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Vista do Corpo, destruição e potência em Branco sai, preto fica

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Academic year: 2022

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Corpo, destruição e potência em Branco sai, preto fica*

Body, destruction and potency in White out, black in

B E A T R I Z F U R T A D O * *

Universidade Federal do Ceará, Professora da Graduação em Cinema e Audiovisual e Programa de Pós-Graduação em Comunicação. Fortaleza – CE, Brasil.

É R I C O O L I V E I R A D E A R A Ú J O L I M A * * *

Universidade Federal Fluminense, Programa de Pós-Graduação em Comunicação. Niterói – RJ, Brasil

RESUMO

Este artigo apresenta dois campos de tensão. O primeiro se refere ao lugar do corpo na filosofia a partir do diálogo com Nietzsche e Foucault. O segundo abrange o campo do cinema, no qual propomos uma interlocução com Branco sai, preto fica (2014), de Adirley Queirós, filme que embaralha corpos marcados pela violência policial e que encontra nos artifícios da ficção científica uma linha de fuga contra o refúgio da história. Entre esses dois campos em diálogo – o do pensamento da filosofia sobre o conceito de corpo e o da obra cinematográfica como artifício e estratégia para relatos documentais sobre a resistência e a fabulação dos personagens – se colocam as rela- ções entre a memória e a ficção, o verdadeiro e o falso.

Palavras-chave: Cinema, ficção científica, corpo

ABSTRACT

This article discusses two stress fields. The first one regards the place of the body in philosophy from the dialogue with Nietzsche and Foucault. The second one compre- hend the field of cinema, in which we propose a dialogue with White out, black in (2014), by Adirley Queirós, a film that shuffles bodies marked by police violence and that finds in the devices of science fiction a line of flight against the refuge of history.

Between these two fields in dialogue – the thought of philosophy on the concept of body and the cinematographic work as artifice and strategy to documentary reports on resistance and fabling of the characters –, relations between memory and fiction, true and false arise.

Keywords: Cinema, science fiction, body

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* Uma primeira versão deste texto foi apresentada no GT Estudos de Cinema, Fotografia e Audiovisual do XXIV Encontro Anual da Compós, na Universidade Federal de Brasília e Universidade Católica de Brasília, de 9 a 12 de junho de 2015.

** Docente do Programa de Pós-Graduação em Comunicação e da graduação em Cinema e Audiovisual, da Universidade Federal do Ceará. Coordena o Laboratório de Estudos e Experimentações em Audiovisual (LEEA-UFC). E-mail:

sylviabeatrizbezerrafurtado@

gmail.com

*** Doutorando do Programa de Pós-Graduação em Comunicação, da Universidade Federal Fliminense e Paris III – Sorbonne Nouvelle. E-mail:

ericooal@gmail.com

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CAMPO UM – O CORPO

I

NICIALMENTE, É IMPORTANTE ressaltar o lugar do corpo na obra de Michel Foucault assim como em Nietzsche. Em Foucault podemos situar a problemática do corpo, de modo fundamental, não só a partir de Vigiar e punir (1987), quando descreveu o corpo supliciado de Damien, mas em todo o decorrer do seu pensamento, em especial em O nascimento da clínica (2011), no qual Foucault trata dos corpos doentes e dissecados e de como o corpo humano se constitui no espaço de origem e repartição da doença. Corpo cujo saber da Medicina Clínica cuidou de espacializar a doença: “Espaço cujas li- nhas, volumes, superfícies e caminhos são fixados” (2011: 1). Com Nietzsche, podemos vê-la especialmente em Genealogia da moral (1987), ao dizer que se trata de formar corpos e de engendrar um agente que os submeta a uma auto- disciplina, como bem situa David Lapoujade (2002), ao tentar responder sobre o corpo que não aguenta mais. Em Nietzsche, diz Lapoujade, é um corpo ani- mal (que é preciso adestrar) e, em Foucault, é o corpo anômalo (que é preciso disciplinar).

Para Foucault, o corpo é matéria, uma superfície de modulações por téc- nicas disciplinares e de biopolítica. O corpo é um ente que sofre as ações das relações de poder que compõem as tecnologias políticas e históricas; é objeto de relações de poder e saber. Isso implica, portanto, que os processos de sub- jetivação só são possíveis através do corpo. Foucault entendeu o corpo e os processos de subjetivação em um campo de forças entre o controle e as resis- tências desse mesmo controle.

Foucault afirmou a inscrição do corpo como campo das injunções de poder. O corpo não é apenas uma superfície modulável, mas é, sobretudo, o lugar da tensão, de embates, e, nesse sentido, lugar privilegiado para a sua análise do poder. Bem sabemos que desde a Idade Clássica o corpo é objeto de manipulação e treinamento para obediência. Podemos ver de forma clara no texto de Saly Wellausen (2006, 2007) esses exercícios de poder sobre o corpo, quando explica que a Idade Clássica instrumentalizou a tortura física utilizada pelo poder real na objetivação do criminoso, produzindo o duplo efeito de inspirar medo e respeito pelo poder e de incitar a revolta das mul- tidões.

