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O ABUSO SEXUAL INFANTIL SOB A ÓTICA DA PSICANÁLISE

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O ABUSO SEXUAL INFANTIL SOB A ÓTICA DA PSICANÁLISE Sara Raísa Vieira Araujo

(sara.raisa@gmail.com)

Fundamentos da Teoria Psicanalítica – Araceli Albino

Resumo

O abuso sexual infantil é tema de grande relevância e pode ser entendido a partir de conceitos psicanalíticos, tais como a perversão, quando tratamos da figura do abusador, e da teoria do desenvolvimento psicossexual de Freud, quando consideramos a criança vitimizada. Neste estudo, buscou-se compreender o fenômeno a partir de referenciais psicanalíticos por meio de pesquisa bibliográfica. Pode-se concluir que a possibilidade de apoio familiar e psicológico constitui-se como oportunidade de minimizar possíveis danos à vítima.

Palavras-chave: Abuso Sexual, Psicanálise, Perversão.

Introdução

Desde 1990, quando o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) entrou em vigor, houve grande aumento no número de denúncias de abuso sexual infantil aos órgãos responsáveis, buscando a proteção da criança e do adolescente junto aos Conselhos Tutelares e a justiça. Segundo o artigo 130 do Estatuto da Criança e do Adolescente: “Verificada a hipótese de maus-tratos, opressão ou abuso sexual impostos pelos pais ou responsável, a autoridade judiciária poderá determinar, como medida cautelar, o afastamento do agressor da moradia comum” (BRASIL, 1990, p. 81).

Nota-se que a legislação oferece subsídios para casos de violência sexual infantil, no entanto, é importante analisar o fenômeno a partir do ponto de vista da Psicanálise, permitindo maior entendimento sobre tais eventos e buscando oferecer recursos para suporte e prevenção.

O objetivo geral deste estudo foi analisar o fenômeno da violência sexual a partir do referencial teórico da Psicanálise, observando-se as contribuições desta teoria para o entendimento do objeto de estudo.

1 – Perversão

O termo perversão, segundo Ferraz (2000, p.13), “tem origem no latim perversione, designa o ato ou efeito de perverter-se, isto é, tornar-se perverso ou mau, corromper, depravar, desmoralizar”. Já de acordo com Roudinesco e Plon (1998), o termo é derivado do latim pervertere (perverter), utilizado em Psiquiatria e pelos precursores da Sexologia para indicar as práticas sexuais tidas como anormalidades em relação a um princípio social e sexual.

Segundo Mijolla (2005, p. 1376.), “a chamada sexualidade perversa supõe a noção de uma sexualidade “normal” em relação à qual certos atos e escolhas de objeto sexual serão considerados como aberrantes”.

A perversão está originalmente relacionada à sexualidade, uma vez que diz respeito a práticas sexuais que ultrapassam o objetivo do coito. Nesses casos, o orgasmo é obtido através de práticas ou objetos desviantes do normal, sendo as perversões o resultado do desenvolvimento da pulsão sexual em zonas erógenas distintas dos genitais. No texto

Fragmentos da análise de um caso de histeria (FREUD, 1905, p. 55), Freud pontuou que:

“Na vida sexual de cada um de nós, ora aqui, ora ali, todos transgredimos um pouquinho os estreitos limites do que se considera normal”.

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Laplanche e Pontalis (1967 apud FERRAZ, 2000. p. 20) explicam a ideia inicial de Freud sobre a perversão, tratando-se de um

Desvio em relação ao ato sexual ‘normal’, definido este como coito que visa à obtenção do orgasmo por penetração genital, com uma pessoa do sexo oposto. Diz-se que existe perversão quando o orgasmo é obtido por outros objetos sexuais (homossexualidade, pedofilia, bestialidade, etc.), ou por outras zonas corporais (coito anal, por exemplo) e quando o orgasmo é subordinado de forma imperiosa a certas condições extrínsecas (fetichismo, transvestismo, voyeurismo e exibicionismo, sadomasoquismo); estas podem mesmo proporcionar, por si sós, o prazer sexual. De forma mais englobante, designa-se por perversão o conjunto do comportamento psicossexual que acompanha tais atipias na obtenção do prazer sexual. (LAPLANCHE; PONTALIS, 2001, p.341).

