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BRASIL REPÚBLICA NOVA: DA POSSE DE DUTRA AO SUICÍDIO DE VARGAS

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BRASIL REPÚBLICA NOVA: DA POSSE DE DUTRA AO SUICÍDIO DE VARGAS

CONTEÚDOS

 Presidente Eurico Gaspar Dutra  Presidente Getúlio Vargas

 Vice-presidente João Café Filho, Carlos Luz e Nereu Ramos AMPLIANDO SEUS CONHECIMENTOS

Presidente Eurico Gaspar Dutra

Eurico Gaspar Dutra, foi o primeiro presidente do Brasil eleito pelo voto secreto. Antes de ser presidente, seguia a carreira militar como profissão e na sua campanha eleitoral, recebeu o apoio de Getúlio Vargas. Desde a sua posse em 1946, até o fim do seu mandato em 1951, seu governo sofreu com as pressões externas devido ao contexto da Guerra Fria. Esse fato fez com que as suas ações políticas se alinhassem aos interesses do bloco capitalista liderado pelos Estados Unidos. Essa postura mais centrada no liberalismo econômico, acabou o distanciando do projeto nacionalista e intervencionista de Getúlio Vargas.

Figura 1 – Presidente Eurico Gaspar Dutra Fonte: Wikimedia commons

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Logo no início do seu mandato, Dutra convoca uma assembleia constituinte e em 1946, aprova uma constituição mais democrática, que substituiu a Constituição Polaca da ditadura do Estado Novo varguista. Desse modo, a Constituição de 1946, tornou-se um símbolo da redemocratização do Brasil e garantiu praticamente, todos os direitos que o povo conquistou durante a Era Vargas.

Uma das suas primeiras medidas impopulares tomada por Dutra foi a proibição dos jogos de azar e o fechamento de todos os cassinos do Brasil. Como muitas dessas casas apresentavam grandes shows, o desemprego acabou atingindo não só os trabalhadores desses recintos, como também, a classe artística que se apresentava neles.

Figura 2 - Jogos de azar Fonte: Goden_Sikorka/Shutterstock

No campo econômico, Dutra adotou uma forte política de importações de produtos norte-americanos. Esse fato fez com que as empresas brasileiras (nascidas durante a Era Vargas), sentissem os efeitos da concorrência com os produtos trazidos dos Estados Unidos. Assim, muitas delas desaceleraram sua produção e demitiram parte dos seus funcionários, outras chegaram a encerrar as suas atividades. Como consequência disso, as reservas cambiais do Brasil (deixadas por Vargas) foram diminuindo, a dívida externa do país voltou a crescer e a inflação ganhou força.

Para tentar reverter esse cenário de crise, o governo Dutra decide congelar os salários dos trabalhadores (que tiveram seu último aumento em 1942). Desse modo, eles perdiam cada vez mais seu poder de compra, uma vez que os preços das mercadorias não paravam de subir e seus salários estavam totalmente defasados. Isso levou, a população insatisfeita com o governo a protestar nas ruas e organizar greves, a partir de 1947.

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Nesse contexto, Dutra passou a classificar esses movimentos sociais contrários ao seu governo como revoltas de orientação comunista, utilizando-se desses fatos e do cenário político da Guerra Fria para romper relações diplomáticas com a União Soviética. Com isso, ele ordena o fechamento dos sindicatos e do Partido Comunista do Brasil.

Além dessas medidas, ele também assinou com os Estados Unidos e outros países Latino-americanos um acordo denominado de TIAR (Tratado Interamericano de Assistência Recíproca) que garantia a intervenção militar norte-americana nos demais países, caso houvesse alguma ”ameaça comunista” (ou seja, um pretexto para combater a esquerda).

Figura 3 - Guerra Fria Fonte: Aquir/Shutterstock.com

Buscando reorganizar a economia, em 1947, Dutra lançou o Plano SALTE que previa sólidos investimentos do governo nas áreas de saúde, alimentação, transporte e energia. Apesar de ter investido em obras, como a pavimentação da rodovia Rio de Janeiro - São Paulo e ter retomado os investimentos na Companhia Hidrelétrica do São Francisco (CHESF) iniciada por Vargas, pode-se dizer que as metas desse plano não foram atingidas de maneira expressiva.

