Universidade Federal de Santa Maria
Centro de Ciências Sociais e Humanas
Departamento de Ciências Da Comunicação
Curso de Comunicação Publicidade e Propaganda
O Jogo na vida: um estudo sobre
Gamification
e suas diferentes
aplicações
MONOGRAFIA DE GRADUAÇÃO
Matheus Chitolina da Silva
Santa Maria, RS Brasil
MONOGRAFIA DE GRADUAÇÃO
O Jogo na Vida: um estudo sobre
Gamification
e suas
diferentes aplicações
Por
Matheus Chitolina da Silva
Monografia de Graduação apresentada ao Curso de Graduação em
Comunicação Social Publicidade e Propaganda da Universidade Federal
de Santa Maria (UFSM), como requisito parcial para obtenção do grau de
Bacharel em Comunicação Social Publicidade e Propaganda
.
Orientador: Prof. Dr. Cláudio Renato Zapala Rabelo
SANTA MARIA RS
2015
Universidade Federal de Santa Maria Centro de Ciências Sociais e Humanas Departamento de Ciências Da Comunicação Curso de Comunicação Publicidade e Propaganda A comissão examinadora, abaixo assinada, aprova a Monografia de Graduação.
O JOGO NA VIDA: UM ESTUDO SOBRE GAMIFICATION E SUAS DIFERENTES APLICAÇÕES Elaborada por Matheus Chitolina da Silva Como requisito parcial para obtenção de grau de Bacharel em Comunicação Social Publicidade e Propaganda COMISSÃO EXAMINADORA ________________________________________ Cláudio Renato Zapala Rabelo, Dr. (Presidente/Orientador) _______________________________________ Fernando da Silva Barbosa, Ms. (UFSM) _________________________________________ Jessie Martins Gutierres, Dr. (UFSM) Santa Maria, 17 de dezembro de 2015
RESUMO
Monografia de Graduação Departamento de Ciências da Comunicação Curso de Publicidade e Propaganda Universidade Federal de Santa MariaO Jogo na Vida: Um estudo sobre Gamification e suas diferentes aplicações AUTOR: MATHEUS CHITOLINA DA SILVA ORIENTADOR: CLÁUDIO RENATO ZAPALA RABELO Local e data da defesa: Santa Maria, 17 de dezembro de 2015
Os jogos fazem parte da nossa sociedade. Comumente, é reservado um espaço e um tempo específico para eles, como forma de distração das atividades cotidianas. Jogase, então, para se entreter, passar o tempo, se divertir. Mas o que acontece quando os jogos trespassam esse ambiente prédeterminado para eles? Quando jogos começam a ser usados para outras finalidades além da lúdica, surge o que é chamado de Gamification, conceito que apesar de novo já é utilizado há bastante tempo. Partindo destes pressupostos, o presente trabalho procurou analisar, a partir dos métodos cartográficos, quais as relações existentes entre jogos e Gamification. Além disto, demonstrar diferentes aplicações possíveis para esta ferramenta em diversas áreas, como saúde, educação, mídias e empresas. Após a realização da análise, formulouse um mapa, que demonstra o quão complexa pode ser esta rede que envolve jogos, Gamification e as suas áreas de aplicação.
Palavraschave: Jogos; Gamification; Redes.
ABSTRACT
The game in life: A study about
Gamification and its uses
AUTHOR: MATHEUS CHITOLINA DA SILVA MENTOR: CLÁUDIO RENATO ZAPALA RABELO Local and date: Santa Maria, december 17th, 2015Games are part of our society. Usually, there is a specific time and place for them, in a way to distract us from our labour. We play to entertain ourselves, to have fun. But what happens when games trespass its predetermined time and place? When games starts to be used for other ends besides just fun, we have what is called Gamification . Although the terminology is new, its uses have been around for a while. With that in mind, this study analyzed the relations between games and Gamification , using the cartographic method. It also shows different uses of Gamification applied to several different areas, like education, health, midia, and companies. After the analysis was completed, a map was created, to emphasize how complex can be the network that envolves games, Gamification and its uses.
Key Words: Games, Gamification, Networks.
SUMÁRIO
1. INTRODUÇÃO………08 1.1. Objetivos Gerais……….…10 1.2. Objetivos Específicos………...………….…10 1.3. Metodologia……….…10 1.3.1. Rastreio………12 1.3.2. Toque………...…12 1.3.3. Pouso………...13 1.3.4. Reconhecimento atento……….13 1.4. Justificativa………..14 2. JOGOS, GAMIFICATION E MECÂNICAS………...162.1. Jogos………....…16 2.2. Gamification………....24 2.2.1. Características básicas………..26 2.2.1.1. Objetivos………..….26 2.2.1.1.1. Achievers………..28 2.2.1.1.2. Killers……….…29 2.2.1.1.3. Socializers……….…29 2.2.1.1.4. Explorers………...29 2.2.1.1.5. Facebook e os tipos de jogadores……….…30 2.2.1.2. Regras………...31 2.2.1.3. Sistema de feedback………..31 2.2.1.4. Participação voluntária………...33 2.3. Mecânicas………...34 3. GAMIFICATION NA PRÁTICA………..…38 3.1. Sistema de Pontos……….…38
3.1.1. Pontuação de troca direta……….….39
3.1.2. Pontuação de troca indireta……….……..…39
3.2. American Idol e Gamification na televisão……….…43
3.3. Gamification na educação e ensino……….…………47
3.4. Gamification aplicado à atividades físicas………..…………51
3.4.1. Wii Fit e os games de exercício………....51
3.4.2. Zombies, Run! e os aplicativos para celular………...52 3.4.3. Escadas rolantes ou convencionais?………...53 3.5. Gamification na publicidade………..54 3.5.1. Sorteios……….54 3.5.2. Advergames……….55 3.5.3. Publicidade em jogos eletrônicos……….…57
3.5.4. Easy Taxi e Gamification em campanhas de mídias sociais………...58
3.6. Gamification na saúde………...59 3.6.1. Foldit e pesquisas sobre doenças………....60 3.7. Mapa……….62 4. CONSIDERAÇÕES FINAIS……….68 5. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS………...69
1. INTRODUÇÃO
Imagine o seguinte jogo: Você começa sem saber onde está e nem o que fazer. Aos poucos, vai compreendendo o ambiente e entendendo os movimentos possíveis. Seu personagem precisa de bastante ajuda no começo, até cumprir os primeiros objetivos. Conforme eles vão sendo alcançados, novos vão surgindo, e se moldando conforme você avança. A ajuda, que no começo era constante, passa a diminuir, pois o seu personagem já tem um controle maior sobre suas ações.
Os objetivos, antes simples, passam a ficar mais complexos, e começam a se moldar a partir das escolhas feitas. Você passa a conhecer outros aventureiros, com caracteristicas parecidas com as suas, e que podem ajudálo a avançar. Conforme seu personagem vai evoluindo, ele passa a adquirir novas habilidades, que podem ser treinadas para uma melhor performance. Algumas possibilitam também que se consiga um ofício, e o acúmulo de moedas através dele pode ser uma das conquistas almejadas.
