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Análise da atuação do estado de São Paulo na governança global do clima à luz da problemática do carbon lock-in

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Academic year: 2023

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Pontifícia Universidade Católica de São Paulo PUC-SP

Bruno André Blume

Análise da atuação do estado de São Paulo na governança global do clima à luz da problemática do carbon lock-in

Mestrado Profissional em Governança Global e Formulação de Políticas Internacionais

São Paulo 2022

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Pontifícia Universidade Católica de São Paulo PUC-SP

Bruno André Blume

Análise da atuação do estado de São Paulo na governança global do clima à luz da problemática do carbon lock-in

Mestrado Profissional em Governança Global e Formulação de Políticas Internacionais

Dissertação apresentada à banca examinadora da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, como exigência parcial para obtenção do título de MESTRE PROFISSIONAL em Governança Global e Formulação de Políticas Internacionais, sob a orientação da Prof.ª Dr.ª Terra Friedrich Budini.

São Paulo 2022

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Bruno André Blume

Análise da atuação do estado de São Paulo na governança global do clima à luz da problemática do carbon lock-in

Trabalho Final apresentado à Banca Examinadora da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP), como exigência parcial para obtenção do título de MESTRE PROFISSIONAL em Governança Global e Formulação de Políticas Internacionais, sob orientação da Prof.ª Dr.ª Terra Friedrich Budini.

Aprovado em: ___/___/______

Banca Examinadora

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AGRADECIMENTOS

Agradeço aos meus pais, Rosvitha e Odair, pela educação exemplar que me ofereceram, pelo amor e dedicação incondicionais, por sempre acreditarem em mim. Não seria nada sem vocês.

Ao meu irmão Lucas, cuja amizade é inestimável.

À minha orientadora Terra, por todo o apoio intelectual e técnico oferecido ao longo desta trajetória.

Aos meus amigos Thiago, Iuri, Júlia, Bernardo e Beatriz por serem acima de tudo bons amigos e por se fazerem presentes, seja nos momentos bons ou ruins.

Aos colegas do curso de Governança Global e Formulação de Políticas Internacionais da PUC, que, mesmo à distância na maior parte do tempo, estiveram próximos a mim e também estão encerrando este ciclo.

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“Nós não herdamos a Terra de nossos ancestrais; nós a emprestamos de nossos filhos.” – Autor desconhecido

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RESUMO

BLUME, Bruno André. Análise da atuação do estado de São Paulo na governança global do clima à luz da problemática do carbon lock-in. 2022. 98f. Dissertação (Mestrado Profissional) - Curso de Governança Global e Formulação de Políticas Internacionais, Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, São Paulo, 2022.

Esta pesquisa busca investigar e avaliar o impacto de atores governamentais subnacionais na governança climática global. Parte-se de constatações teóricas de que tal governança tem se tornado crescentemente multifacetada e fragmentada desde os anos 1990, com a consequente inclusão e fortalecimento de atores subnacionais e não estatais em seus processos. Esse fenômeno estaria relacionado com a conformação de uma ordem global neoliberal, em que as preocupações ambientais estão subordinadas aos interesses econômicos, comerciais e políticos dominantes no cenário internacional. Além disso, busca-se evidenciar que, por mais significativa que seja a participação de governos subnacionais na governança climática global, estes também estão sujeitos a limitações que seus homólogos nacionais encontram na tentativa de imprimir efetividade a essa governança, especialmente por conta da dependência sistêmica e duradoura do consumo de carbono e outros gases de efeito estufa em economias industrializadas, fenômeno denominado carbon lock-in. A fim de aprofundar o conhecimento sobre a participação de atores subnacionais brasileiros na governança do clima e de sua interação com o carbon lock-in, foi desenvolvido estudo de caso do estado de São Paulo, cuja atuação internacional em prol do combate às mudanças climáticas tem se destacado, sobretudo pela apresentação de compromissos e metas mais arrojados do que média nacional. A pesquisa demonstra que, em que pese a burocracia paulista estar relativamente avançada em seus compromissos climáticos e alinhada a diversas tendências internacionais nesse âmbito, esta ainda não está lidando diretamente com seu problema de carbon lock-in, especialmente por conta da relação estreita com a indústria de petróleo e gás, cuja influência apenas se fez aumentar no estado desde a descoberta das reservas do pré-sal.

Palavras-chave: mudanças climáticas; governança global; governança climática; carbon lock- in.

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ABSTRACT

BLUME, Bruno André. Analysis on the state of São Paulo’s participation in global climate governance in light of the carbon lock-in challenge. 2022. 98p. Dissertation (Professional Master’s degree in Global Governance and International Policies Formulation), Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, São Paulo, 2022.

This research seeks to investigate and assess the impact of subnational government actors on global climate governance. It departs from theoretical findings that such governance has become increasingly multifaceted and fragmented since the 1990s, with the subsequent inclusion and strengthening of subnational and non-state actors in its processes. This phenomenon is connected to the conformation of a neoliberal global order, in which environmental concerns are subordinated to dominant economic, commercial and political interests in international politics. In addition, it seeks to show that, regardless of how significant the participation of subnational governments in global climate governance is, they are also subject to limitations that their national counterparts find in trying to make this governance effective, especially due to systemic and long-standing dependence on the consumption of carbon and other greenhouse gases in industrialized economies, a phenomenon known as carbon lock-in. In order to deepen the knowledge about the participation of Brazilian subnational actors in climate governance and their interaction with carbon lock-in, we develop a case study of the state of São Paulo, whose international action in favor of combating climate change has stood out in the country, especially for the presentation of commitments and goals that are bolder than the national average. The study shows that, despite the fact that São Paulo’s bureaucracy is relatively advanced in its climate commitments and aligned with several international trends in this area, it is still not dealing directly with the root causes of carbon lock-in, especially due to the close relationship with the oil and gas industry, whose influence has only increased in the state since the discovery of pre-salt reserves in deep waters near the Brazilian coast.

Keywords: climate change; global governance; climate governance; carbon lock-in.

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LISTA DE TABELAS

Tabela 1 - Metas do Plano de Ação Climática 2050 de São Paulo (versão preliminar) ... 61

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LISTA DE GRÁFICOS

Gráfico 1 - Tempo de vida médio de infraestrutura ... 35 Gráfico 2 – Evolução das emissões de CO2 do estado de São Paulo (1990-2020, em MtCO2) ... 56 Gráfico 3 – Estados brasileiros com maiores emissões brutas de CO2 (em milhões de

toneladas de CO2) ... 57 Gráfico 4 – Comparação do perfil de emissões por fontes de emissão – São Paulo e Brasil ... 58

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LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS

ALESP Assembleia Legislativa do Estado de São Paulo

ACT Australian Capital Territory (Território da Capital Australiana) ANP Agência Nacional do Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis C40 Grupo C40 de Cidades para a Liderança Climática

CCP Cities for Climate Protection (Cidades pela Proteção do Clima) CDP Carbon Disclosure Project

CO2 Dióxido de carbono ou gás carbônico

COP Conferência das Partes das Nações Unidas sobre Mudanças Climáticas EUA Estados Unidos da América

FAPESP Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo

GATT General Agreement on Tariffs and Trade (Acordo Geral sobre Tarifas e Comércio)

GEE Gases de Efeito Estufa

GW Gigawatt

ICLEI Rede de Governos Locais pela Sustentabilidade ICMS Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços

IPCC Intergovernmental Panel on Climate Change (Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas)

IPVA Imposto sobre a Propriedade de Veículos Automotores LPAA Lima-Paris Action Agenda (Agenda de Ação Lima-Paris)

NAFTA North American Free Trade Agreement (Acordo de Livre Comércio da América do Norte)