Wellausen também assinala que o século XVII inaugurou novos métodos de controle minuciosos sobre o corpo através da coerção ininterrupta, velando mais sobre os processos de atividades do que sobre seus resultados, esqua- drinhando ao máximo o tempo, o espaço, os movimentos. Segundo a autora, na Idade Clássica o corpo foi descoberto como objeto de poder, que pode ser manipulado, modelado, treinado, que responde e obedece, tornando-se dócil

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e hábil à medida que suas forças se multiplicam. Cria-se então não apenas a dimensão metafísica do corpo, mas as técnicas que controlam sua operação.

Uma análise do corpo em Foucault só pode ser entendida se acompanha- da por Nietzsche, pois é Nietzsche quem estabelece a ruptura com a filosofia centrada na verdade e na alma e que produz outra, que se afasta de uma unida- de do sujeito. Com ele, o corpo deixa de ser considerado como a parte inferior do homem em relação à alma e passa a ser entendido como fio condutor para a análise de problemas filosóficos. Na proposição do autor, o corpo é uma multiplicidade composta por forças em constante movimento. Diferente da metafísica dualista que deu ao corpo o papel de vilão, culpabilizando-o por todos os erros e, principalmente, pelas perdas, sobretudo da própria memória, em Nietzsche, podemos entender o corpo como criação. Se para a metafísica, ele é o lugar do esquecimento como perda e punição, em Nietzsche a memó- ria só ocorre articulada com o esquecimento, levando à criação contínua de novos valores.

Maria Cristina Franco Ferraz (2002) assinala no pensamento de Niet- zsche a importância e a celebração da força do esquecimento, considerando como a mais alta atividade do espírito. O esquecimento, para Nietzsche, é uma digestão e a produção do esquecimento corresponde a um processo sem o qual não nos livraríamos do ressentimento com relação ao incessante escoar do tempo, à sua irreversibilidade, nem poderíamos nos instalar no novo e ser felizes. É, sobretudo, em Genealogia da moral (1987), como nos indica Maria Cristina Franco Ferraz, que Nietzsche propõe esse novo sentido para o esque- cimento, já não entendido como pura passividade. Esquecer, para Nietzsche, seria uma atividade primordial:

O esquecimento não viria apagar as marcas já produzidas pela memória, mas, antecedendo à sua inscrição impediria, inibiria qualquer fixação. Nesse sentido, a memória é que passa a ser pensada como uma “contrafaculdade”; é ela que viria a se superpor ao esquecimento, suspendendo-o, impedindo sua atividade salutar, fundamental. (Ferraz, 2002: 60)

Desse modo, esquecer passa a ser considerado como uma força plástica, modeladora, assim como uma faculdade inibidora. É só assim que o esque- cimento se configura não mais como uma punição, mas, ao contrário, como uma atividade essencial e constituidora da memória. É preciso escutar muito de perto para entender como ocorre esse diálogo entre Nietzsche e Foucault, para que possamos fundar no corpo o primado desse jogo plástico, estético, entre a memória e o esquecimento. Trata-se, sobretudo, de compreender que a

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separação entre corpo e espírito desaparece completamente nesse pensamen- to. Vejamos isso na análise de Ferraz (2002: 61-63), realizada a partir de sua leitura de Genealogia da moral:

Nietzsche remete o esquecimento, na “Genealogia da moral”, ao processo de di- gestão, chegando mesmo a criar uma palavra alemã complementar a que cor- responderia, em português, à expressão “assimilação física” (Einverleibung) […]

Rompendo com a circunscrição do processo digestivo ao âmbito do corpo fi- siologicamente pensado. Desse modo, Nietzsche não apenas arranca o tema da digestão do campo da mera fisiologia, trazendo-o para o da filosofia, mas propõe uma concepção de corpo bastante singular: na medida em que o processo da digestão passa a ser estendido para o campo da “alma”, é a própria alma, como algo supostamente diverso do corpo, que é engolida pelo que antes se associava apenas a uma função física, pretensamente distinta da atividade do “espírito”. […]

O tema da função digestiva do esquecimento relaciona-se diretamente à seguinte afirmação do parágrafo 16 do capítulo “Das velhas e novas tábuas”, de “Assim falou Zaratustra”: “o espírito é um estômago”, em que o “é” foi destacado por Niet- zsche. […] O espírito não é semelhante a um estômago. [...] Espírito e estômago se fundem.

Ao fazer o estômago engolir a alma, Zaratustra deslocou o lugar do espíri- to para o estômago e com ele deu uma nova dimensão e outro território ao cor- po, onde esquecer e lembrar fazem parte de uma atividade desse mesmo corpo.

E é desse novo lugar, do abrigo da alma no estômago, que passamos a falar do corpo como arquivo vivo, que pulsa, que se esquiva e se inventa, tomando como objeto o filme de Adirley Queirós, Branco sai, preto fica (2014). Antes, no entanto, é preciso nos deter no conceito de arquivo, como o tomamos aqui.

