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As raízes do experimentalismo no pensamento de Oliver Wendell Holmes Junior e o surgimento da tese de junção do direito com a economia na obra de Richard Posner

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UNIVERSIDADE FEDERAL DE PERNAMBUCO

CENTRO DE CIÊNCIAS JURÍDICAS

FACULDADE DE DIREITO DO RECIFE

PROGRAMA DE PÓS GRADUAÇÃO EM DIREITO (DOUTORADO)

AS RAÍZES DO EXPERIMENTALISMO NO PENSAMENTO DE

OLIVER WENDELL HOLMES JÚNIOR E O SURGIMENTO DA

TESE DE JUNÇÃO DO DIREITO COM A ECONOMIA NA OBRA

DE RICHARD POSNER.

Luiz Edmundo Celso Borba

Recife,

2013.

(2)

LUIZ EDMUNDO CELSO BORBA

AS RAÍZES DO EXPERIMENTALISMO NO PENSAMENTO DE

OLIVER WENDELL HOLMES JÚNIOR E O SURGIMENTO DA

TESE DE JUNÇÃO DO DIREITO COM A ECONOMIA NA OBRA

DE RICHARD POSNER.

Tese de doutorado apresentada no Programa de Pós-Graduação em Direito da Faculdade de Direito do Recife / Centro de Ciências Jurídicas da Universidade Federal de Pernambuco como requisito parcial para obtenção do grau de Doutor. Área de Concentração: 3 – Linguagem e Direito. Grupo de Pesquisa 3. 1. – Retórica e Pragmatismo no Direito (O Pragmatismo jurídico e a questão do método no Direito), tendo como orientador: Prof. Dr. George Browne

Recife,

2013.

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Catalogação na fonte

Bibliotecária Eliane Ferreira Ribas CRB/4-832

B726r Borba, Luiz Edmundo Celso

As raízes do experimentalismo no pensamento de Oliver Wendell Holmes Junior e o surgimento da tese de junção do direito com a economia na obra de Richard Posner / Luiz Edmundo Celso Borba. – Recife: O Autor, 2013.

253 folhas : il.

Orientador: George Browne Rego.

Tese (Doutorado) – Universidade Federal de Pernambuco. CCJ. Direito, 2013.

Inclui bibliografia.

1. Pragmatismo. 2. Peirce, Charles Sanders, 1839-1914. 3. Ética. 4. Retórica. 5. Direito e economia. 6. Direito - Filosofia. 7. Norma (Filosofia). 8. Smith, Adam, 1723-1790. 9. Holmes Junior, Oliver Wendell, 1841-1935 - Crítica. 10. Direito - Aspectos econômicos. 11. Posner, Richard A., 1939- . I. Rego, George Browne (Orientador). II. Título.

(4)

Luiz Edmundo Celso Borba

AS RAÍZES DO EXPERIMENTALISMO NO PENSAMENTO DE

OLIVER WENDELL HOLMES JÚNIOR E O SURGIMENTO DA

TESE DE JUNÇÃO DO DIREITO COM A ECONOMIA NA OBRA

DE RICHARD POSNER.

Tese apresentada ao Programa de Pós-Graduação em Direito da Faculdade de Direito do Recife / Centro de Ciências Jurídicas da Universidade Federal de Pernambuco PPGD/UFPE, como requisito parcial para obtenção do grau de Doutor.

Área de Concentração: Linguagem e Direito. Orientador: Prof. Dr. George Browne Rego

A Banca Examinadora composta pelos professores abaixo, sob a presidência do primeiro, submeteu o candidato à defesa em nível de Mestrado e o julgou nos seguintes termos:

MENÇÃO GERAL: _______________________________________________

Prof. Dr. Francisco de Queiroz Bezerra Cavalcanti, (Presidente – UFPE) Julgamento__________________________ Ass.:______________________ Prof. Dr. Aurélio Agostinho da Bôaviagem, (1º Examinador – UFPE)

Julgamento: _________________________ Ass.:______________________ Prof. Dr. Cláudio Roberto Cintra Bezerra Brandão, (2º Examinador – UFPE) Julgamento: _________________________ Ass.:______________________ Prof. Dr. João Maurício Leitão Adeodato, (3º Examinador – UFPE)

Julgamento: _________________________ Ass.:______________________ Prof. Dr. José Arlindo de Aguiar Filho, (4º Examinador – UFPB)

Julgamento: _________________________ Ass.:______________________

(5)

Dedico este trabalho, primeiramente, ao Pai, de onde toda luz, calor e amor irradiam, tornando a vida uma dádiva. A minha esposa, companheira, parceira, mãe dos meus filhos e, acima de tudo, amada. Minha vida se tornou melhor contigo, obrigado pelos presentes: Luiz Augusto e Giovana e por fazer-me ver rindo no reflexo dos teus olhos.

Aos meus filhos pela inspiração e impulso na reta final, mesmo que nem saibam disso, ainda, este trabalho é para vocês, também.

Para os meus pais, Flávio e Sílvia Borba, porto seguro, meu esteio, dedico este e agradeço a visão do certo e do errado, que ajudaram a formar meu caráter, de quem o respeito surge como uma certeza, vocês é que me fizeram acordar do meu sonho metafísico.

Para minha irmã, também, pelo amor, carinho, paciência, calma e felicidade. Para minhas avós pelo exemplo de vida, retidão e de luta.

Para minha sogra e cunhadas, pelo apoio emocional, incentivos das mais variadas formas e as balançadas no berço, nos braços e no carrinho dos meninos!

A todos cujo carinho e paciência me fortaleceram na elaboração deste trabalho.

(6)

AGRADECIMENTOS:

Ao meu orientador, George Browne, inspiração acadêmica e de vida, sem o qual meu doutorado seria um sonho impossível, sua atenção, carinho e acima de tudo dedicação, fizeram crescer um profundo sentimento de gratidão e de fé na atividade da docência. Que o meu trilhar, daqui por diante, também o orgulhe e me torne um espelho, na medida das minhas muitas limitações. Sua humildade e dedicação à academia são um valioso modelo.

A todos os professores que tive a honra de ser aluno no curso de mestrado e agora de doutorado, pois as aulas de cada um deles se refletem no presente trabalho, assim como os seus acertados e valiosos conselhos, em especial: João Maurício Adeodato (inclusive sobre música e, principalmente, seriedade na pesquisa); a Frederic Kellogg (pelas aulas acerca do pragmatismo jurídico de Holmes e os conselhos sobre a necessidade da presença de Adam Smith no meu trabalho); a Cláudio Brandão (pela dedicação e comprometimento para com a academia); a Torquato de Castro (pela poesia, hedonismo e por saber lidar com a tradição da geração) e a Marcos Nóbrega (por tornar fácil a compreensão de uma análise entre Economia e Direito).

Ao amigo Valter Romeiro o primeiro a mostrar que existe uma visão pragmática, filosófica que revela na nossa atualidade aspectos a impulsionar uma boa parte dos seres humanos a agirem em conformidade com o mercado. Sem sua inspiração, atenção e apoio desprendidos (inclusive com livros), jamais este trabalho seria possível agora, em razão da minha ignorância sobre o tema tratado, meses antes da minha candidatura a este programa de doutoramento jurídico. O pouco que sei se deve ao auxílio do seu empurrão vestibular.

A Carminha, por quem nutro grande admiração e amizade, tendo me ajudado, sempre que precisei, com um grande sorriso, da forma mais fraterna e delicada. A Secretaria deste Curso ganha um brilho especial com a sua presença. Sua amizade se tornou uma joia preciosíssima para mim; além de Gilka pela atenção que dá aos alunos deste Curso, sendo, sempre, prestativa e cuidadosa conosco; assim como fazem jus a estes agradecimentos os demais membros do corpo administrativo deste PPGD.

A todos os meus amigos, inclusive os conquistados nesta instituição de ensino e aos familiares, os quais não poderia esquecer, pelo eterno estimulo e incentivo ofertados para a concretização do presente trabalho, em especial: Álvaro Gouveia pela leitura desta tese, empréstimos de livros e incentivo, obrigado meu irmão; Mariana Barros, pelo impulso e ideia de inscrição no mestrado, há mais de dez anos (quando tudo começou), a Karla Toniolo, Ricardo Melo, José Roberto e Renata Andrade pelo encorajamento nos momentos difíceis, quando a toalha queria escorregar das mãos, entre tantos outros presentes em meu coração e tão igualmente relevantes.