Já no final do mandato, a perda da popularidade de Dutra, associada a uma campanha de retomada nos investimentos da indústria nacional e de aumento salarial para os trabalhadores, impulsionaram a campanha presidencial que levará o povo a eleger pela primeira vez, por meio do voto direto (48% dos votos), Getúlio Vargas como presidente.

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Presidente Getúlio Vargas

Vargas retoma a cadeira presidencial do Brasil, como ele mesmo gostava de dizer, pelos braços do povo. Em sua campanha política, ele se comprometeu em encerrar a política liberal de Dutra, retomar os investimentos na indústria nacional e reajustar o salário dos trabalhadores, ganhando o apoio das massas.

Figura 4 – Presidente Getúlio Vargas Fonte: Wikimedia commons

Curiosidade: Ao se eleger-se por voto popular, Vargas assume a presidência com um forte apelo ao apoio das massas. Na cultura popular, por exemplo, para comemorar esse retorno, foi lançada uma marchinha carnavalesca que tinha o seguinte refrão:

Bota o retrato do velho outra vez, Bota no mesmo lugar,

o sorriso do velhinho, faz a gente trabalhar.

Disponível em: <https://www.letras.mus.br/francisco-alves/1313875/>. Acesso em: 22 set. 2016. 10h30min.

Logo no primeiro ano como presidente, Vargas lança uma campanha de cunho nacionalista denominada de "O petróleo é nosso". O seu objetivo era conquistar o apoio de alguns grupos políticos e um forte apoio popular, para garantir a soberania nacional sobre as riquezas naturais do nosso subsolo, que vinha sendo exploradas por multinacionais, e garantir o monopólio estatal sobre elas.

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Assim, para administrar o petróleo brasileiro, refiná-lo e investir no aumento da produção, Vargas criou no ano de 1953 a Petrobrás S/A (empresa de capital misto onde o Estado Brasileiro controla no mínimo 51% das ações) que passou a ser a única empresa com direitos plenos sobre a pesquisa, produção, refino e distribuição do petróleo nacional.

Figura 5 – Atual logo da Petrobrás S/A Fonte: Wikimedia commons

A região do Nordeste brasileiro enfrentou um segundo grande período de seca em 1941 (a primeira ocorreu em 1932). Desse modo, para tentar reduzir os impactos das estiagens que eram constantes nessa região, Vargas fundou o Banco do Nordeste, no ano seguinte dessa grande seca.

Cumprindo com suas promessas de campanha e resgatando suas práticas populistas, Vargas retoma os investimentos na indústria nacional e, com a redução das importações, a oferta de empregos volta a crescer no Brasil, apesar do arrocho salarial dos operários ter sido mantido. Pautado nessa ideia de fomentar a indústria nacional, Vargas decide fundar em 1952, o Banco Nacional do Desenvolvimento Econômico (BNDE), que passou a financiar uma série de projetos que visavam modernizar o país.

Depois de muita pressão popular e grandes greves, em 1954, Vargas decide conceder 100% de aumento no salário mínimo, recuperando o apoio dos trabalhadores ao seu governo. Ao mesmo tempo, ele acabou perdendo o apoio político das elites.

Nesse mesmo ano, entrou em operação a Usina Hidrelétrica de Paulo Afonso, o que motivou a tentativa de Vargas de criar a Eletrobrás, uma empresa estatal que controlaria a produção e distribuição de energia elétrica no Brasil. Porém, os seus opositores políticos articularam para que o projeto acabasse inviabilizado.

A oposição dos setores que se beneficiavam com as políticas liberais do antigo governo e a pressão externa da indústria internacional, que teve suas exportações para o Brasil reduzidas durante o governo Vargas, buscavam desmoralizar as ações nacionalistas do presidente, alegando que elas faziam parte de uma política desenvolvimentista ultrapassada, populista e autoritária. Desse modo, eles buscavam retomar na memória popular a figura do antigo ditador, para enfraquecer o governo.

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Além disso, também houve uma série de acusações de corrupção a membros do governo e pessoas próximas a Vargas. Como o jornal Última Hora praticamente era o único órgão de imprensa que apoiava o governo, não tardou a surgir denúncias de que ele era financiado por ele, com desvios de recursos do Banco do Brasil.

Nesse contexto de oposição, ganhou destaque o jornalista Carlos Lacerda, que era o maior crítico do governo varguista. Ele buscou se aliar ao grupo dos militares defensores do intervencionismo político e aos partidos de oposição, como a União Democrática Nacional (UDN), em um esforço conjunto para derrubar o presidente Vargas por meio de acusações que ele publicava em seu jornal, Tribuna da Imprensa.

