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AS CONDIÇÕES SOCIOAMBIENTAIS DA PESCA EM NOVA DESCOBERTA-SE, BRASIL

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Academic year: 2020

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International Scientific Journal – ISSN: 1679-9844 Nº 2, volume 12, article nº 2, April/June 2017 D.O.I: http://dx.doi.org/10.6020/1679-9844/v12n2a2 Accepted: 02/09/2016 Published: 24/06/2017

ISSN: 16799844 – InterSciencePlace – International Scientific Journal Páginas 15 de 173

AS CONDIÇÕES SOCIOAMBIENTAIS DA PESCA EM NOVA

DESCOBERTA-SE, BRASIL

THE SOCIAL AND ENVIRONMENTAL FISHING

CONDITIONS IN NOVA DESCOBERTA-SE, BRAZIL

Ronaldo Gomes Alvim1; Ajibola Isau Badiru2; Mary Lourdes Santana Martins3

1

Universidade Tiradentes/AL, Maceió, Alagoas, Brasil, e-mail: alvimrg@yahoo.com.br

2

Universidade Tiradentes/AL, Maceió, Alagoas, Brasil, e-mail: ajibolacanada@hotmail.com

3

Universidade Federal de Sergipe/São Cristóvão, Sergipe, Brasil: marylugeo@yahoo.com.br

Resumo: O presente estudo faz parte de uma pesquisa desenvolvida sobre

a condição de vida dos pescadores tradicionais da comunidade de Nova Descoberta localizada no município de Itaporanga D’Ajuda, ao sul do litoral de Sergipe, Brasil e a 30 km de Aracaju, capital do Estado. A pesquisa de campo teve como objetivo compreender como a comunidade de pescadores vive e percebe seu entorno. Para a obtenção dos dados, foram realizadas entrevistas com aplicação de questionário semiestruturado aplicando a técnica de seleção de snow-ball, que contou com a participação de 30 profissionais que trabalhavam fundamentalmente com a pesca artesanal como forma de subsistência. Foi considerado entre os aspectos do cotidiano como: aspectos que envolvem as relações familiares, e as condicionantes socioeconômicas, ambientais e sociais que vem afetando a região ao longo das últimas décadas. Também foi incorporada a dinâmica da pesca como padrão de subsistência, qualidade e quantidade dos recursos. De acordo

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ISSN: 16799844 – InterSciencePlace – International Scientific Journal Páginas 16 de 173 com os resultados levantados, ficou constatado que a comunidade pesqueira na região vem vivenciando ao longo dos últimos o aumento do estado de privação e pobreza gerada pela diminuição da pesca e que a crise tem sido minimizada devido à distribuição das bolsas do Governo Federal.

Palavras-chave: Ecologia Humana; Interdisciplinaridade; pesca artesanal.

Abstract: This study is part of a research developed on the living condition of

the traditional fishermen called Nova Descoberta community located in Itaporanga D’Ajuda municipal area, southern coast of about 30 km from Aracaju the State capital of Sergipe, Brazil. The main objective of this survey is to understand how the community of fishermen live and work together with the nature and environment. Through semi-structured interview and by applying the snow-ball selection technique, several data about living condition were obtained on 30 traditional professionals that are engaged in artisanal fishing. Survey was conducted on the report provided on maintenance and other aspects, considering their daily work of living. Family relationships, socioeconomic conditions, fishing instruments are also incorporated as standard quality and quantity aspects, connecting living and environmental resources. The social and historical changes over the past decades have greatly affected the coastal community in the state. Environmental impacts have contributed directly to the actual community standard. Fishing occupation has witnessed the process of deprivation and poverty due to the decline of available resources. Although the Federal grants from the government have aided subsistent fishing occupation from such adversity, their actual living conditions is critical, needing immediate measures.

Keywords: Human ecology; interdisciplinary; artisanal fishing.