(7)

IMORAL, ILEGAL OU ENGORDA.

Vivo condenado a fazer o que eu não quero então bem comportado às vezes eu me desespero. Se faço alguma coisa sempre alguém vem me dizer. Que isso ou aquilo não se deve fazer. Restam meus botões...

Já não sei mais o que é certo E como vou saber

O que eu devo fazer Que culpa tenho eu Me diga amigo meu

Será que tudo o que eu gosto É imoral, é ilegal ou engorda

Há muito me perdi entre mil filosofias. Virei homem calado e até desconfiado. Procuro andar direito e ter os pés no chão. Mas certas coisas sempre me chamam atenção. Cá com meus botões...

Bolas, eu não sou de ferro

Paro pra pensar mas eu não posso mudar Que culpa tenho eu, me diga amigo meu Será que tudo que eu gosto

É imoral, é ilegal ou engorda.

Se eu conheço alguém num encontro casual. E tudo anda bem, num bate-papo informal. Uma noite quente sugere desfrutar. Do meu terraço, a vista de frente para o mar. Mas a noite é uma criança. Delícias no café da manhã. Então o que fazer

Já não quero mais saber Se como alguma coisa Que não devo comer

Será que tudo o que eu gosto É imoral, é ilegal ou engorda.

(8)

RESUMO

BORBA, Luiz Edmundo Celso. AS RAÍZES DO EXPERIMENTALISMO NO PENSAMENTO DE OLIVER WENDELL HOLMES JUNIOR E O SURGIMENTO DA TESE DE JUNÇÃO DO DIREITO COM A ECONOMIA NA OBRA DE RICHARD POSNER. 2013. (216 folhas). Tese de Doutorado – Centro de Ciências Jurídicas / Faculdade de Direito do Recife, Universidade Federal de Pernambuco, Recife.

A presente pesquisa versa sobre as principais raízes do experimentalismo a influenciar Oliver Wendel Holmes Junior, a exemplo de: Aristóteles, Smith e Peirce, culminando no Pragmatismo Jurídico, consubstanciado em um modelo de Estado a dotar uma política econômica liberal, terminando por separar a utilização das normas morais, das normas jurídicas. Holmes apenas almeja separar a moral da aplicação do Direito, como faz em “The Path of The Law”. Posner, um dos seus mais fervorosos admiradores, termina por criar um modelo teórico inovador, afastando por completo a norma moral da prática jurígena e inaugura a análise econômica do direito, como defendido pela maioria da doutrina. As críticas ao seu trabalho surgiram como uma decorrência lógica, trazendo modificações às suas teorias de escolha da maximização de riquezas como elemento ético primordial a nortear o Direito. As teses, aqui, levantadas versam sobre quatro pontos específicos: Há similaridades entre retórica e pragmatismo? Adam Smith ou Posner: quem seria o verdadeiro artífice da análise econômica do direito? Quais o motivo principal de sua prosperidade em Estados liberais? Por fim, como aproveitar a vasta e rica teoria criada por Posner, a mais inovadora do século passado e em crescente expansão no Brasil?

Palavras-chave: Pragmatismo Jurídico; Análise Econômica do Direito; Norma Moral; Norma jurídica: e eficiência normativa.

(9)

ABSTRACT

BORBA, Celso Luiz Edmundo. THE EXPERIMENTALISM´S ROOTS IN THE THOUGHT OF OLIVER WENDELL HOLMES JUNIOR AND THE RISE OF THE THEORY OF THE JUNCTION OF THE LAW WITH THE ECONOMICS IN THE WORKS OF RICHARD Posner. 2013. (216 sheets). Doctoral Thesis - Science Center Legal / Law Faculty of Recife, Universidade Federal de Pernambuco, Recife.

This research deals with the main roots of experimentalism influencing Oliver Wendell Holmes Junior, like: Aristotle, Smith and Peirce, culminating in the Legal Pragmatism, embodied in a state model to endow a liberal economic political model, ending the use of moral norms and legal rules in Law application. Holmes only aims to separate the application of the moral law, as he does in "The Path of The Law." Posner, one of his most ardent admirers, ends up creating a groundbreaking theoretical model, removing, completely, the moral norm to the laws practice, inaugurating the economic analysis of law, as advocated by the majority of the doctrine. Criticism of his work emerged as a logical consequence, bringing changes to his theories of choice of the wealth maximization as an ethical guide to primary law. The thesis here deal raised on four specific points: There are similarities between rhetoric and pragmatism? Adam Smith or Posner: who was the real architect of the economic analysis of law? What are the main reason for its prosperity in liberal states? Finally, how to tap the vast and rich theory created by Posner, the most innovative of the last century and becoming increasingly widespread in Brazil?

Keywords: Legal Pragmatism, Economic Analysis of Law, Moral Norm; legal standard: normative and efficiency.

(10)

SUMÁRIO

CONSIDERAÇÕES PRELIMNARES: PRETENSÕES E ACORDOS

METODOLÓGICOS PARA O DESENVOLVIMENTO DA TESE.

11

1. A ESQUINA DOS CAMINHOS RETÓRICOS DE ARISTÓTELES E DOS PRAGMÁTICOS DE PEIRCE EM TORNO DA ÉTICA: a experiência como motivo para a troca da construção do conhecimento “iluminado pelas estrelas”, por uma perspectiva sensível.

15

Aspectos introdutórios: a busca por congruências nos métodos. 15

1.1 Perspectivas Retóricas Aristotélicas: a ética como “norte”.

1.1.1. O entimema como guia ao discurso retórico.

1.1.2. Ethos, pathos, logos e outros fundamentos relevantes do discurso ético-retórico.

1.1.3. A retórica: analítica, estratégica e material.

18

20 24 30

1.2. Peirce e a pragmática sensibilidade do mundo: a, positiva, fixação da crença.

1.2.1. A fixação da crença através das idéias claras: a necessidade do “método científico”.

1.2.2. As conseqüências da fixação das crenças claras sobre o pensamento pragmatista: uma, ética, busca por satisfação.

34

35 48

1.3. Considerações finais: a “esquina” entre os caminhos da Retórica

e do Pragmatismo em razão da ética.

52

2. ADAM SMITH E A TESE DOS HOMENS SEREM SENHORES E PERSECUTORES DA PRÓPRIA FELICIDADE: a crença em uma mão invisível como preambulo para uma análise econômica do direito como substituta de uma análise moral.

61

Aspectos introdutórios: a postura liberal e a economia como mais uma perspectiva de debate.

61

2.1 – O contexto do liberalismo de Adam Smith como o início de um

basta ao, secular, modelo Absolutista de gestão estatal e o retorno ao pragmatismo.

63

(11)

uma Sociedade com axiomas econômicos e de liberdade.

2.3 – A riqueza das nações e a reafirmação de uma necessária junção do Direito com a Economia como paradigmas para a interpretação e aplicação eficiente das normas.

93

2. 4 – Considerações finais: Há uma necessária ruptura entre Moral e

Direito provocada pela Economia?

110

3. OLIVER WENDELL HOLMES JÚNIOR E A CONSTRUÇÃO DE UM PRAGMATISMO JURÍDICO: “que a experiência dos juristas prevaleça sobre a sua lógica!”

115

Aspectos introdutórios: a lógica vencida pela experiência. 116

3. 1 – O Direito funciona como um sistema ético ou como um sistema

para minimizar custos? As respostas de “The Path Of The

Law”, marco para o Pragmatismo Jurídico Norte Americano.

125

3. 2 – A norma moral e a questão de sua influência acerca da criação

da norma jurídica: uma visão pragmatista provocada pelo “The

Path of the Law”.

139

3. 3 – A aplicação da norma jurídica deverá considerar,

preponderamente, aspectos: morais? Econômicos? Ou ambos? A influência de Oliver Wendell Holmes Junior para a criação do Law and Economics.

150

3. 4 – Consideração finais: o pragmatismo jurídico e a perspectiva econômica.

