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A Função Social da Propriedade Urbana – Da Evolução Histórica à Aplicação na Sociedade Contemporãnea Ana Carolina Bueno Ferrer, Rafael Rodrigues de Andrade

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XXVI ENCONTRO NACIONAL DO

CONPEDI BRASÍLIA – DF

DIREITO URBANÍSTICO, CIDADE E ALTERIDADE

FLAVIA PIVA ALMEIDA LEITE

ROSÂNGELA LUNARDELLI CAVALLAZZI

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Copyright © 2017 Conselho Nacional de Pesquisa e Pós-Graduação em Direito

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D597

Direito urbanístico, cidade e alteridade [Recurso eletrônico on-line] organização CONPEDI

Coordenadores: Flavia Piva Almeida Leite; Rosângela Lunardelli Cavallazzi; Valter Moura do Carmo - Florianópolis: CONPEDI, 2017.

Inclui bibliografia ISBN: 978-85-5505-439-6

Modo de acesso: www.conpedi.org.br em publicações

Tema: Desigualdade e Desenvolvimento: O papel do Direito nas Políticas Públicas

CDU: 34 ________________________________________________________________________________________________

Conselho Nacional de Pesquisa e Pós-Graduação em Direito Florianópolis – Santa Catarina – Brasil

www.conpedi.org.br Comunicação – Prof. Dr. Matheus Felipe de Castro – UNOESC

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XXVI ENCONTRO NACIONAL DO CONPEDI BRASÍLIA – DF

DIREITO URBANÍSTICO, CIDADE E ALTERIDADE

Apresentação

Apraz-nos apresentar os vinte e um trabalhos selecionados para publicação que foram

apresentados no Grupo de Trabalho Direito Urbanístico, Cidade e Alteridade apresentado no

XXVI Encontro Nacional do CONPEDI - Conselho Nacional de Pesquisa e Pós-Graduação

em Direito realizado em Brasília, entre os dias 19 a 21 de julho de 2017. O Grupo propiciou

excelente oportunidade para debater o grande número de instrumentos jurídico-urbanísticos

previstos no Estatuto da Cidade e a visão do tratamento da propriedade urbana e da função

social no ordenamento brasileiro. De forma resumida, os trabalhos apresentados por este

Grupo com a indicação de seus autores.

Esta obra inicia-se com o trabalho de Flavia Sousa Garcia Sanz, intitulado “A

APROPRIAÇÃO DO TERMO SUSTENTABILIDADE POR INTERESSES

CAPITALISTAS NAS CIDADES E O PAPEL DOS MOVIMENTOS SOCIAIS URBANOS

E DA CULTURA POPULAR NO SEU ENFRENTAMENTO”, em que a autora analisa a

influência de interesses econômicos sobre aspectos sociais e ambientais na construção da

cidade e o antagonismo destas duas forças: as do capital e as dos movimentos sociais urbanos

na construção das cidades sustentáveis.

No artigo “A FUNÇÃO SOCIAL DA PROPRIEDADE URBANA – DA EVOLUÇÃO

HISTÓRICA À APLICAÇÃO NA SOCIEDADE CONTEMPORÂNEA”, Ana Carolina

Bueno Ferrer e Rafael Rodrigues de Andrade discutem o instituto da função social da

propriedade urbana e sua aplicação atual a partir da evolução do conceito de propriedade.

Na sequência, Thiago Ribeiro de Carvalho discute as questões relativas à demora na

prestação judicial e à busca pela agilidade na prestação jurisdicional no trabalho “A

IMPORTÂNCIA DA TUTELA PREVENTIVA NA PROTEÇÃO DO PATRIMÔNIO

HISTÓRICO E CULTURAL”.

A seguir, Luiza Gaspar Feio e Lise Tupiassu apresentam o trabalho “A IMPORTÂNCIA DO

PODER LOCAL PARA CONCRETIZAÇÃO DOS DIREITOS HUMANOS A PARTIR DA

ANÁLISE DO INSTRUMENTO ‘ICMS ECOLÓGICO’” em que ressaltam o papel do Poder

Local para efetivação dos Direitos Humanos com a finalidade de expor as transformações

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À Luz do advento do Estatuto da Metrópole, Jean Alves e José Carlos de Oliveira debatem

em “A NECESSIDADE DA GOVERNANÇA INTERFEDERATIVA DOS SERVIÇOS

PÚBLICOS DE SANEAMENTO BÁSICO NAS REGIÕES METROPOLITANAS”. A

gestão associada no âmbito das regiões metropolitanas viabiliza a universalização e a

equidade, uma vez que os municípios menos favorecidos são compensados com os aportes

dos municípios maiores (subsídios cruzados).

No artigo “A OCUPAÇÃO DA ZONA RURAL COM FINS URBANOS, O

ORDENAMENTO TERRITORIAL PELO MUNICÍPIO E A CIDADE SUSTENTÁVEL”,

Marcos Prado de Albuquerque e Patrícia Cavalcanti Albuquerque debatem sobre a ocupação

da zona rural com fins urbanos e o ordenamento territorial pelo município a partir das

funções socioambientais da propriedade e da cidade, e do direito à cidade sustentável,

conforme diretrizes do Estatuto da Cidade.

Já em “A PARTICIPAÇÃO DO PODER JUDICIÁRIO NA PROTEÇÃO URBANÍSTICA”,

Ariel Augusto Pinheiro dos Santos e Júlio César de Souza abordam o Poder Judiciário como

um ator na proteção ambiental e urbanística, impedindo assim que o particular pratique

determinadas atividades lesivas. Da mesma forma, tratam do papel do Judiciário em evitar

que haja uma regressão normativa em suas dimensões.

A participação da sociedade civil no processo de elaboração e implementação do Plano

Diretor é apreciada no texto “ASPECTOS DA PARTICIPAÇÃO NO PROCESSO DE

ELABORAÇÃO DO PLANO DIRETOR MUNICIPAL”. A autora Ana Cláudia Milani e

Silva, para garantir a aplicação do princípio da Gestão Democrática, identifica as limitações

do modelo participativo e a relevância do Plano Diretor. Destaca a necessária gestão

democrática da cidade sem, contudo, deixar de afirmar que, a contrário senso, na prática, não

garante a democracia do processo, logo a importância do papel do Executivo municipal, da

Câmara de vereadores. Em conclusão, ressalta que o Plano Diretor municipal deve estar em

consonância com os ideais de uma cidade sustentável e igualitária.