A expressão perversão foi retomada por Sigmund Freud a partir de 1896, e decididamente tomada como conceito pela Psicanálise, que optou por conservar a ideia de desvio sexual em relação a uma norma. Nesse novo sentido, o conceito não contém qualquer conotação pejorativa ou valorizadora e unindo-se à psicose e à neurose, se inscreve numa estrutura tripartite. O termo perversão abarca um sentido mais amplo, na medida em que os comportamentos, as condutas e até as fantasias que ele engloba só podem ser entendidos se correlacionados a uma norma social, a qual induz a uma norma jurídica (ROUDINESCO; PLON, 1998).

Em sua obra Três ensaios sobre a teoria da sexualidade (1905), Freud centralizou a sexualidade normal na genitalidade, se utilizando de pulsões parciais para distinguir a perversão. No referido texto, ele abordou a pedofilia como um desvio relacionado ao objeto sexual (FREUD, 1905).

Segundo Rudge (1999)

Essa interpretação torna-se impossível a partir de textos freudianos posteriores, já que a perversão é situada no terreno do complexo de Édipo (Freud, 1919/1971), e especificada por um certo modo de se situar em relação à angústia de castração (Freud, 1927/1971). É em torno do tema do fetichismo que Freud avançará em uma elaboração sobre o que é a perversão para a psicanálise.

Roudinesco e Plon (1998) e Valas (1990) concordam quando afirmam que a sexualidade perversa possui funcionamento contrário ao dos neuróticos. Foi uma ideia imposta por Freud, para ele “a neurose é o negativo da perversão, na medida em que só lhe concernem os sonhos ou fantasmas inconscientes, enquanto que na perversão os fantasmas conscientes podem ser transformados em comportamentos agenciados” (VALAS, 1990, p.104).

Tal sexualidade renega a proibição incestuosa, o recalque e faz o mesmo com a sublimação. Sendo assim, a sexualidade perversa demonstra não ter limites, devido ao fato dela se organizar como um desvio em relação a uma pulsão, a uma fonte, um objeto e um alvo. Dados esses quatro termos, Freud apontou dois tipos de perversões: as perversões do objeto e as perversões do alvo. As primeiras (do objeto) caracterizam-se por possuir uma fixação num único objeto, desprezando os demais. Freud “incluiu, por um lado as relações sexuais com um parceiro humano (incesto, homossexualidade, pedofilia, auto-erotismo) e, por outro, as relações sexuais com um objeto não humano (fetichismo, zoofilia, travestismo)” (ROUDINESCO; PLON, 1998, p.585).

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De acordo com Roudinesco e Plon (1998), em 1987 a expressão perversão foi trocada, na nomenclatura psiquiátrica mundial, por parafilia, que envolve comportamentos sexuais em que o parceiro ora é um sujeito reduzido a um fetiche (pedofilia, sadomasoquismo), ora o próprio corpo de quem se entrega à parafilia (travestismo, exibicionismo), ora um animal ou um objeto (zoofilia, fetichismo). E então? Como pode-se, de forma sucinta, apreender a Perversão? Roudinesco (2007 apud SANTOS; CECCARELLI, 2009) escreveu em seu último livro o seguinte:

A perversão é um fenômeno sexual, político, social, físico, trans-histórico, estrutural, presente em todas as sociedades humanas [e questiona]: O que faríamos se não mais pudéssemos designar como bodes expiatórios - ou seja, como perversos - aqueles que aceitam traduzir por seus atos estranhos as tendências inconfessáveis que nos habitam e que recalcamos? (p. 15)

Vale destacar os diversos fatores que estão envolvidos no fenômeno da pedofilia, conforme apontado pela autora no trecho transcrito a cima, devendo-se levar em consideração não apenas o caráter sexual, mas também os aspectos políticos, sociais, físicos, trans-históricos e estruturais que podem influenciar de diferentes formas no entendimento sobre o fenômeno do abuso sexual.

