenhum se declarou indígena. O autodeclarado amarelo não será considerado nas análises.

Um outro esclarecimento merece ser feito: segundo o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), a população negra é a somatória dos autodeclarados pardos e pretos; por isso, em algumas tabelas, os deputados serão tratados exclusivamente como negros, ao passo que em outras eles serão especificados como pardos e pretos. Isto se deu em casos que se pretendeu entender melhor a estratificação entre pretos e pardos, para uma compreensão mais acurada da dinâmica da representação racial no Brasil – trata-se de uma escolha epistêmica que consideramos importante para considerações neste relatório, tendo em vista seu objetivo geral e seus objetivos específicos.

4.1 – O perfil social dos parlamentares

5De fato, o número de titulares na Câmara dos Deputados é de 513. Há várias causas para que o número

de titulares empossados por legislatura não coincida com o número de titulares eleitos. A morte antes da posse, a desistência ou a impugnação judicial dos eleitos são algumas delas. Nos primeiros dois casos, o número de titulares que tomam posse é menor que o número de titulares eleitos, no último caso, o número é maior, porque titulares são afastados e dão lugar a outros parlamentares que passam a ser considerados titulares desde o momento da posse.

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As analises se iniciam pelos dados sociográficos. São elencados o pertencimento racial, idade, sexo, nível de instrução dos candidatos, região onde foram eleitos e a área de formação acadêmica. Em seguida, são analisados os dados sobre a trajetória política dos parlamentares. Vale observar que a trajetória política dá sinais sobre grau de profissionalismo político dos representantes. Para uma sondagem da trajetória dos parlamentares, serão considerados: a ideologia, as experiências anteriores nos cargos de vereador, prefeito, deputado estadual, governador, senador, bem como cargos diversos na administração pública – secretários municipais, estaduais e ministros de estado. Também foi considerada a experiência prévia dos deputados na própria Câmara dos Deputados, para saber se eles são novatos ou se têm senioridade, isto é, se têm experiência prévia na própria casa. Importante frisar que este dado, a senioridade, é considerado na literatura um relevante indicador de profissionalização política – é o que diz Polsby sobre a profissionalização parlamentar nos Estados Unidos (POLSBY, 2008). No caso do Brasil, tendo em vista nossas particularidades institucionais, que se refletem nas estratégias dos parlamentares para organizar suas carreiras políticas, os demais cargos ocupados também podem ser considerados como importantes indicadores de profissionalismo político (DI MARTINO, 2010). Por isso, cargos políticos diversos serão considerados indicadores de experiência política e profissionalismo parlamentar. Quanto maior o acúmulo de cargos na trajetória política, maior o profissionalismo e maior a experiência do parlamentar.

Começamos a análise com a tabela 1, apresentando o número geral de parlamentares e o status do mandato, se suplente ou titular. A tabela já permite uma visão geral da estratificação racial que marca a representação política brasileira no nível federal.

Tabela 1: Número de deputados, suplentes e titulares, por raça/cor

Suplentes Titulares Total

Amarela 1 0 1 1,0% 0,0% 0,2% Branca 74 415 489 70,5% 80,0% 78,4% Parda 25 84 109 23,8% 16,2% 17,5% Preta 5 20 25

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4,8% 3,9% 4,0%

Total 105 519 624

100,0% 100,0% 100,0%

Fonte: Elaboração própria, com base nos dados do TSE, 2019.

Nota-se, na tabela, todo o conjunto de parlamentares coletados e a sua identificação étnico-racial: amarela6, branca, parda e preta. Em números absolutos e percentualmente, temos uma baixa presença de deputados pretos e pardos, 104 titulares e 30 suplentes, que compõem, somados, 21,5%. Importante lembrar que, segundo o último censo do IBGE, o percentual dos autodeclarados pretos na população brasileira é de 7,6% e o de pardos é de 43,1%, perfazendo um percentual total de 50,7%. Com base nisso, podemos afirmar que há uma sub-representação do contingente de negros na Câmara dos Deputados.Com relação ao número de suplentes, importa observar que há um numerosos parlamentares pretos e pardos (28,6% somados) que não foram eleitos “de primeira”, mas ascenderam à Câmara por meio da suplência. Isso mostra que a suplência é uma importante via de acesso para os negros brasileiros se alçarem à mais alta arena de representação política no Brasil.