E, falando em conquistas, elas podem ser das mais diversas. Jogadores costumam ter objetivos completamente diferentes, que muitas vezes se sobrepõem ou se complementam. Inclusive o próprio jogador pode ter seus mais variados sonhos, desejos ou troféus que pretende ganhar. A proposta de ter tantas opções também é que hajam prêmios de curto e de longo prazo, para que haja motivação para continuar jogando.
O ambiente recém descrito poderia ser o de diversos games . Mas não falo de MMORPG’s como o1 World of Warcraft 2, por exemplo. Nem de RPG’s de mesa, como
1 Sigla que se refere a Massive Multiplayer Online Role Playing Games, ou, em outras palavras, um jogo de RPG online em que muitos jogadores interagem no mesmo ambiente virtual. Os Role Playing Games, comumente conhecidos como RPG’s, são um estilo de jogo que se baseiam na criação de um personagem e a interpretação das ações deste personagem em um ambiente ficcional.
2 World of Warcraft é um jogo da Blizzard. Pela definição do site da empresa “World of Warcraft é um jogo online em que jogadores de todo o planeta assumem papéis de heróis fantásticos para explorar um mundo virtual repleto de magia, mistério e aventuras sem limites.” (disponível em
Dungeons and Dragons . 3 Na verdade, não estava falando nem de um jogo propriamente dito, mas sim da vida. Porque sim, a vida pode ser comparada com um jogo. Também nela temos objetivos a cumprir, obstáculos a superar. Podemos aprimorar nossas habilidades para atingir essas conquistas, e muitas vezes a conquista pode ser o próprio aprimoramento dessas habilidades.
Porque então às vezes os jogos parecem tão mais divertidos que a vida? Porque muitas vezes preferimos utilizar nosso tempo para resolver os problemas nos games ao invés de resolver os problemas do nosso cotidiano? Ou aprimorar as habilidades dos nossos personagens ao invés das nossas próprias?
Alguns autores, incluindo McGonigal (2012) e Huizinga (2010), separam o jogo do “mundo real”. O simples fato dos jogos serem ou não reais ou do que é a realidade e como eles se enquadram nela exigiria uma enorme reflexão, que fugiria do foco deste trabalho e possivelmente não chegaria em uma resposta concreta. O que nos interessa dessa ideia de separação é se pensar que diversas vezes, ao jogarmos, somos transportados para dentro do ambiente do jogo, o que Huizinga (2010) chama de Círculo Mágico. Quando imersos nesse círculo, tendemos a nos esquecer dos nossos problemas, utilizando toda a nossa energia e foco para resolver os problemas do jogo.
Mas e porque a vida também não pode ser um jogo? Como descrito nos primeiros parágrafos, ela também tem elementos que se confundem com os dos jogos. Porque então diferenciar vida e jogo? Porque muitas vezes tomamos a vida como séria e o jogo como diversão, passatempo? Ou ainda, porque não pode haver jogos no trabalho, na escola, ou até nas nossas práticas de consumo?
Uma resposta possível a essas perguntas se encontra no termo Gamification, tema deste trabalho. A proposta dessa ferramenta é justamente tornar a nossa vida mais parecida com os jogos. Mas o que afinal é Gamification? A partir destes questionamentos, surge a problemática deste trabalho, que consiste em responder: O que é Gamification? E como ele pode ser aplicado?
3 Um dos mais conhecidos jogos de RPG existentes. O jogo é baseado em uma fantasia medieval com monstros, dragões e magia.
Considerandose estes questionamentos, têmse os objetivos a serem alcançados:
1.1. Objetivos gerais:
Compreender, através da utilização do método cartográfico, as relações entre jogos e Gamification, bem como possíveis aplicações deste conceito.
1.2. Objetivos específicos:
Através da pesquisa bibliográfica, conceituar jogos e Gamification, traçando uma relação entre os conceitos;
Através do método cartográfico, buscar exemplos relevantes de aplicações de
Gamification em diferentes ambientes;
Criar um mapa, utilizandose dos conceitos de rizoma, que demonstre as relações entre jogos, Gamification, e os exemplos encontrados.
1.3. Metodologia:
Ao se deparar tanto com a problemática quanto com os objetivos propostos por este trabalho, fezse necessária uma conjunção de métodos para melhor responder aos questionamentos propostos. Num primeiro momento, ao buscar as definições tanto de jogos quanto de Gamification, foi utilizada a pesquisa bibliográfica, de modo a compreender os conceitos sob o ponto de vista dos diferentes autores. Para Stumpf, a pesquisa bibliográfica é
“desde a identificação, localização e obtenção da bibliografia pertinente sobre o assunto, até a apresentação de um texto sistematizado, onde é apresentada toda a literatura que o aluno examinou, de forma a evidenciar o entendimento do pensamento dos autores, acrescido de suas próprias ideias e opiniões.” (STUMPF, 2012, p.51)
Realizandose a pesquisa bibliográfica, percebeuse que existem diversos pontos de intersecção entre jogos e Gamification, e que os exemplos apresentados pelos autores ressaltam esta ocorrência com diferentes intensidades. Ainda, houve um
entendimento que, por diversas vezes, tanto os jogos como o próprio Gamification já estão interligados com diferentes aspectos da vida cotidiana, ainda que não se utilize esta terminologia.
Entendese então estas interligações entre jogos, gamification, e as aplicações no cotidiano, como se fossem rizomas, conceito apresentado primeiramente por Deleuze & Guatari (1996).
“O rizoma se estende e desdobra num plano horizontal, de forma acêntrica, indefinida e nãohierarquizada, abrindose para a multiplicidade, tanto de interpretações quanto de ações, remetendo à formação radicular da batata, da grama e da erva daninha. Ele não opera pelo jogo de oposição entre o uno e o múltiplo, não tem começo, fim ou centro, nem é formado por unidades, mas por dimensões ou direções variáveis, além de constituir multiplicidades lineares ao mesmo tempo em que é constituído por múltiplas linhas que se cruzam nele, formando uma rede móvel, conectando pontos e posições.Devese ainda ter em conta o aspecto subterrâneo de uma formação rizomática, que leva a um problema de visibilidade imediata dessa complexa e intrincada teia de relações” (PRADO FILHO & TETI, 2013, p. 51)
Desta forma, podese pensar nestas conexões como rizomáticas, tendo no caso diversos pontos de encontro que se cruzam e formam uma rede, que não necessariamente tem começo nem fim. Isto porque, ao se pensar em jogos, ou até mesmo Gamification, novos pontos de encontro são criados a todo momento, assim que se utiliza a mecânica conhecida de um objeto e se adapta para outro.
Portanto, tendo em vista este dinâmismo, bem como as diversas interligações possíveis entre os aspectos a serem estudados, optouse pelo uso do método cartográfico como estratégia de análise da relação entre jogos e Gamification e, como consequência, a exemplificação de suas diferentes aplicações.