162

4. POSNER E A TEORIZAÇÃO DE UMA ANÁLISE ECONÔMICA DO DIREITO: DESCARTE-SE A ÉTICA MORAL POR UMA ÉTICA DA MAXIMIZAÇÃO DE

RIQUEZAS, DA EFICIÊNCIA NA ALOCAÇÃO DOS RECURSOS

INSTRUMENTADA PELA ORDEM JURÍDICA.

169

Aspectos introdutórios: A ética moral e a ética do mercado: a busca por eficiência em uma realidade neoliberal.

169

4. 1 – Conceitos da ciência econômica empregados na elaboração de teorias sobre o Direito: uma necessária análise.

175

4. 2 – A eclosão de uma análise econômica do Direito: seu

surgimento na escola de Chicago.

180

4. 3 – O neoinstitucionalismo: uma visão neoliberal. 192

4.4 – A análise Econômica do Direito para Posner e as fases de sua

busca por uma eficiência econômica na prestação

jurisdicional.

195

4. 5 - Algumas críticas contra a troca da ética moral pela objetividade da ciência econômica: o receio provocado pela visão de Posner acerca do Direito.

213

(12)

valor para o operador jurídico?

EM QUE MEDIDA SERIA LEGÍTIMA A TROCA DA MORAL PELO EFICIENTISMO E O RISCO DE UMA APROXIMAÇÃO UTILITARITARISTA RADICAL NA TEORIA DE POSNER?

231

(13)

CONSIDERAÇÕES PRELIMNARES: PRETENSÕES E ACORDOS METODOLÓGICOS PARA O DESENVOLVIMENTO DA TESE

O experimentalismo se inaugura nas obras de Aristóteles, em especial em seu discurso constitutivo da Retórica, embora as ontologias ainda estivessem bastante presentes neste texto, ele marca a primeira grande ruptura contra a produção intelectual de cunho mais metafísico, inaugurando a pretensão da lógica não dever prevalecer sobre a experimentação da realidade, algo a influenciar uma nova corrente experimentalista: o Pragmatismo de Peirce, já no fim do século XIX.

Mas antes mesmo de Peirce e de suas inovadoras teses virem a luz um outro filósofo, um dos primeiros liberais da modernidade, demanda atenção nesta quebra das ontologias, em especial com os primeiros golpes contra a forte influência da norma moral sobre a norma jurídica: Adam Smith, reconhecido mais tarde como o principal artífice da ciência econômica, inspirado em Hume e no próprio Aristóteles, a quem estudara com afinco.

Essa influência de Smith não termina se encerrando na filosofia e/ou na economia, ela deflagra uma intensa revolução liberal ao redor do mundo, com ecos bastante fortes na realidade Norte Americana, encorajando Peirce e Holmes, colegas do Clube Metafísico de Boston, a alçarem voos mais altos para o experimentalismo, criando o pragmatismo e o consecutivo pragmatismo jurídico.

Holmes, então, traz toda sua rica experiência de ex-combatente e jurista para os seus textos, reconhecidos como a base do realismo jurídico, com um ceticismo nunca visto antes e apesar de ser um moralista, passou a defender a necessidade de uma ruptura, para o magistrado, da falsa imagem de que os valores morais estão presentes na compreensão do ser humano sobre a vida em Sociedade, dividindo-a em “homens bons” e “homens maus”.

Seus trabalhos ecoaram por décadas e até hoje são estudados ao redor do mundo, mas o primeiro a sistematizar e tentar criar um aspecto teórico para justificar o passo mais audacioso do experimentalismo,

(14)

alçar o direito ao patamar de uma ciência quase exata, foi Richard Posner, quando construiu toda uma parafernália teórica pretensiosamente apta a dar ao Direito uma perspectiva econômica, no intento de viabilizar uma comprovação da eficácia do texto normativo, quando passa a defender a substituição da moral pela economia, completamente.

Esses são os cenários para o desenvolvimento da presente tese e estes autores e suas contribuições para o experimentalismo serão pesquisadas dentro da seguinte estrutura textual: no primeiro capítulo a abordagem será sobre o início de toda a perspectiva experimentalista, com Aristóteles, assim como as congruências entre a Retórica e séculos após o pragmatismo de Peirce, quando será, igualmente analisado o que viabilizou essa influência, assim como quais as diferenças entre as duas vertentes, estudadas por dois grupos de pesquisa desta PPGD, dos quais tenho o orgulho de participar.

No segundo capítulo o enfoque dar-se-á sobre Adam Smith, procurando entender como a retórica de Aristóteles o influenciara, assim como os motivos que o levaram a defender a quebra do Estado Absolutista e a implementação do Liberalismo, através da própria compreensão da transformação das Sociedades e como os processos de produção e consumo tomavam parte e influenciavam para viabilizar esta realidade. Também cabe ressaltar como Smith passou a visualizar o papel da norma moral e da norma jurídica, após a implementação de uma nova realidade econômica.

Entendendo as premissas de Peirce e as de Smith, a tese se ocupará da compreensão de Holmes, o pragmatista jurídico mais proeminente do Clube Metafísico e quais feitos o alçaram a esta condição, assim como sua visão de como a lógica e a moral devem ser encaradas pelo operador jurídico. Qual o papel, para ele, do Common Law, em especial o vigente nos EUA, na sua obra The Path of the Law.

No quarto capítulo será estudada a Análise Econômica do Direito de Posner, assim como as formas usadas por ele para disseminar sua teoria ao redor do mundo, tornando um dos principais focos de discussão hoje. Cabe também a avaliação de como Posner, Juiz da Suprema Corte de Recursos da 7ª Regiao do EUA, visualiza a inter-relação entre: Moral,

(15)

Economia e Direito e quais os meios, se isso for possível, de uma prática interdisciplinar entre elas.

O tópico 4.1 trará aspectos conceituais, instrumentais, da economia, como forma de melhor inserir o leitor ao diálogo interdisciplinar que se dará no restante do capítulo.

O principal alvo desta tese está em percorrer uma trilha que conduzirá ao caminho pavimentado para o experimentalismo, em seus diversos níveis como as obras de Aristóteles, Adam Smith, Peirce e Holmes, responsáveis por eclodir com Posner e sua criação do eficientismo jurídico, ou seja, a idéia do juiz dever ser um maximizador de riquezas e como isto poderá ou deverá ser classificado para o Direito, como algo útil ou perigoso. Objetividade e segurança para o magistrado ou a quebra de paradigmas morais sem nenhum benefício?

Passando as convenções necessárias para a redação e elaboração da presente tese de doutoramento, indico a utilização do sistema completo de citação, com a preocupação de facilitar o trabalho de leitura, assim como cada capítulo terá breves: introduções, pois trarão um esboço mais aprofundado do que será pesquisado (ao contrário desta introdução geral); e conclusões, para apresentar teses instrumentais para a tese final de fechamento do trabalho, após o quarto capítulo, somatizando-as e trazendo novos elementos para uma quinta tese, decorrente, mas distinta.

As introduções explicarão melhor as pretensões de cada capítulo e até mesmo como os mesmos terminarão se entrelaçando, apesar da junção de autores, aparentemente, tão diferentes em suas perspectivas, mas nem tanto como restará demonstrado ao final da tese.

Também optei, apesar de não convencional, pela utilização de imagens, acreditando que as mesmas sumarizam toda a razão de ser de cada capítulo e após a leitura integral destes, as imagens funcionarão como uma espécie de “gatilho mnemônico” para o conteúdo do capítulo. E como surgem as primeiras aspas, já neste parágrafo da introdução, deixo claro que além do seu uso em concordância com as regras da ABNT, utilizá-las-ei como forma de indicar metáforas ou outras figuras de linguagem.

(16)

Assim como as figuras, iniciam os tópicos de cada capítulo uma epígrafe que pode sumarizar a própria essência do tema a ser tratado, ou um aspecto relevante desta discussão, ainda que sejam apresentadas discordâncias.

A pesquisa se dará não sobre toda a bibliografia dos autores avaliados em cada um dos quatro capítulos, mas nos trabalhos mais marcantes de sua obra a influenciar a discussão entre o papel da Moral, do Direito e da Economia, alvo de correlação da presente tese, assim como a indicação de se surgirão efeitos positivos ou negativos desta empreitada, hoje, capitaneada e disseminada mundialmente pelo polêmico Richard Posner.