1. Introdução

O Brasil apresenta uma grande diversidade de ecossistemas costeiros ao longo dos seus 4,5 milhões de quilômetros quadrados de Zona Econômica Exclusiva (ZEE). No nordeste do país especificamente,

a zona costeira apresenta muitos estuários de pouca extensão marginados por manguezais. (...) são frequentes os recifes de arenito que criam regiões protegidas de pouca profundidade. (…) a diversidade de espécies é alta,

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ISSN: 16799844 – InterSciencePlace – International Scientific Journal Páginas 17 de 173 mas suas abundancias são baixas (Castello, 2010 p.2).

No estado de Sergipe, o menor estado da Federação, segundo o boletim estatístico da pesca e aquicultura do Ministério da Pesca de 2009, embora seja o penúltimo estado em nível de pesca extrativa, há de considerar a importância da atividade extrativista para as comunidades locais com mais de vinte mil pescadores registrados, condição que demonstra a importância social e econômica da atividade pesqueira executada majoritariamente por pescadores artesanais, grupo este que

se caracteriza pela simplicidades (sic) tecnológica (uso da propulsão natural ou de pequenos motores, barcos instrumentos artesanalmente feitos pelos próprios pescadores), pelo trabalho familiar sem a prática do assalariamento. Neste tipo de produção, os mesmos processos e tarefas (náuticas, de captura, desembarque e distribuição do peixe), são desempenhados pelos mesmos grupos de trabalho. (Carneiro 1993: 25) Estes conhecimentos marcam a prática social, econômica e ambiental que tendem a formar a base cultural que se manifesta em cada grupo e em cada comunidade e, por outro lado, tendem de certa maneira, gerar conhecimentos sobre valores ecológicos dos animais como citam Claret, Ramires e Barella (2005). São condições que formarão a partir das práticas coletivas e a partir de suas experiências marcadas pelos acertos e erros, ao longo do tempo, através da oralidade, o saber tradicional como base de sua sustentabilidade de socioambiental. Tais valores criados pelos saberes tradicionais dos pescadores artesanais a partir de suas práticas cotidianas que, de certa forma, marcam, transformam e recriam bases de sua consciência sensível e coletiva própria já que sua visão de mundo e uso dos seus recursos estão essencialmente ligados à subsistência e manutenção do padrão socioambiental embora não deixa de ter em si a necessidade do comércio, situação que permite a subalternidade social dos trabalhadores (...) frente ao lucro e ao acúmulo capitalista efetivado por atravessadores e empresas de pescados (RAMALHO, 2010 p.2010).

Da mesma forma, a concepção de trabalho parece ultrapassar o sentido da captura pois, seu sentido é ao mesmo tempo, a força física e sociabilidade nos quais circulam elos familiares, mitos, maneiras de humanização das águas e dos pescados, tempos e ritmos próprios, costumes tradicionais, lógicas econômicas que não se apartam de outros vínculos societários pesqueiros” (RAMALHO;

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ISSN: 16799844 – InterSciencePlace – International Scientific Journal Páginas 18 de 173 NEGREIROS, 2009, p. 278).

A atividade laboral da pesca artesanal em relação às ciclicidades ambientais, onde os recursos nem sempre são abundantes, de muitas maneiras evita por um lado o sentido de prosperidade do trabalhador e o sucesso se dão pelo conhecimento, prática e habilidade do sujeito. Por outra parte, o baixo poder aquisitivo impede a aplicação de recursos na aquisição de instrumentos ou tecnologias mais modernas que o permite terem acesso mais abundante durante o ano, dando ao grupo, o caráter de baixo impacto ambiental.

Na visão de Alvim (2012a, p.108), outra condição que retrata a questão do trabalho do pescador é a situação sub-humana da atividade pela forma precária como executam. É repetitivo, requer grande rigor físico sendo que, em muitas ocasiões, é necessário executar a tarefa mais de uma vez ao dia pela dificuldade de se encontrar a quantidade adequada de recursos que a própria dinâmica ambiental - abundancia ou escassez - pode resultar, condição que afetou a saúde da grande maioria dos trabalhadores.

Discussões sobre a dinâmica de vida dos pescadores artesanais partem, sobretudo, das concepções científicas da Ecologia Humana que procura reconstruir e reconhecer o valor social e cultural que tendem dirigir-se a compreensão do uso dos recursos em toda a sua dimensão e as estratégias de encontradas pelos grupos de sobrevivência ao longo da trajetória do grupo, motivo da fixação, organização, habilidade, técnica usada ou construída e habilidade na arte da construção de artefatos e na pesca.