A tabela 2 mostra a estratificação da representação federal por gênero e revela o reduzido número de mulheres em geral, e de pretas e pardas em particular, na Câmara dos Deputados. Com relação aos percentuais gerais, as mulheres perfazem 10,4% dos representantes na Câmara, quando correspondem a 51,7% da sociedade brasileira, segundo dados da Pesquisa Nacional Por Amostra de Domicílios (PNAD) de 2018. Ou seja, há uma forte sub-representação das mulheres em geral na Câmara dos Deputados. Importante ressaltar também que a representação de mulheres está bem abaixo até mesmo da cota de 30% prevista para mulheres nas listas eleitorais dos partidos (artigo 10, parágrafo 3º da Lei nº 9.504/1997 - Lei das Eleições). Além das cotas, há o fundo eleitoral7, efetivado para financiar as campanhas femininas e viabilizar o acesso das mulheres à representação política. Com esses dispositivos legais, não obstante tenha havido um pequeno aumento no nível de representação feminina, a expressão política das mulheres ainda está distante do esperado e do ideal. Isso afeta particularmente as

6Conforme dito anteriormente, o parlamentar que se autoidenficou como amarelo não será considerado na

análise.

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mulheres negras, que são muito pouco contempladas, sobretudo quando se considera apenas o número absoluto das representadas.

Tabela 2: deputados por sexo e cor

Branca Parda Preta Total

Feminino 51 10 4 65 10,40% 9,20% 16,00% 10,40% Masculino 438 99 21 558 89,60% 90,80% 84,00% 89,60% Total 489 109 25 623 100,00% 100,00% 100,00% 100,00%

Fonte: Elaboração própria, com base nos dados do TSE, 2019.

Considerando-se a estratificação por raça-cor e sexo, deve-se notar que o percentual de mulheres pretas, em relação aos homens pretos, é o mais alto (16%). O que ocorre é que o número absoluto é muito baixo: há apenas quatro casos. Com relação às mulheres pardas, o percentual em relação aos homens é menor (9,2%), mas o número absoluto é maior: dez.O fato é que, em termos absolutos, temos uma presença muito pequena de mulheres pretas pardas entre as mulheres (e frente aos homens), contabilizando 14 parlamentares negras (pretas e pardas) e 51 parlamentares brancas. Em termos percentuais, as brancas (10,4%) ficam um pouco acima das pardas (9,2%) mas e abaixo das pretas (16%). Os homens são sobrerrepresentados nos dois segmentos raciais: entre os brancos, 89,6% dos eleitos são homens; entre os pardos, eles somam90,8% e entre os pretos são 84%.

A idade é um indicador interessante, pois mostra a facilidade ou dificuldade de acesso às arenas de representação política. Os dados mostram que, neste sentido, tanto brancos quanto os negros têm o mesmo grau de dificuldade para chegarem ao cargo de deputado federal.

Tabela 3: média de idade, por raça/cor

Raça Média de Idade N

Negro 51,6984 134

Branco 51,5143 489

Total 51,5539 623

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A tabela 3 mostra uma semelhança na média de idades dos eleitos, brancos e negros, ambos em torno dos 51 anos. Interessante notar que essa média de idade é bem distante dos 21 anos que a Constituição exige para ser eleito deputado federal. Essa distância entre a idade constitucional e a idade real pode significar que tanto brancos quanto negros tem de percorrer uma longa trajetória antes de chegar à Câmara. Ou seja, eles têm não só oportunidade quanto, provavelmente, necessidade de se profissionalizarem na política – isso será melhor considerado adiante, ao se analisarem os dados sobre a trajetória política dos parlamentares federais.

A tabela 4 mostra a distribuição dos parlamentares pelas regiões por onde foram eleitos. Na tabela percebe-se uma relação aproximada com a distribuição territorial dos segmentos de raça-cor no território brasileiro, conforme os dados fornecidos pelo IBGE sobre as regiões brasileiras.