Trata-se, na linha de Foucault, do Arquivo que deixa entrever que, em cada presente, em cada atualidade, somos tomados por uma interseção na qual aquilo que julgamos saber o que somos coexiste com aquilo que estamos nos tornando, mas que ainda não sabemos o que é. É como se cada atualidade, cada configuração espaço-temporal fosse um complexo lugar de embates e de simultâneas emissões de signos que buscamos decifrar, seja como signos de nossas retenções, de nossas contenções, de nossos bloqueios, de nossas insufi- ciências, seja como signos de resistências ou de afirmações diferenciais anun- ciadoras de saídas.

Se o lugar do qual falamos da alma é o corpo, é nesse mesmo corpo que se inscreve a memória e suas articulações com o esquecimento como um jogo sensório-corporal. Daí porque podemos dizer sobre o corpo como arquivo,

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portanto, de um corpo que comporta e constrói arquivos. Tal perspectiva nos leva à criação do conceito de corpo-arquivo, de um corpo onde se efetiva o Arquivo do qual falou Foucault, qual seja, pleno de interseção temporal.

O corpo-arquivo é corpo da memória e memória do corpo, que

é uma memória constituída pelo conjunto de sistemas sensório-motores que o hábito organizou e que é, portanto, uma memória quase instantânea à qual a ver- dadeira memória do passado serve de base. […] Para que uma lembrança reapa- reça à consciência, é preciso com efeito que ela desça das alturas da memória pura até o ponto preciso onde se realiza a ação. (Bergson, 1999: 280)

O corpo-arquivo se faz do lugar do agora, no presente – um ponto infini- tamente pequeno onde coabitam distintas temporalidades. É no presente que todos os tempos se tocam. O corpo-arquivo não é o lugar de armazenar as marcas do mundo, não é o baú onde se encontram fantasmas. O corpo-arqui- vo é presente e o lugar para onde confluem as diferentes temporalidades. É o agora de que fala Benjamin, que só subsiste na confluência entre a interrupção e a fugacidade. O corpo-arquivo é da ordem do acontecimento, que faz saltar pelos ares o contínuo do mundo. É ainda o território e a condição poética do acontecimento.

CAMPO DOIS – O CINEMA

Tomemos então o filme de Adirley Queirós, não com a intenção de ilus- trar um pensamento, mas para colocá-lo em diálogo com o sistema de cruel- dade que se impõe sobre os corpos. Sistema contra o qual Nietzsche e Fou- cault, ao mesmo tempo em que fizeram ver na filosofia como o corpo se deu sob a condição da doença, da culpa e a dor, nos apontam para o corpo como potência. A boa nova que aparece em Zaratustra: “Escutai-me, antes, a mim meus irmãos, escutai a voz do corpo são” (Nietzsche, 2010: 59). Em Nietzsche, o corpo não é um obstáculo à resistência, nem muito menos algo que prende a alma ou martiriza os homens. Ao contrário, ele nos fala do corpo como um jogo de forças em constante devir, um corpo de potências.

Em Branco sai, preto fica, dois homens negros, moradores da maior pe- riferia de Brasília, têm seu corpo mutilado pela ação criminosa da polícia no Quarteirão, clube de black music, lugar da festa dos moradores da Ceilândia nos anos 1980 e que foi invadido pela polícia. Tiros, correria e a consumação da tragédia: um homem fica para sempre na cadeira de rodas, o outro perde a perna após um cavalo da polícia montada cair sobre ele. No entanto, esses

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homens não se sentem confortados em apenas contar a história sem inventar novas possibilidades de vida. Eles querem fabular, querem outras possibili- dades de narrar. Eis quando o cinema, assim como a filosofia, não serve ao Estado nem à Igreja, nem à imagem dogmática do pensamento. Uma filosofia e um cinema que contrariam e afligem. Nos termos de Nietzsche, a arte é o mais alto poder do falso, magnifica o mundo como erro, santifica a mentira, faz da vontade de enganar um ideal superior. Uma arte e uma filosofia que não curam, não acalmam, não sublimam. Ao contrário, nos impedem de morrer.

Nesse filme, a ficção científica é uma estratégia da arte, para a qual a Verdade e a História são jogadas, seu ponto de fuga. É preciso falsear a vida dos seus três personagens, todos absolutamente tragados pela violência do Estado, da Polícia e da Miséria, três instituições avassaladoras. É preciso inventar o tráfico através de passaportes, para que a periferia de Brasília tenha acesso à cidade, que ao final é a expressão e o alvo mortal daqueles a quem é negado o direito de passagem.

Brasília é o lado de dentro da história. Para além da fronteira, estão os restos, justo aquilo que vai retornar, em forma de desenho de animação, com armas e máquinas de destruição, como único modo de fazer a vingança. Para destruir a realidade (dura, insuportável) é preciso imaginar um futuro, um lugar onde estão todos sob a mesma condição. Mas onde ninguém sai ileso ou vitorioso.