Os capítulos procurarão edificar elementos de ligação e desenvolvimento das teorias experimentalistas até a eclosão de uma Análise Econômica do Direito e se há motivos para o descarte da norma moral, para os experimentalistas um dos últimos resquícios das ontologias, dos argumentos de autoridade, nas teorias de Richard Posner.

O principal escopo desta tese é avaliar os motivos para se existir um debate entre moral e Direito e como ele evolui ao longo dos séculos, modificando o tratamento e a gênese do próprio Direito, perante as contribuições de Aristóteles, Smith, Peirce, Holmes e por fim Posner, assim como aspectos para se discordar desta postura. Todos estes autores entrelaçam suas teorias, como será abordado no transcorrer da tese, por concordarem ou discordarem de seus posicionamentos.

Deixo claro, in fine, que o escopo último desta tese é avaliar as condições de possibilidade para se justificar, ou não, alguma prevalência do trabalho desenvolvido por Posner, inobstante a grande quantidade de críticas negativas suscitadas, verificando-se a pertinência de seus postulados através da exposição de importantes antecessores experimentalistas e das transformações, em sua teoria, provocadas por seus detratores.

(17)

01. A ESQUINA DOS CAMINHOS RETÓRICOS DE ARISTÓTELES E DOS PRAGMÁTICOS DE PEIRCE EM TORNO DA ÉTICA: a experiência como motivo para a troca da construção do conhecimento “iluminado pelas

estrelas”, por uma perspectiva sensível1

2

Aspectos introdutórios: a busca por congruências nos métodos. 1.1 Perspectivas Retóricas Aristotélicas: a ética como “norte”. 1.1.1. O

entimema como guia ao discurso retórico. 1.1.2. Ethos, pathos, logos e outros fundamentos relevantes do discurso ético-retórico. 1.1.3. A retórica: analítica, estratégica e material. 1.2. Peirce e a pragmática sensibilidade do mundo:

a, positiva, fixação da crença. 1.2.1. A fixação da crença através das idéias

claras: a necessidade do “método científico”. 1.2.2. As conseqüências da fixação das crenças claras sobre o pensamento pragmatista: uma, ética, busca por satisfação. Considerações finais: a “esquina” entre os caminhos da

Retórica e do Pragmatismo em razão da ética.

Aspectos introdutórios: a busca por congruências nos métodos

1

O título da presente monografia foi inspirado no famoso afresco de Rafael (1483-1520), A

Escola de Atenas, pintada no Palácio Apostólico, no Vaticano, entre 1509 e 1510 (que se

encontra reproduzido na capa do presente texto e nesta página); nela aparecem, ao centro, Platão e Aristóteles. Observa-se que Platão segura o Timeu e aponta para o alto (figura de

número 14), sendo assim identificado com o ideal, o mundo inteligível. Aristóteles segura a Ética a Nicômaco e tem a mão na horizontal, representando o terreste, o mundo sensível (figura de número 15), fruto da experiência, informações obtidas em:

<<http://pt.wikipedia.org/wiki/Escola_de_Atenas>>, coletada em: 07/01/2008. 2

A presente foto do Afresco de Rafael foi encontrada em: << http://pt.wikipedia.org/wiki/Ficheiro:Raffaello_Scuola_di_Atene_numbered.svg>>, coletada em: 07/01/2008.

(18)

O objetivo do presente capítulo está na análise de perspectivas convergentes da Retórica com o Pragmatismo, no sentido de buscar uma série de pontos comuns entre essas diferentes, mas nem tanto, escolas filosóficas ou metodológicas, em seu esforço na construção de verdades transitórias, ou crenças, como preferiria Peirce. Procurando viabilizar esta tarefa, o enfoque da pesquisa se dará entre os postulados de Aristóteles, em sua Retórica, assim como no principal artífice do Pragmatismo Americano, Charles Sanders Peirce, através da análise de seus textos: Como Tornar as

Ideias Claras (How to Make Our Ideas Clear) e a fixação da crença (The

Fixation of Belief).

Como dito na primeira nota de rodapé deste texto, aqui se pretende uma metáfora demonstrando as intersecções da Retórica e do Pragmatismo, aventurando-se a demonstrar o rompimento da ontologia platônica, para a adoção de um método empírico, de forma a sonegar o “lume das estrelas”, o metafísico, a inspiração divina e passar a produzir conhecimento através da “luz” terrena dos fatos. Como sintetiza o afresco de Rafael.

A escolha pelo estudo do entimema, como uma das características da retórica, quiçá a principal, revelar-se-á como necessária, diante da análise dos seguintes textos de Peirce: a fixação da crença e como

tornar as idéias claras, na busca por identidades entre estes, ainda que sob

uma diferente “exposição de motivos”.

Assim como, a ponderação do ethos, do pathos e do logos também será sopesada, em relação aos já citados textos de Peirce, avaliando como ocorrerá uma congruência dos métodos hábeis para induzir crenças, privilegiando o método científico para a produção filosófica (como instruído por Peirce em a fixação da crença), em oposição aos outros três métodos por ele explanados: tenacidade, autoridade e a priori.

Neste caminho, primeiro, serão expostos os postulados basilares da retórica de Aristóteles, assim como as considerações de desenvolvedores de sua doutrina, como Ottmar Balweg e João Maurício Adeodato; já em um segundo momento as teses de Peirce serão expostas, para a edificação da terceira parte desta pesquisa: a procura pela convergência

(19)

de teses, ainda que apresentadas de uma forma distinta, a exemplo da busca pela “felicidade” anunciada por Aristóteles e a fixação da “crença” demonstrada por Peirce; ou da satisfação proveniente dela, como afirmaria James; não esquecendo, neste ínterim: Posner e George Browne.

Ressalte-se que, na busca dessas idiossincrasias, o principal ponto a ser trabalhado reside na construção de uma “visão de mundo” ou “crença” resultante do sensível,3 da experiência humana e de sua interação

entre o mundo, objetos e os outros seres (como pretendem esses 2 métodos de produção filosófica), através da eleição do discurso ético, como maior baldrame.

O autor também ressalta que as citações dos trabalhos de Peirce usados como referência estão em sua língua original em notas de rodapé no tópico 1.2 e em seus subtópicos; mas em português no tópico 1.3, justificando a tradução para facilitar (para o leitor) o “processo comparativo” entre os textos de Peirce e Aristóteles. Assim como as citações, de uma mesma obra e de forma consecutiva, receberão a simplificação descritiva “de obra citada”, com o intuito de facilitar a leitura, evitando eivar o leitor com informações supérfluas, já que o sistema autor-data, na presente tese, é preterido ao sistema completo, adotado para a indicação de referências.

Por fim, faço questão de ressaltar o fato da busca por essas “identidades” ter seu marco nas aulas da pós-graduação em Direito da UFPE, aonde se nota um instigante convite ao estudo da Retórica, através das aulas de João Maurício Adeodato, e do Pragmatismo, na cátedra de George Browne; pois, aos mais desavisados, esses dois grupos de pesquisa podem parecer “divergentes”, mas o que a experiência revela, a quem deles participa, é uma via oposta, diante de uma vasta “coleção de identidades”, não sobrepujadas por algumas diferenças na construção destas duas vertentes da filosofia.

De forma que este capítulo tem a pretensão de estreitar, ainda mais, a relação entre estes dois grupos empiristas de estudo do fenômeno jurídico e de seus desdobramentos dogmáticos, em uma ambiciosa busca por conhecimentos Retóricos e Pragmáticos, cada vez mais profundos e

3

Entenda-se sensível como perceptível pelos sentidos humanos, como forma de captação do “mundo exterior”.

(20)

inseridos no cenário internacional, além de demonstrar como se pondera a transformação do uso da moral, para o Direito, a ponto de se viabilizar sua análise econômica, como os capítulos subsequentes desta tese terão o intento de apresentar.