Figura 6 – Carlos Lacerda Fonte: Wikimedia commons

No ano de 1954, quando Carlos Lacerda retornava para o prédio onde morava, houve o disparo de dois tiros de revólver. Um deles acabou matando o major da Força Aérea Brasileira, Rubens Florentino Vaz, que acompanhava o jornalista, e o outro atingiu o pé de Lacerda. No dia seguinte, esse evento ganhou grande destaque na imprensa como o Atentado da Rua Tonelero. As suspeitas sobre esse crime, recaíram quase que automaticamente sobre Vargas, uma vez que os acusados pertenciam a guarda pessoal do presidente.

Desse modo, Vargas passou a ser pressionado a renunciar à presidência, pela imprensa, pelos partidos de oposição e pelos militares. A figura do velho ditador que usava a força para calar a oposição, foi retomada com toda força. Em resumo, Vargas estava acuado, pois caso renunciasse, estaria assumindo a culpa das acusações que recaiam sobre ele, e caso insistisse em se manter na presidência, provavelmente sofreria um golpe de estado que levaria os seus opositores ao poder. Assim, a solução encontrada por ele, foi o suicídio.

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Oficialmente, em 1954, Vargas se mata com um tiro no peito, no dia em que se comemora a noite de São Bartolomeu (24 de agosto), em seus aposentos no Palácio do Catete no Rio de Janeiro, deixando duas notas de suicídio, uma manuscrita (mais curta) e outra datilografada (mais longa), as quais receberam o nome de Carta-testamento.

Figura 7 – Pijama de Getúlio Vargas com a marca do tiro no seu peito Fonte: Wikimedia commons

Depois de veiculada a notícia do suicídio, Vargas, de acusado passou à condição de vítima e, com isso, multidões saíram às ruas para se despedir do presidente que ficou conhecido como o "pai dos pobres". Retratos de Vargas foram distribuídos para o povo durante todo o dia e sua família recusou as homenagens oficiais oferecidas pelo governo. Lacerda, com medo de uma perseguição popular, decide sair temporariamente do Brasil.

A frase extraída da Carta-testamento (versão datilografada): “Saio da vida para entrar na história”, refletia exatamente o cenário de agitação política que estava por vir no período que restava a ser cumprido do seu mandato (de agosto de 1954 a janeiro de 1946). No campo político, o suicídio de Vargas impediu o golpe militar que pretendia depô-lo, preservou a sua popularidade enquanto um governo de base popular e nas próximas eleições, acabou afastando o povo dos candidatos que faziam oposição a ele, o que facilitou a vitória de Juscelino Kubitschek como o próximo presidente eleito por voto popular.

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Saiba mais: A versão manuscrita da carta-testamento, assinada no final da última reunião ministerial comandada por Getúlio Vargas, foi divulgada ao público, apenas em 1967, por Alzira Vargas, devido a insistência de Carlos Lacerda que não acreditava que tal carta existisse. Nela, o presidente explica aquele que seria o seu último gesto político:

“Deixo à sanha de meus inimigos, o legado de minha morte. Levo o pesar de não ter podido fazer, por este bom e generoso povo brasileiro, e principalmente pelos mais necessitados, todo o bem que pretendia.

A mentira, a calúnia, as mais torpes invencionices foram geradas pela malignidade de rancorosos e gratuitos inimigos, numa publicidade dirigida, sistemática e escandalosa.

Acrescente-se na fraqueza dos amigos que não defenderam, nas posições que ocupavam, à felonia de hipócritas e traidores a quem beneficiei com honras e mercês, à insensibilidade moral de sicários que entreguei à Justiça, contribuindo todos para criar um falso ambiente na opinião pública do país contra a minha pessoa.

Se a simples renúncia ao posto a que fui levado pelo sufrágio do povo me permitisse viver esquecido e tranquilo no chão da pátria, de bom grado renunciaria. Mas tal renúncia daria apenas ensejo para, com mais fúria, perseguirem-me e humilharem-me. Querem destruir-me a qualquer preço. Tornei-me perigoso aos poderosos do dia e às castas privilegiadas.