“A cartografia surge, então, para orientar e organizar a busca, permitindo um
mapeamento a partir de uma indeterminação inicial e aparente de nosso objeto: não conhecemos seu início e nem seu final, identificamos aspectos que o definem, porém não suas fronteiras e, tampouco, vislumbramos com clareza seus entremeios, suas intensidades, seus modos de ser e de atuar.” (PETERMANN, 2011, p. 37)
Este método condiz com os objetivos propostos pelo trabalho, tendo em vista que, uma vez definidos os conceitos principais (jogos e Gamification), não se pretende chegar a uma resposta final, mas sim fazer um mapeamento de como estes conceitos estão sendo utilizados no cotidiano. E, partindo do pressuposto que a cada dia novas relações são criadas, tornase inviável conhecer todas as fronteiras, servindo este estudo apenas como um embasamento das possibilidades de utilização destas ferramentas.
Kastrup (2007) sugere quatro tipos de variações na atenção ao se realizar o trabalho de cartografia, sendo elas o rastreio, o toque, o pouso e o reconhecimento atento. Estas variações foram utilizadas como um modo de estruturar o trabalho.
1.3.1. Rastreio:
“O rastreio é um gesto de varredura de campo” (KASTRUP, 2007, p. 18). Este
foi o primeiro tipo de atenção utilizada. Como o próprio nome diz, nesta etapa ainda não se utiliza o foco de atenção sobre determinadas áreas, mas sim percebese tudo que existe ao redor dos objetos estudados. No presente trabalho, esta etapa figurou principalmente em conjunto com a pesquisa bibliográfica, na qual se procurou num primeiro momento apenas dimensionar, através da conceituação, até onde se encontram os jogos e Gamification.
1.3.2.Toque:
A partir da pesquisa bibliográfica, começouse a perceber onde o Gamification
vem sendo utilizado, a sua relação com os jogos e algumas apliacações. A essa percepção destes pontos rizomáticos, Kastrup (2007) chama de toque. “O toque é sentido como uma rápida sensação, um pequeno vislumbre, que aciona em primeira mão o processo de seleção.” (KASTRUP, 2007, p. 19).
Pensando em uma analogia com a palavra, podese pensar no toque como por exemplo observar uma maquete com os olhos fechados, utilizando apenas o tato. Será possível observar as saliências do terreno, entendendose como os pontos que mais
chamarão a atenção. No presente trabalho, estas saliências podem ser compreendidas como os exemplos encontrados e que servirão para demonstrar a aplicabilidade do
Gamification.
1.3.3. Pouso:
Considerando as atenções anteriores, que permitiram um reconhecimento do campo (rastreio) e a observação de diversos pontos de contato entre os objetos estudados (toque), foi possível passar para uma próxima etapa de atenção, compreendida como sendo o pouso. “O gesto de pouso indica que a percepção, seja ela visual, auditiva ou outra, realiza uma parada e o campo se fecha, numa espécie de zoom. Um novo território se forma, o campo de observação se reconfigura. A atenção muda de escala.” (KASTRUP, 2007, p. 19).
No presente trabalho, o gesto de pouso configura a escolha de quais exemplos serão utilizados, a partir de todos os encontrados durante as fases anteriores. Cada escolha (ou cada pouso) realizada tem como base o rastreio e o toque realizados previamente. Entendese, portanto, que os exemplos utilizados não são os únicos existentes, mas sim que eles detiveram a atenção do autor com base na sua relevância. A proposta da escolha destes exemplos então serve para demonstrar o uso do Gamification em diferentes áreas, como forma de um mapeamento de possibilidades do uso desta ferramenta.
1.3.4. Reconhecimento atento:
“Bergson afirma que o reconhecimento atento tem como característica nos reconduzir ao objeto para destacar seus contornos singulares.” (KASTRUP, 2007, p. 20). Após as escolhas dos exemplos realizadas durante a etapa do pouso, o reconhecimento atento então funciona como uma forma de atenção mais focada, visando entender as particularidades de cada exemplo escolhido e como elas se comportam.
No caso do presente trabalho, como a atenção é voltada para o Gamification e a sua relação com os jogos, o foco da analise no reconhecimento atento foi justamente entender quais os aspectos dos jogos que estão presentes em cada exemplo, e como que isto configura o uso da ferramenta de Gamification . Portanto, não se atevese sobre assuntos como a história e conceituação de cada exemplo, pois isto tiraria o foco dos pontos de interesse.
Por fim, após a análise dos exemplos, foi composto um mapa com os resultados encontrados. Conforme dito anteriormente e também levando em consideração o método escolhido, a proposta do mapa não é delimitar fronteiras dos objetos estudados, mas sim servir como um embasamento das possibilidades existentes.
1.4. Justificativa
Primeiramente, é preciso ressaltar que sempre fui fascinado pelos jogos e pela capacidade de imersão que eles me proporcionam a cada partida. E isto inclui não só jogos eletrônicos (para videogames ou para computador), mas também jogos de tabuleiro e diferentes esportes.
Mas porque os jogos sempre me chamaram mais a atenção do que outros aspectos do cotidiano? Porque às vezes, mesmo tendo uma matéria interessante para estudar, ou algum trabalho para fazer, eu acabava deixando tudo de lado para jogar um pouco. E, ainda, porque realizar estas outras atividades não me pareciam tão divertidas quanto o ato de jogar? Estes eram alguns dos meus questionamentos ao iniciar este trabalho.
Ao começar os estudos sobre jogos, me deparei com outros autores que também compartilham da mesma fascinação que eu. E que eles enxergam o potencial desta capacidade imersiva para além da finalidade lúdica. A partir desta ideia de utilizar os jogos em outras áreas, que surgiu o termo Gamification , como uma tentativa de utilizar a imersão e o engajamento dos jogos lúdicos para atividades produtivas.
E o termo logo virou “moda”, com diversas empresas surgindo para atender a esta nova demanda e outras tantas tentando adaptar processos para deixálos mais parecidos com jogos. Tanto que, em 2011, surgiu uma pesquisa do instituto Gartner mostrando que até o final de 2015, mais de 70% das 2000 maiores empresas do mundo iriam ter pelo menos algum processo “gamificado” . 4
Porém, como Kapp (2012) comenta, Gamification ainda é visto por muitas organizações como apenas um sistema que distribui pontos, distintivos e premiações . 5 Isto delimita de certa forma a criatividade de se pensar em diferentes mecânicas, cada uma apropriada para uma situação em específico. Portanto, este trabalho serve, de certa forma, para desmitificar essa premissa e tentar demonstrar a abrangência que esta ferramenta pode ter.
Partindo destes pressupostos, entendese que este trabalho possui, então, como justificativa pessoal, a intenção do autor em conhecer mais sobre o assunto e suas aplicações. Do ponto de vista da comunicação, mostrar como o Gamification vêm sendo utilizado em diferentes mídias, incluindo a televisão e redes sociais. E, para a publicidade, se torna um termo relevante, partindo da premissa que o publicitário deve conhecer o máximo de ferramentas possível, de modo a conseguir escolher qual a que mais se adequa a cada cliente e a cada problema de comunicação a ser resolvido.