Partindo desta visão, Estudos a partir da Ecologia Humana tentam construir a realidade a partir da visão atomizada do sujeito para a pluralidade perceptiva das comunidades envolvidas nos estudos como cita Morán (1990, p.34) numa

tentativa de integrar o conhecimento sobre a diversidade de comportamento das populações humanas com os sistemas dentro dos quais tais populações se encontram, invalidando a ideia de que representa um ‘reducionismo materialista’.

Isto se deve ao fato de ser uma ciência interdisciplinar por adentrar em áreas como a sociologia, antropologia, geografia, economia, demografia, história e várias outras (Bates & Lees 1996; Bates 2005; Alvimc 2014), construindo uma teia de

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ISSN: 16799844 – InterSciencePlace – International Scientific Journal Páginas 19 de 173 conhecimentos ou propostas de trabalhos em que cada campo trabalha dentro de suas bases filosóficas sem deixar de lado as demais. No aspecto biológico, a Ecologia Humana busca, sobretudo, retratar a interdependência entre os organismos onde as forças encontram padrões de sustentabilidade e, desta maneira, ultrapassa conceitos atomizados de conservação e preservação a partir da compreensão e alienação do seu entorno (Alvimb 2012).

Na condição de formação de valores tradicionais a percepção e transmissão de informações não deixam de lado seu pensamento e valor científico não acadêmico, pois como cita Diegues (2003: 12),

o conhecimento tradicional na pesca é cumulativo, produzido por gerações sucessivas; é empírico, pois deve se confrontar com o teste da experiência diária; é dinâmico no sentido que ele se transforma em função das mudanças socioeconômicas, tecnológicas e físicas.

Compreender assim, tais comunidades, sobretudo a partir de valores da Ecologia Humana é, na verdade, conhecer a dinâmica da sustentabilidade ambiental para as sociedades de risco apregoado por Beck (1998) já que se observa a interferência apenas como uma dinâmica que se desenvolve de forma respeitosa com o entorno. É entender a postura convergente e interdependente entre homem e o meio físico-natural e como estes se entrelaçam e formam o caráter, a percepção, o conhecimento e a interpretação das suas ações em relação ao meio físico natural.

Além disso, é analisar a sobrevivência pessoal, familiar e de seu grupo social e a forma como estes grupos percebem, tomam ações e geram valores sociais a partir da compreensão das condicionantes ambientais (TUAN 1980; MARTINS, ALVIM e RAMALHO, 2015) considerando os acertos e erros do passado para poder organizar-se social e culturalmente utilizando estratégias e materiais comuns de captura dos recursos naturais a partir da compreensão dos ciclos da natureza e a dinâmica hidrológica e biológica das espécies.

Por outro lado, os conhecimentos das populações tradicionais não lhes asseguram sustentabilidade já que esta condição depende de dois aspectos fundamentais: o primeiro de ordem biológica é regido pela dinâmica populacional das espécies de interesse que cria variações de abundancia ou escassez ao longo do tempo. O segundo, de ordem socioeconômica, é influenciado pelo uso de tecnologias, modernas ou crioulas, capaz de interferir na resiliência do ecossistema

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ISSN: 16799844 – InterSciencePlace – International Scientific Journal Páginas 20 de 173 e afetar na capacidade de oferta de pescado (Rosa & Alves 2007; Maldonado 1993)

Assim, como salienta Cunha (2009: 61) que neste sentido,

é a modalidade da pesca que comanda o horário cotidiano do pescador artesanal perpassando tanto a vida laboral quanto a vida sociocultural como um todo, marcada por temporalidades distintas.

Partindo deste contexto, propôs-se estudar de forma multidisciplinar a dinâmica de vida dos pescadores artesanais tradicionais da comunidade de Nova Descoberta e como eles percebem suas ações influenciam e são influenciadas na sua dinâmica de vida seja em nível social ou ambiental a partir do seu modus vivendi.