NAZCA Non State Actor Zone for Climate Action (Zona de Atores Não Estatais para Ação Climática)

nrg4SD Network of Regional Governments for Sustainable Development (Rede de Governos Regionais para o Desenvolvimento Sustentável)

ONG Organização Não Governamental ONU Organização das Nações Unidas P&D Pesquisa e Desenvolvimento P&G Petróleo e Gás

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PeixeSP Associação dos Piscicultores em Águas da União PEMC Política Estadual de Mudanças Climáticas

PFPMCG Programa FAPESP de Pesquisa sobre Mudanças Climáticas Globais PPE Plano Paulista de Energia

REDD+ Reducing Emissions from Deforestation and forest Degradation

Rio 92 Conferência das Nações Unidas sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento ou CNUMAD (1992)

RPS Renewable Portfolio Standards

SEEG Sistema de Estimativas de Emissões e Remoções de Gases de Efeito Estufa SEI Stockholm Environment Institute (Instituto do Meio Ambiente de Estocolmo) UNEP United Nations Environment Programme (Programa das Nações Unidas para

o Meio Ambiente)

UNFCCC Convenção-Quadro das Nações Unidas sobre a Mudança do Clima

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SUMÁRIO

1 INTRODUÇÃO ... 14

1.1 Objetivos de pesquisa ... 17

1.1.1 Objetivo geral ... 17

1.1.2 Objetivos específicos ... 17

1.2 Metodologia ... 18

2 GOVERNOS SUBNACIONAIS: PARTICIPAÇÃO NA GOVERNANÇA GLOBAL DO CLIMA E INTERAÇÕES COM O CARBON LOCK-IN... 20

2.1 Governança global do clima: conceituação e evolução teórica... 20

2.2. Governança global do clima e ascensão dos governos subnacionais... 29

2.2.1 Participação de governos subnacionais e atores não estatais na governança global do clima: críticas à literatura ... 32

3 CARBON LOCK-IN E OS DESAFIOS DA ATUAÇÃO DE GOVERNOS SUBNACIONAIS NA GOVERNANÇA DO CLIMA ... 34

3.1 Tipos de carbon lock-in... 38

3.2. Possíveis saídas para o carbon lock-in... 39

3.3 Carbon lock-in e a dimensão subnacional: estudos de caso internacionais ... 43

4 ESTUDO DE CASO: A AÇÃO CLIMÁTICA DO ESTADO DE SÃO PAULO – ENTRE O PIONEIRISMO E A PERPETUAÇÃO DA DEPENDÊNCIA DE CARBONO ... 53

4.1 Participação do estado de São Paulo na governança global do clima... 54

4.1.1 São Paulo: perfil e quantitativos de emissões de gases de efeito estufa ... 56

4.2 Políticas e Planos Estaduais de Ação Climática de São Paulo: de 2009 a 2022 ... 59

4.2.1 Plano de Ação Climática 2050 – Eixo 1: eletrificação acelerada ... 62

4.2.2 Plano de Ação Climática 2050 – Eixo 2: Combustíveis avançados ... 63

4.2.3 Plano de Ação Climática 2050 – Eixo 3: Eficiência Sistêmica ... 64

4.2.4 Plano de Ação Climática 2050 – Eixo 4: Resiliência e Soluções Baseadas na Natureza ... 65

4.2.5 Plano de Ação Climática 2050 – Eixo 5: Finanças e Inovação ... 66

4.2.6 Plano de Ação Climática de São Paulo 2050: avaliação geral ... 66

4.3 Evidências do lock-in de carbono no estado de São Paulo ... 68

4.3.1 A expansão da indústria de petróleo e gás em São Paulo ... 68

4.3.3 Receitas do Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS) ... 73

4.3.4 IncentivAuto e a dependência da indústria automotiva na economia paulista ... 77

4.3.5 Regulação da geração de energia termelétrica ... 81

4.3.6 Investimentos em pesquisa, desenvolvimento e novos negócios ligados à descarbonização ... 82

4.4 O carbon lock-in de São Paulo: considerações gerais ... 84

5 CONSIDERAÇÕES FINAIS ... 86

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ... 89

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14 1 INTRODUÇÃO

Setembro de 2021. A cerca de um mês da 26ª Conferência das Partes (COP-26) da Convenção-Quadro das Nações Unidas sobre a Mudança do Clima (UNFCCC, na sigla em inglês), considerada a mais importante desde a COP-21 – realizada em Paris, em 2015, na qual foi apresentado um novo acordo climático global ao mundo – o presidente da COP-26, Alok Sharma, reuniu-se em evento híbrido com governadores, prefeitos e líderes empresariais brasileiros, no qual afirmou: “Vocês são meus heróis climáticos e sua adesão a este grande compromisso climático é muito importante” (PACTODEALCALDES-LA, 2021).

À época do evento, quatro estados brasileiros já haviam aderido à campanha “Race to Zero”, cujo principal objetivo é o alcance da neutralidade de carbono até 2050. Juntaram-se a eles doze cidades e mais de 100 empresas do País. Com a possibilidade de adesão de pelo menos mais cinco estados interessados, o grupo já representaria mais de 50% da economia e das emissões brasileiras de gases de efeito estufa (GEEs), dentre os quais se destaca o dióxido de carbono (PACTODEALCALDES-LA, 2021).

Tal encontro não ocorreu naquele momento por acaso: tratava-se de um sintoma de dinâmicas, tanto locais e nacionais quanto globais, que se consolidaram nos últimos anos e que apontam para uma nova configuração da governança climática global. Diversos pesquisadores indicam uma crescente relevância dos chamados “atores não estatais” (non-state actors) no âmbito das negociações internacionais do clima – seja nos foros da UNFCCC ou externos a ela –, que incluem um amplo leque de organizações para além do clássico Estado-nação (ONGs, movimentos sociais, empresas, bem como redes transnacionais que mobilizam todos esses atores). Também são incluídos nesse conjunto atores estatais subnacionais, como estados e cidades (BACKSTRAND e LÖVBRAND, 2015; CHAN et al., 2015; DRYZEK;

NORGAARD; SCHLOSBERG, 2013; HALE, 2018). Isso tem gerado uma governança do clima mais fragmentada, com múltiplos níveis de ação e autoridade, e, em muitos casos, híbrida, com grande influência de atores privados.

O principal motivo para essa fragmentação seria a dificuldade que Estados nacionais têm enfrentado para alcançar acordos efetivos no nível internacional desde os anos 1990, quando foi criada a UNFCCC (KEOHANE e VICTOR, 2011). Alguns desses autores também indicam que essa paisagem diversa de atores reflete a própria natureza da questão climática, que foge aos temas clássicos tratados por Estados nacionais ao atingir de forma mais direta toda

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15 a sociedade, representada por suas mais diversas instituições (DRYZEK; NORGAARD;

SCHLOSBERG, 2013; HALE, 2018).

No que tange especificamente aos governos subnacionais, a literatura traz diversas observações e previsões otimistas sobre suas contribuições para a governança do clima. Além de possuírem controle direto sobre grande parte da economia de seus respectivos países, tais atores de natureza estatal também costumam regular temas como planejamento urbano, uso do solo, gerenciamento de resíduos, gerenciamento do sistema de distribuição de energia, entre outros muito caros à questão ambiental e climática. Também possuem menos restrições para a assunção de compromissos mais ousados do que os de seus respectivos governos nacionais e seriam capazes de se apresentar como uma alternativa para contornar eventuais impasses políticos em nível nacional, lançando iniciativas contra as mudanças climáticas mesmo quando o respetivo governo central se mostra inerte ou indiferente em relação ao tema. A possibilidade de associação com outros governos locais e regionais mundo afora por meio de redes transnacionais também fortalece as sinergias entre esses atores, por meio da troca de experiências e recursos que tornam suas ações climáticas mais efetivas.