Ainda, como será demonstrado ao longo do trabalho, esta ferramenta pode ser aplicada em diversas áreas. Logo, tanto acadêmicos quanto profissionais podem se valer desta pesquisa como embasamento para pensar em ações ou processos que utilizem mecânicas de jogos, como uma solução viável para conseguir engajamento dos públicos com os quais trabalham. 4 Artigo disponível em <http://www.gartner.com/newsroom/id/1629214> 5 Esta visão distorcida engloba inclusive revistas de negócio. Como exemplo, podese citar uma matéria na revista Exame que, ao tentar explicar o conceito, cita o gamification como sendo apenas a distribuição de distintivos e prêmios. Matéria disponível em <http://exame.abril.com.br/pme/noticias/oqueegamification>
2. JOGOS, GAMIFICATION E MECÂNICAS
2.1. Jogos
Gamification, Funware, ou em português Gamificação é um termo que vem se tornando cada vez mais frequente no mundo empresarial, embora a ideia exista há muito tempo, e advém da nossa vontade de jogar, consequentemente transformando partes do nosso cotidiano em jogos. Podemos, por exemplo, “gamificar” uma caminhada, ao evitar pisar nos vãos entre as pedras da calçada, ou ao tentar ultrapassar os outros caminhantes. Mas o que afinal é o Gamification?
O termo é originário do inglês, através da junção da palavra ‘ game’ (em português jogo) com o sufixo ‘ fication’ (designando, neste caso, a ação de tornar). Deste modo, uma tradução literal do termo seria o ato de transformar algo em jogo. Porém, Huizinga (2010), adverte sobre a variação dos termos jogo ( game , por exemplo, em inglês) e jogar (que em inglês significa play ) nas diferentes línguas. Como o autor explica, o conceito de jogo é bem tardio, e varia conforme a cultura e a importância dada ao jogo por ela. Exemplos de jogos. Montagem do autor6 6 Fonte das imagens: <http://ajogada.com.br/wpcontent/uploads/2015/05/futebol.jpeg> <http://www.redesulbahia.com.br/br/nossaregiao/ilheus/1032semifinaldecompeticaodexadrezacontece emilheus.html> <http://www.techtudo.com.br/dicasetutoriais/noticia/2015/03/counterstrike16comoinstalarnovosmapas
Portanto, é primeiro definir o jogo, para poder então compreender o que é o
Gamification. Futebol, xadrez ou Counter Strike (jogo de tiro para computador) são considerados jogos, e os reconhecemos instantaneamente com tais, mesmo sendo eles bem distintos entre si. Como Vianna comenta, “qualquer pessoa, por menor afinidade que tenha com o tema, é capaz de identificar um jogo quando em contato com ele.” (VIANNA et al, 2013, p. 25). Huizinga (2010) expõe as caracteristicas básicas dos jogos como sendo:
Participação espontânea;
Distinção da vida real, podendo a qualquer momento o jogador ter toda a sua atenção absorvida pelo jogo;
Limitação tanto de espaço quanto de tempo;
Ordem, no sentido de se respeitar as regras, e o espaço do jogo.
Ainda sobre a limitação de espaço, Huizinga (2010) compara o espaço do jogo, sendo ele a mesa, a quadra ou o computador, com os lugares sagrados dos cultos. “Todos eles tem a forma e a função de terrenos de jogo, isto é, lugares proibidos, isolados, fechados sagrados, em cujo interior se respeitam determinadas regras. Todos eles são mundos temporários dentro do mundo habitual, dedicados à prática de uma atividade especial.” (HUIZINGA, 2010, p. 13).
Por essa razão que ao jogarmos, seja em um tabuleiro, onde estamos tentando montar uma estratégia para conseguir o maior número de pontos possíveis, ou numa quadra de futebol, ao nos esforçarmos para ganhar do adversário, há uma sensação de imersão naquele ambiente e por vezes perdemos a noção de tempo, pois fomos transportados para o universo do jogo em questão.
A essa imersão Huizinga (2010) dá o nome de Círculo Mágico, conceito utilizado também por diversos outros autores, como por exemplo Mastrocola (2012) e Alves (2014). O Círculo Mágico, conforme as caracteristicas do próprio autor, tem um espaço e um tempo bem definido. Dentro dele há ordem, provida não só pelas delimitações de espaço/tempo, mas também pelas regras propostas.
Com relação a isso, Mastrocola comenta que “um jogo belíssimo, mas com regras desconexas e que não atingem seus objetivos, acaba sendo dispensado pelos jogadores, que possivelmente não vão se divertir ao se envolverem na experiência.” (MASTROCOLA, 2012, p.36). Ou seja, regras que não promovam a ordem, ou em outras palavras que não façam sentido aos olhos dos jogadores, podem acabar impedindo a imersão, e sendo o jogo uma atividade espontânea, o mais provável é a desistência por parte do jogador.
Koster (2012), também comenta sobre as regras e a ordem gerada por elas, mas utilizando uma abordagem diferente. Para ele, o cérebro é orientado para a ordem, e para encontrar padrões em tudo que vemos. Tendemos a desgostar do caos. E no jogo há uma possibilidade maior de controle. Ao jogar, tendemos a conhecer todas as regras e restrições, e mesmo quando as regras mudam ou que são apresentadas ao longo do tempo, há uma clara noção do que pode ou não ser feito.
Tomando como exemplo uma partida de futebol entre garotos do bairro, ao se ver de frente para o gol, um dos meninos tem diversas opções: ele pode chutar a bola, tentar driblar o goleiro, ou passar a bola para outro jogador do seu time. Cada uma dessas ações pode ou não resultar em gol. Ao mesmo tempo, ele sabe que não pode fugir das regras para atingir o objetivo, sendo que elas próprias é que deixam claro qual é este objetivo. Caso o garoto, por ser dono da bola, decidir que ele pode agarrála com a mão, colocandoa dentro da goleira, e esse gol valerá por cinco ao invés de um, ele estará quebrando as regras, e possivelmente os outros meninos deixarão de jogar com ele. Como Huizinga (2010) explica, “O jogador que desrespeita ou ignora as regras é um ‘desmanchaprazeres’. O desmanchaprazeres destrói o mundo mágico, portanto, é um covarde e precisa ser expulso.”
Tradicionalmente, as regras do jogo são apresentadas antes de se começar a jogar. Após os jogadores conhecerem o que podem ou não fazer, eles começam a partida. Como exemplos, podemos citar jogos de tabuleiro ou esportes. Porém, com o advento de jogos eletrônicos, mais e mais games aparecem em que as regras são
desvendadas ao longo do percurso. Isto não quer dizer que as elas não existem, apenas são desconhecidas pelo jogador.
Isso acarreta em uma mudança de comportamento, de aprender para jogar para aprender jogando. Projetase o jogo de certa forma que haja uma curva de aprendizagem, ou seja, a partida começa de maneira simples, para a ambientação, e conforme os movimentos e possibilidades vão se tornando conhecidos, mais obstáculos são acrescentados, criando o desafio.
Essas mudanças acarretam em novas possibilidades dentro do universo dos jogos. Isso inclui principalmente a quebra de expectativa e surpresas ao decorrer do processo. Enquanto, como no exemplo acima, no futebol as regras são conhecidas e aceitas por todos os jogadores antes da partida começar; ao jogar um game de computador, o jogador pode se surpreender ao avançar. Como por exemplo, ganhar uma habilidade que permita que ele possa voar, algo que não era possível antes, ou encontrar um caminho secreto escondido em um túnel.