1.1 Perspectivas retóricas aristotélicas: a ética como “norte”

“Aristóteles não tentou uma síntese unificadora. Preferiu adotar o que se acha entre os dois, traçar os seus limites, balizar o domínio dos ‘assuntos humanos’, o domínio das ações, produções, imitações, discursos indefinidos, diálogos, estudá-lo em todas as suas dimensões (ética, política, retórica, dialética, poética, pedagógica). Esses múltiplos fios, quando unidos, desenham como que uma tapeçaria, o rosto do que seria o homem integralmente maduro, tendo realizado todas as suas potencialidades humanas, separado do impassível Primeiro Motor Divino e diferente dos outros animais, em primeiro lugar graças ao logos, que possibilita sua vida com os outros, sua existência intersubjetiva, como se diria em nossa época”. François Stirn4 (Grifos nossos)

No texto acima, observa-se Stirn procurando salientar a abrangência do estudo aristotélico, em sua hercúlea e pretensiosa tarefa de definir uma “visão de mundo” ou do ambiente (Lebenswelt), tendo como observador (e observado) o homem, em suas mais variadas formas de interação subjetiva,5 talvez como necessidade, paradigmática, de construir uma nova realidade e forma de se produzir conhecimento, como será debatido adiante, rompendo com os pilares teóricos de seus predecessores; motivo a justificar o uso de tal excerto como introdutor das perspectivas a serem trabalhadas neste capítulo.

Destarte, Aristóteles almejou “destruir” as perspectivas sofistas vigentes, assim como sua pouca preocupação com a ética, ao resgatar valores que julgava essenciais à vida em coletividade, discordando de seus

4

Compreender Aristóteles. tradução de Ephraim F. Alves. Petrópolis: Vozes, 2006. p. 13 e 14. 5

Por um claro corte metodológico, o presente trabalho encontrará foco na questão da retórica (em específico na sua perspectiva ética), diante da sua importância ao conhecimento humano. Relembrando, para tanto, João Maurício Adeodato, quando, frequentemente, recorda Nietzsche em suas aulas na Disciplina de Filosofia do Direito e no Grupo de Pesquisa sobre Retórica e Direito do Programa de Pós Graduação em Direito da UFPE: “a retórica está em tudo e tudo está na retórica”.

(21)

antecessores Sócrates e Platão,6 seu mestre, ao afirmar, no início do capítulo primeiro da Retórica, que ela é uma oposição à dialética, à sofística, enfim, aos “costumeiros” usos da arte de persuadir que instrumentavam a intersubjetividade na Grécia Antiga,7 em seus mais variados campos cognoscitivos, até então, visando afastar o excessivo e abusivo uso do pathos nessa tarefa de convencimento, pois ela é uma perspectiva mais individualista, sobrepujando o interesse da maioria, e a própria idéia de justiça-ética.8

Aristóteles se sagra como um dos mais proeminentes expositores deste forte movimento Grego de oposição aos sofistas e a sua forma de persuasão,9 como espelhado em As Nuvens (423 AC), de Aristófanes,10 que caricaturizou Sócrates e a sua “influência nefasta” naquela Sociedade, diante de um exacerbado desapego moral e uma individualista

6

Sobre os ideais platônicos da geração do conhecimento e sonegação ao mundo sensível, cite-se a dura crítica de Emmanuel Kant: “Assim, Platão, abandonando o mundo sensível que encerra a inteligência em limites tão estreitos, lançou-se nas asas das idéias pelo espaço vazio do entendimento puro, sem advertir que com os seus esforços nada adiantava, faltando-lhe ponto de apoio onde manter-se e segurar-se para aplicar forças na esfera da própria inteligência. Mas tal é geralmente a marcha da razão humana na especulação; termina o mais breve possível a sua obra, e não procura, até muito tempo depois, indagar o fundamento em que repousa.” Em: Crítica da Razão Pura – coleção grandes mestres do pensamento. S/l: S/Ed, s/d. p. 11 e 12.

7

Aristóteles. A Retórica; tradução de Marcelo Silvano Madeira. São Paulo: Rideel, 2007. p. 19 a 23.

8

ADEODATO, João Maurício. Filosofia do Direito: uma crítica à verdade na ética e na ciência. São Paulo: Saraiva, 2005. p. 57, 61e 62.

9

Oportuna a lembrança de João Maurício Adeodato, acerca da gênese sofista da retórica, ao afirmar: “A retórica surge ligada à sofística e herda o preconceito contra ela, o qual leva a sua identificação com a erística, colocando em um mesmo plano entimemas e erismas, os falsos juízos. Mais correto é ver o erisma como um dos tipos de encadeamento de juízos, de argumentos sofísticos, diferente do entimema. E, ainda assim, o juízo erístico tem dois sentidos básicos: o de falso argumento, um associação pejorativa feita à sofística, como o objetivo de vencer a qualquer preço, e o de controvérsia, do dissoi logoi, ligado à agonística, à arte do debate no discurso. A tradição anti-retórica não apenas identifica entimema e erisma, como também reduz o próprio erisma a uma acepção negativa, que não é a única.” Em: A retórica constitucional - sobre tolerância, direitos humanos e outros fundamentos éticos do direito positivo. São Paulo: Saraiva, 2009.

10 Aristófanes, em grego antigo Ἀριστοφάνης (447 AC. - 385 AC.), foi um dramaturgo grego. É considerado como um dos (senão “o”) maiores representantes da Comédia Antiga. Este Ateniense viveu toda a sua juventude sob o esplendor do Século de Péricles, sendo testemunha, também, do início do fim daquela grande Atenas, ao acompanhar o início da Guerra do Peloponeso, que arruinou a hélade; assim como presenciou, de perto, o papel, em seu entender, “nocivo” dos demagogos na destruição econômica, militar e cultural de sua cidade-estado, diante do florescimento da forma sofística de persuasão, subvertendo os conceitos religiosos, políticos, sociais e culturais da sua civilização, em decorrência de uma necessidade de vitória no discurso e seus, proveitosos, resultados.

(22)

“necessidade” de vencer no discurso,11

algo que Aristóteles, em sua retórica, inviabiliza, ao exprimir a ética como imprescindível ao uso persuasivo.12

Mas antes de se adentrar no, intrínseco, aspecto ético da Retórica Aristotélica, faz-se necessária a abordagem das suas características e bases. Aristóteles, ainda, na primeira lauda do livro I, Capítulo I da Retórica, afirma-nos: “…Os modos de persuasão são as únicas verdades constituintes da arte, tudo o mais é mero acessório”,13 mas nos alerta para o esquecimento

de um importante aspecto do discurso, até então sonegado, o entimema, elencando-o como “… a substância da persuasão retórica…”.14

1.1.1. O entimema como guia ao discurso retórico

Diante dos excertos citados anteriormente, observa-se uma preocupação com a linguagem e o próprio discurso, pois “nada” existiria, nas perspectivas de Aristóteles, sem a linguagem; de forma a impedir o discurso em suas mais variadas formas de captação sensível;15 em uma segunda análise o entimema é apreciado, ou assim deveria o ser, como um dos principais focos do fenômeno discursivo, da linguagem, tomado como:

“… um tipo de silogismo, e em consideração a todas as espécies de silogismos, sem distinção, constitui assunto da dialética, ou da dialética como um todo ou de um ramo específico dela. Segue-se, entretanto, que ele está capacitado a ver como e de quais elementos o silogismo é constituído e, assim, estará melhor capacitado no entimema, mas, somente quando ele tiver aprendido qual é o tema principal deste e no que ele difere do silogismo da lógica estrita. Pode-se observar, também, que os homens têm instinto natural

11

RUSSELL, Bertand. História da Filosofia Ocidental (Livro Primeiro); traduzido por Breno Silveira. São Paulo: Companhia Editora Nacional, s/d. p. 97.

12

_______. Op. cit. p. 190 a 195. 13

ARISTÓTELES. A Retórica; tradução de Marcelo Silvano Madeira. São Paulo: Ridel, 2007. p. 19.

14

_______. Op. cit. p. 19.

15

ADEODATO, João Maurício. A retórica constitucional - sobre tolerância, direitos humanos e outros fundamentos éticos do direito positivo. São Paulo: Saraiva, 2009. Na primeira página do primeiro capítulo.