O tema do direito à moradia é analisado por Elizabeth Maria Campbell Neto Machado

Peralta e Paulo Lage Barboza de Oliveira com o título “ACESSO à MORADIA EM CABO

FRIO: INSTRUMENTOS URBANÍSTICOS E SUA EFETIVIDADE”. Estudam a

implantação de programas de habitação de interesse social na cidade de Cabo Frio

privilegiando o Plano Diretor. A função social da propriedade pública e privada também é

objeto de estudo visando à efetividade dos instrumentos jurídico-urbanísticos. Ressaltam que

o Plano Diretor de Cabo Frio já conta com quase 11 anos de idade e propõem que a imediata

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permitir ao Poder Público uma maior capacidade de intervir no sentido do cumprimento da

função social da cidade e da propriedade.

“DIREITO À CIDADE E POLÍTICAS PÚBLICAS PARA A SEMART CITY”, da autoria

de Daniel Machado Gomes e Nicolas Arena Paliologo, constitui o tema que aborda o

conceito de cidade inteligente e a relevância da tecnologia. Propõe conceituar a cidade

inteligente e apontar os requisitos para a sua implementação prática em face do Direito à

Cidade. O estudo também considera a relevância do acesso amplo à tecnologia digital

mediante políticas públicas. Conclui que as cidades inteligentes não estão reduzidas a uma

tendência tecnológica e, finalmente, afirmam que a cidade inteligente é o resultado da

combinação entre a tendência tecnológica e as necessidades políticas, econômicas e sociais.

Émilien Vilas Boas Reis e Edson Roberto Siqueira Jr, no contexto histórico de migração e

formação de cidades, indagam sobre a viabilidade da sustentabilidade no caso das cidades

brasileiras. Assim, com o título “DIREITOS HUMANOS, MIGRAÇÃO E

SUTENTABILIDADE DAS CIDADES BRASILEIRAS” realizam a investigação, segundo

uma abordagem interdisciplinar, considerando o meio ambiente como direito fundamental.

Analisam também o conceito de ideologia para abordarem a questão da efetividade dos

Direitos Humanos. Consideram essencial a efetividade dos direitos fundamentais na

perspectiva da equidade social. Concluem no sentido da necessária ação do Estado Brasileiro,

por meio de políticas públicas para a promoção dos direitos humanos fundamentais.

“O ESTUDO DE CASO DE PROTEÇÃO AO PATRIMÔNIO CULTURAL NO

MUNICÍPIO DE CONTAGEM MG - PATRIMÔNIO INDUSTRIAL E EXPANSÃO

IMOBILIÁRIA” realizado por Jesmar César da Silva enfrenta o conflito inerente entre a

sociedade de mercado e proteção ao Patrimônio Cultural. Adota a concepção de Patrimônio

como essencial à vida, construído e vinculado à história dos grupos sociais. Denuncia o

equívoco de considerar a população regida pela lógica do mercado e, por consequência, o

Patrimônio Cultural como mero produto para de consumo.

Analisa o caso do Empreendimento Oasis localizado no município de Contagem MG e

constata, de forma coerente, a violação do texto constitucional.

Com o título “GOVERNANÇA INTERFEDERATIVA NAS ENTIDADES

METROPOLITANAS FEDERATIVAS”, Edson Ricardo Salene e Renata Soares Bonavides

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supramunicipais, especialmente as regiões metropolitanas reconhecidas como governança

interfederativa. O estudo destaca Zoneamento Ecológico-Econômico e também inclui o caso

da AGEM – Baixada Santista à luz do Estatuto da Metrópole.

Ressalta, por fim, o grande desafio da aprovação do PDUI (Plano de Desenvolvimento

Integrado da Região) em lei estadual.

A aplicabilidade de instrumentos jurídico-urbanísticos prevista no Estatuto da Cidade é

analisada por Felipe Jardim da Silva e Luciana Grassano de Gouvêa Melo no ensaio IPTU

PROGRESSIVO NO TE: APLICABILIDADE NO NORDESTE DO BRASIL. Qualificado

como uma sanção prevista na Constituição Federal da República de 1988 e no Estatuto da

Cidade indutora do cumprimento da função social da propriedade. Os autores concentram o

estudo empírico nas capitais do Nordeste do Brasil e concluem que, apesar dos avanços

legislativos, o IPTU, o instrumento não é aplicado na prática nas cidades objeto de estudo,

resultando, portanto, urgente a revisão/regulamentação deste e dos seus códigos

complementares.

Na sequência, Nadja Karin Pellejero e José Ricardo Caetano Costano, no artigo intitulado

“MORADIA PARA QUEM? UMA REFLEXÃO SOBRE POLÍTICAS PÚBLICAS

DIRECIONADAS À QUESTÃO DA MORADIA DE RIO GRANDE/RS", fizeram uma

análise sobre os impactos das políticas públicas direcionadas à habitação implementadas nos

últimos anos no município de Rio Grande-RS.

No artigo "MULTIDIMENSIONALIDADE DO DIREITO À CIDADE NO ESTATUTO DA

CIDADE”, Jussara Romero Sanches e Miguel Etinger De Araújo Júnior analisam o

desenvolvimento urbano contemporâneo tendo como base, no âmbito internacional, bem

como no âmbito interno, o Direito à Cidade. Para tanto, apresentam uma reflexão sobre os

contornos que o Direito à Cidade possui, para compreender sua complexidade e sua

multidimensionalidade.

A seguir, Irene Celina Brandão Félix, por meio do trabalho “O ESTATUTO DA CIDADE E

A GARANTIA AO DIREITO À MORADIA ADEQUADA”, faz uma análise das normas

procedimentais e a possibilidade de criação de políticas públicas introduzidas pelo Estatuto

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Em sua apresentação do trabalho intitulado “O ESTATUTO DAS CIDADES, A

PARTICIPAÇÃO POPULAR E A GESTÃO URBANA DEMOCRÁTICA", Glauce Suely

Jácome da Silva aborda a participação como forma de controle social, sobretudo através dos

Conselhos, visando o desenvolvimento das cidades.