Velho e cansado, preferi ir prestar contas ao Senhor, não dos crimes que não cometi, mas de poderosos interesses que contrariei, ora porque se opunham aos próprios interesses nacionais, ora porque exploravam, impiedosamente, aos pobres e aos humildes. Só Deus sabe das minhas amarguras e sofrimentos. Que o sangue dum inocente sirva para aplacar a ira dos fariseus. Agradeço aos que de perto ou de longe me trouxeram o conforto de sua amizade. A resposta do povo virá mais tarde..."

Disponível em: <https://pt.wikipedia.org/wiki/Get%C3%BAlio_Vargas>. Acesso em: 22 set. 2016. 14h45min.

Vice-presidente João Café Filho, Carlos Luz e Nereu Ramos

Com a morte de Vargas, o Vice presidente João Café Filho assume o comando do Brasil. Apesar de sua orientação política ser pautada no liberalismo econômico, dada a grande comoção nacional que agitava o povo e o cenário de crise política, esse presidente não conseguiu impor grandes mudanças ou reformas radicais.

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Figura 8 - Vice-presidente João Café Filho Fonte: Wikimedia Commons

Sofrendo grande resistência e pressionado pela opinião pública, ele se afasta da presidência, alegando problemas de saúde em novembro de 1955. Nesse caso, quem assumiu o comando temporário do Brasil (de novembro de 1955 a janeiro de 1946) foi Carlos Luz, que na época era o presidente da Câmara dos Deputados.

Porém, nesses poucos meses de governo, Carlos Luz tentou articular um golpe político para impedir a posse de Juscelino Kubitschek, que havia sido eleito presidente do Brasil pelo voto popular.

Para impedir um golpe de estado e garantir que a democracia prevalecesse, o general Henrique Lott (na época ministro da guerra), destituiu Carlos Luz e nomeou Nereu Ramos, presidente do Senado, para encerrar o mandato de Vargas e oficializar a posse de Juscelino Kubitschek em janeiro de 1946.

ATIVIDADES

1. Explique quais foram as consequências para a economia brasileira das políticas liberais adotadas pelo presidente Eurico Gaspar Dutra.

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2. Sobre o governo do presidente Eurico Gaspar Dutra (1946-1951) assinale “V” para as afirmativas verdadeiras e “F” para as afirmativas falsas.

( ) Pavimentou a rodovia que liga a cidade de São Paulo a cidade do Rio de Janeiro. ( ) Incentivou as importações, principalmente de produtos norte-americanos.

( ) Privatizou as empresas estatais Petrobrás e Companhia Siderúrgica Nacional. ( ) Criou uma política de desenvolvimento econômico denominada de Plano SALTE. ( ) Rompeu relações diplomáticas com os Estados Unidos e se aproximou dos Soviéticos.

3. Explique qual foi a importância de Getúlio Vargas (1951-1954) no contexto de defesa nacional do petróleo brasileiro.

4. (ENEM-2005) Zuenir Ventura, em seu livro Minhas memórias dos outros (São Paulo: Planeta do Brasil, 2005), referindo-se ao fim da Era Vargas e ao suicídio do presidente em 1954, comenta:

“Quase como castigo do destino, dois anos depois eu iria trabalhar no jornal de Carlos Lacerda, o inimigo mortal de Vargas (e nunca esse adjetivo foi tão próprio)”. Diante daquele contexto histórico, muitos estudiosos acreditam que, com o suicídio, Getúlio Vargas atingiu não apenas a si mesmo, mas o coração de seus aliados e a mente de seus inimigos.

A afirmação que aparece "entre parênteses" no comentário e uma consequência política que atingiu os inimigos de Vargas aparecem, RESPECTIVAMENTE, em:

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a) a conspiração envolvendo o jornalista Carlos Lacerda é um dos elementos do desfecho trágico e o recuo da ação de políticos conservadores devido ao impacto da reação popular. b) a tentativa de assassinato sofrida pelo jornalista Carlos Lacerda por apoiar os assessores do presidente que discordavam de suas ideias e o avanço dos conservadores foi intensificado pela ação dos militares.

c) o presidente sentiu-se impotente para atender a seus inimigos, como Carlos Lacerda, que o pressionavam contra a ditadura e os aliados do presidente teriam que aguardar mais uma década para concretizar a democracia progressista.

d) o jornalista Carlos Lacerda foi responsável direto pela morte do presidente e este fato veio impedir definitivamente a ação de grupos conservadores.

e) o presidente cometeu o suicídio para garantir uma definitiva e dramática vitória contra seus acusadores e oferecendo a própria vida Vargas facilitou as estratégias de regimes autoritários no país.