Tabela 4: Regiões onde foram eleitos, conforme a raça/cor

Negro Branco Total

Centro-oeste 11 41 52 8,20% 8,40% 8,30% Nordeste 49 113 162 36,60% 23,10% 26,00% Norte 40 59 99 29,90% 12,10% 15,90% Sudeste 32 183 215 23,90% 37,40% 34,50% Sul 2 93 95 1,50% 19,00% 15,20% 134 489 623 Total 100,00% 100,00% 100,00%

Fonte: Elaboração própria, com base nos dados do TSE, 2019.

Temos uma grande presença de negros (pretos e pardos) no Nordeste (36,6%) e Norte (29,9%). Mesmo no Sudeste, o contingente de representantes negros é expressivo (23,9%). Já nas regiões centro-oeste e mais especificamente no Sul, temos uma presença bastante baixa dos parlamentares negros – 8,20% e 1,5%, respectivamente. Esse dado nos mostra que a representação de minorias étnicas é também regionalizada, com forte presença do Norte e do Nordeste e com certo protagonismo dos pretos no Sudeste, mas

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em outras regiões há um número muito reduzido de negros, conforme a distribuição racial da sociedade brasileira pelo território nacional.

Tabela 5: Nível superior completo, por raça/cor

Negro Branco Sim 100 412 512 74,60% 84,30% 82,20% Não 34 77 111 25,40% 15,70% 17,80% 134 489 623 100,00% 100,00% 100,00%

Fonte: Elaboração própria, com base nos dados do TSE, 2019.

A tabela 5 indica se o parlamentar eleito possui nível superior ou não. Nota-se que os negros, percentualmente, têm nível de escolaridade um pouco mais baixo do que os brancos – 74,6% e 84,3%. No entanto, os percentuais gerais de escolaridade são altos se comparados com a média da sociedade brasileira8.As diferenças entre brancos e negros refletem, por certo, as dificuldades para o acesso dos negros à universidade – dificuldade essa reduzida com a implementação das cotas para acesso ao ensino de nível superior. No entanto, o mais interessante dos dados talvez seja o de eles revelarem que, no geral, o parlamentar federal típico tem nível superior. Como a tabela mostra, na média geral, 82,2% dos deputados federais têm curso superior. Como dito, algo muito distante da média da sociedade brasileira.

Quanto à relação entre raça-cor e campo de formação universitária há também dados interessantes. Como mostram outros trabalhos na literatura (vide CODATO et al, 2015), o curso de direito tende a ser um dos mais presentes entre os políticos federais. Os dados da tabela 6 confirmam as expectativas.

Tabela 6: Formação universitária por raça-cor

Negro Branco Total

Não 86 324 410

71,70% 70,40% 70,70%

Sim 34 136 170

28,30% 29,60% 29,30%

8Em 2016, cerca de 66,3 milhões de pessoas de 25 anos ou mais de idade (ou 51% da população adulta)

tinham no máximo o ensino fundamental completo. Além disso, menos de 20 milhões (ou 15,3% dessa população) haviam concluído o ensino superior. (disponível em https://bit.ly/3248eMM, acesso em 03 de julho de 2019)

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Total 120 460 580* 100,00% 100,00% 100,00%

Fonte: Elaboração própria, com base nos dados do TSE, 2019.

* os casos faltantes correspondem a casos sem informação sobre a área de formação acadêmica

Por falta de espaço neste trabalho, outras áreas deformação acadêmica não serão consideradas. O curso de direito foi o escolhido por ser o mais comum entre os políticos, provavelmente devido à convergência, já observado por Weber (1974), entre cursar direito e fazer política. O direito, além de qualificar os políticos para a vida política – com formação retórica e o conhecimento sobre leis – está vinculado a uma profissão liberal que permite o tempo livre para a dedicação às atividades que a política requer. Como os dados da tabela 6 mostram, os quase 30% de formados em direito na 55ª Legislatura confirmam essa tendência. Nenhuma outra profissão é tão comum entre os parlamentares no banco de dados analisado. Neste particular, negros e brancos não se diferenciam entre si, ficando, ambos, perto dos 30% de formados na área jurídica.. Em suma, em relação ao perfil social dos deputados estudados, há poucas diferenças entre brancos e negros. São em sua grande maioria homens, com pouca diferença em termos do nível de escolaridade, idade em torno dos 50 anos, com predileção pela formação acadêmica na área de direito. A maior diferença está na distribuição regional dos parlamentares: há mais negros nas regiões Nordeste, Norte e Sudeste, nesta ordem. Com pouca expressão da representação negra no Sul e no Centro-Oeste.