No entanto, nota-se na literatura da governança do clima uma relativa escassez de avaliações mais aprofundadas a respeito das contribuições de governos subnacionais. É público e notório que muitos desses governos, de diversas nacionalidades do Norte e do Sul global, fizeram compromissos públicos internacionais relacionados ao clima ao longo dos últimos anos, muitos dos quais amplamente divulgados e em certos casos até mais avançados do que os de governos centrais de seus respectivos países. Em alguns casos, entram em conflito direto com o posicionamento nacional destes. Mas são poucas as pesquisas que buscaram avaliar tanto a relevância desses compromissos para as metas globais do sistema de governança climática quanto sua efetiva implementação.

Ademais, poucos estudos levantados buscaram explorar as relações de atores subnacionais com algumas das dinâmicas sociais, políticas e econômicas que diretamente constrangem e diluem o impacto das negociações climáticas entre governos centrais – os quais, é preciso lembrar, continuam a ser as únicas partes que celebram acordos de caráter vinculante no âmbito da UNFCCC a respeito das mudanças climáticas. Dentre essas dinâmicas, destaca- se a persistente influência da indústria de combustíveis fósseis na economia global, a qual se manifesta por meio do fenômeno que alguns pesquisadores denominam de carbon lock-in – que forma uma complexa teia de arranjos, acordos e costumes nos níveis econômico, institucional, cultural e microeconômico que tornam a emissão de gás carbônico e de outros GEEs na

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16 atmosfera uma realidade praticamente obrigatória de sociedades industrializadas em um panorama de longo prazo, mesmo em pleno século XXI (SETO et al., 2016; UNRUH, 2000).

Esta pesquisa busca contribuir para a composição de um quadro mais preciso sobre o real impacto dos compromissos de governos subnacionais brasileiros nos esforços de mitigação e enfrentamento das mudanças climáticas, bem como de sua própria contribuição na perpetuação da dependência do uso intensivo de carbono e de outros gases de efeito estufa na economia global. O problema central a ser tratado é que, apesar da crescente contribuição de estados e municípios brasileiros para as ações de contenção das mudanças climáticas nos últimos anos, há uma relativa ausência de avaliações mais críticas sobre o impacto dos compromissos subnacionais desses entes em relação aos objetivos das negociações do clima – sobretudo, a descarbonização da economia global e a consequente desaceleração do aumento da temperatura do planeta – bem como em relação à superação da inércia política, tecnológica e social que favorece a manutenção de uma matriz energética baseada em altos níveis de emissão de carbono e outros GEEs. Para isso, será explorada a experiência do governo do estado de São Paulo, cujo engajamento nas questões climáticas tem se tornado destaque nacional e internacional.

Em suma, busca-se responder às seguintes questões: como governos subnacionais brasileiros estão empenhados em reduzir ou desestimular a produção e o consumo de combustíveis fósseis em seu território? Esse engajamento já produziu resultados práticos observáveis? Além disso, quais são as evidências de que governos subnacionais brasileiros também contribuem para o prolongamento da dependência de combustíveis fósseis na economia e quais são as evidências dessa contribuição?

Essas questões possuem relevância ao se constatar que governos subnacionais ganharam relevância no contexto da governança do clima nas últimas décadas. Ao passo que sua participação é bem-vinda, também se torna necessário submeter tais entidades a um escrutínio cada vez mais apurado em relação aos seus compromissos nesse âmbito, a fim de fazer jus ao protagonismo que tem sido por elas conquistado. Entretanto, além de existirem indicativos de que os compromissos climáticos desses atores não serem suficientes para conter o avanço da temperatura global a níveis alarmantes, também há poucos parâmetros para se prever se todas essas promessas serão de fato cumpridas (MACLEAN, 2020, p. 30).

Cabe também ressaltar as razões para a escolha por um estudo específico de um estado brasileiro – São Paulo –, dentro do universo de governos subnacionais deste País, que ainda inclui os municípios. Como uma das maiores federações do mundo, o Brasil assume uma posição natural de destaque em termos de ações subnacionais, uma vez que seus estados e

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17 municípios possuem recursos e autonomia significativos para desenvolverem suas próprias relações internacionais – desde que respeitando os limites de suas próprias atribuições no pacto federativo. Como será exposto em maior detalhe em capítulos posteriores, o engajamento desses entes não é desprezível e justifica uma atenção especial dos pesquisadores da governança do clima. Os estados brasileiros possuem competências residuais que normalmente se referem à dimensão regional. Seus orçamentos bilionários os tornam capazes de mobilizar ações que, quando tomadas em conjunto, rivalizam com a capacidade do governo federal. O estado de São Paulo, por exemplo, possui o maior Produto Interno Bruto (PIB) entre todas as unidades federativas brasileiras. Trata-se, portanto, de entes com cartas na manga para fazer a diferença na governança do clima – e cujas ações nesse âmbito também merecem grande escrutínio.

1.1 Objetivos de pesquisa

1.1.1 Objetivo geral

Esta pesquisa tem como objetivo geral fornecer indícios que ajudem a evidenciar as formas como a problemática do carbon lock-in se desenvolve atualmente na dimensão subnacional brasileira – mais especificamente no estado de São Paulo. Busca-se, assim, evidenciar quão alinhados os compromissos e as ações climáticas dos estados brasileiros estão com a necessidade premente de redução da produção e do consumo desses combustíveis.

1.1.2 Objetivos específicos

A fim de formar esse diagnóstico acerca do alinhamento entre metas de descarbonização e as projeções de produção e consumo de combustíveis fósseis, esta pesquisa buscará:

1. mapear possíveis incoerências entre os compromissos assumidos por governos estaduais brasileiros e suas políticas e atividades nos âmbitos econômico, político e social;

2. investigar como estados brasileiros lidam com a produção e consumo de combustíveis fósseis em seu território, sem perder de vista que os direitos de exploração de petróleo e gás pertencem à União;

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18 3. identificar setores das economias estaduais que são beneficiados ou colaboram,

direta ou indiretamente, para dinâmicas econômicas dependentes da emissão de GEEs.

1.2 Metodologia

Para responder aos problemas elencados nesta pesquisa, foi escolhido o estudo de caso como ferramenta metodológica. Optou-se por essa metodologia por conta de restrições de recursos e tempo que inviabilizariam uma análise comparada aprofundada entre todos os estados.

O recorte do estudo de caso desenvolvida para esta pesquisa é o estado de São Paulo.

Além da notória relevância econômica desse ente, essa seleção se justifica por expor a realidade de um estado que possui fortes ligações com a indústria de petróleo e gás natural, altamente industrializado e ainda dependente da energia proveniente de fontes fósseis e de atividades ligadas a elas. Trata-se de um ente federativo que precisará enfrentar dilemas ao assumir compromissos com a diminuição de emissões de GEEs.

A análise da ação climática de São Paulo realizada neste estudo desenvolveu-se por três eixos, que são:

1. Revisão de metas e compromissos climáticos assumidos pelo estado: levantamento dos compromissos, metas e projetos que esse governo assumiu junto a redes internacionais, que estejam ou não consolidadas na legislação local ou através de documentos como planos estaduais de mudanças climáticas;

2. Levantamento de políticas setoriais: aqui, busca-se encontrar outras evidências de incentivos ou formas de dependência diretas ou indiretas da produção de combustíveis fósseis no nível estadual brasileiro, como concessão de benefícios fiscais, promoção de investimentos, investimentos em pesquisa e desenvolvimento (P&D), entre outros;

3. Análise de arrecadações tributárias vinculadas à produção ou consumo de combustíveis fósseis, como o Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS) e os royalties do petróleo.