Por sua vez, André Luiz Costa e Rossana Marina De Seta Fisciletti apresentam no artigo “O

VALOR DA FUNÇÃO SOCIAL EM TEMPOS INCERTOS: PANACEIA OU UTOPIA”

uma análise sucinta da questão da especulação imobiliária e sua relação com o poder público,

observando a função social sob a perspectiva do proprietário, bem como a dos menos

favorecidos, que, em razão dos “avanços” das leis, os excluem da possibilidade de aquisição

da propriedade.

No artigo “OPERAÇÕES URBANAS CONSORCIADAS: UM INSTRUMENTO PARA

CONCRETIZAÇÃO DA GESTÃO DEMOCRÁTICA DAS CIDADES”, os autores Carolina

Souza Castro e Carlos Henrique Carvalho Amaral demonstram que as Operações Urbanas

Consorciadas constituem um importante instrumento no planejamento urbano, vez que

permitem a flexibilização da legislação urbanística vigente em prol de uma melhor

adequação com a realidade local.

Finalmente, com o intuito de finalizar as discussões acerca desse novel diploma normativo,

Ana Luiza Novais Cabral e Samuel Fernandes Dos Santos apresentam o trabalho intitulado

“PRIMAZIA DA PARTICIPAÇÃO POPULAR NA REALIZAÇÃO DE AUDIÊNCIAS

PÚBLICAS EM ALTERAÇÃO E REFORMA DO PLANO DIRETOR MUNICIPAL”, no

qual fazem uma análise da participação popular nas audiências públicas para alterações

legislativas e reformas do plano diretor municipal por meio da gestão democrática descrita

expressamente na Constituição Federal e no Estatuto da Cidade.

Por fim, os organizadores e coordenadores do Grupo de Trabalho DIREITO

URBANÍSTICO, CIDADE E ALTERIDADE parabenizam e agradecem aos autores dos

trabalhos que compõem esta obra pela valiosa contribuição científica de cada um, o que por

certo será uma leitura interessante e útil à comunidade acadêmica. Reiteramos a satisfação

em participar da apresentação desta obra e do CONPEDI, que se constitui, atualmente, no

mais importante fórum de discussão e socialização da pesquisa em Direito.

Profª. Drª. Flávia Piva Almeida Leite (FMU)

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1 Mestranda do Programa de Pós-Graduação stricto sensu em Direito da Universidade Veiga de Almeida

(PPGD-UVA). Advogada e Inspetora de Polícia Civil no Estado do Rio de Janeiro. Email: acbferrer@gmail.com

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A FUNÇÃO SOCIAL DA PROPRIEDADE URBANA – DA EVOLUÇÃO HISTÓRICA À APLICAÇÃO NA SOCIEDADE CONTEMPORÃNEA

THE SOCIAL FUNCTION OF URBAN PROPERTY - FROM HISTORICAL EVOLUTION TO APPLICATION IN CONTEMPORARY SOCIETY

Ana Carolina Bueno Ferrer 1 Rafael Rodrigues de Andrade

Resumo

O presente artigo tem o objetivo de discutir o instituto da função social da propriedade

urbana e sua aplicação atual a partir da evolução do conceito de propriedade. Abordar-se-á a

parte histórica, desde o seu surgimento até a legislação hoje pertinente. Quanto aos métodos,

além da pesquisa bibliográfica, foi realizado estudo de caso em uma região conhecida como

Morubá, localizada em Cabo Frio, interior do Estado do Rio de Janeiro, que foi ocupada por

um assentamento popular. Questiona-se se nessa ocupação a propriedade cumpriu

efetivamente sua função social, e, caso positivo, se tal direito está sendo exercido de forma

plena.

Palavras-chave: Propriedade, Função social, Dignidade humana

Abstract/Resumen/Résumé

This article aims to discuss the institute of the social function of urban property and its

current application from the evolution of the concept of property. We will approach the

historic, from its inception to the legislation today. As for the methods, besides the

bibliographical research, a case study was carried out in a region known as Morubá, located

in Cabo Frio, in the state of Rio de Janeiro, which was occupied by a popular settlement. It is

questioned whether in this occupation the property effectively fulfilled its social function,

and, if positive, if such right is being exercised fully.

Keywords/Palabras-claves/Mots-clés: Property, Social role, Human dignity

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INTRODUÇÃO

Para tratar da função social da propriedade urbana é preciso, antes de qualquer coisa, desenvolver o conceito de propriedade dando-lhe contornos precisos, delineando sua evolução no decorrer da história, mencionando suas principais características e espécies e, por último, abordando a questão da função social da propriedade, a qual será delineada com maior minúcia por tratar-se do tema principal deste artigo.

No estudo da História do Direito se percebe que a propriedade teve valor primordial e, por isso, foi tutelada ao longo dos tempos e nos mais variados lugares, estando hoje assegurada pela atual Constituição da República Federativa do Brasil, desde que atendidos os requisitos essenciais de sua função social.

A função social da propriedade é uma questão bastante presente desde os primórdios da civilização, advinda da conotação monetária que a terra sempre teve. Em épocas pretéritas a terra teve maior valor que a própria vida humana. Com isso grandes áreas se centralizaram com um só proprietário por esse ser detentor de grande poder econômico e político, advindo então a desigualdade social e principalmente a irregular distribuição da terra, gerando assim grandes conflitos sociais.

No entanto, ao contrário do que se poderia imaginar, a função social da propriedade é tema atual, bastante presente no debate político e jurídico contemporâneo, como se observam os movimentos sociais que lutam em prol da redistribuição da propriedade na constante busca da função social da terra.

Cumpre lembrar que a Constituição da República Federativa do Brasil promulgada em 1988, chamada de “Constituição Cidadã”, insculpiu o instituto da Função Social da Propriedade em seu artigo 5º, entre os Direitos Fundamentais, não se embasando somente em valores econômicos.