Em um trecho dos Três Ensaios (1905, p. 152), Freud relata que, às vezes, nos diferentes tipos de perversões, a qualidade do novo alvo sexual ocorre tão intensamente que requer uma examinação especial. De acordo com ele:

Algumas delas afastam-se tanto do normal em seu conteúdo que não podemos deixar de declará-las “patológicas”, sobretudo nos casos em que a pulsão sexual realiza obras assombrosas (lamber excrementos, abusar de cadáveres) na superação das resistências (vergonha, asco, horror ou dor). Nem mesmo nesses casos, porém, pode-se ter uma expectativa certeira de que em seus autores se revelem regularmente pessoas com outras anormalidades graves ou doentes mentais. Tampouco nesses casos pode-se passar por cima do fato de que pessoas cuja conduta é normal em outros aspectos colocam-se como doentes apenas no campo da vida sexual, sob o domínio da mais irrefreável de todas as pulsões. Por outro lado, a anormalidade manifesta nas outras relações da vida costuma mostrar invariavelmente um fundo de conduta sexual anormal.

Outro conceito da Psicanálise que pode ser utilizado para o entendimento do abuso sexual infantil é o conceito de sadismo. Sadismo é o prazer obtido com a crueldade infligida a outrem. Seu nome lhe foi dado por Krafft-Ebing em referência aos escritos do marquês de Sade. Em 1905, nos Três ensaios sobre a teoria da sexualidade, Freud descreveu o sadismo, forma ativa, formando um par de opostos com o masoquismo, forma passiva da mesma perversão sexual (MIJOLLA, 2005).

2 – Desenvolvimento psicossexual infantil

A teoria do desenvolvimento psicossexual da obra de Freud defende a ideia de que as crianças, desde o seu nascimento, têm sensações de prazer e satisfação sexual. Hall, Lindzey e Campbell (2000) afirmam que a criança, durante os primeiros anos de vida, passa por estágios distintos de desenvolvimento, o que é confirmado pelo próprio Freud, e em cada estágio desse desenvolvimento uma área específica do corpo é tomada como zona erógena, o que caracteriza as fases do desenvolvimento psicossexual.

A primeira dessas fases é a fase oral, que se inicia no nascimento da criança e se estende até em torno dos dois anos de vida. É evidente que neste período a criança é

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completamente dependente da mãe, e a única forma que a criança encontra para satisfazer suas necessidades básicas é o choro. Através do choro a criança cria vínculo emocional com sua mãe, por ser ela quem desperta a satisfação do prazer na criança por meio da amamentação. O ato biológico do amamentar provoca prazer na criança (sentimento de gratificação), que de certa maneira é registrado na memória do bebê (FREUD, 1916).

Freud (1905), em sua obra Três Ensaios sobre a Teoria da Sexualidade, nos diz que os lábios da criança são como uma zona erógena e o estímulo gerado pelo fluxo do leite provoca uma sensação de prazer, inicialmente associada à satisfação da fome. Essa sensação de prazer faz com que o bebê associe o prazer ao ato de sugar. Posteriormente, quando a criança sente outra vez o desejo e não é atendida imediatamente, leva o polegar à boca e simula o ato de sugar gerando assim certo prazer, porém diferente de quando suga o leite no seio materno.

“O componente erótico, que é satisfeito simultaneamente durante a sucção [nutricional], torna-se independente com o ato da sucção sensual [lutschen]” (FREUD, 1916). É possível observar aí que o bebê desenvolve certa independência com a sensação de prazer, encontra em si mesmo outras áreas erógenas; tem-se então o chamado auto-erotismo. O fato é que os lábios exercem função libidinal na fase oral, já que a criança para conhecer o mundo que a cerca leva tudo à boca para sua experimentar e fazer associação. Zimerman (1999) aponta ainda para a possibilidade de distinguir duas sub-etapas nessa fase: a fase oral passivo-receptiva e a fase oral ativo-incorporativa.

Após a fase pré-genital oral, Freud (1905) aponta para a fase anal. Segundo o autor, esta fase inicia-se na vida infantil na idade de um a dois anos de idade e está relacionada à estimulação erógena do ânus pela retenção das fezes, ou seja, a criança consegue ter certo controle fisiológico sobre seus esfíncteres anais e sobre bexiga. Dois aspectos caracterizam bem este estágio, um diz respeito à expulsão das fezes e o outro consiste na sua retenção, ambos provocando prazer na criança. Porém a forma com a qual a informação da necessidade de retenção das fezes chega à criança pode ser refletida de diversos modos.