LEITURA COMPLEMENTAR

Tratado Interamericano de Assistência Recíproca (TIAR)

Assinado pelas repúblicas americanas na Conferência do Rio de Janeiro (1947), esse tratado de defesa hemisférica estabelecia basicamente que “um ataque armado por qualquer Estado contra um Estado americano será considerado como um ataque contra todos os Estados americanos”, ao mesmo tempo que definia os princípios, obrigações e mecanismos que deveriam ser postos em ação em caso de necessidade. O tratado procurava dar um formato permanente às afirmações de solidariedade hemisférica estabelecidas em encontros interamericanos anteriores, especialmente na Conferência do México, dois anos antes (1945).

 Antecedentes

O conceito de “defesa hemisférica” era consequência lógica da política de “boa vizinhança” do governo Roosevelt para a América Latina. Se a “boa vizinhança” pressupunha processos de consulta e ação comum entre as Repúblicas americanas, dever-se-ia fazer também um esforço de defesa comum do continente; daí o conceito de defesa hemisférica. Esse conceito esbarrava porém nas definições estratégicas dos militares norte-americanos que, desde a década de 1930, pensavam a defesa do continente como parte da defesa nacional dos Estados Unidos e formularam planos, segundo os quais as forças

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norte-americanas seriam diretamente responsáveis pela defesa do território continental. Dentro dessas definições estratégicas, os demais países americanos dariam contribuições adequadas, que seriam celebradas mediante acordos bilaterais. Sobrava pouco espaço para uma ação comum (multilateral) de defesa continental. Desse modo, os esforços de criação de um Conselho de Defesa Interamericano, de caráter multilateral, durante a guerra, nada mais eram do que uma fachada política necessária à ação do Departamento de Estado, em seu esforço para conseguir uma unanimidade de perspectivas em relação ao perigo representado pelo Eixo.

Quase ao final da guerra, durante a Conferência do México (fevereiro/março de 1945), os Estados Unidos insistiram na aprovação da resolução intitulada Assistência recíproca e solidariedade americana, que dispunha sobre a defesa mútua contra a agressão externa ou interna. Àquela altura, o inimigo - já praticamente derrotado - era o Eixo, e as relações entre Estados Unidos (EUA) e União Soviética (URSS) eram de irrestrita colaboração. A menção à “agressão interna” era claramente dirigida à Argentina, cuja política de neutralidade na guerra, conflituava-se com a política internacional dos Estados Unidos e cujo nacionalismo, inspirado em parte nos modelos fascistas europeus, significava uma ameaça aos interesses do grande capital norte-americano. De outro lado, a inexistência de perigo de agressão externa acentuava a intenção de solidificar a unidade continental e ipso facto a liderança dos Estados Unidos, ao restaurar a possibilidade de intervenção em um dos Estados-membros. A forma definitiva da “assistência recíproca e solidariedade americana”, acordada no México, deveria ser estabelecida na conferência seguinte, a se reunir no Rio de Janeiro, no mesmo ano de 1945. No entanto, o conflito político entre Estados Unidos e Argentina, agravado com a eleição de Perón para a presidência da República, levou a conferência a sucessivos adiamentos até 1947.

Nesse meio tempo, EUA e URSS delineavam-se como duas superpotências e sua colaboração durante a guerra esvaía-se rapidamente, com a “reversão das alianças” operada no imediato pós-guerra. A colaboração entre os dois países se transformou em competição e rivalidade e essa mudança produziu reflexos imediatos na política norte-americana para a América Latina. Tornou-se perceptível desde 1946 que os objetivos de Washington no continente americano consistiam em “consolidar uma frente anti-russa, eliminar centros de propaganda antiamericana e organizar politicamente a defesa hemisférica”, segundo o embaixador brasileiro em Washington. No plano militar, os esforços norte-americanos de coordenação do continente fizeram-se através de acordos bilaterais com cada Estado latino-americano. Desde 1945, começaram a se estabelecer modelos

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norte-americanos de organização e treinamento militar na América Latina, assim como um processo de padronização de armamentos, segundo as matrizes dos Estados Unidos. Do ponto de vista de Washington, essas iniciativas de colaboração militar bilateral deveriam criar “um flanco estável, seguro e amigável” de países alinhados, com a finalidade de “promover a segurança nacional dos Estados Unidos”, de acordo com as palavras do secretário de Defesa Patterson em carta e Dean Acheson de 17 de abril de 1947.