Entretanto a aplicação desse instituto em nosso país esbarra no grande poder econômico e político dos proprietários de terras, os quais alegam o cerceamento ao direito de propriedade que a mesma Constituição prevê, gerando assim uma grande discussão acerca do tema. De um lado os grandes proprietários de terra e, do outro, pessoas com parcos poderes econômicos pleiteando o direito a uma moradia digna.

Pretende-se, portanto, conceituar a função social da propriedade com base em sua evolução histórica, bem como analisar sua aplicação atual levando-se em conta o acesso à moradia e à cidade, utilizando-se como parâmetro a região do Morubá – Cabo frio, onde foi realizado o estudo de caso.

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1. BREVE PANORAMA HISTÓRICO DA PROPRIEDADE

O direito de propriedade passou por transformações históricas. Inicialmente o tradicional caráter absoluto da propriedade, onde os interesses individuais se sobressaíam aos direitos coletivos, dando a propriedade uma figura egoísta, inviolável e sagrada, agora no direito contemporâneo passou a ser medido pelos interesses coletivos.

Caio Mário fala em publicização do Direito Privado, alegando que a influência do Estado e o anseio de se instituírem fórmulas dirigidas à realização da finalidade preliminar do direito no propósito de garantir e proteger o bem estar do indivíduo, geram tendência à publicização da norma jurídica.

A relativização do direito de propriedade é decorrência da necessidade de atender novas situações na sociedade que possuem caráter emergencial. Apesar das várias restrições impostas ao direito de propriedade, ele continua sendo um direito privilegiado no sistema pátrio, o que pode ser visualizado no Código Penal, Título II, na Lei Federal de Registros Públicos e no Código de Processo Civil.

1.1 O direito de propriedade e as declarações de direitos

O direito de propriedade é um direito tão relevante, que mesmo nas declarações universais que prevêem direitos e garantias fundamentais ele foi lembrado, corroborando assim sua importância em nossa sociedade.

Segundo José Afonso da Silva (1999, p.108):

[...] as declarações de direitos do século XX procuram consubstanciar duas tendências fundamentais: universalismo, implícito já na Declaração francesa de 1789, e socialismo [...] com a extensão do número dos direitos reconhecidos, o surgimento dos direitos sociais, uma inclinação ao condicionamento dos direitos de propriedade e dos demais direitos individuais, propensão que refletiu no Direito Constitucional contemporâneo. (destaques em itálico no original)

Inicialmente as declarações tinham caráter de meras enunciadoras de direitos, passando depois a preâmbulos das constituições. Não houve propriamente uma inspiração das declarações de direitos, mas “reivindicações e lutas para conquistar os direitos nela

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consubstanciados, conjugando condições objetivas e subjetivas para sua formulação” (SILVA, 1999, p.108 )

As condições objetivas, também chamadas de materiais ou históricas, caracterizaram-se principalmente no inconformismo da sociedade contra a monarquia absoluta, enquanto as condições subjetivas materializaram-se nas fontes de inspiração das ideias da doutrina francesa, tais como o pensamento cristão primitivo, donde advieram as ideias de dignidade e igualdade humanas; a doutrina do direito natural dos séculos XVII e XVIII; e o pensamento Iluminista que firmou o individualismo.

1.1.1 Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão de 1789

A Declaração de Direitos do Homem e do Cidadão de 1789 significou o ponto final do Antigo Regime (Ancien Régime), representando o primeiro elemento constitucional do novo regime político. Através dela se garantiu a propriedade privada contra expropriações abusivas e a estrita legalidade na cobrança de tributos.

Operou-se ainda uma mudança no poder econômico, que “deslocou-se da propriedade fundiária para os bens móveis, e destes últimos para os títulos-valores e contas bancárias, dissolvendo-se em símbolos, escrituras e códigos eletrônicos” (COMPARATO, 2003).

A Declaração de 1789 consagra em seu art. XVII a propriedade como direito inviolável e sagrado ao lado dos direitos individuais, especialmente a liberdade.

A propriedade não é definida, é apenas garantida ou proclamada, e, com isso o novo direito de propriedade constitui-se de duas características: sua exclusividade, que significa que todos os poderes ou direitos que outros possam execer sobre determinada coisa aos poucos perdem autonomia e passam a ser encarados como desmembramentos do direito exclusivo do proprietário, e sua negociabilidade.

1.1.2 Declaração Universal dos Direitos do Homem

A Declaração Universal dos Direitos do Homem, vitória das potências democráticas contra os países de regime autoritário, aprovada em 10 de dezembro de 1948, por iniciativa da ONU, estabelece em seu artigo XVII: “1 - Toda pessoa tem direito à propriedade, individual e coletivamente. 2 - Ninguém será arbitrariamente privado de sua propriedade”.

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A desapropriação por interesse social resulta do conceito de função social da propriedade, inserta em constituições modernas, depois da segunda guerra mundial, a mais assinalada delas, a Constituição de Weimar (Alemanha) de 1919.

Essa função social da propriedade já fora assinalada por Augusto Comte antes mesmo dos juristas franceses que melhor sustentaram essa teoria, ao condenar os abusos do sistema capitalista de propriedade e ao mesmo tempo as doutrinas socialistas consideradas por ele como “utopias ou extravagâncias." (COMTE, 1851/1854).

1.2 A propriedade e sua função social inseridas em Constituições

Em toda Europa Ocidental a partir do século XI ocorreu uma tendência à centralização dos poderes, concentrado precipuamente nas mãos do rei. A sociedade medieval europeia era composta, basicamente, de três estamentos ligados à condição pessoal de seus integrantes: nobreza, clero e povo. Os dois primeiros possuíam privilégios hereditários, e o terceiro tinha como única vantagem o status libertatis, isto é, o fato de que os seus componentes não se confundiam com a multidão de servos de todo gênero. (COMPARATO, 2003).