4.2. Dados sobre o perfil político e a trajetória política dos parlamentares

A discussão sobre o perfil político e trajetória política dos parlamentares começa pela ideologia – esquerda, centro e direita. A ideologia é um fator importante no recrutamento dos parlamentares, pois mostra a disposição dos partidos, conforme sua posição no espectro ideológico, para recrutar segmentos determinados da sociedade. Estudos mostram que partidos de esquerda são mais abertos e propensos ao recrutamento de minorias, enquanto partidos de centro e direita são mais afeitos a segmentos mais estabelecidos na sociedade (MARENCO; SERNA, 2007). O fato é que, quanto à representação de minoria racial, os dados desta pesquisa confirmam achados anteriores da literatura.

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Tabela 7: Raça e ideologia

Negro Branco Total

Esquerda 66 145 211 49,30% 29,70% 33,90% Centro 15 127 142 11,20% 26,00% 22,80% Direita 53 217 270 39,60% 44,40% 43,30% Total 134 489 623 100,00% 100,00% 100,00%

Fonte: Elaboração própria, com base nos dados do TSE, 2019.

A posição ideológica dos partidos foi definida conforme Campos e Machado (2014) e com base nos partidos políticos nos quais os parlamentares se elegeram. Os dados mostramque na esquerda há um percentual maior de parlamentares negros do que brancos – 49,30% e 29,70%, respectivamente. Conforme acima dito com base na literatura,tipicamente os partidos considerados no campo da esquerda dão mais abertura às pessoas negras em sua estrutura e em suas listas eleitorais. No Brasil, na vanguarda, o Partido Democrático Trabalhista (PDT9) foi o primeiro a colocar a pauta racial como prioridade programática, bem como, criar uma estrutura interna para combate a discriminação racial, em 1981. Essas aberturas internas podem ser compreendidas como facilitadoras na inclusão de pessoas negras às arenas políticas. Não obstante, convém observar, atualmente são poucos os partidos que constam, em sua estrutura partidária, com setoriais ou diretorias voltadas à igualdade racial e ao combate ao racismo.

Os dados adiante analisados permitem refletir, considerando a raça-cor, a trajetória percorrida pelos parlamentares até chegarem à Câmara dos Deputados em 2019. Os dados analisados no restante deste trabalho se referem à experiência política dos parlamentares na Casa, em mandatos anteriores, e fora da Casa, em postos no executivo, no legislativo e em cargos administrativos nos três níveis da federação brasileira.

9 “O PDT foi o primeiro partido brasileiro a criar uma estrutura interna dedicada à luta contra a

discriminação racial. A criação da Secretaria do Movimento Negro do PDT significou entregar aos próprios negros a condução de suas propostas e políticas específicas. Não por acaso, o PDT também foi o primeiro partido a nomear secretários de estado negros, incentivar candidaturas afro-brasileiras, e criar

metas de participação política dos afrodescendentes”. Disponível em

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Tabela 8: deputados calouros por raça Negro Branco Veterano 75 296 371 56,00% 60,50% 59,60% Calouro 59 193 252 44,00% 39,50% 40,40% 134 489 623 100,00% 100,00% 100,00%

Fonte: Elaboração própria, com base nos dados do TSE, 2019.

Os dados apresentados nas tabelas 8 e 9 permitem considerações sobre a composição na 55ª legislatura em termos da renovação e do acúmulo de mandatos. Na tabela 8, nota-se um maior percentual de parlamentares negros,em comparação com brancos, que estão assumindo o primeiro mandato – 44% e 39,5%, respectivamente. A diferença percentual é relativamente pequena, mas aponta para um aumento do número de negros na Câmara, uma vez que eles são novatos na Casa. Eles são, por assim dizer, calouros. Entre os parlamentares brancos, o número de veteranos é maior, ou seja, eles não estavam em primeiro mandato ao tomarem posse em 2019. A tabela 9 reforça esse dado.