Um exemplo que pode ser citado é o jogo Portal. Ao clicar em “começar um novo jogo” não há nenhuma explicação do que o jogador deve fazer. Na tela, ele aparece preso em uma sala, e deve achar a saída. Conforme se vai avançando novas explicações são fornecidas, de modo a criar o entendimento sobre o que deve ser feito e o contexto.
Imagem da tela inicial do jogo Portal. As únicas informações fornecidas são como se movimentar, através dos botões W S A e D. O jogador deve descobrir o que fazer para avançar. Fonte da imagem:
Koster (2012) explica que os jogos são exercícios para o cérebro. Portanto, os que não o estimulam acabam sendo deixados de lado. Essa falta de estímulos ser ocasionada tanto pelo jogo ser muito fácil, por ser muito difícil, ou, como supracitado, quando há regras desconexas que impedem a criação de ordem.
Já McGonigal (2011), define o jogo como tendo quatro caracteristicas primordiais:
● Objetivos: São a finalidade de o jogo estar sendo jogado. Eles podem variar de jogador a jogador, e também de partida a partida. Como exemplo, podese citar o golfe. O objetivo primário do jogo é colocar a bola no buraco. Mas o jogador pode ter outros, como ganhar dos seus amigos, ou bater um recorde pessoal.
● Regras: São as limitações impostas para cumprir os objetivos. No exemplo do golfe, podemse citar como limitações o fato de que o jogador deve começar a partida longe dos buracos, e que deve utilizar apenas o taco para acertar na bola.
● Sistema de feedback: Serve para mostrar aos jogadores o quão próximos ou distantes eles estão dos objetivos. No exemplo do golfe, podese considerar a distância entre a bola e o buraco, ou o número de tacadas que foram necessárias para concluir a partida.
● Participação voluntária: Assim como Huizinga (2010) explica, a participação deve ser voluntária. McGonigal (2011) entende esse item como sendo também a aceitação dos objetivos, das regras e do sistema de feedback.
É importante ressaltar também que existem jogos em que não é possível “vencer”. McGonigal (2011) dá o exemplo do Tetris, um jogo eletrônico em que o objetivo é encaixar peças da maneira mais eficiente possível. Porém, conforme as peças vão sendo organizadas, novas surgem, com a velocidade gradativamente aumentando, até que o jogador perca. Mesmo sendo impossível ganhar, o jogo se tornou popular porque era possível contar pontos, e era jogado com objetivos
diferentes, sendo eles tanto sobreviver mais tempo ou conseguir uma pontuação maior do que a dos amigos.
Um exemplo mais recente foi o aplicativo lançado para smartphones chamado FlappyBird. O jogo consiste em tentar fazer um pássaro voar entre canos e, considerando que os canos continuam aparecendo infinitamente (ou até o pássaro bater), é impossível ganhar. Em pouco tempo, FlappyBird, embora simples, se tornou um sucesso, com pessoas querendo bater o recorde de seus amigos ou seus próprios recordes. Imagem do jogo Flappy Bird. Podese notar a mecânica da utilização de apenas um botão, que serve para o pássaro voar, e o objetivo, passar entre os canos. Fonte: <http://www.macrumors.com/2014/03/11/flappybirddongnguyeninterview/>
Este aplicativo, embora não tenha um final alcançável, se tornou tão viciante que o criador, Dong Nguyen, optou por não vendêlo mais sob a justificativa de não querer atrapalhar a vida das pessoas, mesmo estando ele ganhando cerca de US$50.000,00 por dia com anúncios no jogo (NGUYEN, 2014). E este é apenas um exemplo de como a sociedade busca jogar.
Outra definição relevante é apresentada por Suits (APUD Vianna et. al., 2013; Mastrocola, 2012; McGonigal, 2011) que explica o jogo como sendo “uma tentativa voluntária de transpor obstáculos desnecessários.” A ideia de se ter obstáculos desnecessários é justamente para fazer com que os jogadores se esforcem ao seu
limite. Quanto mais obstáculos, mais desafiador será o jogo. Porém, o desafio não pode ir além das habilidades do jogador, caso contrário ele desistirá.
Tomando novamente como exemplo o golfe, temos como objetivo colocar a bola no buraco. Racionalmente, se não houvesse obstáculos, o jogador iria resolver o objetivo do jeito mais eficiente possível, ou seja, ir caminhando e colocar a bola com a mão. Porém, o jogador aceita os obstáculos que são propostos no jogo, sendo eles utilizar apenas o taco e dar a primeira tacada longe dos buracos, por exemplo.
A partir disto, é criado o desafio, tentar cumprir o objetivo com o menor número de jogadas possíveis, sem deixar de cumprir as regras, ou obstáculos, por ele aceito. Porém, caso obstáculos além de suas capacidades forem apresentados, como por exemplo jogar com os olhos vendados, o jogador provavelmente acabará desistindo, pois achará o desafio muito difícil.
Se, no sentido contrário, houvesse poucos obstáculos, como por exemplo começar a partida bem próximo ao buraco, o jogador também provavelmente desistiria logo do jogo, por considerar muito fácil. “O cerne desse pensamento nos mostra a responsabilidade que está nas mãos de um designer de jogos. Afinal de contas, se o desafio criado não divertir ou valer a pena, com certeza será descartado pelos jogadores.” (MASTROCOLA, 2012, p. 34)
McGonigal (2011) reforça a participação dos jogadores nesse conceito apresentado por Suits. Isto porque eles estão se voluntariando, estão dispondo seu tempo e suas energias para superar esses obstáculos desnecessários. Porque, para os jogadores, esses obstáculos importam. São os obstáculos que os fazem querer jogar o jogo. Para os jogadores, estes obstáculos são necessários. Mais do que necessários, são eles que criam a vontade de jogar, de superar os desafios propostos.
Por causa disto, e refletindo acerca do conceito apresentado por Suits, podese pensar em uma dualidade dos obstáculos. Eles são desnecessários do ponto de vista lógico/racional, pois são empecilhos para o cumprimento do objetivo da maneira mais eficiente possível; mas são necessários do ponto de vista do jogador, pois são eles que criam o desafio e a vontade de jogar.
Essa escolha pelos obstáculos é comparada por McGonigal (2011) com trabalho árduo. O trabalho árduo se refere ao esforço que o jogador vai ter para atingir os objetivos do jogo. E este esforço pode ser tanto mental quanto físico. Só que quando pensamos em trabalho árduo, as definições que nos vem à mente são geralmente negativas e relacionadas ao estresse.
Isto acontece, segundo McGonigal (2011), porque em geral quando temos trabalho árduo a fazer, este é relacionado ao que os outros nos pedem. Como em um emprego onde é necessário o preenchimento de diversos relatórios, por exemplo. Além de ser uma atividade que o empregado não tenha escolhido fazer, ainda há a pressão e o estresse envolvidos caso ele não consiga cumprir os prazos, ou não entregue os relatórios da maneira que seu chefe deseja.
Por outro lado, no jogo o jogador escolhe se esforçar. Ele escolhe dar o máximo de si para vencer os obstáculos desnecessários. Ele se sente motivado para resolver os problemas, mesmo que as recompensas se deem apenas dentro do Círculo Mágico.