A reforma protestante veio enfraquecer muito esta estrutura estamental, mas somente a partir da Revolução Francesa ela começou a ser abolida formalmente. Foi neste contexto histórico que o rei João da Inglaterra chamado também de João Sem Terra, assinou a declaração de 15 de junho de 1215, a Magna Carta. Nesta se reconhecia que os direitos da nobreza e do clero independiam do consentimento do rei para existir, e que, portanto, não eram suscetíveis de modificação por parte dele.

Dentre suas cláusulas mais importantes, em se falando da evolução histórica dos direitos humanos e da instituição do regime democrático, são apontadas por Fábio Konder Comparato (2003), entre outras, a garantia do respeito à propriedade privada contra confiscos ou requisições, decretados abusivamente pelo soberano ou seus oficiais:

[...]30. Nenhum dos nossos xerifes ou bailios, ou qualquer outra pessoa, poderá servir-se dos cavalos e carroças de propriedade de um homem livre, sem o seu consentimento.

31. Nem nós nem os nossos bailios apossar-nos-emos, para nossos castelos ou orbas, de madeiras que não nos pertencem (alienum boscum), exceto com o consentimento do proprietário. (COMPARATO, 2003, p.148 )

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1.2.1 Constituição Norte-Americana

Antes da Constituição norte-americana, a ideia de “Constituição” significava simplesmente a previsão da estrutura social de uma cidade, de seu poder político, do conjunto das instituições da vida privada, entre elas casamento, educação e propriedade. A Constituição norte-americana mudou esse conceito ao ser concebida como a expressão da vontade política de um povo, com a finalidade de proteger o indivíduo contra os abusos dos governantes e, por estas razões, lei suprema sobre as demais.

A garantia de judiciabilidade dos direitos humanos foi reconhecida posteriormente, através do caso Marbury v. Madison de 1803, e em 1868 com a promulgação da 14ª emenda que declarou a impossibilidade de qualquer Estado fazer ou executar alguma “lei com efeito de reduzir as prerrogativas ou imunidades dos cidadãos dos Estados Unidos; nem tampouco Estado algum privará uma pessoa de sua vida, liberdade ou bens, sem o devido processo jurídico; nem denegará a alguma pessoa, dentro de sua jurisdição, a igual proteção das leis”.

Dessa forma, o direito de propriedade, como direito humano positivado constitucionalmente, ou na terminologia tecnico-jurídica correta, como direito fundamental, também foi protegido por esta previsão, especialmente na parte em que se menciona que sem o devido processo legal ninguém será privado dos seus bens.

2. FUNÇÃO SOCIAL

A expressão função Social procede do latim Functio, cujo significado é de cumprir algo ou desempenhar um dever ou uma atividade. Utilizamos o termo função para exprimir a finalidade de um modelo jurídico, certo modo de operar um instituto, ou seja, o papel a ser cumprido por determinado ordenamento jurídico (ROSENVALD/FARIAS, 2006).

Realmente, a evolução social demonstrou que a justificação de um interesse privado muitas das vezes é fator de sacrifício de interesses coletivos. Há muito não mais se admite que a satisfação de um bem individual seja obtida à custa da desgraça alheia. Portanto, ao cogitarmos da Função Social, introduzimos no conceito de direito subjetivo a noção de que o ordenamento jurídico apenas concederá merecimento à persecução de um interesse individual se este for compatível com os anseios sociais que com ele se relacionam.

Caso contrário, o ato de autonomia privada será censurado em sua legitimidade. Todo poder de ordem privada é concedido pelo sistema com a condição de que sejam satisfeitos determinados deveres perante o corpo social.

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2.1. FUNÇÃO SOCIAL DA PROPRIEDADE URBANA

O primeiro grande defensor da idéia de que a propriedade gerava para o seu titular o dever de empregar esta riqueza no interesse da sociedade foi Leon Duguit. Já em 1914, Duguit afirma que: A propriedade é uma instituição jurídica que se formou para responder a uma necessidade econômica, como, por outra parte, todas as instituições jurídicas e que evoluciona necessariamente com as necessidades econômicas.

O pensador francês notou que a sociedade moderna se transformava rapidamente e também o conceito jurídico da propriedade deveria acompanhar esta transformação, a fim de assegurar seu relevante papel econômico. Por isso, para ele, a sociedade deixou de ser um direito individual para converter-se em uma função social. Por isso mesmo, Duguit pregava a necessidade de leis (até então inexistentes) que impusessem ao proprietário a obrigação de cultivar o campo, de conservar a casa, de dar à riqueza que tinha em mãos uma utilidade econômica e social. Defendia como legítima a intervenção do legislador para evitar que grandes propriedades imobiliárias se prestassem à especulação, de forma que seus donos deveriam lhe dar uma destinação produtiva.

Com efeito, com a relativização dos direitos privados pela função social ocorrida principalmente a partir do inicio do século XX, os direitos individuais não podem mais ser considerados como interesses do indivíduo, mas sim como instrumento de realização do coletivo. Com isso tornou-se praticamente impossível visualizar o interesse individual somente, tendo hoje o interesse coletivo o ponto de destaque em discussões que envolvem os dois interesses.

Com o advento da Constituição da República de 1988, a propriedade foi inserida como um direito fundamental do cidadão, devendo ser observada sua função social. Nesse sentido, reza o artigo 5.º, XXIII, que a propriedade atenderá a sua função social.

Destarte, a propriedade é uma das bases do sistema socioeconômico do Estado. A sua importância transcende o âmbito dos direitos individuais, alocando-se também na ordem econômica e social, o que torna plenamente compreensível e razoável o entendimento de que a propriedade deve atender aos anseios tanto do proprietário quanto da sociedade.

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O proprietário, como senhor da coisa, pode usá-la, gozá-la e dispô-la, além de poder reavê-la de quem injustamente a detenha (direitos de seqüela), desde que o exercício do direito corresponda aos anseios da sociedade, já que os reflexos do bom ou mau uso da propriedade irão, invariavelmente, sobre ela se projetar. Assim, a propriedade deve ser usada em prol do bem coletivo, da segurança e do bem-estar dos cidadãos, bem como do equilíbrio ambiental.