 A Conferência do Rio

O mesmo propósito de manter “um flanco estável, seguro e amigável” subjazia aos esforços multilaterais de “defesa hemisférica” na Conferência Interamericana do Rio de Janeiro em 1947. O esboço original dessa conferência, proposto pelo Departamento de Estado em 1945 previa o estabelecimento de uma agência militar interamericana. As dificuldades encontradas na aceitação da ideia (mesmo que tal agência funcionasse mais como fachada política do que como organismo de planejamento estratégico real) levaram o governo dos Estados Unidos a abandoná-la e limitar a Conferência do Rio à discussão sobre um tratado de assistência recíproca em caso de agressão ou ameaça de agressão.

Entre 15 de agosto e 2 de setembro de 1947 reuniram-se em Petrópolis os delegados das Repúblicas americanas para a discussão do tratado. Abandonou-se de saída, a antiga regra de unanimidade das decisões e adotou-se a da maioria absoluta (2/3 dos votos) para a adoção de resoluções, de modo a evitar que um único país pusesse a perder as moções apresentadas. Ao final do encontro, tinha-se redigido um tratado que incluía a reafirmação dos princípios básicos de resolução pacífica de disputas entre os Estados americanos; obrigações no caso de um ataque armado contra um Estado americano; consulta e medidas coletivas no caso de outros perigos à paz continental; tipos de medidas que deviam ser tomadas em cada caso e especificação de atos de agressão. A ideia básica do documento era a de que “um ataque armado por qualquer Estado contra um Estado americano será considerado como um ataque contra todos os Estados americanos”.

Não havia porém, em 1947, qualquer evidência de agressão ou ameaça de agressão contra qualquer Estado americano. Considerando-se porém a “reversão de alianças” em curso no plano internacional desde o final da guerra, o único inimigo potencial dos Estados Unidos era a União Soviética e esta desempenhou o papel de ator oculto durante a conferência. Algumas delegações desejaram mesmo discutir “medidas contra o comunismo” em nível continental, mas foram dissuadidas pela posição das representações do México e dos Estados Unidos. Marshall, que chefiava a delegação norte-americana,

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alegou que cada país deveria cuidar das medidas contra o comunismo. Em realidade um debate sobre atividades comunistas no continente tornaria claro o sentido encoberto da conferência, isto é, a articulação do sistema de poder hegemônico dos Estados Unidos no continente em contraposição ao sistema soviético, articulação da qual a “defesa hemisférica” constituía uma excelente cobertura.

 Consequências

O sistema interamericano formalizou-se mais concretamente no ano seguinte, na Conferência de Bogotá, de onde emergiu a Organização dos Estados Americanos (OEA), e na qual se instituiu o Conselho de Defesa Interamericano. Do ponto de vista dos Estados Unidos, solidificou-se nos anos seguintes a noção de que o Tratado Interamericano de Assistência Recíproca (TIAR) deveria ser um instrumento para garantir “a segurança do hemisfério ocidental e nosso acesso [leia como EUA] aos recursos do hemisfério, que sejam essenciais a qualquer projeção transoceânica de um maior poder ofensivo dos Estados Unidos”, conforme o relatório do secretário de Defesa ao Conselho de Segurança Nacional, em 31 de agosto de 1949. De acordo com este relatório, o TIAR deveria ser um instrumento dos objetivos estratégicos dos EUA para a América Latina. Estes incluíam primordialmente a produção e o fornecimento de matérias-primas estratégicas essenciais, a manutenção da estabilidade política e segurança interna de cada nação, a cooperação mútua de todas as nações latino-americanas em apoio aos Estados Unidos, a proteção de linhas de comunicação, o fornecimento de bases para uso dos Estados Unidos em caso de necessidade e outros. O TIAR, desde seu nascimento, era menos um tratado de defesa hemisférica e muito mais um canal de articulação político-militar da hegemonia norte-americana no continente. A aliança proposta pelos Estados Unidos à América Latina não visava a algum perigo externo, mas antes à consolidação das partes e do conjunto de um sistema de forças que fazia dos Estados Unidos uma superpotência ao final da Segunda Guerra Mundial.