Pelas palavras da autora:
“Se apenas o trabalho árduo que fazemos na nossa vida real tivesse o mesmo efeito. Na nossas vidas, trabalho árduo é muito frequentemente algo que fazemos por que temos que fazer para viver, anteciparse, atender às expectativas de alguém, ou simplesmente por que alguém nos deu um trabalho para fazer. Nos ressentimos deste tipo de trabalho. Ele nos estressa. Nos tira tempo com os amigos e a família. Vem acompanhado de críticas. Temos medo de falhar. E frequentemente não vemos o impacto direto de nossos esforços, então raramente nos sentimos satisfeitos”
(McGONIGAL, 2011, localização 505,tradução do autor)
A partir dessa constatação da autora, podemos pensar sobre o conceito de
Gamification, pois a proposta do termo é justamente combater estes sentimentos negativos. É tornar a nossa vida, ou partes dela, mais parecida com jogos, fazendo com que os “jogadores” se sintam mais engajados, mais motivados, e prontos para trabalharem arduamente em algo que eles acreditam que trará recompensas positivas para eles.
2.2. Gamification
Como vimos anteriormente, diversos autores têm as suas diferentes concepções de jogo e suas teorias se complementam. Porém, no geral eles falam dos jogos com finalidade lúdica. Quando levamos estes conceitos apresentados por eles para outros ambientes, temos o que se chama de Gamification, ou a utilização da lógica dos jogos. Uma definição que abrange o conceito de maneira simples e concisa, é apresentada por Deterding et al (2011). Os autores definem Gamification como sendo o uso de elementos de game design em contextos que não de jogos. Ou, em outras palavras, utilizar a lógica de jogos em ambientes nos quais comumente ela não é utilizada.
Vianna et al, na sua definição, cita também o motivo de se utilizar o
Gamification, quando diz que “a gamificação (do original em inglês Gamification ) corresponde ao uso de mecanismos de jogos orientados ao objetivo de resolver problemas práticos ou de despertar engajamento entre um público específico” (VIANNA et al, p. 13).
Engajamento é também a palavra chave utilizada por Alves (2014) para definir Gamification. Para a autora, a ideia de Gamification é
“criar algo que seja tão interessante e envolvente que nos permita fazer
com que as pessoas queiram investir seu tempo, compartilhar seu conhecimento e contribuir com sua energia para o alcance do resultado, transportandoos para o círculo mágico definido por Johan Huizinga” (ALVEZ, 2014, p. 27)
A proposta do Gamification, segundo estes autores, é motivar as pessoas envolvidas, seja em um treinamento, no trabalho, escola, ou qualquer outro ambiente ou atividade; através de mecânicas de jogos, criando engajamento e fazendo com que os ‘jogadores’ queiram transpor os obstáculos, não desnecessários, como no jogo lúdico, mas com alguma finalidade específica.
Zichermann e Linder (2010), que utilizam o termo Funware, ao invés de
principalmente da relação entre empresa e clientes, elencando maneiras de como o
Gamification (ou Funware) pode tornar estas interações mais divertidas. Para eles, os clientes devem se divertir enquanto ‘jogam’ com a empresa. Mas este divertimento tem como finalidade aumentar o engajamento e estreitar as relações clienteempresa. Nas palavras dos próprios autores, “ Funware é a arte e a ciência de tornar as interações do dia a dia dos seus consumidores em ‘jogos’ que servem para os propósitos da empresa” (ZICHERMANN e LINDER, 2010, p.20, tradução do autor).
Mas Gamification pode ajudar não só as relações entre clientes e empresa, como também ajudar nos processos da própria empresa, ou na sua relação com os funcionários ou fornecedores. Isto não quer dizer necessáriamente criar um grande e complexo jogo. Muitas vezes a solução de Gamification pode ser simples e mesmo assim eficiente.
Porém, isto não quer dizer que a utilização seja menos eficiente. Porque, da mesma maneira que os jogos muitas vezes conseguem nos engajar de maneira tão eficiente, ao entendermos como isto funciona, podemos utilizar de partes destes conceitos de game design que mais se adequem ao problema que deve ser resolvido. Cada caso poderá utilizar mecânicas completamente diferentes, mas ainda assim ser considerado Gamification. Entendese então que não há e nem tem como existir um modelo pronto, ou uma fórmula, para “Gamificar”.
Portanto, ao analisar estas definições, e, de modo a ter uma consistência ao decorrer do trabalho, será considerado Gamification como o uso de mecânicas de jogos com finalidades para além da lúdica. Isto porque, em diversos casos, como será visto posteriormente, existe de fato a criação ou utilização de um jogo (contrastando com a ideia da utilização em outros ambientes).
2.2.1. Características básicas
Voltando aos conceitos de jogos, podemos pensar nas quatro caracteristicas que McGonigal utiliza para definir jogos. Cada uma delas tem particularidades que podem ser exploradas ao se utilizar Gamification:
2.2.1.1. Objetivos
Às vezes as pessoas não compreendem o porque de estarem realizando alguma tarefa, ou podem não se identificar com o objetivo. Pode acontecer também do objetivo a ser alcançado seja apenas de longo prazo, o que não causa motivação para agir no momento.
Como em uma escola por exemplo, o aluno está no primeiro ano do ensino médio, e tem como objetivo passar no vestibular para publicidade. Porém, só será possível passar no vestibular após três anos de estudo, e ele não vê relação entre as matérias que ele tem que estudar no primeiro ano e o curso de publicidade.
Outro exemplo seria em uma empresa, na qual um funcionário deve preencher um relatório toda semana sobre o que foi feito. Entretanto, ele não consegue enxergar o objetivo para o qual ele está tendo esse trabalho. Para o empregado, é apenas uma perda de tempo preencher o relatório.
McGonigal (2011) comenta que nos jogos geralmente é possível cumprir diversos objetivos ao longo do percurso. E que todos eles estão relacionados com o objetivo principal proposto. Este conceito pode ser utilizado também no o dia a dia, como motivação para a realização de certas atividades.
Podemos citar como exemplo o jogo de tabuleiro War. Neste jogo, cada jogador recebe um objetivo diferente, como por exemplo conquistar 24 países, dominar a Ásia e a Africa, ou derrotar o jogador de cor vermelha.
Imagem do tabuleiro. A mecânica do jogo é que cada jogador escolhe uma cor, e são sorteados países diferentes. Então eles tem que batalhar para conquistar os territórios adversários. As disputas se dão através de rolagem de dados. Fonte da imagem: <http://tecontohistoria.blogspot.com.br/2012/08/warojogodaestrategia.html>
Porém, a cada turno, o jogador tenta cumprir objetivos menores, que o levem a atingir a meta proposta e consequentemente ganhar o jogo. Estes podem ser: conseguir uma carta para comprar mais tropas, conquistar um país para fazer o caminho até chegar no continente desejado, ou mesmo derrotar uma tropa da cor vermelha. Ao tentar cumprir cada um desses objetivos de curto prazo, o jogador tem a plena consciência de que eles o ajudarão diretamente a conquistar o objetivo principal. Voltando ao exemplo do colégio, os professores podem criar uma relação maior
da matéria com as atividades do dia a dia do rapaz, ou até mesmo com o curso que ele pretende fazer no futuro. Outras medidas poderiam ser fazer competições, como olimpíadas de física, com alguma premiação, ou até um sistema de notas que incentivasse o aluno a estudar ao longo do ano, e não apenas antes das provas.