O que se encontra em jogo no filme de Adirley Queirós é a força dos corpos, a constituição de uma dramaturgia dos corpos mutilados. Cada se- quência desenha um espaço onde os corpos atravessam, desafiando o cinema a transgredir, em planos, os impedimentos dos corpos. São corpos mecani- zados, espécies que se reinventam articulados por sobras do ferro-velho. A cadeira mecânica, o carro adaptado para ser usado pela perna mecânica, o elevador feito de peças improvisadas, o túnel para entrada na sede da rádio pirata; as pernas mecânicas construídas em uma oficina de pedaços de corpos de borracha, silicone etc. É esse corpo que faz do cinema de Adirley Queirós um objeto de resistência, uma pergunta sobre os seus limites e a sua potência.

Tudo é absolutamente desenhado para pôr em cena corpos que se refazem pela ação desses personagens.

Eis que os corpos determinam a mise-en-scène como lugar privilegiado em Adirley Queirós. O corpo é obstinadamente aquilo que resiste como forma de cena. Ele é o lugar do foco da câmera sobre o cotidiano das vidas de seus personagens, fazendo ver nos corpos o que resta das experiências passadas. E a resposta vem nas formas do corpo. Como se entre a destruição do Quartei- rão, o terror e o tempo presente, se fazendo, tudo estivesse embaralhado em diferentes camadas, na forma como o corpo nos incita a pensar. É como se o movimento dos corpos, suas dobras, seus desequilíbrios, a força das suas vo-

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zes fossem o impensado, o não dito do tempo, da memória. Seguir os corpos amputados de Marquim e Sartana e os devaneios do corpo de Dimas é o que a cena nos impõe nos vínculos de encadeamento, de coordenação, de uma cena com a outra. Vale observar que esses corpos, em seus gestos cotidianos, não são naturalizados. Em Branco sai, preto fica, o corpo entra em cena com marcações que determinam a ação, não para simplesmente contar uma histó- ria do foi, mas, sobretudo, para falsear (talvez teatralizar as atitudes corporais, exprimindo a força da violência), falsear a si próprio. Eis no filme então, a destruição e a potência dos corpos.

É o princípio da arte, onde o poder do falso, desdobrado e repetido, é elevado à sua máxima potência. Falsear a história para afirmar a vida. Os três personagens de Branco sai, preto fica são Dimas Cravalanças, o detetive que vem do futuro; Sartana (Shokito), que tem uma perna mecânica, uma espécie de ciborgue, e o Marquim, que vive isolado entre seus artefatos da rádio e os vários objetos que ele usa para se movimentar em um espaço arquitetônico la- biríntico. Adirley Queirós fala de um lugar onde a vida só é possível de alguma narrativa através da ficção de si mesmo. Procedimentos fílmicos fundamen- tais, não apenas do âmbito da narrativa, mas, sobretudo, da constituição de um campo de forças no qual corpo e espaço estão intimamente relacionados.

E também corpo e estratos do tempo, de onde vem um corpo-arquivo produ- zido pela cena fílmica, pelas potências da ficção infiltrada no documentário, a traçar vizinhanças entre as experiências vividas, o traçado das sobrevivências e a dimensão fabulatória que vem tornar possível o trabalho da imaginação política, amparada no corpo.

“Branco sai, preto fica”: palavra de ordem que dá início ao massacre da juventude negra da periferia, que também dá título ao filme, narra a mais dura expressão de uma memória, inscrita nos corpos amputados de Marquim e Sartana (Chokito), quando da tragédia/extermínio dos frequentadores do Quarentão. Dilmar Durães, que faz o Dildu em A cidade é uma só? (2011), ou- tro filme de Adirley Queirós, agora interpreta Dimas Cravalanças, um homem que veio do futuro colher provas contra o Estado. É nesse futuro que podemos ver o lugar da ficção científica como um núcleo acolhedor do desafio de fazer um documentário extremamente colado nesse mundo e cheio de artifícios e corpos dilacerados. O candidato Dildu não joga mais seus dados em um jingle popular que poderia fazer dele um político, deputado federal, para representar a Ceilândia. Ele não é mais candidato a nada desde que foi atropelado pela enorme carreata da candidata do Partido dos Trabalhadores, que atravessou o caminho quando seu carro parou de funcionar por falta de gasolina.

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Agora é a geração 80, apartada pela miséria cuja cor da pele é uma de- núncia, que vem explodir o Poder Absoluto, com suas avenidas largas e seus prédios impeditivos. Afinal, em Branco sai, preto fica, Adirley Queirós faz um cinema com os subterrâneos, lugar onde estão sendo planejados o retorno e a volta do reprimido. O elemento mais forte da construção da ficção científica nesse cinema do agora são menos seus espaços escuros, interiores sinuosos e túneis de entrada para os seus interiores do que as engenhocas construídas para fazer o mundo poder continuar, ter movimento. O elevador que dá acesso a casa/escritório de Marquim é talvez a mais contundente forma de conhecer os arranjos e estratégias desse cinema que resiste sob o regime do falso.