(23)

suficiente para aquilo que é verdade e, desse modo, chegam ao

verdadeiro.”16 (grifos nossos)

O contexto retórico do entimema procura atrelar ao silogismo, eminentemente lógico,17 uma forma de apresentar “verdades”, como Aristóteles revela no excerto, acima, citado; buscando a experiência, a quebra das contradições e a edificação de bases discursivas que se inclinem à objetividade, a um resultado mais focado na coletividade para a produção de convencimento, notadamente mais eficiente e menos refutável.1819

A idéia aristotélica de entimema demonstra a elaboração de um silogismo evidente e, até mesmo, implícito ao ponto de, instintivamente ou naturalmente, poder ser captado,20 mais próximo da “verdade” ou de uma convenção, aceitação social, melhor dizendo.21

16

ARISTÓTELES. A Retórica; tradução de Marcelo Silvano Madeira. São Paulo: Ridel, 2007. p. 19.

‘ 18

ADEODATO, João Maurício. Ética e Retórica: para uma teoria da dogmática jurídica. São Paulo: Saraiva, 2008. p. 330 a 331.

19

Vale a ressalva de que Autores, ontólogos, não aceitam tal tipo de construção do conhecimento, de elaboração da “verdade”, a exemplo das perspectivas de Pontes de Miranda: “A idéia platônica a que os seres obedeceriam, da qual o objeto tiraria as suas qualidades, servia para explicarem a perfeição do a priori e a imperfeição do a posteriori (a reta e a régua). O que a idéia inspira é inferior a ela. O empirismo contorna o problema e o nominalismo pula-o. Sabe-se que Aristóteles criticou a Platão” o criar, com as idéias, uma duplicata inútil do mundo. Mas a sua filosofia foi insuficiente para se substituir à do seu mestre. À hipóstase platônica, de uma ousadia ontológica, que nele mesmo não poderia perdurar com tanta energia, opôs Aristóteles a origem universal nas coisas sensíveis. Restaurava-se a compenetração entre inteligível e sensível que Parmênides e Platão haviam rompido. Em vez de transcendência, imanência. Mas outro duo se inseria: a inteligência assimila o elemento formal da coisa, porque essa, desmaterializando-se, se ‘desindividualiza’, se universaliza.” Em: O problema fundamental do conhecimento. Campinas: Bookseller, 2005. p. 127. Mas nas páginas: 128, 129 e 240, da mesma obra, Pontes de Miranda reconhece o impulso dado a ciência pelas perspectivas aristotélicas.

20

ADEODATO, João Maurício. Op. cit. p. 333.

21 Diógenes Laêrtios, a este respeito, pronuncia-se: “Aristóteles estabelece claramente que a

lógica tem um objetivo dúplice: a probabilidade e a verdade. Para cada uma dessas ele utilizou duas faculdades: a dialética e a retórica para a probabilidade, e a análise e a filosofia para a verdade, sem nada descurar do que leva à descoberta, ao juízo ou ao uso.” Em: Vidas e doutrinas dos filósofos ilustres – tradução de Mario da Gama Kury. Brasília: Editora da Universidade de Brasília, 1988. p. 136. Mas há de se observar um certo problema em relação a afirmação da retórica ser probabilística, pois, como visto, a idéia do entimema leva a uma “construção de verdades”, não no seu aspecto ontológico, mas em uma convenção, “eterna” enquanto durar sua instrumentalidade prática… a exemplo do que cita João Maurício Adeodato: “Enquanto pleno, o ser humano possui o critério e é capaz de chegar à verdade, servindo-lhe a língua apenas como instrumento e a retórica como simples ornamento, pelos quais aquele que fala pode influir no meio de forma mais ou menos eficaz; como ser deficiente ou carente, o ser humano é incapaz de perceber quaisquer verdades a respeito do mundo, independentemente de um contexto lingüístico, única realidade artificial com que é capaz de

(24)

Os entimemas são a substância do discurso retórico, em seu afã de influenciar persuasivamente, funcionando como uma espécie de “exposição de motivos”, ligado a todas as formas de silogismo, em especial à dialética; mas necessita de indivíduos dotados de instrução prévia acerca do conteúdo tratado. Por isto mesmo a “verdade” (objetivamente considerada) é parte essencial à sua construção, daí Aristóteles defender a prevalência, grandeza e “pureza” do discurso político em relação ao judicial, onde a necessidade de vencer gera um maior desprezo ao justo, mas tal hipótese deve ser evitada pelo retórico.22

O entimema é a indução retórica, haurida através de provas, fatos ou argumentos que persuadirão o destinatário do discurso, afinal esta é a função das provas, o silogismo indutivo. Para tanto a afirmação persuasiva “confiável” decorre de características como a auto-evidência ou a provocação de afirmações correlatas. Logo, deverão tratar de assuntos do interesse humano de forma, preferencialmente, restrita (com poucas proposições, visando erigir uma maior confiabilidade) evitando a propagação de dúvidas desnecessárias.23

Vale relembrar que Aristóteles considerava o entimema um elemento próprio, necessário, do discurso retórico, diante de tudo já esponsado anteriormente, mas não se torna, com isso, exclusivo de outras áreas cognoscitivas; talvez esquecido ou desapercebido, o que permite caracterizá-los como gerais (desaconselháveis por seu extenso espectro de abrangência e conseqüente falibilidade, dúvida) ou específicos (mais robustos e incisivos em seu feitio persuasivo).24

lidar. Assim é colocado o problema: a linguagem e tudo o que se convencionou chamar de ‘inteligência’, ‘mente’, ‘espírito’, pode ser visto como um plus, como habitualmente é feito na cultura ocidental, mas também como um minus. E o que se denomina livre arbítrio ou liberdade resulta de um plus ou de um minus em relação à natureza? A liberdade pode ser vista como algo sublime que assemelha o ser humano a Deus e o torna superior aos demais seres. Mas todas essas características humanas também podem ser pensadas, cética ou biologicamente, como um ‘defeito’ no código genético, gerando inadaptação ao mundo e conflitos, inexistentes entre abelhas e formigas.” Em: Filosofia do Direito: uma crítica à verdade na ética e na

ciência. São Paulo: Saraiva, 2005. p. 235 e ss.

22

ARISTÓTELES. A Retórica; tradução de Marcelo Silvano Madeira. São Paulo: Rideel, 2007. p. 19 a 23.

23

_______. Op. cit. p. 24 a 26. 24

(25)

Tal objetividade aproxima e viabiliza o homem na busca por uma codificação ética, diante do fato da moral ter forte cunho subjetivo, porém como afirmara Miguel Reale:

“Essa homologia entre as exigências espirituais de diálogo universal e o aparelhamento técnico posto ao nosso alcance para a realização de tal fim não vem senão confirmar a universalidade da cultura, todo esse complexo infinito de bens materiais e espirituais que se apóia sobre as subjetividades das quais promana. Daí, como veremos logo mais, o vínculo essencial entre Ética e Cultura, cujo imperativo primordial é a preservação, a todo custo, das forças da subjetividade, contra tudo que possa cercear o poder criador do espírito, estancando a fonte de liberdade, valor que surge quando surge o primeiro ato de valoração.

Como se vê, o processo cultural ‘apóia-se’ sobre a massa dos indivíduos, cada qual com o seu código genético irrevogável e com a sua vocação espiritual. Ocorre, porém, que, ao nascermos, já nascemos no meio de um incomensurável patrimônio de bens culturais, que nos torna devedores de nossos predecessores.”25

Essa observação de Miguel Reale nos remonta, sem maior esforço, a uma construção axiomática aristotélica, pois a construção de uma idéia de moral objetiva reprime os exageros da subjetividade, ao passo que a garante dentro de limites aceitáveis à interação dos sujeitos. Outra importante lição diz respeito à experiência deixada pelos predecessores e, também, ampara a vida em Sociedade em mesmo tom, uma clara demonstração do valor da história e do ensaio, como valores para a perfectibilização do ser humano, como será apresentado adiante, também, nas ideias de Peirce, Adam Smith e Holmes, neste e nos capítulos subsequentes.