No caso do funcionário, primeiramente seria necessário explicar o motivo de existirem os relatórios e a importância deles para os objetivos da empresa. Depois, poderiase criar um sistema de pontos que premiasse as ações positivas realizadas por ele. Cada relatório poderia valer 1 ponto, e ao completar determinado número de pontos ele poderia tirar uma tarde de folga ou ganhar algum bônus no salário. Além
disso, poderia haver uma premiação por melhor relatório preenchido, ou o que foi entregue mais cedo.
É importante ressaltar que pessoas diferentes tem objetivos diferentes. Isso acontece tanto nos jogos como na vida. Bartle (APUD Alves, 2014; Vianna et al, 2013; Zichermann e Linder, 2010) apresenta um modelo com quatro diferentes grupos de jogadores, que têm metas diferentes ao jogar. Entendese que estes grupos não devem ser vistos como fixos, a ponto de se dizer que cada pessoa age exclusivamente de um jeito todo o tempo. Mas sim como possibilidades diferentes de objetivos que os jogadores podem tentar atingir ao jogar.
Os grupos que Bartle apresenta são os seguintes: Achievers , Killers , Socializers, e Explorers.
2.2.1.1.1. Achievers:
Os Achievers tendem a jogar para cumprir objetivos. Eles gostam de pontos, pequenas vitórias ao longo do jogo, e diversas conquistas. Para eles, não importa tanto ganhar, mas sim jogar bem. Eles apreciam status e serem reconhecidos por completar as tarefas. Preferem jogos nos quais possam subir de nível. Entendese então que o
feedback constante é muito importante para eles.
Podese pensar em como utilizar a lógica dos jogos para este tipo de jogador. Em uma escola, por exemplo, recompensar pequenas tarefas cumpridas, como um tema de casa ou uma questão respondida corretamente.
O mesmo pode ocorrer em uma empresa. Como no exemplo do relatório, a cada um entregue pontos vão sendo acumulados, que podem ser utilizados para tirar uma tarde de folga, ou como um bônus no salário. Além disso, pode haver um quadro com os pontos de cada um, mostrando quem entrega mais relatórios dentro do prazo, ou quem preenche da melhor maneira.
É importante ressaltar, como nos exemplos acima, que o ideal é ter tipos de prêmios diferentes, que possibilitem que mais de uma pessoa alcance diferentes
objetivos. Isto porque, considerando que os Achievers prezam por jogar bem, isto dá a eles mais opções de utilizarem suas habilidades.
2.2.1.1.2 Killers:
Os Killers , ao contrário dos Achievers , se importam mais com a vitória. Para eles, o importante é ganhar. “Seu desejo de competir supera o desejo de cooperar” (ALVES, 2014). Portanto, eles gostam de jogos em que é possível vencer o adversário, de preferência o máximo de vezes possível.
Existem diversos exemplos utilizando a lógica dos jogos com o foco nos Killers. Podemos citar, nos meios empresariais, o funcionário do mês, ou também as bonificações dadas ao funcionário que vende mais. No meio escolar, podese citar as olimpíadas. E nas relações entre empresasclientes, podese utilizar como exemplo os sorteios.
2.2.1.1.3. Socializers:
Os Socializers jogam não tanto pelo jogo em si, mas mais pela oportunidade de interagir com outras pessoas. Ao invés dos Killers , a intenção deles na interação não é vencer o outro, mas sim vencer com o outro. Tendem a gostar mais de jogos cooperativos, ou ainda jogos em que possam ajudar o outro a vencer.
Como exemplos nas escolas, podemse citar os trabalhos em grupo e as gincanas. Na área da saúde, a criação de grupos de ginástica para a terceira idade pode ajudar a solucionar problemas relacionados a velhice. Ou ainda grupos de caminhada para combater o sedentarismo. Nas empresas, o próprio estímulo para a interação entre os funcionários pode resultar numa maior eficiência entre os setores, por exemplo.
2.2.1.1.4. Explorers:
Os Explorers apreciam conhecer todo o ambiente do jogo, e explorar todas as possibilidades. Gostam de narrativas, de conhecer o passado dos personagens, e, no
caso de games eletrônicos, de explorar todo o universo digital criado. Eles se interessam mais pelo caminho para chegar até o final do que no final em si.
Utilizar a lógica dos jogos para os Explorers pode implicar em incluir objetivos paralelos e narrativas, fazendoos se envolver mais. Na publicidade por exemplo, podese utilizar a história de como determinada empresa ou produto foi criado, aumentando os laços com o cliente. Nas escolas, fazêlos explorar mais o conteúdo, como explicar de onde veio determinada fórmula matemática; ou dar uma resposta, como por exemplo dizer que a Alemanha perdeu a 2ª guerra mundial, e fazêlos procurar pelos motivos que levaram isto a acontecer.
Obviamente, cada um dos exemplos citados anteriormente serve apenas para enfatizar cada um dos objetivos diferentes que os grupos de jogadores procurariam. O ideal, ao se utilizar a lógica dos jogos, é combinar diversas destas técnicas para conseguir engajar os diferentes tipos de jogadores. E também refletir sobre o ponto que os objetivos podem mudar, assim como a motivação das pessoas para cumprilos.
2.2.1.1.5. Facebook e os tipos de jogadores:
Um outro exemplo que pode ser utilizado para explicar cada tipo de jogador é a rede social Facebook. Cada vez que entramos na rede podemos fazêlo com objetivos distintos, ou inclusive mais de um. Ao postarmos algo em nossa linha do tempo, esperamos curtidas, comentários, compartilhamentos. Ou seja, estamos agindo como
Achievers. Ao mesmo tempo, podemos estar conversando com amigos em conversas, ou até com desconhecidos em páginas ou grupos, agindo como Socializers.
Ao participar de discussões, tanto em páginas quanto em grupos, queremos ‘ganhar’. O mesmo acontece ao compartilharmos promoções. Logo, estamos agindo como Killers. E, por outras vezes, só queremos acompanhar o que as outras pessoas estão postando, ou as curiosidades das páginas que curtimos, agindo como Explorers.
2.2.1.2. Regras:
As regras são um fator fundamental para qualquer jogo. Ao se pensar em
Gamification, as regras também devem ser levadas em conta, pois é preciso que os envolvidos saibam o que podem ou não fazer, e o que esperar. As regras não precisam ser todas conhecidas de uma só vez, mas algumas convenções devem ser feitas, pois caso o jogador não saiba o que esperar, a tendência é que ele não se engaje.
Tome como exemplo um hotel. Por convenção, as regras de um hotel são prover um quarto com uma cama e lençois limpos. Porém, o hotel em questão tem uma outra regra, desconhecida pelos hóspedes, que é de presentear com flores os aniversariantes que ali se hospedam. Ao tomar conhecimento desta nova regra, o hospede provavelmente ficará surpreso e feliz, pois é como se tivesse obtido uma conquista.