Nesse filme, Adirley Queirós faz o embate entre a memória e a forma cine- ma. Toma pelo menos duas questões centrais como suas: a discussão sobre as estratégias documentais e as da ficção científica, engendradas em um mesmo cinema, e por outro, o lugar dos corpos como inscrição e arquivo. Nesse emba- te, há um campo de forças na obra de Foucault, quando ele atribui a biopolítica toda ação pela qual a política intervém no domínio do vivente: saúde, higiene, sexualidade etc. Os biopoderes se exercem sobre as propriedades biológicas da vida, controlando e gerando os seres humanos na condição de corpo e popu- lação, enquanto as antigas concepções do poder se davam sobre a alma, os es- píritos. É quando Foucault aponta para a concepção de biopolítica como uma forma de resolução encontrada pelos biopoderes para solucionar uma equação do liberalismo, qual seja, de como governar menos, mas sem perder o controle.

Nesse sentido do governo dos corpos, da inserção da vida no campo da política, podemos compreender a ordem executada pelos policiais que invadi- ram o Quarentão, o lugar onde os corpos experimentavam um devir comum, um sentido de alargamento de forças e das pulsões da alegria. É da matéria dessa memória que nesse filme experimentamos os corpos estraçalhados como corpos da memória, ou seja, na tensão direta do que resta contra o que é da ordem da reinvenção desses corpos, como biopotência. Na linha de Fou- cault, o corpo como matéria da memória e como superfície de modulações por técnicas disciplinares e de biopolítica encontra na sua própria destruição a articulação da potência de vida.

Mais do que dos relatos, a força do filme de Adirley Queirós vem das ar- quiteturas da resistência, que fazem a extrapolação dos limites da ficção cien- tífica e do desenho de animação, como formas fílmicas do u-topos (a ficção como projeção do futuro intervindo no presente e a animação como desenho da fantasia, do faz de conta, do que não viola o real e, por isso mesmo, lugar do brincar contra todo tipo de verdade). O embaralhamento entre o relato como ficção e memória, tão arduamente trabalhado na sua constituição de

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uma ordem de procedimentos e adequações, faz do filme de Adirley Queirós não apenas um exercício estilístico. Trata-se muito mais de enfrentar o cinema com todas as suas armas. Não a da purgação, tal como atribuída à tragédia por Aristóteles, uma acepção medicalizada da dor e uma sublimação moral – for- ças reativas – mas, ao contrário, da concepção trágica da arte, cujos princípios são a vontade de poder e o poder do falso.

Têm relevo aqui os procedimentos pelos quais o trabalho do filme forja ou- tros espaços possíveis para habitar, espaços para corpo e memória, engendra- dos mutuamente na escritura da obra. Retomando aqui uma chave que Rancière (2013: 159) nos coloca a respeito do documentário como tipo de ficção – e de uma ficção da memória no cinema de Chris Marker, podemos encontrar na no- ção de forjar uma figura central para elaborar uma nova compreensão a respeito de uma política da ficção. “Fingere não quer dizer, em primeiro lugar, fingir, mas forjar. A ficção é a mobilização dos recursos da arte para construir um ‘sistema’

de ações representadas, de formas agregadas, de signos que se respondem” (Ran- cière, 2013: 160). Há um empenho no trabalho ficcional dos filmes de Adirley Queirós em fabricar cenas e em pesquisar dramaturgias na tessitura íntima entre as operações de mise-en-scène vindas do dispositivo ficcional e o mundo de de- rivas aberto pelos corpos dos sujeitos filmados.

Em Branco sai, preto fica, tornam-se ainda mais singulares as dinâmicas de apropriação e desvio postas em jogo no contato com os códigos dos cinemas de ficção científica. Essa capacidade da operação ficcional diz respeito ao trabalho de forjar situações em que o aparelho cinematográfico dispara um encontro, na dupla dinâmica do realizador que recorta e indica movimentos e dos atores que modulam no corpo as orientações, elaboram gestos e exprimem outras deriva- ções do que estava, em alguma medida, combinado e planejado. Os corpos não estão presos a marcações e a um encaixe em uma estrutura pré-fabricada, mas estão forjando um jogo de relações em contínuo movimento. Trata-se de uma fabricação coletiva, tramada em conjunto por seres que desejam fabular, fissurar mundos e seguir produzindo sobrevivências. Um filme de máquina do tempo, de lajes abertas para o espaço da rua e de aventuras que colocam em contato as formas expressivas das vidas em comunidade e os universos de um imaginário dos filmes da sessão da tarde. Implicam-se aí, de forma íntima, a experiência do vivido e as potências de uma imaginação em constante devir.