Portanto, não mais se concebe a propriedade como um direito ilimitado como o era no direito antigo. Vários dos dispositivos da Constituição da República expressam essa limitação ao direito de propriedade, como é o caso, por exemplo, daquele que admite a expropriação em caso de necessidade ou utilidade pública ou ainda por interesse social, mediante justa e prévia indenização em dinheiro, ressalvados os casos previstos na própria Lei Maior.

O texto do artigo 182 § 2º preceitua: “a propriedade urbana cumpre a sua função social quando atende às exigências fundamentais de ordenação da cidade expressa no plano diretor”.

Cumpre esclarecer que as sanções previstas para os imóveis ociosos que não estão cumprindo a função social, são obrigações propter rem, ou seja, recairá a obrigação ao sujeito passivo que for à época o titular do imóvel. Com isso, mesmo que o proprietário queira se esquivar da obrigação de parcelar ou edificar vendendo o imóvel, a obrigação constará no Registro Geral de Imóveis, sendo o novo titular obrigado a cumprir com a sanção.

O IPTU progressivo se trata de um tributo urbanístico que recebe um tratamento diferenciando, sendo seu valor majorado de acordo com a ociosidade do imóvel em questão, não podendo o proprietário do imóvel alegar o confisco, como já decidiu o Supremo Tribunal Federal (RE nº 153771/MG). É o entendimento que a progressividade da alíquota não tem o fim arrecadatório, mas sim que o proprietário destine sua propriedade para o fim esculpido na Constituição, ou seja, a função social da propriedade urbana.

Nessa linha de raciocínio, cumpre lembrar que a súmula 668 do Supremo Tribunal Federal pressupõe a inconstitucionalidade de lei municipal que majorava alíquotas de IPTU antes da Emenda Constitucional de nº 29, da qual emergiu esse direito, salvo se destinada a cumprir a função social da propriedade urbana.

Não cumpridas as sanções retro mencionadas, o Poder Público poderá desapropriar o imóvel em caráter de sanção, recebendo o proprietário sua indenização com Títulos Públicos

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regatáveis em até 10 anos, prazo previsto em lei, para que se evite, assim, o enriquecimento sem causa do proprietário ocioso.

A desapropriação-sanção é motivada pelo interesse Público, razão pela qual o Poder Público é obrigado a destinar a propriedade desapropriada à sua função social, concretizando o parcelamento ou a edificação compulsória no bem.

Mais um exemplo da aplicação da função social da propriedade urbana é o direito de perempção concedido ao Poder Público, ou seja, em uma área na qual o Poder Público tenha interesse, instituirá uma lei que determine que os proprietários antes de aliená-la terão que consultar o poder Público no prazo de 30 (trinta) dias, para que o Poder Público possa exprimir a sua vontade de compra. A não manifestação do Poder Público obrigará ao particular que apresente a escritura de compra e venda do imóvel para que possa ser analisado se a venda foi feita nos mesmos moldes oferecidos ao Poder Público, sob pena de nulidade do negocio jurídico e aquisição do bem pelo município pelo valor da base do IPTU.

Segundo Pietro Perlingieri (1997: 33/34) a publicização ou despatrimonialização do direito civil é a sua “repersonalização”, cujo valor máximo é o da dignidade da pessoa humana e não a proteção do patrimônio. Com isso podemos acreditar que a norma privada advinda após a Constituição teve a influência incisiva de valores constitucionais solidificados. No mesmo diapasão manifesta-se Gilberto Bercovici (BERCOVICI, 1998).

3. LEGISLAÇÃO

Atualmente, no ordenamento jurídico brasileiro encontram-se diversos diplomas legais para reger a matéria propriedade e função social, dentre os quais pode-se destacar a Constituição Federal; o Código Civil; o Estatuto da Cidade, o Código Tributário Nacional e a recente Medida Provisória nº 759 de 2016. São inúmeros os instrumentos que podem ser utilizados para a aplicabilidade da função social da propriedade.

A Carta Magna promulgada em 1988 em nosso país se preocupou em insculpir em seu artigo 5º inciso XXIII, ao tratar dos direitos fundamentais, a incumbência dos proprietários de promoverem a função social da propriedade.

Previsto ao nível dos direitos e garantias fundamentais, direitos e deveres individuais e coletivos, o direito de propriedade é preliminarmente contemplado já no caput no artigo 5º da norma constitucional. No mesmo artigo, o inciso XXII garante o direito de propriedade e o inciso XXII determina a finalidade da propriedade a atender o sua função social.

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O artigo 170 ainda apresenta em seu caput a ordem econômica, fundada na valorização do trabalho humano e na livre iniciativa, como a responsável por assegurar a todos a existência digna, conforme os ditames da justiça social observados entre outros, a função social da propriedade.

O determinado no caput do artigo 182 §2º também estabelece o cumprimento da função social da propriedade urbana, bem como o aproveitamento adequado do solo urbano expresso no §4º do mesmo artigo, garantindo assim o regramento do desenvolvimento das cidades e da função social desses aglomerados populacionais, observando a forma de como cumprir a função social da propriedade urbana, referindo-se ao plano diretor de cada município, sempre observando suas peculiaridades.

Ademais existem outras atividades de função social contempladas pela nossa Constituição Federal de 1988, como o prestígio da moradia da população de baixa renda (art. 183); produtividade, aproveitamento racional, preservação ambiental, respeito aos direitos trabalhistas e ao bem-estar dos proprietários e trabalhadores (arts. 184 a 186); tombamento e desapropriação (art. 216, § 1º) proteção dos bens de natureza material e imaterial; a progressividade do IPTU (art. 156, § 1º), nos termos da lei municipal, assegura o cumprimento da função social da propriedade.

A usucapião extraordinária de imóveis rurais está definida na pelo artigo 191 da CF/88 e a usucapião especial urbana (art. 183 e parágrafos), os quais são, indubitavelmente, dispositivos constitucionais reconhecedores do direito explícito de acesso à propriedade.

A Constituição também prevê, tutelando valores diversos, penas para o proprietário infrator de lei penal, perda de bens e cosequente extinçao de propriedade em seu artigo 5º incisos XLV, XLVI, b.