Com a revisão documental, buscar-se-á apontar: o estado atual das metas climáticas do estado de São Paulo; exemplos em que a produção e o consumo de combustíveis fósseis conflitam com compromissos fixados pelo governo estadual paulista em prol do clima; por fim,

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19 indícios das possíveis dinâmicas de perpetuação da dependência desses combustíveis nessa economia estadual.

Este trabalho está dividido em cinco capítulos. O segundo capítulo discute a governança global do clima e as construções teóricas mais relevantes acerca dos determinantes que moldaram sua configuração atual. Além disso, procura posicionar os governos subnacionais nessa governança e os papéis que têm assumido enquanto integrantes cada vez mais ativos e notórios dessa estrutura.

O terceiro capítulo apresenta o conceito de carbon lock-in como fundamentação teórica para explicar os motivos da aparente incapacidade da governança global do clima em lidar e solucionar as questões fundamentais que circunscrevem a questão climática. Ademais, são apresentados exemplos de como o tema já foi estudado na dimensão subnacional, com a coleta de evidências de que a problemática do carbon lock-in não se limita aos Estados nacionais.

O quarto capítulo é dedicado aos resultados da pesquisa documental acerca do cenário de carbon lock-in no estado de São Paulo. Por um lado, são expostos o histórico de compromissos que o estado já assumiu nesse âmbito, com especial atenção às metas apresentadas na versão preliminar do Plano de Ação Climática 2050, que devem nortear a descarbonização paulista pelas próximas décadas. Por outro lado, são identificadas relações materiais, econômicas e políticas indicativas de que, apesar do discurso de transição para a economia de baixo carbono, o estado ainda está longe de enfrentar o carbon lock-in presente em sua economia.

Finalmente, no capítulo final, discutem-se os resultados da pesquisa empírica à luz das previsões teóricas, bem como possíveis desdobramentos deste trabalho.

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20 2 GOVERNOS SUBNACIONAIS: PARTICIPAÇÃO NA GOVERNANÇA GLOBAL DO CLIMA E INTERAÇÕES COM O CARBON LOCK-IN

2.1 Governança global do clima: conceituação e evolução teórica

Para compreender o que vem a ser uma governança global do clima, é importante em primeiro lugar refletir sobre a governança global, em linhas gerais. Os estudos de Rosenau a respeito do tema, condensados em seu livro Study of World Politics - Volume II: globalization and governance (2006), contribuíram fundamentalmente para a concepção de uma nova ontologia da governança global. O termo ontologia é definido pelo autor como o conceito filosófico que se refere às suposições gerais que as pessoas fazem a respeito da realidade e que destacam seus elementos básicos, essenciais e estáticos, que auxiliam a entender quais atores se engajam para sustentar um certo tipo de governança e de que formas eles se engajam (ROSENAU, 2006, p. 112-113).

Nessa busca por uma nova ontologia da governança global, Rosenau destaca os fenômenos de globalização, localização e “fragmegração” (“fragmegration”, neologismo do autor que caracteriza um cenário de dinâmicas simultâneas de integração e fragmentação)1 como decisivos para a erosão da autoridade do Estado na ordem global e para a redistribuição da autoridade entre diversos atores sociais. Essas dinâmicas são visíveis desde os anos 1990, década em que ocorre o fim da União Soviética e o consequente desmantelamento do bloco comunista, a aceleração da globalização econômica, o surgimento de blocos regionais econômicos e a ampla liberalização comercial. Tudo isso teria contribuído fundamentalmente para uma perda relativa de autoridade do Estado e para a ascensão e o fortalecimento de inúmeras entidades da sociedade civil internacional, que juntas passaram a formar novos arranjos e exercer novas formas de autoridade. Portanto, chegamos ao século XXI com uma miríade de arranjos sociais, formais e informais, em todos os níveis da sociedade, do local ao global, que são interdependentes entre si e cujas ações podem ter repercussões em todos os demais níveis sociais, inclusive internacionais (ROSENAU, 2006).

1 “(...) Se as interações dos estados soberanos em um mundo anárquico estão no coração da velha ontologia, no centro da nova estão as interações de forças globalizantes e localizadoras, de tendências à integração e fragmentação que são tão simultâneas e interativas que entram em colapso, em um processo errático, mas singular, aqui rotulado de ‘fragmegração’. Infere-se que vivemos e estudamos um mundo fragmentado que cascateia eventos através, sobre e ao redor de fronteiras há muito estabelecidas dos estados e, ao fazê-lo, realoca a autoridade para cima para organizações transnacionais e supranacionais, lateralmente para movimentos sociais e ONGs, e para baixo, para grupos subnacionais.” (ROSENAU, 2006, pp. 115-116, tradução nossa).

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21 O termo governança, conforme a definição do Conselho de Roma trazida por Rosenau (2006, p. 121, tradução nossa), encamparia os “(...) mecanismos de comando em sistemas sociais que objetivam oferecer segurança, prosperidade, coerência, ordem e continuidade ao sistema (...)”. Seriam os canais pelos quais os comandos de múltiplos atores, não apenas governos nacionais, são transmitidos em formas de objetivos, diretrizes e políticas (ROSENAU, 2006, p. 122).

O autor tece uma crítica ao uso do termo “comando”, que remete à ideia de hierarquia, o que poderia trazer a impressão de que uma governança pressupõe a existência de cadeias hierárquicas, quando na prática é comum que esta não precise de qualquer hierarquia para funcionar – e inclusive costuma ser bem-sucedida em contextos não hierarquizados (ROSENAU, 2006). Por esse motivo, Rosenau introduz o conceito de controle, enquadrado como um “fenômeno relacional que engloba sistemas de normas”, em que os controladores buscam modificar o comportamento dos controlados e geram os padrões de interação que podem conformar tais sistemas e, por conseguinte, o seu controle (ROSENAU, 2006, p. 122).

Esses sistemas só se consolidam à medida que as tentativas de controle por parte dos controladores tornam-se bem-sucedidas e surge um padrão de aceitação desses mecanismos por parte dos controlados. Os sistemas de normas, portanto, baseiam-se na regularidade do padrão de comportamento gerado a partir dos esforços dos controladores e a aceitação dos controlados, seja por canais formais ou informais, de forma que esses sistemas podem ser mantidos mesmo na ausência de autoridade política ou legal.

Além da discussão sobre a presença de mecanismos de comando e controle que auxiliam no surgimento e consolidação da governança global, Rosenau (2016, pp. 123-125) ainda alude a outras dinâmicas fundamentais do fenômeno, que são listadas abaixo:

a) alta proliferação dos mecanismos de governança em todos os níveis da sociedade, com um consequente aumento da interdependência entre tais mecanismos (uma vez que o que ocorre em um nível de governança pode ter repercussões em todos os demais, do familiar ao global);

b) alto nível de desagregação, seja no sentido de que não há princípio organizador único entre os diferentes tipos de governança, seja em relação à desagregação da autoridade, o que permite maior inovação, flexibilidade e desenvolvimento, bem como a aplicação de novos mecanismos de controle;

c) emergência e evolução, uma vez que os mecanismos de governança emergem, em geral, por meio de dinâmicas bottom-up (de baixo para cima), por conta de necessidades compartilhadas por grupos sociais e presença de condições que conduzem à geração e

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22 aceitação de instrumentos compartilhados de controle; por outro lado, estão em constante mudança, o que pode levar tais mecanismos à sua evolução e maturação ou ao seu declínio;

d) realocação de autoridade: existem processos contraditórios em curso que estão minando a capacidade dos Estados nacionais de promover mecanismos de governança – por um lado, um que conduz à promoção de mecanismos de controle que se estendem para além das fronteiras nacionais; por outro, mecanismos locais que providenciam conforto psíquico para grupos com laços étnicos. A combinação desses processos tem como efeito um deslocamento, ou pelo menos uma pulverização da autoridade do Estado-nação para outros níveis de governança, regionais, locais, internos ou externos ao Estado.