A ficção não é a criação de um mundo imaginário oposto ao mundo real. É an- tes o trabalho que opera dissentimentos, que modifica os modos de apresentação sensível e as formas de enunciação, alterando os quadros, as escalas ou os ritmos, construindo relações novas entre a aparência e a realidade, o singular e o comum,

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o visível e sua significação. Este trabalho muda as coordenadas do representável;

altera a nossa percepção dos acontecimentos sensíveis, a nossa maneira de os pôr em relação com os sujeitos, o modo segundo o qual o nosso mundo está povoado de acontecimentos e de figuras. (Rancière, 2010: 97, grifo do autor)

Com Rancière, poderíamos falar de uma ficção constituinte, que pode tam- bém ser uma maneira de trabalhar as memórias dos povos, de fazer os cruza- mentos temporais para vingar uma geração de amputados. Branco sai, preto fica desdobra a potência da infiltração entre ficção e documentário, para inventar com Marquim e Sartana a fabricação de uma explosão. Viagens nos tempos, in- tervenções nas partilhas policiais do espaço urbano, ficção científica que dobra uma opressão. A insurgência preparada materializa-se em linhas e em papel, as figuras da resistência ganham corpo e se constituem enquanto corpo. O que pa- rece fundamental aqui é mesmo um gesto que pode apontar para um novo fôle- go na insistência em viver. Mais do que qualquer atitude niilista ou de catástrofe, trata-se de afetar novos flancos sensíveis. Estamos diante de uma aposta radical naquilo que o filme pôde produzir, não como mobilização para uma continui- dade com o mundo, mas para entrada mesmo no desacordo com ele. Uma ficção constituinte se funda aí como forma fílmica de desconexão, para desorganizar lugares e embaralhar dentro e fora, centro e periferia. O documentário toma estratégias da ficção para perturbar o real e para constituir outros mundos sensí- veis, insurgentes diante dos esquadrinhamentos efetivados.

A ordem da polícia, que dá título ao filme, e que faz a distinção entre o branco e o preto, é a fissura mesmo da tela do cinema, da superfície do qua- dro, da composição dos campos. Em Branco sai, preto fica não há lugar para a esperança no poder reativo. Ao contrário de A cidade é uma só?, em Branco sai, preto fica ninguém é candidato a nada. Estão todos no submundo, seja ele uma espécie de ferro-velho de próteses humanas, seja no elevador inventado de pedaços de ferro e roldanas, que nos leva para o alto do esconderijo onde as vozes do passado se expressam na rádio pirata. Este é o mesmo local onde se fabrica uma bomba musical caseira que deverá explodir a Brasília do Planalto Central. A Ceilândia de A cidade é uma só? não é apenas uma cidade-satélite, um dos arredores do poder, é um espaço a esmo onde se instaura o bunker do contrapoder, lugar onde os passaportes para entrar na Capital Federal são negociados pelo tráfico. Fábrica do negócio de falsificações, do que é burlado, modificado, mesma engenharia que move o Poder de Brasília. Entretanto, na Ceilândia nada é legal.

A dimensão da violência de como o Estado se apoderou da vida e a des- truiu está na imagem. Não há meio-termo, não há representação. É o cinema

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que entra para documentar um futuro mais que presente. A vida é feita dos corpos que foram decepados. As imagens são os artifícios desses mesmos cor- pos se reinventando em estado de sobrevivência. Velharias, restos de máqui- nas, latas, pedaços de coisas emendadas em outras, refugos de materiais da indústria, das mercadorias descartáveis. É nesse cenário que o documentário sobre o fim do Quarentão se transforma em ciência-ficção. Do lado de cá dos pretos, separados por uma faixa, um muro, uma cortina, estão os corpos da memória e dos arquivos de uma noite em que a festa foi coberta de sangue. Do lado de lá dos brancos, o apagamento absoluto sobre o que não pode ser visto, não faz parte, os habitantes e seus pedaços de vida. Até que um dia qualquer, a bomba explode. Brasília desaparece exatamente como ocorre e através de um desenho animado.

As duas cidades separadas, ou talvez nem sejam mesmo duas cidades, mas uma só, dividida em dois blocos. Ou talvez sejam apenas dois mundos e uma trincheira. Ou talvez duas ilhas, uma da fantasia, outra dos fantasmas.

Mas não é, certamente, a cidade posta em dúvida sobre ser uma afirmação ou talvez uma pergunta: Seria a cidade uma só? Seria a cidade uma só. Aquela em que Dildu se confrontou com a imensa carreata da candidata Dilma Rousseff à presidência do país. Não, em Branco sai, preto fica, não há sombra de dúvidas.

É urgente destruir Brasília para ser escutado. Afinal, essa é a crença de que a ciência, base da ficção científica, tem proposto apenas bombas, explosões, desaparecimentos para a população negra, pobre, jogada na periferia.

O cinema de Adirley Queirós não faz mediações, mas trabalha com os incômodos. O principal deles é a proposta da destruição como grande final.