Em contrapartida, caso o hospede chegasse no seu quarto, e visse que não há ali nenhum móvel, nem a cama que por regra o hotel deveria ter, o mais provável é que ele volte desapontado ao saguão para reclamar ou ir embora. O que houve em ambos os casos, foi uma quebra de expectativas. A diferença é que uma foi positiva e a outra negativa.
Ao se refletir sobre isto, podese pensar que, ao se utilizar à lógica dos jogos ,
pode haver alguma alternância nas regras, para evitar que esse sistema fique engessado. Porém, é preciso tomar cuidado para que essa mudança não seja uma quebra de expectativa negativa, pois pode levar os envolvidos a se desmotivarem ou pararem de jogar.
2.2.1.3. Sistema de feedback:
Como vimos anteriormente, o feedback constante é importante para os jogadores pois demonstra o quão bem eles estão indo e o quão longe ou perto estão dos objetivos a serem cumpridos. Esse acompanhamento pode ser mostrado através de diversos estímulos, que vão desde os visuais (como por exemplo o personagem brilhar quando sobe de nível) e auditivos (como por exemplo cada moeda coletada faz
determinado som, e ao coletar 100 o som é diferente) até sistemas mais complexos, envolvendo níveis, pontos, rankings, distintivos, entre outros.
Zichermann e Linder (2010) apresentam os Frequent Flyers Programs como um 7 exemplo eficiente do uso do Gamification . Neste modelo, há uma resposta constante de como os participantes estão indo. Cada passagem comprada automaticamente gera os pontos, e o “jogador” sabe quantos ele precisa para subir de nível e conseguir vantagens com a companhia. Ainda, ao juntar determinado número de pontos, ele pode trocálos por outras passagens ou alguns produtos.
Além disso, esses programas ainda apresentam desafios, possibilitando, como vimos anteriormente, que outros objetivos sejam cumpridos para além de acumular pontos e subir de nível. Inclusive alguns destes desafios possibilitam a formação de equipes, criando uma interação entre os participantes.
Podemos tomar como outro exemplo escolas e universidades. É comum que o desempenho do aluno em determinado tempo, seja um bimestre, trimestre ou semestre, seja definido através de uma avaliação, podendo ela ser uma prova ou trabalho. Portanto, o feedback de como o estudante está evoluindo, só fica evidente após o recebimento da nota nestes casos. Pensando no objetivo do aluno como sendo passar de ano ou de matéria no caso da faculdade, esse feedback pode vir demasiado tarde.
Utilizando dos conceitos vistos acima, poderiamos pensar, no caso deste exemplo, em utilizar um sistema de pontos, em que a cada aula poderiam ser executados alguns exercícios, cuja resolução se converteriam em pontos para a nota final. É uma solução simples, mas que pode ajudar os estudantes a ter um controle maior sobre como estão se saindo nas matérias. 7 Programa de pontos das companhias áreas americanas. São similares aos programas de milhagem existentes no Brasil, nos quais ao voar por determinadas companhias, o passageiro acumula pontos que
2.2.1.4. Participação Voluntária:
Aqui entra um ponto de diferenciação entre jogos com finalidade exclusivamente lúdica e sistemas “Gamificados”. Ao criar estes modelos em empresas, escolas ou outros ambientes, nem sempre a participação poderá ser voluntária. No caso de uma escola por exemplo, se as notas forem concedidas através de um sistema de pontos apenas, não haverá opção para os alunos se não participar.
Isto não significa que eles estarão menos dispostos a participar ou que ficarão menos engajados. Para McGonigal (2012), a participação voluntária é entendida como a aceitação dos objetivos, das regras e do sistema de feedback . Portanto, o que deve pensar se ao utilizar o Gamification é fazer um sistema em que os participantes envolvidos queiram jogar.
Pensando no conceito de Suits (APUD Vianna et. al., 2013; Mastrocola, 2012; McGonigal, 2011) dos obstáculos desnecessários e do que já foi discutido, é preciso criar um sistema em que os participantes estejam dispostos a transpor estes obstáculos. Porém, ao contrário do jogo com finalidade lúdica, os obstáculos nesses casos são necessários em todos os sentidos, não apenas para o jogador.
Pense no exemplo de uma empresa de construção civil. Para trabalhar em determinada obra, os operários precisam de uma roupa especial, que inclui botas de borracha, capacete e macacão. Como incentivo para que os funcionários utilizem o material, o dono da empresa resolveu utilizar o Gamification. Para cada peça que os funcionários estivessem utilizando corretamente, eles ganhariam um ponto. Esses pontos poderiam ser trocados posteriormente por bônus no salário, folgas ou prêmios.
No exemplo acima, entendese os obstáculos para os “jogadores” como necessários, pois independente de haver ou não jogo, eles devem utilizar os equipamentos como forma de segurança. Mas, assim como descrito por McGonigal, os operários devem aceitar as restrições impostas e os objetivos a serem alcançados. Caso eles não concordem, por acreditar que não vale a pena se esforçar pra conseguir os benefícios ou por ser mais prático simplesmente utilizar chinelo e trabalhar sem camisa, então o sistema provavelmente não irá funcionar.
Voltamos então na dificuldade em criar um jogo ou sistema “gamificado”, apresentado tanto por Mastrocola (2012) e Koster (2012). Para estes autores, o desafio está em criar um jogo que não seja nem muito fácil e nem muito díficil. Utilizando o exemplo acima, podemos pensar que, caso seja muito fácil ganhar os benefícios, os operários utilizarão o equipamento apenas até conquistar o que desejam, e depois voltarão a utilizar o que considerarem mais conveniente. Ou ainda, eles podem vir a utilizar apenas parte do equipamento, como só o capacete, e mesmo assim conseguir os bônus.
Por outro lado, caso seja muito difícil, os trabalhadores poderão considerar que
o esforço não compensa. Se, por exemplo, eles precisarem utilizar todo o equipamento durante um ano para conseguir uma tarde de folga, provavelmente escolherão não utilizálo por ser mais prático. Esse exemplo também se encaixa na questão do sistema de feedback . É importante que os jogadores tenham uma resposta constante do quão bem eles estão indo, e quão longe estão dos objetivos.
2.3. Mecânicas
Até agora, analisouse as características básicas dos jogos e como elas podem ser transportadas para outros ambientes através do Gamification. Essa transposição se dá através da utilização de elementos presentes nos jogos e que possibilitam a existência dos mesmos. Como algumas definições citam, o Gamification se dá através da utilização de mecânicas de jogos em outros ambientes. As mecânicas então podem ser entendidas como as maneiras com as quais os jogadores irão interagir com o jogo. Para Fabricatore (1999), as mecânicas funcionam como um sistema que recebe
inputs e gera outputs, criando a interação tanto com o jogo, quanto com outros jogadores e outras mecânicas. Já conforme Sicart, “as mecânicas de jogos são os métodos invocados por agentes, designados para interação com o estado do jogo” (SICART, 2008, tradução do autor).
Sicart (2008) fala em agentes, e não em jogadores, porque a mecânica não necessariamente exige a interferência de um jogador. Esse agente pode ser um juíz,