Em suma, Rosenau apresenta uma configuração contemporânea da política internacional em que há menos governo e mais governança, ou seja, em que as formas de criar e sustentar acordos, normas, padrões globais não necessariamente decorrem ou dependem da tradicional esfera de autoridade do Estado-nação. Nesse ínterim, outros atores estatais de níveis regionais e locais, ou atores não estatais identificados no terceiro setor ou nas corporações entram em cena com mais potencial para contribuir na política internacional. E essa nova configuração propicia a formação de novos tipos de arranjos de governança, com maior ou menor grau de institucionalização, que em muitos casos criam sobreposições, complementaridades, entre outras relações.

A ideia de governança global, evidentemente, não é imune a críticas. Como observa Mello (2009), a origem de sua concepção contemporânea não está dissociada do contexto político e ideológico do final dos anos 1980 e início dos anos 1990, época do declínio e dissolução do bloco comunista soviético, da circulação de ideias liberais como o fim da história e das ideologias, bem como da promoção da agenda do Consenso de Washington em escala global. Nesse contexto, a ideia de governança prosperou por conta de sua harmonização com a noção de enfraquecimento do papel do Estado e com a promoção de um regime ordenado por consensos em torno de uma agenda política, de caráter liberalizante (MELLO, 2009).

Na prática, porém, as décadas de 1990 e 2000 demonstraram em diversas instâncias que a possibilidade de consenso global, bem como de superação das diferenças ideológicas, não seriam os produtos diretos do fim da Guerra Fria. Na realidade, a própria potência hegemônica do sistema internacional, os Estados Unidos, assim como outras potências associadas ou rivais, agiram em diversos momentos de modo a colocar em descrédito o multilateralismo e o direito internacional, como na promoção de guerras à revelia de condenações diretas da comunidade

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23 internacional – e, para trazer um exemplo específico da governança global do clima, no caso da não ratificação do Protocolo de Quioto por parte dos Estados Unidos (MELLO, 2009).

Dessa forma, Mello (2009, p. 53) conclui que

“Se a governança internacional envolve tanto a promoção de algum interesse comum quanto dos mecanismos de incorporação das assimetrias de poder entre os atores do sistema internacional, seu terceiro propósito reside no intento da mediação da diferença, hoje claramente reconhecido na medida em que foram evidentemente superadas as expectativas de convergência progressiva e homogeneidade em escala global.”

Portanto, fica evidenciado, pelas próprias práticas da governança global desde os anos 1990, que essa nova configuração de distribuição de poder e de construção de normas não foram capazes de gerar consensos efetivos em torno de uma agenda liberalizante, e que hoje é preciso que as estruturas da governança global sejam hábeis em mediar os dissensos entre seus diversos atores (MELLO, 2009). Isso certamente também é uma realidade para a governança climática global, a qual será tratada na próxima seção.

2.1.1 Governança multinível e complexo de regimes: visões acerca da governança global climática

As lições de Rosenau acerca da governança global contemporânea e suas nuances alinham-se em grande medida à visão de Betsill e Bulkeley (2006) acerca da governança global do clima. Ao analisar a natureza das ações da Cities for Climate Protection (CCP), rede criada pela International Council for Local Environment Initiatives (ICLEI) e que reúne centenas de autoridades locais para fomentar e catalisar iniciativas contra as mudanças climáticas em nível local, esses autores propõem que não apenas as redes transnacionais de autoridades locais são uma parte da governança global do clima, como também devem ser analisadas a partir de uma nova conceituação da governança, a qual eles denominam governança multinível. Cabe mencionar que, à época da pesquisa, em 2006, já havia 28 redes semelhantes à CCP apenas na Europa (BETSILL e BULKELEY, 2006).

Para defender sua tese, Betsill e Bulkeley revisitam as teorias de regimes internacionais e de redes transnacionais e argumentam que nenhuma das duas dão conta de explicar a particularidade de uma rede transnacional formada por atores que são estatais, mas cuja autoridade é local. A primeira, porque parte da perspectiva de que a relevância dos governos

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24 subnacionais se dá por meio do tamanho da influência que estes possuem sobre o comportamento dos Estados-nações; ou seja, o poder político continua a estar concentrado no Estado-nação – e um é sinônimo do outro. Tal visão seria mais consistente com uma noção de governo do que uma de governança. Algumas implicações disso são que os Estados-nação continuam sendo a entidade com maior relevância na esfera internacional; a política interna segue sendo um espaço de menor importância; e o Estado continua a ser encarado como um ator unitário, homogêneo (BETSILL e BULKELEY, 2006).

Já a segunda abordagem (a de redes transnacionais), que aparentemente abarcaria melhor os papéis e as capacidades de uma rede como o CCP, ainda possui como pressuposto a noção de que o poder das redes transnacionais seria derivado de sua maior ou menor capacidade de influenciar o comportamento dos Estados. Além disso, haveria uma tendência a enquadrar tais redes como um tipo de ator não estatal, pertencente à sociedade civil global, embora estejam profundamente ligadas à administração governamental de diversos países por meio de seus membros, porquanto são autoridades estatais locais destes.

Portanto, a realidade da existência de redes transnacionais na governança do clima demandava uma nova forma de conceituar e analisar tal governança – e a proposta dos autores nesse sentido é a governança multinível. Em que pese o fato de que tal conceito foi pensado a partir da realidade política da União Europeia, ela também se aplica a outros contextos em que os Estados não possuem mais o monopólio da formulação de políticas, em que o processo de tomada de decisão a respeito de problemas complexos tornou-se coletivo, levando à perda de controle dos Estados sobre esses processos e em que os níveis supranacional, nacional e subnacional estão interconectados por meio de redes (BETSILL e BULKELEY, 2006). Essa perspectiva “chama atenção para a importância de compreender como a autoridade política e processos de formulação de políticas cruzam limites tradicionais entre atores estatais e não estatais, esferas doméstica e internacional” (BETSILL e BULKELEY, 2006, p. 149, tradução nossa).

Dentre duas abordagens formuladas na literatura dentro do conceito de governança multinível, os autores destacam aquela que captura os múltiplos níveis em que a governança ocorre e a diversidade de atores e instituições que atuam simultaneamente nesses níveis, descritas como esferas de autoridade, não definidas em um sentido estritamente hierárquico e que surgem nos limites da política formal, com interações entre atores estatais e não estatais, e a política nacional e internacional. É justamente por meio dessas dinâmicas que as redes transnacionais de governos locais surgem, uma vez que agem, em larga medida, de forma independente dos respectivos governos nacionais para criar esferas de autoridade e, por

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25 conseguinte, novos mecanismos de governança em temas ligados às mudanças climáticas.

Redes como a CCP, portanto, são evidências de que a governança do clima é, hoje, multifacetada e não se concentra apenas em mecanismos tradicionais e de maior grau de institucionalização, como a UNFCCC.