Mesmo que na forma de desenho, na animação da explosão, destruir Brasília não é uma saída fácil. Entra em cena uma tensão, que além de dramatúrgica, é um gesto de confronto com a tradição do cinema americano de fazer filmes com explosivos dos mais diversos. O verdadeiro Day After é mesmo o fato que antecede o filme, momento em que a polícia ordenou que os brancos saíssem e os pretos ficassem no Quarentão. O que vem depois é pura fantasia, a bomba sequer é um explosivo de verdade, pois é feita de uma música estranha para os brasilienses, estes que certamente não se reconhecem como “candangos”, já que estão em Brasília não porque descendam dos migrantes nordestinos, que a construíram.

Os candangos estão todos jogados na periferia, onde não há cidade. É destinado a eles o apartheid social, de cor, de sotaque, que já se deixa notar como uma ferida no sentido da própria palavra. Candango, aquilo que está na origem do que é ruim, ordinário, próprio do vilão. A Ceilândia é o lugar dessa gente, os personagens que fazem o filme narrar, em voz futura, a explosão

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de Brasília. Os candangos, cujos corpos foram doados ao trabalho pesado do tijolo daquela paisagem de areia vermelha e ar seco. São eles que carregam a memória nos seus corpos, que vivem e se inventam, apesar de tudo, também fazendo cinema.

Adirley Queirós faz um filme de ação contraterrorismo, de vingança, con- tra as armas do Estado brasileiro, policial, que destrói as vidas fora da rede produtiva. Os passaportes negados aos da Ceilândia para entrar em Brasília não são simples metáforas de um terror ficcional. Trata-se de um documento negado, de corpos mutilados pelo extermínio de pobres negros. Não há bran- cos entre os personagens de Branco sai, preto fica. Os corpos que vibravam ao som da música funk, black, ganharam muletas, próteses negociadas no câm- bio paralelo. São corpos-arquivos de uma cidade mutilada e que precisa ser inventada com as sobras. Ou, como disse Adirley Queirós, um filme-resposta à falta de diálogo: “não se faz diálogo com o outro com armas nas mãos”. O cinema é a sua arma, um ato de terrorismo. Um cinema que se faz ao mesmo tempo como uma estratégia de guerra e de cinema.

As armas do cinema existem. Há uma longa pesquisa de quatro anos so- bre o dia em que a polícia invadiu o Quarentão, incluindo vários depoimentos.

Um roteiro construído a cada dia, onde as situações das cenas vão se dando no decorrer das filmagens. O diálogo com o futuro, esse tempo que vai sen- do maquinado através da construção de uma bomba, se fez no mesmo ritmo do funk, uma música que nasce entre os negros americanos e é negada pela sociedade dos corpos assépticos, exatamente por remeter ao ato sexual e ao odor dos corpos durante as relações sexuais. O funk pede um corpo explosivo.

É exatamente esse corpo destroçado pela Ordem que o cinema de Adirley Queirós põe em cena. Um corpo acusado de se entregar a uma sonoridade que

“não faz parte da boa música, não é música, um lixo eletrônico, com letras sem nenhum sentido” (GARRET, 2014). Esse ritmo sincopado pela densa linha do baixo e pelo ritmo da guitarra não encontra ouvidos no Poder.

O que está em jogo nessa estratégia fílmica é a proposição de fazer do cinema um lugar de confronto entre a memória e a ficção. E é aí mesmo que o corpo fala sob a tensão entre lembrar e esquecer. A força do esquecimento não vem do apagamento da memória, das marcas deixadas no próprio corpo dessa violência. O que se encontra no filme não é um simples jogo de cena.

Nesse filme, trata-se de um tipo de procedimento para construir personagens, colocá-los em uma determinada situação, e filmar nessa tensão entre o docu- mentário e a ciência ficção, a fabulação e a denúncia. É esse processo que passa a acionar uma força de invenção e a força da memória, onde já não é possível dizer onde se encontra o personagem como pura fabulação e a memória como

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invenção de si. E aí já não há lugar de um e de outro, mas o trânsito e a indis- cernibilidade que traz para o cinema uma narrativa possível.

É, finalmente, o Nietzsche da Genealogia da moral (1987) que nos leva a entender a vingança em Branco sai, preto fica, para além da bomba que explo- dirá Brasília. Não é uma força reativa a que mobiliza esse filme, mas a potência de vida, porque o homem pequeno e a força reativa não retornarão. Foi o que Nietzsche (2010) apresentou como cura de Zaratustra e o segredo de Dionísio.

O que retorna muda eternamente de Natureza. E talvez ainda se possa dizer do cinema de Adirley Queirós, o que Foucault nos dá a ver com a sua ciência da heterotopologia: “o cinema é uma grande cena retangular, no fundo do qual, sobre um espaço de duas dimensões, projeta-se um novo espaço de três di- mensões” (2014: 24). O cinema como uma heterotopia, onde se constitui um espaço de todos os tempos (o da memória, o do vivido, o do fabulado, o que se inscreve nos corpos) e que, nesse sentido, ao encerrar todos eles, já não é mais nenhum deles. Adirley Queirós faz da tragédia dos anos 1980 do Quarentão uma experiência que não é mais a de seus personagens, pois nesse emaranhado de memória e fabulação é a vida mesma que surge em sua máxima potência.