Os arts 182 e 183 da Constituição Federal estao regulamentados pela Lei nº 10257/01, denominada Estatuto da Cidade. Nessa legislação apresenta aspectos que merecem ser tratados aqui. A lei referendada invoca princípios gerais ao âmbito nacional no que diz respeito à gestão e organização das cidades.

Compreendem na referida lei, normas de ordem pública e interesse público para compatibilizar o uso da propriedade urbana com o aproveitamento coletivo, ultizando assim a real função social da propriedade, a segurança e o bem estar da população, tudo isso aliado ao equilíbrio ambiental.

O Estatuto da Cidade, advindo com a lei nº 10.257/01, estabelece em seu art. 1º, § 1º, normas de ordem pública e interesse social que regulam o uso da propriedade urbana em prol do bem coletivo, da segurança e do bem-estar dos cidadãos, bem como do equilíbrio

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ambiental, por meio do caput do art. 2º determina que a política urbana tem por objetivo ordenar o pleno desenvolvimento das funções sociais da cidade e da propriedade urbana.

A regulamentação dos artigos. 182 e 183 do texto constitucional vigente, pelo Estatuto da Cidade, demonstra claramente o avanço na interferência do Poder Público sobre a propriedade urbana. Tal fato exterioriza-se particularmente na efetiva intenção de impedir a retenção especulativa de imóvel urbano, que resulte na sua subutilização ou não-utilização (inciso VI,e), a lei municipal determina o parcelamento, a edificação ou a utilização, compulsórios, do solo urbano não edificado, subutilizado ou não utilizado (art. 5º). Tais dispositivos determinam nova leitura do art. 1.228 do Código Civil, pois impõem ao proprietário o ônus de dar, necessariamente, alguma destinação a seu imóvel, do qual não poderá dispor com a mesma liberdade, sob pena de cobrança do IPTU progressivo e desapropriação, com pagamento em títulos da dívida pública (artigos. 7º e 8º).

O Código Civil, por sua vez, é claro ao dispor que o direito de propriedade deve ser exercido em consonância com as suas finalidades econômicas e sociais e de modo que sejam preservados a flora, a fauna, as belezas naturais, o equilíbrio ecológico e o patrimônio histórico e artístico, bem como evitada a poluição do ar e das águas (art. 1228 do CC). Embora o dispositivo não afirme expressamente, é óbvio que o proprietário também não pode, sob pena de violar a função social da propriedade, contaminar o solo do bem imóvel do qual é dono.

Portanto, a propriedade deve ser utilizada como instrumento da produção e circulação de riquezas, para moradia ou produção econômica, não podendo servir de instrumento para a destruição de bens ou valores caros a toda a sociedade como é o caso do meio ambiente sadio e equilibrado.

No dia 22 de dezembro de 2016, foi adotada a Medida Provisória nº 759 que, dentre outras mudanças no ordenamento jurídico pátrio, alterou o Código Civil para incluir um novo direito real: o direito real de laje.

Com o direito de laje, a separação entre propriedade e direitos sobre o espaço aéreo superior dos imóveis, ganham regulamentação e direção próprias, que permitiriam nortear agentes e procedimentos que ocorrem há muito tempo, sobretudo nas favelas brasileiras, mas de maneira informal. Assim, na medida em que segue uma das diretrizes do Estatuto da Cidade, o “reconhecimento da cidade real”, ou seja, a adoção das formas efetivas de urbanização – e não modelos ideais de cidade presumida, ou pressentida – como matéria-prima básica da ordem jurídica e administrativa.

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Com efeito, conforme Claudia Franco Corrêa (2012) após estudo empírico realizado na Favela do Rio das Pedras no Rio de Janeiro sobre o direito de laje:

O “direito de laje”, ao ser instrumentalizado, traz à tona o sentimento de pertencimento do cidadão, uma vez que o favelado ao articular tais meios econômicos, participa da mobilidade social, consequência do estado Democrático de Direito, em que todos possuem possibilidades de participar das riquezas sociais e econômicas. [...] Ao contrário do que se estabelece nos discursos de representantes públicos, a “laje” não é uma distonia urbana, ela se perfaz como meio de utilizar o solo, analogamente ao que ocorre nos espaços formais, na perspectiva utilitarista do solo.(CORRÊA, 2012, p.154 )

De acordo com o texto da mencionada Medida Provisória, o direito de laje somente se aplica quando for impossível a individualização dos lotes ou unidades, a sobreposição ou a solidariedade de edificações ou terrenos, contemplando o espaço aéreo ou o subsolo de terrenos públicos ou privados, tomados em projeção vertical, criando assim uma unidade imobiliária autônoma. As unidades a serem reconhecidas como autônomas devem ter acessos próprios.

Sem entrar no mérito das críticas já existentes sobre o texto normativo em questão e a alegada atecnia legislativa em alguns aspectos, é certo que trata-se de uma tentativa do legislador de regularizar as propriedades já existentes em grande escala na realidade das favelas e bairros de classe média/baixa brasileiros, numa perspectiva de atender à finalidade da novidade legislativa de regularizar núcleos urbanos informais e de dar maior efetividade à função social da propriedade.

4. O MORUBÁ – ESTUDO DE CASO

O presente estudo de caso reflete um exemplo de má utilização da terra, a qual, como em muitos casos, acabou sendo ocupada irregularmente por famílias carentes de moradia. Trata-se da localidade conhecida como Morubá, na cidade Cabo Frio, região litorânea e turística do Estado do Rio de Janeiro que compõe a famosa Região dos Lagos.

O caso ocorreu em uma das regiões mais valorizadas da cidade de Cabo Frio por volta da década de 60 do século XX. Em razão da não utilização da terra pelo poder público,

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houve a ocupação desorganizada por famílias que ali buscavam melhores condições de vida e, principalmente, um lugar para viver.

A comunidade está localizada entre os bairros Braga e Vila Nova, ocupando uma área de 11.000m² dividida em três ruelas e uma rua de intenso movimento, contendo 99 (noventa e nove) domicílios construídos irregularmente em área particular e pública, cercada de imóveis de classe média e comércios de médio porte, ficando a menos de 1km da principal praia do município que recebe em torno de 1 milhão de visitantes na alta temporada.