Tabela 9: raça-cor e experiência prévia na Câmara

Raça-Cor Média de anos de mandato

N Desvio Padrão Mínimo Máximo

Negro 5,1 134 6,251 0 28

Branco 6,1 489 7,409 0 40

Total 5,9 623 7,182 0 40

Fonte: Elaboração própria, com base nos dados do TSE, 2019.

A tabela 9apresentaa expertise dos parlamentares, ou seja, o tempo médio de mandato dos parlamentares negros e brancos na Câmara dos Deputados antes de tomarem posse

em 2019. A título de exemplo, pode-se dizer que um parlamentar que tem um mandato

de experiência antes de 2019 tem expertise igual a 4 anos (tempo de um mandato). Constata-se que o tempo médio de mandato prévio dos deputados negros é inferior ao dos brancos – 5,1 anos e 6,1anos, respectivamente. O desvio-padrão, menor em relação aos negros, mostra que a variação em torno da média é menor entre eles. Isso revela que há entre os negros uma menor variação, se comparados com os brancos, em torno do tempo médio de mandato: eles ficam mais perto do valor médio de 5,1 anos de mandato

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do que os brancos em torno do valor de 6,1 anos de mandato. Entre os negros, o número de anos de experiência prévia varia de 0 a 28 anos na Câmara dos Deputados, enquanto que, entre os brancos, o tempo de experiência prévia na Casa varia de 0 a 40 anos. Há, portanto, maior variabilidade entre os brancos, indicando que a entrada nos negros na Câmara dos Deputados é mais recente – varia menos em um tempo mais curto.

Também é importante notar que, em ambos os casos, o tempo médio de experiência prévia é um pouco maior que um mandato, mostrando que tanto brancos quanto negros acumularam baixa expertise, sendo que os negros acumulam menos expertise que os brancos – um ano a menos, em média. Esse dado converge com o que foi mostrado na tabela 8: há entre os negros um maior número de calouros, ou seja, deputados sem qualquer expertise na Casa.

Tabela 10: Cargos ocupados nas diversas instâncias de governo (%)

Negro Branco Total

Ocupou cargo no Executivo nos três níveis da federação

Prefeito 16,4% 19,6% 18,9%

Governador 3,0% 2,9% 2,9%

Presidente 0% 0% 0%

Ocupou cargo no Legislativo nos três níveis da federação

Vereador 32,1% 26,8% 27,9%

Deputado Estadual 29,9% 35,8% 34,5%

Senador 3,7% 1,6% 2,1%

Ocupou cargo adminstrativo nos três níveis da federação Secretários

municipais

11,2% 18,0% 16,5%

Secretários estaduais 20,1% 19,6% 19,7%

Ministros 3,7% 2,7% 2,9%

Fonte: Elaboração própria, com base nos dados do TSE, 2019.

A tabela 10 apresenta os cargos ocupados em diferentes níveis e instâncias de governo, revelando, assim, a trajetória política dos parlamentares antes de acessarem a Câmara dos Deputados em 2019. Em linhas gerais, pode-se dizer que as trajetórias dos brancos e negros são mais ou menos equiparáveis em termos das experiências acumuladas ao longo de suas trajetórias políticas. Na tabela, estão grifados os cargos em que os negros superam os brancos em termos de experiência prévia.

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O cargo de presidente da República não foi ocupado por nenhum deles antes de chegarem à Câmara10 – nem por negros nem por brancos. Já nos demais cargos todos acumularam alguma experiência na trajetória rumo à Câmara. Os negros superaram os brancos, ainda que por pequena margem, nos cargos de governador, senador, secretário municipal e ministro. A maior diferença, no entanto, se revela nas experiências no cargo de vereador: 32,1% dos negros acumularam essa experiência antes de chegarem à Câmara dos Deputados, frente a 26,8% dos brancos. Isso sugere que a vereança é uma importante porta de entrada por onde os negros iniciam sua trajetória política.