Denota-se a necessidade de experimentação, sensibilidade da “verdade”, em situações envolvendo o discurso, algo inovador e transformador da filosofia grega daquela época, ao se romper com o sonho, o etéreo suspiro dos deuses nos “mundanos ouvidos” humanos (a metafísica) e se abraçar, calorosamente, à realidade cotidiana humana, convincente aos mais valorosos filósofos, quanto ao mais “alienado” dos mortais, ao ponto de ciência e filosofia se fundirem, como Reale afirma se constatar hoje.26

25

REALE, Miguel. Introdução à filosofia. São Paulo: Saraiva, 2002. p. 196. 26

(26)

Assim, o entimema demonstra o início dessa procura por convenções, por aceitação na/para a persuasão discursiva de forma apta aos intentos do seu proponente, preferencialmente, fulcrado na ética, para o presente trabalho que trará as transformações que o trato da ética sofreu desde Aristóteles até Posner, tão drasticamente.

Nestas perspectivas, Aristóteles leva a crer que a Retórica teria 3 fins distintos, um para cada tipo de situação pretendida, ajudando na indicação de suas finalidades básicas. O primeiro, político, tem relação com o

futuro e aconselha a fazer, ou não, algo de acordo com uma conveniência

coletiva;27 o segundo seria o jurídico, em uma perspectiva de vitória dos proponentes sob embate judicial, de maneira a versar sobre o passado, mas não desatrelado da idéia de justiça ou da sua adversa (os famosos precedentes); por fim o exibicional, visando galgar o elogio ou o repúdio imediato, presente. O entimema, neste turno, revela o arremate mais eficaz para o sucesso do orador, em qualquer das áreas passíveis ao contexto discursivo.28

1.1.2. O Ethos e outros fundamentos relevantes do discurso retórico

Outros relevantes aspectos na construção da Retórica, para o presente texto, estão vinculados à construção da estrutura discursiva, através da divisão retórica dos argumentos e de seus níveis (retóricas: material,

27

Ao ponto de afirmar ser, a Retórica, fruto da combinação da lógica com o ramo ético da política, necessariamente, diferentemente das visões ontólogas, como já exponsado neste texto e lembra João Maurício Adeodato que as inclinações ontológicas e retóricas marcam a cultura ocidental, disputando espaço e credibilidade no meio acadêmico, até por serem opostas de forma radical, desde a Grécia Antiga, situação aumentada aos longo dos séculos, dividindo a produção filosófica nestes dois “grandes gabaritos”. No Ocidente, as perspectivas ontólogas tem preponderado sobre as retóricas, até pelo fato da ignorância gerar, no senso comum, a falsa idéia de que o sofismo e a retórica são sinônimos quase perfeitos. Um grave erro, diante da, já citada, luta de Aristóteles contra tais ideais. Em: ADEODATO, João Maurício. A retórica constitucional - sobre tolerância, direitos humanos e outros fundamentos éticos do direito positivo. São Paulo: Saraiva, 2009 (no prelo). Na página 04 do primeiro capítulo.

28

ARISTÓTELES. A Retórica; tradução de Marcelo Silvano Madeira. São Paulo: Rideel, 2007. p. 30 a 32.

(27)

estratégica e analítica)29 que será logo tratado; mas antes se torna cogente a apreciação do ethos, do pathos e do logos como elementos atrelados ao discurso retórico e uma forma de se “experimentar” o mundo, das mais variadas formas, desde o sentimento até o julgamento.30

Tais expressões aparecem como ponto chave para a Retórica de Aristóteles, como elementos a serem ponderados pelo, bom e cuidadoso, orador. O ethos será uma decorrência da personalidade do emissor, sua identidade; já o pathos está atrelado ao que se provoca no “auditório”, facilitando e preparando, no receptor, um terreno propício, ou não (geralmente indesejado pelo orador), ao convencimento; por fim o logos está nas provas ou argumentos usados na transmissão do discurso.3132

Por uma razão metodológica clara, o enfoque desta pesquisa se dará sobre o ethos, pois a ética, alvo do debate aqui travado, surge de um: “… conjunto de conhecimentos relacionados ao ethos, mas também esse próprio ethos, no sentido de designar simultaneamente a meta-linguagem (estudo do caráter humano) e a meta-linguagem objeto (o caráter humano, tal como ele se apresenta), pois o primeiro objetivo da tese está em traçar as transformações necessárias aos postulados aristotélicos, como forma de adequação à realidade.”33

Assim a aristotélica virtude moral é eleita como elemento-chave para a retórica, diferenciando-a de sua geração: a sofística e a

29

Como estudado por Ottmar Balweg (Retórica Analítica e Direito. In: Revista Brasileira de Filosofia. Vol. XXXIX, Fasc. 163. São Paulo: Instituto Brasileiro de Filosofia, julho/agosto/setembro de 1991. p 177.) e desenvolvido por João Maurício Adeodato, em seu mais novo livro: A retórica constitucional - sobre tolerância, direitos humanos e outros fundamentos éticos do direito positivo. São Paulo: Saraiva, 2009 (no prelo).

30

ADEODATO, João Maurício. Op. cit. Na primeira página do primeiro capítulo. 31

ARISTÓTELES. A Retórica; tradução de Marcelo Silvano Madeira. São Paulo: Rideel, 2007. p. 22 e ss.

32

Sobre tal aspecto há de se relembrar o alerta de João Maurício Adeodato acerca de um importante aspecto: estas expressões, ethos, pathos e logos, certamente possuem um sentido diferente do de sua gênese, diante do inexorável “tempo” e suas influências sobre a cultura e consecutivamente sobre a linguagem e a abrangência dos signos por ela usados, viabilizando o fato de alguns pensadores tratarem estas palavras com uma diferente acepção e abrangência. Em: A retórica constitucional - sobre tolerância, direitos humanos e outros fundamentos éticos do direito positivo. São Paulo: Saraiva, 2009. Na sexta página do primeiro cpáitulo.

33

(28)

dialética,34 fazendo o ethos ser acompanhado pela virtuosa prudência (ou phrónēsis), contanto, não se pode negar que muitos, também, defendem a retórica como desassociada da ética, como será visto adiante, nas lições de João Maurício Adeodato;35 contudo estes devem entender a retórica como um mero método, logo desassociada de uma escola filosófica e no contexto no qual a inseriu Aristóteles, seu maior expoente, tão somente relegada a um método explanativo aos caracteres do discurso.

É no ethos que deve estar o princípio do discurso, o motivo da persuasão, o pathos a ser provocado para tal motivo, o que, por si, revela uma estratégia e, também, sua posterior execução se caracterizarão como “logosóficas”. A ética é o meio apto a refrear o intuito de persuadir sem apego à verdade,36 conduzindo a uma “retórica eficiente”, no sentido de revelar uma preocupação com a coletividade, em nada individualista, como erigirá Peirce, tratado no próximo tópico deste capítulo.

Como visto, anteriormente, a ética é coletiva ao surgir de um conjunto de conhecimentos morais, provenientes do ethos e a necessidade de avaliar os efeitos que o discurso, emotivamente, possa desencadear no “auditório”, de forma imediata e, principalmente, futura.37

Mas é bom citar que esse não é um objeto pacífico, até certo ponto “idealizado” por Aristóteles em busca de uma Sociedade mais forte e desenvolvida; pois, de certa forma, há uma ruptura com as perspectivas provenientes da experiência humana em sua vida em coletividade, como revela Nietzsche, sendo inevitável colacionar, literalmente, excertos de suas perspectivas, diante de sua síntese crítica aos postulados de Aristóteles, até aqui definidos:

34

Conforme exposto nas páginas 06 e seguintes deste texto. 35

ADEODATO, João Maurício. Op. cit. p. 06 do primeiro capítulo. 36

Nas perspectivas tratadas a partir da página 06 da presente pesquisa. 37

Algo que Nietzsche também se contrapõe a esta posição de Aristóteles, quando em sua postura cética, dispõe: “… Aquela altivez associada ao conhecer e sentir, nuvem de cegueira pousada sobre os olhos e sentidos dos homens, engana-os pois sobre o valor da existência, ao trazer em si a mais lisonjeira das estimativas de valor sobre o próprio conhecer. Seu efeito mais geral é engano – mas mesmo os efeitos mais particulares trazem em si algo do mesmo caráter.” Em: Sobre Verdade e Mentira no Sentido Extra-Moral. In: COLEÇÃO OS PENSADORES (“Nietzsche – vida e obra”). São Paulo: Nova Cultural, 1999. p 53. Porém o problema não pode ser posto nestes termos, como já visto na nota de número 22 do presente texto, uma vez que a generalização, mesmo com seus problemas, viabiliza a vida coletiva, uma realidade inafastável. Como, também, será visto na nota de número 40.