2. Área da pesquisa

A comunidade da Nova Descoberta está localizada no município de Itaporanga D’Ajuda, no estado de Sergipe, Nordeste do Brasil, a 27 quilômetros de Aracaju, capital do Estado de Sergipe, entre as Coordenadas 10º 59' 53" latitude Sul e a 37º18'38” longitude Este de Greenwich (Mapa 1).

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Mapa 1: Vista aérea do povoado de Nova Descoberta

A região tem parte de suas terras localizadas na Área de Proteção Ambiental do Litoral Sul, Unidade de Conservação de âmbito estadual devido não apenas a sua grande beleza cênica, mas principalmente devido à presença das maiores áreas de restinga, manguezais e fragmentos de Mata Atlântica do Estado (Fonseca et al. 2009).

Embora cada um dos ambientes citados tenha sua importância fundamental para a existência do outro, o ecossistema mangal, para o contexto humano, foi a principal fonte de recurso para a população de baixa renda que encontrou na atividade pesqueira, sua condição de sobrevivência.

Nas últimas décadas, a degradação ambiental gerada pela instalação de indústrias de alimento e de celulose na região, a especulação financeira, a implantação da produção de carcinicultura, o despejo de resíduos urbanos além da sobrepesca devido ao crescimento populacional e demanda pelo recurso. A somatória destes efeitos vem gerando significativos impactos não apenas em relação ao recurso, mas também, na condição de vida dos pescadores artesanais que não encontram outra forma de se inserir no mercado de trabalho local.

Desta feita, propôs-se identificar as condições socioambientais que envolvem/envolveram tal grupo a partir de suas relações e como estes tem encontrado alternativas de o histórico das ações .

3. Materiais e métodos

O trabalho de investigação foi realizado entre os meses de março e maio de 2011 no povoado de Nova Descoberta, município de Itaporanga D’Ajuda, Sergipe e contou com um estudo prévio obtido junto às fichas cadastrais dos membros da Associação de Pescadores do povoado, considerando os principais aspectos: o número total de pescadores, gênero, faixa etária e tempo de associados.

De posse dos dados iniciais, foi elaborado um questionário pré-teste de ordem socioeconômica e ambiental que após a validação, aplicou-se o definitivo a um grupo de 30 pessoas que tinham na atividade pesqueira sua fonte principal de

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ISSN: 16799844 – InterSciencePlace – International Scientific Journal Páginas 22 de 173 subsistência.

Utilizou-se para esta fase, a apresentação de um Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE) de forma a explicar o motivo da pesquisa e as restrições quanto a divulgação das informações obtidas, bem como sua participação voluntária.

Para a obtenção da informação, utilizou-se a técnica de Bailey ou “Snow Ball” (bola de neve), sistema seletivo que parte da seleção, escolha ou indicação de um provável entrevistado indicado e reconhecido socialmente por membros da própria comunidade (Albuquerque & Lins Neto 2010).

Para manter a imparcialidade durante a realização da pesquisa, solicitou-se da presidente da associação de pescadores do município de Nova Descoberta, em primeiro momento, indicação de cinco entrevistados que pudessem fazer parte da pesquisa.

A cada entrevista realizada, ao pescador era solicitado o nome de outros cinco prováveis pescadores entrevistados, dando liberdade quanto à escolha do provável participante e/ou gênero, ser profissional ou não da pesca.

Caso houvesse indicação de mais de uma pessoa que já participou ou tivesse membro da família entrevistada e que atuasse como pescador, considerou-se apenas um dos seus membros a participar, julgando que a probabilidade de estes terem a mesma visão sobre o entorno socioambiental tende a ser a mesma.

Com o intuito em não perder as informações, além dos registros feitos no questionário, foi utilizado também gravador digital.

Para a pesquisa, fez-se o uso da técnica de entrevista semiestruturada e de caráter qualitativo através de um roteiro predefinido dentro do tópico ao qual se propõe considerar relevante e, assim, poder conhecer com maior profundidade as experiências vividas e observadas da realidade do informante como as condições de vida que envolva sua família e comunidade, sua relação com o entorno social, as atividades econômicas e a qualidade dos recursos naturais bem como as práticas de sustentabilidade, moradia, saúde, compreensão do entorno físico-natural que possam demonstrar a realidade em que vivem.