Além da visão de governança multinível de Betsill e Bulkeley, outra teorização de relevo para a governança global é a ideia de complexo de regimes (regime complex), elaborada por Keohane e Victor (2011). A maior contribuição desses autores é enfatizar as causas e consequências da fragmentação da governança climática global. Segundo estes,

“Quando os estados investem recursos na construção de regimes regulatórios, os resultados podem variar ao longo de um contínuo. Em um extremo estão instituições totalmente integradas que impõem regulamentação por meio de regras abrangentes e hierárquicas. No outro extremo estão conjuntos altamente fragmentados de instituições sem núcleo identificável e ligações fracas ou inexistentes entre os elementos do regime” (KEOHANE; VICTOR, 2011, p. 8, tradução nossa).

A governança do clima seria um exemplo de regime regulatório internacional em que ocorreu um processo de fragmentação em múltiplas instituições. Mesmo que o “núcleo identificável” ainda seja a UNFCCC, em torno de cujas conferências anuais gravitam praticamente todos os atores da governança climática, é fato que tal organismo divide espaço com arranjos paralelos, por meio dos quais diversas contribuições de relevo são feitas. As redes internacionais que unem cidades e estados do mundo todo em torno de metas comuns, por vezes mais arrojadas do que aquelas anunciadas no âmbito dos Estados nacionais na UNFCCC, são um exemplo dessa multiplicidade de ações, muitas vezes paralelas ou sobrepostas umas às outras, na área do clima.

Ainda sobre os complexos de regimes, Keohane e Victor (2011) atribuem a três forças distintas a capacidade de influenciar a posição de um regime nesse contínuo integração- fragmentação. A primeira é a distribuição dos interesses: quanto mais alinhados eles forem entre todos os participantes do regime, mais provável se torna que este seja totalmente integrado e centralizado – o contrário também é verdadeiro: menos alinhamento conduz a maior fragmentação e descentralização. A segunda força é a incerteza: quanto mais complexos os temas tratados por um regime, maiores as chances de que atores não tenham clareza sobre os ganhos que podem auferir dele. Dessa forma, a tendência é que sejam menos tolerantes à exposição aos riscos trazidos por regulações relacionadas àquele regime. Por fim, o terceiro fator determinante para uma maior integração ou fragmentação é a capacidade de vinculação

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26 (linkage) entre múltiplos temas tratados pelo regime. Se o regime é capaz de regular diversos subtemas vinculados a um tema principal, sua integração e amplitude tornam-se maiores.

Keohane e Victor (2011, p. 9) citam a evolução das regras do Acordo Geral de Tarifas e Comércio (GATT) e da Organização Mundial do Comércio (OMC), que por meio da norma de nação mais favorecida (most favored nation) conseguiu garantir ganhos a Estados e corporações multinacionais, de forma que estes investiram ativamente na conformação de um regime amplo e integrado na área comercial. Por outro lado, o exemplo do regime na área de diversidade biológica fornece um exemplo da situação oposta, em que a Convenção sobre Diversidade Biológica possui pouca efetividade e é suplementada por meio de diversos acordos menores e mais específicos.

Por fim, indo além das contribuições de autores institucionalistas, cabe trazer a essa discussão as contribuições de proponentes da teoria crítica. Nesse sentido, destaca-se o trabalho de Peter Newell (2008), que elaborou uma análise da governança ambiental tomando como base a política econômica internacional. O autor parte da constatação de que as teorias dominantes na disciplina de Relações Internacionais a respeito dessa governança direcionam um olhar quase exclusivo para a teoria de regimes, com a preocupação central de destrinchar o direito internacional e as instituições que produzem e implementam suas normas.

O problema identificado por Newell é que a teoria de regimes possui baixa capacidade explicativa para o quadro de inefetividade da governança ambiental global em lidar com os problemas que se propõe a resolver. Por isso, o autor preconiza que se direcionem as atenções para as relações políticas, materiais e históricas que estão na gênese do problema ambiental, anteriores à própria criação dos regimes e das instituições internacionais que tratam do tema (NEWELL, 2008). Ademais, Newell também enfatiza a influência política e financeira dos atores privados nessa governança, que hoje possuem recursos e capacidades suficientes e eventualmente até superiores à de agências ambientais de natureza estatal, sejam nacionais ou internacionais.

Em seu exercício de formular uma teoria da governança ambiental global tomando como base a política econômica internacional, Newell (2008) destaca a importância das relações entre Estados, mercados e sociedade civil. Nesse sentido, o autor avalia que não apenas houve perda de poder de muitos organismos estatais que tratam do clima em relação ao mercado, mas também passou a existir um maior alinhamento de muitas dessas entidades aos interesses do capital transnacional. Além disso, há uma tendência de que os temas ambientais sejam relegados a segundo plano em relação às considerações dos regimes comerciais e financeiros

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27 internacionais, o que também é visível no próprio desequilíbrio de poder e recursos entre órgãos nacionais de comércio e finanças e órgãos ambientais (NEWELL, 2008).

Disso decorre a conclusão do autor de que as negociações ambientais globais são crescentemente feitas “à sombra” das regras comerciais globais. De fato, as normas de alguns regimes que não são relacionados diretamente à proteção do meio ambiente moldam e limitam as possibilidades de ação da governança ambiental. Alguns exemplos seriam os empréstimos do Banco Mundial que desconsideram preocupações de ordem ambiental e provisões do NAFTA (Acordo de Livre Comércio da América do Norte) que garantiam a empresas estrangeiras a possibilidade de contestar regulações ambientais de governos locais com base no princípio de não discriminação contra investidores estrangeiros (NEWELL, 2008).

Além disso, as próprias instituições responsáveis por regular a governança ambiental global são capturadas por elites que pertencem à classe capitalista transnacional, de forma que essa governança se sujeita em grande medida aos ditames dos interesses do capital, mesmo aceitando certas críticas mais moderadas à globalização e ao consumismo excessivo. De todo modo, tais grupos sucedem em não permitir que seja explicitada a conexão entre a crise ambiental e o modo de produção capitalista (NEWELL, 2008).

A teoria da governança ambiental de Newell procura expandir a análise para além das instituições que a conformam, jogando luz sobre formas alternativas de governança já existentes, sobretudo aquelas exercidas por atores privados. Nesse sentido, destaca que as empresas possuem tamanho controle sobre a produção, o comércio e as finanças internacionais que elas são capazes de criar seus próprios sistemas de governança ambiental, bem como normas e processos de tomada de decisão que tipicamente caracterizam os regimes internacionais (NEWELL, 2008).

Essa reflexão leva à conclusão de que a governança ambiental global é produto da governança global neoliberal consolidada ao longo das últimas décadas, que em grande parte é produzida a partir das práticas empregadas pelas corporações multinacionais. Características como a predileção pelo voluntarismo, no lugar de mecanismos tradicionais de comando e controle baseados no poder estatal, a “fetichização” das parcerias com múltiplos stakeholders e a predominância do discurso da ecoeficiência e de instrumentos de mercado como formas de validação das iniciativas ambientais acabam sendo decisivas na forma como se governa a governança ambiental atual (NEWELL, 2008). Podem ser vistos como exemplos desses instrumentos as inúmeras redes e parcerias envolvendo empresas, ONGs e governos subnacionais criadas ao longo dos anos 2000 e 2010 no âmbito da governança climática global.

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28 Newell ainda enfatiza o componente crítico de uma política econômica internacional da governança ambiental, especialmente no que se refere à identificação das condições materiais e históricas que ensejaram o surgimento do cenário de degradação ambiental atual, abarcando todos os atores e processos relevantes para a formação esse quadro. Incluem-se também nesse prisma reflexões sobre gênero, raça e classe e sobre como os problemas ambientais tendem a se concentrar e afetar as regiões e as populações mais desfavorecidas do planeta (NEWELL, 2008). A política econômica internacional também ressalta o potencial de transformação da governança ambiental, em vez de padrões de ordem e estabilidade. Ao colocar como prioridade a análise das forças políticas e sociais que produzem as mudanças ambientais, a teoria é capaz de prever momentos e locais de mudança e de resistência a elas (NEWELL, 2008).