(29)

No homem essa arte do disfarce chega a seu ápice; aqui o engano, o lisonjear, mentir e ludibriar, o falar-por-trás-das-costas, o representar, o viver em glória de empréstimo, o mascarar-se, a convenção dissimulante, o jogo teatral diante de outros e diante de si mesmo, em suma, o constante bater de asas em torno dessa única chama que é a vaidade, é a tal ponto a regra e a lei que quase nada é mais inconcebível do que como pôde aparecer entre os homens um honesto e puro impulso à verdade. Eles estão profundamente

imersos em ilusões e imagens de sonho, seu olho apenas resvala às tontas pela superfície das coisas e vê ‘formas’, sua sensação não conduz em parte alguma à verdade, mas contenta-se em receber estímulos e como que dedilhar um teclado às costas das coisas. Por isso o homem, à noite, através

da vida, deixa que o sonho lhe minta, sem que seu sentimento moral jamais tentasse impedi-lo; no entanto, deve haver homens que pela força de vontade deixaram o hábito de roncar.

(… omissis…)

Enquanto o indivíduo, em contraposição a outros indivíduos, quer conservar-se, ele usa o intelecto, em um estado natural das coisas, no mais das vezes, somente para a representação: mas, porque o homem, ao mesmo tempo por necessidade e tédio, quer existir

socialmente e em rebanho, ele precisa de um acordo de paz e se esforça para que pelo menos a máxima bellum omnium contra

omnes (guerra de todos contra todos), desapareça de seu

mundo. Esse tratado de paz traz consigo algo que parece ser o

primeiro passo para alcançar aquele enigmático impulso de verdade. (… omissis…)

Que delimitações arbitrárias, que preferências unilaterais, ora por esta, ora por aquela propriedade de uma coisa! As diferentes

línguas, colocadas lado a lado, mostram que nas palavras nunca importa a verdade, nunca uma expressão adequada: pois senão não haveria tantas línguas. A ‘coisa em si’ (tal seria

justamente a verdade pura sem conseqüência) é, também para o formador da linguagem, inteiramente incapitável e nem sequer algo que valha a pena. Ele desgina, apenas as relações das coisas aos homens e toma em auxílio para exprimi-las as mais audaciosas

metáforas.38 (Grifos nossos)

Esta postura, cética por excelência, revela a implausibilidade de uma objetividade pura, mas também não apresenta uma solução à vida em coletividade, embora descreva, brilhantemente, a realidade, a experiência, tão defendida por Aristóteles, revela-nos sua instrumentalidade e eficácia para o homem moderno e sua coexistência cosmopolita, por excelência, prova maior disso reside no fenômeno da globalização, cada vez mais crescente, ao

38

NIETZSCHE, Friedrich Wilhelm. Sobre Verdade e Mentira no Sentido Extra-Moral. In: COLEÇÃO OS PENSADORES (“Nietzsche – vida e obra”). São Paulo: Nova Cultural, 1999. p 54 e 55.

(30)

contrário do destrutivo ceticismo de Nietzsche, apto a auxiliar o ser humano ao seu autoengrandecimento, mas, pragmaticamente, inútil para a construção de um cenário social favorável, de maneira ainda mais radical que a de David Hume, como será tratado no próximo capítulo, por sua considerável influência sobre o pensamento de Adam Smith.

O fato da língua possuir diversidades, tanto em relação aos próprios signos de uma língua, quanto à pluralidade de idiomas, não a torna inviável à transferência de “verdades”; pois a informação pode, até, ser dificultada, mas o signo pode ser traduzido em sua força de transmissão de verdades. Senão como seria possível, a quem conheça apenas o português, ler Nietzsche ou ele a Aristóteles, apesar das forças da entropia?

Metáfora, nesse caso, pode ser outro nome para “verdade”! O que, realmente, chama atenção é a quebra do paradigma, a quebra do sistema, do entimema aristotélico, algo caracteristicamente retórico, em uma estratégica tentativa de provocar o pathos da reprovação, para o leitor.

E a internet só corrobora para o que afirmara Aristóteles, séculos atrás, pois as barreiras para a veiculação do discurso humano, cada vez mais, tornam-se menores. Mal comparando, naquela época e até na de Nietzsche, elas seriam altas e vastas como a muralha chinesa, hoje não passariam da altura que separa o “meio fio” do calçamento da academia, da estrada do conhecimento humano comum, amparado pelas ferramentas mais modernas de busca.

Colocar um esteio, um conjunto de “verdades” viabilizando tal realidade é algo necessário e, até então não efetivado, como revela o grande motivo deste texto e a idéia trazida pelo Afresco de Rafael, em relação a uma das maiores preocupações de Aristóteles: a experiência como valor necessário à produção de significados, de conhecimento, da verdade, em seus moldes transitórios, experimentalistas.

Afinal, a “generalização” proposta por Aristóteles não é de cunho metafísico, mas amparada na prática e na positividade de resultados, em regra já testados. Não há uma verdade estática, mas em permanente transformação em um eterno “jogo” discursivo, tornando possível a vida em

(31)

Sociedade e necessária a autoridade para a criação de entimemas e outras figuras vinculantes do ethos, como a ética.39

Além do que na Ética a Nicômaco, Aristóteles adverte:

“Assim, se é verdade que uma ciência é acompanhada de demonstração, mas as coisas cujos princípios podem ser diversas do que são não admitem a dita demonstração (precisamente porque

todas admitem essa sua mesma mutabilidade), e se não é

possível deliberar sobre as coisas que existem necessariamente, a prudência não poderia ser nem ciência nem arte – não ciência, porque o objeto da ação pode ser diferente do que é; não arte, porque o gênero da ação é diverso do da produção. Resta então para a prudência do ser uma disposição, acompanhada da verdadeira regra, capaz de agir na esfera do que é bom e do que é mau para um ser humano. Enquanto a produção, com efeito, possui um fim diverso de si mesma, não se passa o mesmo com a ação,

sendo a boa prática em si mesma o seu próprio fim.”40

(Grifos nossos)

Os grifos mostram, necessariamente, temas aqui tratados, como: a mutabilidade das “verdades”; a utilização deste conhecimento objetivo para trazer felicidade a um ser humano; sem “dever” se desvincular da ética.

A ética, então, refreia o ímpeto pessoal, o ethos, fazendo com que o social seja colocado em plano superior, como meio necessário ao desenvolvimento da Retórica em seus mais variados níveis, talvez essa seja a razão maior da sua preocupação ao criar o entimema da Ética como figura necessária à Retórica, em repúdio à sua gênese sofista.

Mas como realizar um estudo das formas da Retórica e as ponderações éticas possíveis? Observando os modos como a linguagem, retórica, pode ser funcional para a condensação da linguagem e seu uso

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Ottmar Baallweg, inspirado pelas idéias de Foucault e Luhmann, expressa-se no sentido de que tais verdades não são estáticas, mas mutáveis em razão da necessidade, de forma a romper com perspectivas ontológicas, pois a autoria humana (subjetiva por excelência) passa a ser substituída pela autoridade, de modo que a credibilidade seja “autopoieticamente produzida e a confiança seja autorefencialmente possível.” E é essa autoconfiança nos dogmas, nas determinações de autoridade que viabilizam, por exemplo (sic), a aceitação do Direito. Em: Kritik und Vertrauen — Festschrift für Peter Schneider zum 70. Geburtstag. Frankfurt a.M.: Anton Hain, 1990 (trad. João Maurício Adeodato. Retórica analítica e direito. Revista Brasileira de Filosofia, n° 163, fasc. 39. São Paulo: Instituto Brasileiro de Filosofia, 1991, p. 175-184). p 177.

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ARISTÓTELES. Obra Jurídica – Aristóteles (tradução Carlos E. Rodrigues). São Paulo: Ícone. p. 103 e s.

Referências

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de professores, contudo, os resultados encontrados dão conta de que este aspecto constitui-se em preocupação para gestores de escola e da sede da SEduc/AM, em

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