Em síntese, os dados mostram que tanto negros quanto brancos acumulam razoável experiência antes de alcançarem o posto de deputado federal. Isso é uma indicação de que – seja para negros seja para brancos – o cargo de deputado federal é um cargo aonde chegam políticos mais profissionalizados, com um currículo que indica significativa experiência política acumulada.

Tabela 11: Experiência nos níveis estadual, federal e municipal – em qualquer cargo

(%)

Experiência nos níveis federal, estadual e municipal –qualquer cargo

Negro Branco Total

Nível municipal 43,3% 47,4% 46,5%

Nível estadual 41,0% 46,4% 45,3%

Nível federal 6,0% 3,7% 4,2%

Fonte: Elaboração própria, com base nos dados do TSE, 2019.

A tabela 11agrega a experiência em arenas políticas nos três níveis da federação – municipal, estadual e federal– e permite saber em que nível da federação os deputados federais acumulam experiência antes de chegarem à Câmara. Observa-se que, no geral, negros e brancos acumulam uma significativa experiência nos níveis estaduais ou municipais. O percentual de experiência nesses níveis fica na casa dos 40%, sendo que os brancos demonstram um pouco mais de experiência. Apenas no nível federal – aqueles que foram senadores antes de se elegerem deputados em 2019 – é que os negros superam os brancos. De toda forma, é muito baixo o percentual de deputados, negros ou brancos, que se atuaram no Senado antes de chegarem à Câmara – 6,0% e 3,7%, respectivamente. A trajetória política de negros e brancos é bem mais marcada por

10 Essa experiência é relativamente comum entre os senadores. Fernando Collor, Itamar Franco, Marco

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experiências – no executivo, legislativo ou na administração pública – nos níveis municipal e estadual.

Tabela 12: Experiência agregada no Executivo, legislativo e administração pública, em

qualquer do níveis da federação

Experiência agregada no Executivo, legislativo e administração pública em qualquer nível

Negro Branco Total

Executivo 17,2% 21,5% 20,5%

Legislativo 49,3% 48,5% 48,6%

Administração pública 29,1% 33,9% 32,9%

Fonte: Elaboração própria, com base nos dados do TSE, 2019.

Já na tabela 12 o foco recai na experiência nos cargos ocupados no executivo, legislativo e administração pública. Esses dados permitem saber quais as portas de

entrada dos deputados federais na política. O maior percentual de experiência dos

parlamentares eleitos está no próprio poder legislativo, sendo que os negros superam os brancos apenas por uma margem mínima – 49,3% e 48,5%, respectivamente. Em relação aos cargos no poder executivo e na administração pública, a situação se inverte, com os brancos apresentando maior percentual de experiência. Mas também aqui as diferenças entre brancos e negros não são grandes, mostrando, mais uma vez, que a chegada na Câmara dos Deputados é marcada por filtros políticos e institucionais que fazem com que aqueles que alcançam essa arena política tenham atributos de políticos profissionais – sejam eles negros ou brancos (CODATO et al, 2015).

Em suma, os dados gerais corroboram a literatura, que afirma que os atributos para acessar o parlamento federal – no caso, a Câmara dos Deputados – são cada vez mais indicativos de profissionalização política, e isso não distingue muito parlamentares negros e brancos. Os negros enfrentam mais dificuldades para chegarem à Câmara dos Deputados, sendo, assim, sub-representados nessa esfera. No entanto, aqueles que chegam lá demonstram ter qualidades e experiências políticas equiparáveis aos brancos.

5. Conclusões

O estudo sobre perfil sócio-profissional e a trajetória política dos deputados federais, considerando a variável raça-cor, possibilitou uma melhor compreensão sobre representação dos negros na Câmara dos Deputados. Foi constatada a forte

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sub-representação dos negros (pretos e pardos), tendo em vista que o contingente de deputados federais negros é muito inferior ao contingente de negros na sociedade brasileira em geral. Embora estejam em situação um pouco melhor do que as mulheres (negras e brancas) está claro que os negros são uma minoria para a qual se deve desenvolver políticas para uma melhor representação política no nível congressual. As noções de representação descritiva (PITKIN, 1983) e de política da presença (PHILLIPS, 2001) chama a atenção para o quão distante a política federal brasileira está de uma verdadeira democracia no plano da representação política de corte racial.