Em suma, Newell apresenta uma visão ainda mais abrangente da governança ambiental global, considerando não apenas as instituições que a conformam, mas também dinâmicas políticas, econômicas e sociais anteriores ou paralelas que possuem efeitos diretos sobre quem governa e como governa nessa governança. Explicita-se, dessa forma, o alinhamento da governança ambiental atual aos ditames de uma ordem global neoliberal, extremamente influenciada por atores privados e suas práticas discursivas, normativas e organizacionais, que inclusive ganham aderência por parte dos atores estatais.

As teorias sobre governança global e, mais especificamente sobre a governança do clima, nos informam de uma contemporaneidade complexa, em que múltiplos atores societais são aptos e convidados a participar e contribuir com suas capacidades na busca de soluções.

Suas ações, por conseguinte, são capazes de influenciar os outros níveis societais, por conta da governança multinível e interdependente. Tais características não são desconexas da evolução da política internacional e das relações materiais, históricas e sociais que a compuseram ao longo das últimas três décadas, as quais levaram ao surgimento de uma ordem neoliberal e, por conseguinte, ao descrédito e enfraquecimento de mecanismos tradicionais de comando e controle de Estados nacionais.

É com essa visão sobre a crescente complexidade e fragmentação da governança climática, pautada pela ênfase no voluntarismo e formação de parcerias entre múltiplos atores, que se analisará, nesta pesquisa, a atuação de um governo estadual brasileiro enquanto participante e coprodutor da governança contemporânea do clima.

Na seção seguinte, resgatar-se-á o histórico da governança do clima no âmbito da UNFCCC e as evoluções que acabaram por abrir espaço para as contribuições de governos subnacionais, bem como atores não estatais, dentro dessa governança.

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29 2.2. Governança global do clima e ascensão dos governos subnacionais

A participação da sociedade civil internacional (e em particular dos governos subnacionais) na governança global do clima remonta aos primórdios de sua institucionalização no âmbito da Organização das Nações Unidas (ONU). Conforme apontado por Phillips (2018, p. 2), o documento das regras de procedimento da UNFCCC (rules of procedure), elaborado durante a COP-2, em 1996, traz a previsão de participação, nas reuniões das COPs, de qualquer organização nacional ou internacional, governamental ou não governamental com expertise nos assuntos relacionados à Convenção, com status de observador, desde que não haja objeção de um terço das partes. Tal previsão fomentou o aumento da participação dessas entidades ao longo dos anos.

Ainda quanto ao histórico do engajamento da sociedade civil internacional na governança climática, é relevante destacar a criação da Rede de Governos Regionais para o Desenvolvimento Sustentável (nrg4SD, na sigla em inglês), em 2002 (SETZER; REI; CUNHA, 2012). Naquele ano, ocorreu a Conferência de Joanesburgo, evento que renovou e, em alguns sentidos, ampliou as ambições globais expressas dez anos antes na Conferência Rio-92, quanto à proteção do meio ambiente e à promoção do desenvolvimento sustentável.

Paralelamente ao evento, um grupo de 23 governos subnacionais de diferentes partes do mundo se reuniram e assinaram a Declaração de Gauteng, que ressalta, segundo Happaerts e Van den Brande, “(...) a importância do nível subnacional no desenvolvimento e implantação do desenvolvimento sustentável e das oportunidades de cooperação subnacional” (2008, p. 5, tradução nossa). Esse foi o primeiro passo para a formação da rede nrg4SD, que foi um marco no engajamento de cidades e estados com a questão climática.

Entretanto, para entender com maior profundidade a escalada de engajamento dos governos subnacionais na governança do clima ao longo dos anos 2010, é de fundamental importância analisar a própria evolução da dinâmica política da UNFCCC ao longo dos anos.

Nesse sentido, cabe destacar o Protocolo de Kyoto, que foi lançado em 1997 e foi o primeiro acordo vinculante a estabelecer metas de redução de emissões de GEEs na atmosfera. As metas estabelecidas por aquele tratado eram aplicáveis apenas aos países desenvolvidos, graças a uma justa resistência de países em desenvolvimento, que apontavam a evidente responsabilidade histórica dos desenvolvidos enquanto principais causadores das mudanças climáticas. A partir desse debate, firmou-se o princípio das responsabilidades comuns, porém diferenciadas no âmbito da UNFCCC, essencial para abarcar as assimetrias Norte-Sul na governança climática global.

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30 Com o passar do tempo, países em desenvolvimento também passaram a figurar entre os maiores emissores de GEEs. A urgência de se abordar a questão com contribuições significativas de todos os maiores players globais levou a UNFCCC, ao se aproximar o fim da vigência do Protocolo de Kyoto (que se daria em 2012), a alvejar o lançamento de um novo tratado, mais ousado em seus objetivos e com metas de caráter vinculante que abrangessem todas as partes – sem perder de vista, evidentemente, o princípio das responsabilidades comuns, porém diferenciadas.

A 15ª Conferência das Partes da UNFCCC (COP-15), realizada em Copenhague, Dinamarca, em 2009, era muito aguardada devido à expectativa de que ali fosse concebido esse novo acordo global, que seria uma continuidade do protocolo de Kyoto e estabeleceria metas mais avançadas e de abrangência global. No entanto, a COP-15 revelou-se um fracasso diplomático, ao obter como produto um breve acordo, costurado às pressas, que abandonou as pretensões iniciais de metas de redução de emissões de GEEs na casa dos 50% a 80% e não estabeleceu qualquer compromisso vinculante para nenhum Estado envolvido nas negociações (MACLEAN, 2020, p. 32).

A legitimidade das negociações multilaterais do clima foi arranhada nesse momento e estudiosos e observadores passaram a expressar ceticismo em relação à capacidade da UNFCCC de trazer soluções efetivas para a questão climática. Desse contexto, emergiram diferentes recomendações acadêmicas para destravar o impasse estabelecido, como o uso do minilateralismo, segundo o qual grupos menores, porém mais influentes de países teriam condições mais favoráveis para celebrar acordos e depois estendê-los aos demais Estados, através de pressão política ou econômica, bem como outros mecanismos informais (DRYZEK;

NORGAARD; SCHLOSBERG, 2013; LEDERER, 2015).

Também cresceu, nesse contexto, o protagonismo da sociedade civil organizada, na figura de ONGs, governos subnacionais, empresas multinacionais, entre outros. Tais atores passaram a formar e a participar de uma multiplicidade de arranjos informais de alto impacto para a governança do clima, de modo que seu engajamento e contribuição passaram a ser reconhecidos nos próprios meios da UNFCCC. Alguns dos sinais desse movimento foram a criação do portal NAZCA (sigla em inglês para Non State Actor Zone for Climate Action), em 2014; a Agenda de Ação Lima-Paris (LPAA); e disposições presentes no arcabouço legal do Acordo de Paris – o texto de decisão da COP-21 faz menção expressa a atores que não são partes do acordo, convida-os e encoraja-os a aumentar seu engajamento em ações de mitigação e adaptação, bem como a trabalhar estreitamente com os Estados nacionais (UNFCCC, 2015b).