Aqui também Zimerman (1999) aponta para uma sub-divisão: fase anal expulsiva e fase anal retentiva. O autor relata sobre a importância desta fase para o desenvolvimento de sentimentos sádicos e masoquistas, a ambivalência, as noções de poder e de propriedade, a rivalidade e competição, e o surgimento de dicotomias.

A fase que se segue, denominada fálica, ocorre em torno dos quatro a cinco anos, e é caracterizada pela percepção das diferenças anatômicas dos órgãos sexuais. O menino exalta seu pênis (falo) e a menina percebe sua falta (ou o seu não desenvolvimento). Nessa fase é comum o auto-erotismo através da masturbação infantil, em que a criança fricciona seu pênis para obter prazer (FREUD, 1925).

Após a fase fálica se iniciará um período conhecido como Período de Latência, e que se estenderá até o principio da puberdade. É um período de desenvolvimento físico e intelectual, onde ocorre uma repressão da sexualidade e uma certa amnésia com relação à experiências vividas anteriormente, é também quando a criança é despertada para as atividades escolares (ZIMERMAN, 1999).

Tendo passado por este período e entrando na puberdade, ocorrerá a Fase Genital que se estenderá por toda a vida adulta, sendo considerada uma fase plena de desenvolvimento. Esta fase, no entanto, não será detalhada nesta revisão teórica, pois nos restringiremos ao período infantil, que condiz com o tema do estudo.

Ainda sobre o desenvolvimento psicossexual, Zimerman (1999) afirma que em cada momento da evolução humana alguns vestígios ficam gravadas no psiquismo, podendo caracterizar o que Freud nomeou como sendo pontos de fixação. Esses pontos podem funcionar como espécies de imãs para os quais a pessoa pode se voltar, caracterizando o movimento de regressão.

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Estes pontos são definidos por meio de uma exagerada gratificação ou exagerada frustração, de modo que, diante de angústias insuportáveis, a regressão se dá numa tentativa de retornar a um momento considerado gratificante ou como uma tentativa de resgatar as frustrações vivenciadas (ZIMERMAN, 1999).

3 – Consequências emocionais do abuso para a criança

Segundo Aded et al. (2006), o abuso sexual é uma das formas mais danosas de violência, no entanto, a prevenção e as formas de amenizar suas consequências ainda não constituem-se como foco de estudos e trabalho. A experiência do abuso sexual pode afetar o desenvolvimento cognitivo, afetivo e social de crianças de diferentes formas e intensidade. Os diversos fatores associados ao abuso também devem ser considerados, visto que contribuem para o desenvolvimento de consequências psicológicas severas para a criança, que se não tratadas podem se perpetuar por toda a vida.

De acordo com Pfeiffer e Salvagni (2005), o fato do desenvolvimento cognitivo das crianças ainda ser imaturo na idade pré-escolar, sendo que nesta faixa etária elas ainda possuem pouca percepção do mundo, somados à dificuldade de linguagem, dificultam sua compreensão dos fatos e, consequentemente, a denúncia, acompanhamento e avaliação dos casos. Já na fase escolar e da adolescência, as barreiras são outras: a vergonha, a culpa e a sensação de estarem desprotegidos ou a conivência por parte dos responsáveis, somadas ao fato de que ainda não possuem a completa formação dos valores morais (maior ou menor, dependendo do meio familiar e dos vínculos afetivos), além ainda da dificuldade ou impossibilidade de diálogo com pais ou responsáveis não envolvidos diretamente no abuso, tornam a denúncia um fato ainda mais raro.

São várias e severas as consequências do abuso sexual infantil. A curto prazo, trazem prejuízos tais como: dificuldade de adaptação sexual, ansiedade com assuntos sexuais, aumento das práticas masturbatórias, súbito aumento das atividades heterossexuais, desenvolvimento prematuro e discrepante dos interesses e da independência do adolescente. Assim, a criança se sente impossibilitada de controlar as demandas sexuais, podendo vir a apresentar desespero relativo (ADED et al., 2006).