Com relação à comparação dos perfis social e político de brancos e negros, foi de certa forma, surpreendente observar que há poucas diferenças entre negros e brancos. Embora em termos quantitativos os negros estejam em franca minoria se comparados aos brancos presentes na Câmara, eles demonstraram, em seus perfis sociais e em suas trajetórias políticas, ter atributos convergentes com o que a literatura mostra em relação ao perfil típico do político profissional no Brasil – e em muitos países do mundo.

Em termos de diferenças entre brancos e negros, os dados mostraram que os negros se concentram nas regiões Nordeste, Norte e Sudeste, nesta ordem, sendo muito pouco representados no Sul e no Centro-Oeste. Também foi notada uma maior frequência dos negros entre os calouros, ou seja, aqueles que chegaram à Câmara dos Deputados pela primeira vez em 2019 – o que indica um certo arejamento da representação racial na Câmara. Além do mais, os negros tendem a ser eleitos mais por partidos de esquerda e tem um pouco menos de expertise (experiência prévia na própria Câmara) do que os brancos. Quanto ao mais, são há muitas similaridades entre negros e brancos.

Os deputados negros, como os brancos, são em geral homens, têm curso superior completo (embora em percentual um pouco mais baixo do que os brancos), média de idade gira em torno dos 50 anos, e tendem a ser formados em direito. Com relação à trajetória política que percorreram até chegarem à Câmara dos Deputados, os negros revelaram, também como os brancos, indicadores de profissionalização política: acumularam experiências importantes nos mais diversos níveis da federação – estados, municípios e união – bem como nos mais diversos tipos de cargo – legislativo, executivo e administrativo.

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A título de exemplo, vale mencionar que vereança se mostrou uma importante porta de acesso dos negros à vida política, mas eles também se destacaram em outros cargos como deputados estaduais e prefeitos. Os cargos estaduais e municipais – no executivo, legislativo ou na administração pública – foram os mais experimentados pelos negros antes de chegarem â Câmara, mas os brancos demonstram trajetórias similares. O que os dados parecem mostrar é que no sistema político nacional operam “peneiras” políticas e institucionais que selecionam indivíduos com certos perfis típicos: o perfil do político profissionalizado. Vale ressaltar: os negros estão em desvantagem numérica se

comparados com os brancos, mas, uma vez adentrando a vida política institucional,

demonstram ter características muito similares aos brancos, pelo menos no que toca ao perfil dos deputados federais.

Novas pesquisas precisam ser feitas, de natureza longitudinal, para ver possíveis transformações nesse perfil ao longo do tempo e para aferir se, com os esforços e lutas pela igualdade racial, a democracia brasileira consegue superar ou pelo menos minimizar a desvantagem dos negros, ainda pouco representados na maior arena de representação popular do sistema político brasileiro – a Câmara dos Deputados.

6. Referências bibliográficas

CAMPOS, Luiz Augusto; MACHADO, Carlos Augusto Mello. A raça dos (in)eleitos. Insight inteligência, 2014.

MARENCO, André; SERNA, Miguel. Por que carreiras políticas na esquerda e na direita não são iguais? Recrutamento legislativo em Brasil, Chile e Uruguai. RBCS, vol. 22, n. 64, 2007.

CODATO, Adriano; COSTA, Luiz D.; MASSIMO, Lucas (eds.). Retratos da classe política brasileira: estudos de ciência política. Saarbrüken: Editora Novas Edições Acadêmicas, 2015.

DI MARTINO, M. 2010. A profissionalização do Legislativo: um modelo de análise comparada para o caso brasileiro. Tuiuti: Ciência e Cultura, n. 44, p. 11-30.

POSLBY, Nelson. A institucionalização da câmara dos deputados dos Estados Unidos.

Revista de Sociologia e Política. vol.16 no.30, 2008

(21)

PITKIN, H. O conceito de Representação. In: CARDOSO, F. H. E MARTINS, C. E.

Política & Sociedade (vol. 2). Cia. Editora Nacional: São Paulo, 1983.

PHILLIPS, A. De uma política de idéias a uma política de presença? Revista de

Referências

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