Adirley Queirós leva seu cinema para o lugar desconhecido onde estão todos os tempos em suas declinações, assim como faz com o cinema que é ao mesmo tempo documentário, já que retrata a tragédia do Quarentão. Entre- tanto, um documentário que não se deixa ser prisioneiro desse passado cruel e violento, que se inventa como ficção científica, com todos os elementos desse gênero de narrativa, e ao mesmo tempo para o desenho de animação, trans- formando tudo em uma grande fabulação animada pelo desenho. Qual lugar é esse? Talvez Andrei Tarkovski, em Stalker (1979), possa nos apontar algum caminho através do personagem que dá nome ao filme, um homem que con- duz prudentemente seus congêneres através de um ambiente apocalíptico, que se chama Zona. A Zona é a Ceilândia, um lugar construído sob a memória da expulsão de moradores pobres de Brasília.

Quando Brasília surgiu, surgiu também, perto do aeroporto, na cara de todo mundo, uma favela de migrantes, espelho, oposto, a total negação da proposta da nova capital. O governo, então, numa operação de guerra, arrancou as pessoas e as jogou aqui, a 40 quilômetros de Brasília. Era um descampado, sem nada. Tipo Dogville’, do Lars von Trier. A única coisa que havia era a demarcação de onde as casas poderiam ser construídas. (Monteiro, 2014)

A relação entre Branco sai, preto fica e Stalker não surge de um modo qualquer. Os dois filmes de ciência-ficção surgem com o que acontece após a

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destruição da vida. O cinema de Adirley Queirós tem lugar no Apocalipse, a Ceilândia, uma terra de ninguém que surge em 1971 com a CEI – Campanha de Erradicação de Invasões, uma política do governo brasileiro de expulsão dos miseráveis, considerados ladrões das terras urbanas. Stalker existe em um país sem nome, em uma hora não precisa, em um cenário de deserto, um Day After, onde um grupo de subversivos, formado por um professor, um artista e um guia, o Stalker, vão em busca da Zona, um lugar desmilitarizado e domi- nado por paranormais, onde os desejos podem ser realizados. A Zona do filme foi inspirada em um acidente nuclear que aconteceu perto da cidade russa de Chelyabinsk em 1957. Uma área enorme que foi poluída por poeira radioativa e depois abandonada.

Dois lugares. Um de fuga, a Zona, uma “heterotopia”, termo dado por uma proposição de Foucault para criação de uma nova ciência. Outro de depósito dos indesejados, a Ceilândia, uma “distopia”, termo de origem grega, formado por dys que significa “mau, ruim” e pelo radical topos que significa “lugar”, que pode ser ainda melhor dimensionado quando tomado do pensamento filosó- fico que caracteriza uma sociedade imaginária controlada pelo Estado ou por outros meios extremos de opressão, criando condições de vida insuportáveis aos indivíduos. Nesses dois lugares antagônicos, o paradoxo da destruição e da potência. Habitando nesses topos, corpos que se reinventam, de forma ainda que muito diversa, como cinema – este lugar possível. M

REFERÊNCIAS

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BRANCO SAI, PRETO FICA. Direção: Adirley Queirós. [S.l.]: Cinco da Nor- te, 2014. 90 min. color.

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FOUCAULT, M. História da sexualidade: o cuidado de si. 10. ed. Rio de Janei- ro: Graal, 1985.

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Petrópolis: Vozes, 1987.

_______. Microfísica do poder. 18. ed. Rio de Janeiro: Graal, 2003.

_______. O nascimento da clínica. 7. ed. Rio de Janeiro: Forense Universitária, 2011. (Coleção Campo Teórico).

_______. O corpo utópico, as heterotopias. São Paulo: N-1, 2014.

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GARRET, A. “É um filme de vingança declarada”, diz diretor de Branco sai, preto fica. 30 mar. 2014. Disponível em: <http://cinefestivais.com.br/e- -um-filme-de-vinganca-declarada-diz-diretor-de-branco-sai-preto-fi- ca>. Acesso em: 11 dez. 2014.

LAPOUJADE, D. O corpo que não aguenta mais. In: LINS, D.; GADELHA, S. (Orgs.). Nietzsche e Deleuze: que pode o corpo. Rio de Janeiro: Relume Dumará, 2002. p. 81-90.

MONTEIRO, K. Ex-jogador de futebol, Adirley Queirós virou diretor de ci- nema premiado. Folha de S.Paulo, 31 dez. 2014. Disponível em: <http://

www1.folha.uol.com.br/ilustrada/2014/12/1568489-ex-jogador-de-fute- bol-adirley-queiros-virou-diretor-de-cinema-premiado.shtml>. Acesso em: 11 mar. 2016.

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Artigo recebido em 2 de janeiro de 2015 e aprovado em 24 de outubro de 2015.

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