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4. Análise das entrevistas

Durante a realização das entrevistas, foram selecionados de acordo com o método Snow Ball, 22 pescadores de ambos os gêneros do povoado considerando aqueles indicados pelos(as) colegas de profissão de maior influência e/ou frequência nas indicações e/ou líder comunitário. Destes, 59% foram pesquisados do gênero Masculino e 41% do gênero feminino sendo, destes, apenas 42% registrados na Associação de Pesca. Destes, 64% são casados; 27% solteiros e 9% encontram-se são viúvos(as) e separados(as) (Figura 1).

Figura 1 - Estado civil dos entrevistados

Na sua maioria, são pescadores com idades predominantes entre 31 e 40 anos, 41% dos entrevistados, seguidos por aqueles com 51 e 60 anos, 27%; 41 e 50 com 14%. As menos representativas foram aqueles com idade maior ou igual a 61 anos, seguido por aqueles com a faixa de 21 e 30 anos e menores ou igual a 4% (Figura 2).

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ISSN: 16799844 – InterSciencePlace – International Scientific Journal Páginas 24 de 173 Uma das condições que chamam atenção nesta comunidade é a vontade dos pais de ter seus filhos em outra profissão. Indagados quanto a oportunidade e incentivo de exercerem outra profissão, estes, a maior parte, 77%, informaram que esperam que a vida de seus filhos seja diferente a da deles e relatam:

"é o que eu quero. A vida da maré, pois pra pensar em ter alguma coisa tem que trabalhar muito"; "acredito que sim porque tão estudando. Talvez pegue um emprego melhor do que o meu"; "estou exigindo que eles tenha uma vida melhor. a falta de estudo é ruim e tendo um estudo melhor a vida e emprego é melhor"; "a vida da maré é muito difícil, tem dias que ganha tem dias que não ganha nada. eu pesco sempre mas o dinheiro que ganho é pouquinho"; "se depender de mim vão estudar pra trabalhar melhor"; “acho que é muito melhor que a vida que nos veve. acho que é um trabalho muito fraco. para estudar o que eu fiz, não quero sofrimento"

Para outros(as) 9%, parece ficar constatado certa resignação quanto ao futuro diferente dos filhos. Em suas declaratórias acreditam que não há muito que fazer para mudar o atual paradigma.

“porque sou pescador e os maridos delas também são, foram criados na pesca"; "porque nascemos e se criemos aqui, vivemos da maré, toda vida acreditei que eles fosse também pescadores como eu";

Para os 14% restante, não tinham posição formada ou não quiseram se declarar. Esta ideia é reforçada pela própria impressão que os pais observam do comportamento dos seus filhos quando analisam a situação precária em que vivem como:

"na maré não sabem fazer nada, nem remar"; "porque eles num vai querer pescá. Acredito que eles vão só de passeio"; "nunca gostou de pescar"; “estão trabalhando pra isso. Eles vê meu sofrimento e diz que não quer a pesca";

O restante, 14%, não deram uma opinião concreta como foi o caso de um pescador que disse: “isto depende deles”, ou não souberam responder ou não quiseram.

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ISSN: 16799844 – InterSciencePlace – International Scientific Journal Páginas 25 de 173 Figura 4 – Perspectiva de futuro melhor dos filhos dos pescadores

A precariedade da condição de vida deles é observada a partir do retorno financeiro que eles obtiveram com a captura e venda dos recursos extraídos nos rios da região nos últimos 15 dias. Segundo eles, 50% dos entrevistados obtiveram ganhos financeiros que variam entre R$ 101 e R$ 200; 23% alcançaram valores iguais ou abaixo dos R$ 100 Reais; 9% alcançaram valores entre R$ 201 e R$ 300; 4% conseguiram valor igual ou maior que R$ 301; 14% não souberam ou não quiseram declarar. Se considerarmos que o salário mínimo no Brasil naquela época era de R$ 622, estes sobrevivem com menos de um salário.