Pfeiffer e Salvagni (2005) destacam ainda alguns sinais posteriores provenientes do abuso sexual, que na opinião dos autores deve ser considerado como uma predispositor a sintomas como fobias, ansiedades e depressão, bem como envolvimento de um transtorno dissociativo de identidade, também conhecido como transtorno de personalidade múltipla, com possibilidade de comportamento autodestrutivo e suicida.

Mudanças súbitas e extremas, tais como distúrbios alimentares e afetivos, comportamentos agressivos ou de autodestruição e pesadelos, podem ser observados em crianças e adolescentes em situação de abuso sexual. Medo, perda de interesse pelos estudos e brincadeiras, dificuldades de se ajustar, isolamento social, déficit de linguagem e aprendizagem, distúrbios de conduta, baixa autoestima, fugas de casa, uso de álcool e drogas, ideias suicidas e homicidas, tentativas repetidas de suicídio, automutilação e agressividade também têm sido descritos. A dificuldade em fixar memórias relativas ao abuso pode estar presente em crianças menores, entre 3 e 10 anos de idade (ADED et al., 2006).

Segundo Kaplan, Sadock e Grebb, (1997), crianças de até 3 anos de idade geralmente não verbalizam uma recordação de traumas ou abusos passados, contudo suas experiências podem ser reproduzidas em seus jogos ou fantasias.

De acordo com estudos apresentados por Sanderson (2008), os impactos e probabilidades de traumas decorrentes do abuso sexual dependem da frequência e duração do período em que a vítima ficou exposta ao abuso, da idade e época em que ocorreu, dos tipos de atos sexuais sofridos, da relação entre abusador e vítima e dos efeitos da revelação do abuso.

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Na visão da Psicanálise, os aspectos relacionados à representação simbólica do abuso e as respostas do funcionamento psíquico formam a base para a compreensão das reações frente às experiências abusivas. No caso específico do abuso sexual infantil, as memórias do trauma estarão relacionadas às fantasias sexuais agressivas desse período. A falta de capacidade da criança de conter o [des]afeto, o significado e a estruturação da experiência vivida colocam o trauma numa organização desordenada, a qual ocasiona vivências de isolamento pessoal e sintomas de ansiedade e pânico. Portanto, resta à criança uma forma elaborada de funcionamento que consiste em isolar as experiências ruins, separando-as de outras vivências psíquicas (MALGARIM, 2010).

Se considerarmos os conceitos de fixação e regressão, descritos acima, podemos refletir sobre como uma experiência de tal teor emocional pode causar inserções específicas no psiquismo, tornando-se pontos de fixação, que poderão acarretar em consequências emocionais posteriores.

No entanto, quando o abuso sexual é reconhecido e interrompido em fase precoce e há participação da família no tratamento, espera-se melhores resultados no acompanhamento das vítimas (PFEIFFER; SALVAGNI, 2005).

Considerações Finais

Vimos que desde a implementação do Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) o número de denúncias de abuso sexual infantil aumentou consideravelmente, entretanto, em muitos casos o assunto continua silencioso e ainda cultivado pela cultura da ignorância.

Hoje em dia a violência sexual infantil é tida como um problema de saúde pública por diversos motivos, seja pelo número de casos que tem aumentado, seja pelas consequências físicas, psicológicas e sociais nas vítimas e suas famílias. Desta forma, o acompanhamento psicológico de crianças que tenham sido vítimas de violência sexual é fundamental. No entanto, como já mencionado, os efeitos que tais violências causarão em cada criança não podem ser generalizados, pois a gravidade e a quantidade das consequências dependem da singularidade da experiência de cada vítima, bem como da forma e duração de ocorrência dos abusos (SANDERSON, 2008).

Também foi possível refletir sobre o fenômeno a partir dos conceitos da teoria psicanalítica, sendo que pode-se propor novos estudos que enfoquem a pessoa do abusador. Por fim, espera-se ainda que este trabalho sirva para fomentar novas pesquisas sobre o tema considerando sua importância.

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