MOURA, Gerson. Tratado Interamericano de Assistência Recíproca (TIAR). FGV CPDOC. Disponível em: <

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REFERÊNCIAS

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<http://secure.shutterstock.com/pic.mhtml?utm_medium=Affiliate&id=115806631&utm_ca

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BOITO JR, Armando. O golpe de 1954: a burguesia contra o populismo. Coleção: Tudo é História. São Paulo: Brasiliense, 1984.

FARIA, Antonio A. da Costa. Getúlio Vargas e sua Época. Coleção - História Popular, São Paulo: Global, 2001.

FAUSTO, Boris. Getúlio Vargas: O Poder e o Sorriso. Coleção - Perfis Brasileiros. São Paulo: Companhia das Letras, 2006.

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casino-roulette-casino-isometric-casino-illustration-casino-poker-ga.html?src=DM8lCYxrn0S3Fo96OdylYw-1-98>. Acesso em: 22 set. 2016. 8h45 min.

INEP. Prova Amarela do Primeiro dia do ENEM de 2005. Disponível em:

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Acesso em: 23 set. 2016. 14h30min.

WIKIMEDIA COMMONS. Atual logo da Petrobrás S/A. Disponível em:

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WIKIMEDIA COMMONS. Carlos Lacerda. Disponível em:

<https://pt.wikipedia.org/wiki/Ficheiro:Carlos_lacerda.jpg>. Acesso em: 22 set. 2016. 12h.

WIKIMEDIA COMMONS. Pijama de Getúlio Vargas com a marca do tiro no seu peito.

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WIKIMEDIA COMMONS. Presidente Getúlio Vargas. Disponível em:

<https://commons.wikimedia.org/wiki/File:Getulio_Vargas_(1930).jpg>. Acesso em: 22 set.

2016. 10h.

WIKIMEDIA COMMONS. Vice-presidente João Café Filho. Disponível em:

<https://commons.wikimedia.org/wiki/File:Cafe_Filho.jpg>. Acesso em: 22 set. 2016. 15h.

GABARITO

1. Comentário: No campo econômico, Dutra adotou uma forte política de importações de produtos norte-americanos. Esse fato fez com que as empresas brasileiras (nascidas durante a Era Vargas), sentissem os efeitos da concorrência com os produtos trazidos dos Estados Unidos. Isso fez com que muitas delas acabaram desacelerando sua produção, demitindo parte dos seus funcionários ou até mesmo encerrando suas atividades. Como consequência disso, as reservas cambiais do Brasil (deixadas por Vargas) foram diminuindo, a dívida externa do país voltou a crescer e a inflação ganhou força. Para tentar reverter esse cenário de crise, o governo Dutra decide congelar os salários dos trabalhadores (que tiveram seu último aumento em 1942).

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2. Comentário: V

V

F - Apesar de sua política ser pautada no liberalismo econômico, durante o governo Dutra não houve privatizações de empresas estatais. Aliás, a Petrobrás ainda nem havia sido criada nesse momento.

V

F - Dentro da lógica da Guerra Fria o governo Dutra se alinhou ao bloco capitalista, ou seja, aos Estados Unidos. Depois aproveitando-se desse contexto, ele rompe relações diplomáticas com a União Soviética visando justificar que sua violenta repressão contra os movimentos sociais que estavam ocorrendo no Brasil, era para combater a influência do socialismo.

3. Comentário: Logo no primeiro ano como presidente, Vargas lança uma campanha de cunho nacionalista denominada de "O petróleo é nosso". O seu objetivo era conquistar o apoio de alguns grupos políticos e um forte apoio popular para garantir a soberania nacional sobre as riquezas naturais do nosso subsolo, que vinha sendo exploradas por multinacionais, e garantir o monopólio estatal sobre elas. Assim, para administrar o petróleo brasileiro, refiná-lo e investir no aumento da produção, Vargas criou no ano de 1953 a Petrobrás S/A (empresa de capital misto onde o Estado Brasileiro controla no mínimo 51% das ações) que passou a ser a única empresa com direitos plenos sobre a pesquisa, produção, refino e distribuição do petróleo nacional.

4. Alternativa A.

Comentário: Essa alternativa aponta corretamente para o “Atentado da Rua Tonelero” que no contexto de crise do governo varguista, dificultou sua permanência no poder. Além disso, ela interpreta o suicídio do presidente como um revés político dos grupos contrários a Getúlio Vargas, uma vez que, com sua morte, ele tornou-se uma vítima de seus opositores.

Referências

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