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31 Desde a época da criação do portal NAZCA, milhares de compromissos de mitigação e adaptação de governos subnacionais, bem como de ONGs, empresas e outras entidades, foram registrados virtualmente. Redes transnacionais também ganharam mais força – alguns exemplos são: Grupo C40 de Cidades para a Liderança Climática2; ICLEI – Governos Locais pela Sustentabilidade3; Coalizão Under24; Carbon Disclosure Project (CDP)5; e o Pacto Global de Prefeitos pelo Clima e Energia6 (Global Covenant of Mayors for Climate & Energy) (MACLEAN, 2020).

Como consequência dessas inflexões observadas ao longo das negociações da UNFCCC nos últimos anos, pesquisadores indicam que perdeu sentido a ideia de uma governança do clima no sentido mais tradicional do termo, marcado pela presença de um tratado multilateral costurado de forma exclusiva entre Estados nacionais, em abordagem top-down, sem participação efetiva da sociedade civil, e estabelecimento de metas vinculantes por uma organização supranacional para todos os seus membros (BERNSTEIN; HOFFMANN, 2018).

O Acordo de Paris introduziu uma dinâmica em que cada país determina seus próprios compromissos, sem imposição precisa dos conteúdos que estes devem conter, e que inclui de forma mais explícita e aberta a contribuição de outros atores no processo de elaboração das metas e na sua consecução. Essas novas dinâmicas são retratadas por alguns autores como um mecanismo ou regime “catalítico e facilitador”, na medida em que visa promover uma aceleração das iniciativas de redução global de emissões (BERNSTEIN; HOFFMANN, 2018;

2 Segundo o website oficial do C40 (c40.org), o “C40 é uma rede de megacidades do mundo comprometidas em lidar com as mudanças climáticas. O C40 apoia as cidades a colaborar de forma eficaz, compartilhar conhecimento e impulsionar ações significativas, mensuráveis e sustentáveis sobre as mudanças climáticas (...) em todo o mundo, C40 Cities conecta 97 das maiores cidades do mundo para realizar ações climáticas ousadas, liderando o caminho para um futuro mais saudável e sustentável. Representando mais de 700 milhões de cidadãos e um quarto da economia global, os prefeitos das cidades C40 estão empenhados em cumprir as metas mais ambiciosas do Acordo de Paris em nível local, bem como em limpar o ar que respiramos” (tradução nossa).

3 Em seu website institucional (americadosul.iclei.org), o grupo assim se apresenta: “ICLEI – Governos Locais pela Sustentabilidade é uma rede global de mais de 2.500 governos locais e regionais comprometida com o desenvolvimento urbano sustentável. Ativos em mais de 125 países, influenciamos as políticas de sustentabilidade e impulsionamos a ação local para o desenvolvimento de baixo carbono, baseado na natureza, equitativo, resiliente e circular”.

4 “A Under2 Coalition reúne 260 governos que representam 1,75 bilhão de pessoas e 50% da economia global.

Nossos membros se comprometem a manter o aumento da temperatura global bem abaixo de 2 ° C, com esforços para atingir 1,5 ° C. 35 estados e regiões da Coalizão se comprometeram a atingir emissões líquidas zero até 2050 ou antes” (vide theclimategroup.org/under2-coalition, tradução nossa).

5O CDP é uma instituição de caridade sem fins lucrativos que administra o sistema de divulgação global para que investidores, empresas, cidades, estados e regiões gerenciem seus impactos ambientais. A economia mundial vê o CDP como o padrão ouro de relatórios ambientais com o conjunto de dados mais rico e abrangente sobre ações corporativas e municipais” (vide cdp.net, tradução nossa).

6 “O Pacto Global de Prefeitos pelo Clima e a Energia é uma aliança global de cidades e governos locais voluntariamente comprometidos com a luta à mudança climática, reduzindo seus impactos inevitáveis e facilitando o acesso à energia sustentável e acessível para todos” (vide https://pactodealcaldes-la.org/).

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32 HALE, 2016). Portanto, a relevância de atores não estatais e governos subnacionais nessa governança tornou-se muito maior desde Copenhague e sobretudo após a COP-21, em Paris.

2.2.1 Participação de governos subnacionais e atores não estatais na governança global do clima: críticas à literatura

Ao se analisar a literatura recente focada na ação de atores não estatais e subnacionais na governança do clima, observa-se que ainda não foram feitas muitas avaliações objetivas e críticas dos resultados dos compromissos assumidos por atores governamentais subnacionais, apesar de já passados mais de seis anos da apresentação do Acordo de Paris e cerca de oito do lançamento do portal NAZCA. Esforços de pesquisa ainda estão voltados ao mapeamento e à sistematização das ações desses grupos, o que pode se justificar pelo fato de que são muitas as inciativas anunciadas e que muitas delas ainda não são totalmente conhecidas pelos pesquisadores, especialmente do Sul global (CHAN et al., 2021). De todo modo, a dimensão avaliativa da atuação de governos subnacionais, conforme quadro de análise elaborado por Chan et al. (2021) não parece ter sido muito explorada.

Também é importante destacar a crítica de MacLean a parte da literatura sobre atores subnacionais e não estatais na governança do clima, ao discordar da visão de que governos subnacionais (prefeituras, estados, províncias, entre outros) seriam agora os líderes dos esforços de ação climática (nas palavras de Michael Bloomberg, empresário e ex-prefeito de Nova Iorque, estariam “dirigindo o ônibus” da governança climática) (MACLEAN, 2020). Tal avaliação de muitos pesquisadores teria surgido a partir de acontecimentos como a reação enfática de governadores e prefeitos norte-americanos contra a denúncia dos Estados Unidos do Acordo de Paris, durante a administração Trump – revertida posteriormente pelo governo Biden. Naquela ocasião, em 2017, foi lançada a declaração “We Are Still In”, assinada por mais de 3800 líderes de prefeituras, governos estaduais e universidades norte-americanas reafirmando o compromisso dos Estados Unidos com o Acordo de Paris (MACLEAN, 2020).

Apesar dos exemplos emblemáticos de mobilização de diversos atores sociais nos Estados Unidos, no Brasil e em muitos outros países, para MacLean, a ação climática ainda seria fundamentalmente dependente da liderança de Estados nacionais, que ainda são as únicas partes oficiais dos tratados multilaterais do clima e detêm mais poder, recursos e legitimidade para tomar a frente de ações de grande impacto sistêmico (MACLEAN, 2020). Por outro lado, isso não significa que não seja importante investigar a atuação dos atores não estatais e governos

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33 subnacionais dentro dessa governança, mas apenas que não se pode perder de vista a posição essencialmente complementar que ocupam.

Outro ponto que MacLean (2020) enfatiza – e que reverbera as considerações de Newell a respeito da governança ambiental contemporânea – é a importância da persistente influência das grandes corporações, especialmente das indústrias de combustíveis fósseis na economia global. Tais entidades – que não deixam de ser uma categoria de atores não estatais nessa governança – continuam a advogar seus interesses junto aos Estados e a outros atores sociais, em direção diametralmente oposta às ações de redução de emissões de GEEs. Muitas vezes, obtêm sucesso. Desse modo, conforme concluem Bloomberg e Pope (2017 apud MACLEAN, 2020), as mudanças climáticas devem ser encaradas como um problema de natureza essencialmente política, mais do que econômica ou financeira, ao contrário do que parecem sugerir hoje diversos executivos e políticos. Portanto, esse olhar para as dinâmicas políticas que moldam as escolhas de governos estaduais brasileiros, como São Paulo, deve estar presente na análise das ações climáticas desses entes.

Na tentativa de elucidar as origens do impasse político, econômico e social que circunda a governança global do clima, bem como suas relações com os governos subnacionais, no próximo capítulo será apresentado e discutido o conceito de carbon lock-in, que tem sido crescentemente explorado na busca por soluções que tragam maior efetividade a essa governança.

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