Na tentativa de compreender o fato de terem um salário muito abaixo do valor oficial do país, alguns declararam que a atividade de pesca era essencialmente para a sua sobrevivência ou de sua família, o restante para troca de mercadorias ou venda para compra de bens.

Para eles, sobretudo aos casais com filhos, o complemento do Governo Federal tem sido um grande aporte à compra de produtos que antes era pouco provável ocorrer. Daqueles que recebem subsídio, 50% declararam receber bolsa família ou bolsa escola1.

1

Os benefícios são concedidos mensalmente pelo Governo Federal que tem como proposta principal combater a fome e a miséria das famílias mais carentes do país.

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ISSN: 16799844 – InterSciencePlace – International Scientific Journal Páginas 26 de 173 Figura 5 – recurso financeiro da atividade pesqueira nos últimos 15 dias

Sobre a qualidade alimentar, perguntou-se se eles faziam uso recursos naturais que pescavam/coletavam. 86% dos entrevistados afirmaram consumir frequentemente tais recursos; 9% de vez em quando, fazendo rodízio com outros tipos de carne e 5% informaram que vendem tudo para comprar outros alimentos (Figura 6).

Figura 6 - voces comem o que pescam?

Em relação a venda dos produtos coletados, 57% vendem no povoado ou na sede do município uma vez que eles acreditam que consigam maior recurso financeiro, enquanto 38% consideram mais fácil entregar ao atravessador; 5% pegam para o seu sustento conforme relatam:

“vou na cidade porque pego meu dinheiro e compro alimentação. Na cidade vendo mais em conta e aqui tem que vender mais barato para o atravessador”; “cambista gosta de comprar de graça; ganha mais”; “assim a renda é melhor”; “porque o povo procura no bairro ou na feira”; “vendo de porta em porta”; “é mais fácil vender pra eles”; “eles pegar o produto na minha porta”; “eles já tem seu comprador”; “para mim é mais difícil porque

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ISSN: 16799844 – InterSciencePlace – International Scientific Journal Páginas 27 de 173 tenho que pegar ônibus”; “perco muito tempo vendendo”; “é pra nós comer, o que sobra vende para comprar outros produto”.

Figura 7 - o que faz com os recursos da pesca?

Considerando que o recurso financeiro é pequeno para a família, 80% deles fazem uso da terra para plantarem, sobretudo macaxeira, milho e feijão e 59% criam animais como galinha e porco como suplemento.

Quando indagados sobre a disponibilidade atual de pescado em relação ao passado, pode-se constatar que há uma preocupação dos pescadores. 86% declararam que há uma diminuição dos recursos e 14% consideram que não houve, ao longo do tempo alguma modificação e a maioria não soube explicar o motivo sua resposta. Nenhum deles julgou haver aumento. Os comentários, em sua maioria se prendem ao crescimento da demanda, do número de pescadores e o impacto dos motores de popa que afugentam os recursos. Dentre suas declaratórias, vale destacar:

“antigamente pegava um cesto e vendia. Hoje passa a semana pescando e não enche o cesto. Antes pegava uns 15 quilos, hoje não chega a 3”; “por causa do tempo e porque tem muito pescador”; “acho que é porque estão pescando demais”; “eu acho que é porque aumentou o número de pescadores no povoado”; “porquê as coisas mudaram ... a zoada do motor espanta os bichos. Antes não tinha barco a motor e hoje são vários suando dentro d’água”; “tem muita gente indo”; “tem muita gente pescando com tarrafa. Tem gente que passa o dia todo pescando”; “a população tá grande. Muita gente pesca. Antigamente se fosse matriculado (registrado) era pela capitania e a capitania ficava de cima”; “por causa dos barco que espanta os peixe”; “por causa de uma rede que chama rede de camboa. O peixe foge”; o marisco está ficando mais pouco. Tem semana que pega nada. Meus pai colocava a rede e não tinha como carrega de tanto bicho”; “porque pega todo tipo de peixe. Pequeno, grande não tem conscientização e agora para recuperar é difícil”; “Os pescador atingo pegava a camboa e 5 a 6 pessoas trazia tudo, hoje uma só pessoa carrega”; “a nação é demais. Se for verificar a quantidade de gente que trabalha sem carteira”; “porque tem muito pescador”; “tá 100%. Porque aumentou os pescador e diminuiu os