Essa área concentra mais de 30% dos chefes de família com rendimento mensal até 03(três) salários mínimos (senso IBGE, 2010) e conta com pouco mais de 11 mil metros quadrados e com 162 domicílios.

Como em muitos lugares no Estado do Rio de Janeiro, trata-se de local marcado pela contradição, em que se verifica o abismo existente entre as pessoas de classe média que têm acesso a condições dignas de vida e aqueles que simplesmente batalham por sua existência, tudo isso em menos de 1km de distância geográfica.

A região em questão apesar de possuir índices de desenvolvimento urbano parecidos com os bairros formais de Cabo Frio (acesso a equipamentos urbanos, grande mobilidade urbana e etc), apresenta grande necessidade de investimento do setor público, pois possui irregularidades fundiárias e deficiência de infraestrutura urbana.

Nota-se grave deficiência de serviços básicos como saneamento ambiental e coleta de lixo, verificando-se grande número de detritos pelas ruas sem que nenhuma providência seja tomada pelo poder público.

Essa área foi denominada de Área Especial de Interesse Social pelo município já prevista no Plano Diretor, que são perímetros demarcados por lei, onde podem ser aplicadas regras e parâmetros especiais que favoreçam a produção de habitação de interesse social e regularização fundiária, que de certa maneira interfiram na dinâmica do mercado de terras com o objetivo de preservar a moradia dessa população.

Merece destaque que tal área foi a única já classificada como assentamento popular no plano diretor, pois em 2011 recebeu investimentos públicos. No entanto, os investimentos realizados pela Administração Pública foram a construção de uma praça em frente à comunidade e a colocação de paralelepípedos nas ruas existentes que podemos considerar três com no máximo 300 metros cada uma. Ou seja, aquela população ainda demanda intervenções de melhorias habitacionais, programas de geração de trabalho e renda, além, é claro, de ações de regularização fundiária.

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É certo que houve a ocupação irregular desse bairro e que seria inviável extrair essas pessoas nos dias de hoje de suas casas. Esses mordores, no entanto, encontram-se em situação de abandono sem suficiente assistência da administração pública.

Porém, para que essas pessoas possuam qualidade de vida ou, no mínimo, condições de vida digna, necessitam de uma intervenção estatal urgente, aplicando-se o previsto no plano diretor.

Sobre as ações que estão ou serão desenvolvidas no Município, verificamos que está em curso a elaboração de projeto de regularização urbanístico- fundiária da comunidade do Morubá. O estudo deste projeto teve como referencial dados e informações processados no CadÚnico e nos processos de pedido de regularização fundiária junto à Secretaria de Ordem Pública – Superintendência Municipal de Fiscalização Fundiária.

Aprovado pelo PAC 2, ainda consta recurso para elaboração de projeto de urbanização no distrito de Tamoios, na localidade do Gargoá, em 585.000 m2 de área, prevendo estudos e projetos de execução de obras de infraestrutura integrada (abastecimento de água, iluminação, esgoto, instalação de filtro/fossa, drenagem pluvial, terraplanagem, compactação, remoção de famílias da área de proteção ambiental do Parque do Mico Leão Dourado, construção de uma praça e da sede do Parque, e também regularização fundiária e projeto social), porém ainda não iniciado.

Observa-se, portanto, que há total consciência pelo poder estatal que se trata de área carente de serviços públicos, no entanto, até o presente momento nenhum projeto foi efetivamente posto em prática pela administração municipal.

Quanto a função social da propriedade urbana, entende-se que esta foi cumprida, tendo em vista que a área que era inutilizada hoje abriga centenas de pessoas e diversas famílias que ali encontraram possibilidade de moradia.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Verificou-se ao longo da pesquisa feita para a elaboração desse artigo, que a função social da propriedade há muito vem sendo aplicada na história, desde a Roma antiga até ser solidificada hoje em nosso país, tendo esse instituto como princípio fundamental. A preocupação com o social e a coletividade há muito assola os governantes e a sociedade mundial, trazendo cada vez mais discussões que atigem as grandes massas, como a fome, a miséria e doenças incuráveis que atacam as camadas mais pobres da sociedade.

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A idéia de função social da propriedade não é inédita, mas suas repercusões certamente ainda serão de muita polêmica, pois esse instituto contraria a tradicional visão da propriedade absoluta, que implica nas grandes concentrações de riqueza e poder, trazendo uma nova concepção de propriedade que atenda a sociedade como um todo, fazendo com que cada vez mais se busque o social ao invés do capital, almejando uma sociedade mais justa e saudável.

A nosso ver a função social da propriedade é um direito condicionado as peculiaridades de cada local, mas nunca pode ser visto como limitação ao direito de propriedade, mas sim como uma evolução histórica e uma tendência do direito contemporâneo em deixar de lado interesses individuais e valorar interesses coletivos, sobretudo quando se referem às camadas menos favorecidas da sociedade.

No presente artigo foi mencionado o caso do Morubá, localizado na cidade de Cabo Frio, de localização privilegiada, mas no qual as terras foram irregularmente ocupadas por pessoas carentes e hoje necessita com urgência de investimentos públicos que possibilitem o acesso aos serviços mais básicos aos moradores que vivem em péssimas condições.

Pelo presente estudo de caso, observa-se exemplo em que a função social da propriedade urbana, mesmo sendo aplicada, vem acompanhada da necessidade premente da intervenção estatal para que conceda um ambiente digno de moradia, principalmente àqueles mais carentes. Com a inércia do poder público, muitas vezes a função social acaba sendo efetivada por assentamentos e invasões irregulares, no entanto, não basta somente o acesso ao direito de moradia, sem que seja ela também uma moradia digna.

Portanto, essa busca pelo social e melhor distribuição de renda e riqueza necessita de programas governamentais sólidos e eficazes para que o instituto seja aplicado plenamente. Deve-se viabilizar o acesso à propriedade, mas não se pode olvidar que outros direitos também são necessários para que se possa alcançar uma melhor qualidade de vida, sendo a dignidade humana a condição fundamental para que todos os demais direitos possam ser devidamente exercidos.

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