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ISSN: 16799844 – InterSciencePlace – International Scientific Journal Páginas 28 de 173 peixes”; “quantidade de pescador e muito motor”;

Figura 7 – Relação da quantidade de recursos pesqueiros ao longo dos anos

Em relação a atividade pesqueira, perguntou-se qual a opinião sobre o prazer que encontram no seu trabalho. 50% dos entrevistados declaram gostar do seu trabalho mas não deixam explícito em suas falas o porquê. Na verdade, verifica-se que o fazem por falta de oportunidades em outras áreas como demonstra em suas declaratórias:

“Gosto, mas é puxado”; “não tem outro jeito mesmo”; “não tem outro jeito mesmo, só não gosto por causa dos meus problemas de saúde e porque ganho pouco”; “estou acostumado; tem que gosta, senão não faz nada”; ”se me criei nisso, mesmo sofrendo faço o que tem que fazê”; “mas porque não tem outro serviço”. "mas é puxado"; "Se eu pudesse morava na maré. O trabalho é esse mesmo"; "Se me criei nisso, mesmo sofrendo, faço o que tem que fazer"; "Tô acostumado";

Outro grupo, 23% dos entrevistados, relatam que não gostam da atividade porque veem um trabalho árduo e de pouco retorno para a família e comentam:

“Queria ser fichado”; “vou porque é o que tem. A maré é dura”; “é ruim ficar doze horas acordado”; “agora não gosto por causa da idade e das dores”. Por outro lado, 18% declaram amar seu trabalho, mas não souberam dar uma explicação o porquê deste fato; 9% não soube dizer ou não quis responder (Figura 8 ).

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ISSN: 16799844 – InterSciencePlace – International Scientific Journal Páginas 29 de 173 Figura 8 - como voce definiria seu interesse pela profissão?

5. Considerações finais

De acordo com os resultados confirma, não há como negar que há um grande desconforto com a atual situação pela qual passam os pescadores do povoado de Nova Descoberta que veem, ao longo dos anos, os recursos naturais que fazem parte de suas subsistências.

Mesmo sendo profissão tradicional, os relatos mostram que a atividade pesqueira tradicional é árdua, repetitiva e pouco remunerativa, chegando a maioria declarar que recebem menos que o salário mínimo. Tal situação, para eles, torna a profissão desinteressante e um ponto forte de desinteresse dos filhos em seguir a profissão dos pais que só procuram pescar quando necessitam comprar alguma coisa.

A ausência de uma cooperativa ou de um mercado consumidor próximo, justifica mais esforço para a maioria procura vender seus produtos o que, para eles, a dificuldade está na condição de deslocamento ou de ir e vir fato de terem que sair de seu povoado até a cidade do município e, em grande parte, passarem a maior parte do tempo no comércio. Entregar para um atravessador, significa na concepção destes, grande perda financeira pelo preço que estes pagam.

Na alternativa de gerar melhor receita ou de ter uma alimentação melhor, além da pesca, muitos pescadores se veem obrigados a trabalhar na roça ou outro tipo de criação.

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ISSN: 16799844 – InterSciencePlace – International Scientific Journal Páginas 30 de 173 Uma diminuição dos recursos em decorrência tanto do aumento de pescadores, acaba por comprometer para este grupo social, uma perda grande em nível de arrecadação capaz de sustentar sua família.

Ainda que se vê um grupo de pessoas que declaram gostar da atividade, na verdade, durante as entrevistas, verificou-se que as dores no corpo geradas pelo trabalho repetitivo e a falta de alternativa de outras frentes de trabalho gera forte descontentamento e aceitação quanto ao fortuna de ser pescador e isto está explícito em seus relatos onde há relatos de mulheres que fazem o uso de medicamentos antidepressivos.

6. Referências

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Imagem

Figura 1 - Estado civil dos entrevistados
Figura 6 - voces comem o que pescam?
Figura 7 - o que faz com os recursos da pesca?
Figura 7 – Relação da quantidade de recursos pesqueiros ao longo dos anos

Referências

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