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Clarify, o tradutor de gestos / Clarify, the gesture translator

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Clarify, o tradutor de gestos

Clarify, the gesture translator

DOI:10.34117/bjdv6n5-271

Recebimento dos originais: 13/04/2020 Aceitação para publicação: 14/05/2020

Amanda Carvalho Monteiro

Estudante de Graduação da Escola Superior de Desenho Industrial (Esdi)

Instituição: Escola Superior de Desenho Industrial da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (Esdi - Uerj)

Endereço: Rua do Passeio, 80 - Lapa, Rio de Janeiro - RJ, Brasil

E-mail: amandalha@gmail.com Letícia Martins Antunes da Silva

Estudante de Graduação da Escola Superior de Desenho Industrial (Esdi)

Instituição: Escola Superior de Desenho Industrial da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (Esdi - Uerj)

Endereço: Rua do Passeio, 80 - Lapa, Rio de Janeiro - RJ, Brasil

E-mail: leticiamantunes@gmail.com

Eduardo da Silva de Alencastre Ceva

Estudante de Graduação da Escola Superior de Desenho Industrial (Esdi)

Instituição: Escola Superior de Desenho Industrial da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (Esdi - Uerj)

Endereço: Rua do Passeio, 80 - Lapa, Rio de Janeiro - RJ, Brasil

E-mail: eduardoalencastre@hotmail.com João Paulo Perez Fernandes Vicente

Estudante de Graduação da Escola Superior de Desenho Industrial (Esdi)

Instituição: Escola Superior de Desenho Industrial da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (Esdi - Uerj)

Endereço: Rua do Passeio, 80 - Lapa, Rio de Janeiro - RJ, Brasil

E-mail: joaopaulopfv@gmail.com

RESUMO

Este artigo consiste na descrição do desenvolvimento de criação de projeto que foi apresentado na

Microsoft Design Exposition 2019 por quatro alunos da graduação da Esdi. O tema dessa edição do

evento foi “empatia em escala”. Esse documento foca nos processos de pesquisa e limitação do tema, e conta também com uma explicação do funcionamento da solução proposta. Alguns dos processos de pesquisa realizados foram consultas a bibliografias especializadas nos temas; observação de voluntária e experimentações de baixo custo. Como resultado, foi concebido um sistema de Comunicação Alternativa e Aumentativa de tradução de gestos, que busca melhorar a comunicação de pessoas com limitações de fala. A solução permite adaptação a cada usuário singular, e busca: aumentar a autonomia dos usuários; ampliar a comunicação entre as pessoas; e, por consequência, expandir a possibilidade de empatia.

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ABSTRACT

This article consists of a description of the project creation development that was presented at Microsoft Design Exposition 2019 by four undergraduate students from ESDI. The theme of this edition of the event was “empathy at scale”. This document focuses in the research and limitation processes of the topic, and also includes an explanation of how the solution proposed works. Some of the research processes carried out were the bibliographies used in the themes; voluntary observation and low-cost experimentation. As a result, an Alternative and Augmentative Communication of Gesture Translation system was developed, which seeks to improve the communication of people with speech limitations. The solution adapts to each individual user, and seeks to: increase users’ capacity; expand communication between people; and, consequently, expand the possibility of empathy.

Keywords: Interaction Design. Image and Communication. Experience Design. Augmentative and

Alternative Communication. Empathy.

1 INTRODUÇÃO

Clarify é um projeto que consiste na conceituação de uma ferramenta tradutora de gestos

individuais para pessoas com incapacidades ou limitações de fala. Sua função seria auxiliar na comunicação dessas pessoas, de forma a fazer com que essas dificuldades não prejudiquem suas autonomias nem suas capacidades de expressão.

Ele foi idealizado por quatro alunos da graduação da ESDI – autores desse artigo – para as aulas de Desenvolvimento de Programação Visual II; e foi também apresentado na edição de 2019 da Microsoft Design Expo. Esse evento ocorre todo ano e consiste em uma parceria entre a Microsoft e escolas de design de diversos lugares do mundo. Nele, os alunos dessas faculdades devem, no período de um semestre, se dividir em grupos e desenvolver projetos que busquem resolver problemas do mundo real e dialoguem com um tema específico.

Ao final, uma equipe representante de cada escola é escolhida para apresentar o seu trabalho na sede da empresa americana, localizada na região metropolitana de Seattle. De acordo com o site do evento, “a proposta é construir relações de longo prazo com as escolas de design e construir comunidades entre as escolas.” (MICROSOFT DESIGN EXPO, 2019, Sumário).

As instituições que participaram do evento em 2019 foram: Carnegie Mellon (Pittsburgh, EUA); Esdi (Rio de Janeiro, Brasil); IIE Vega (Joanesburgo, África do Sul); National Institute of

Design (Ahmedabad, Índia); New York University (Nova York, EUA) ; Umeå (Umeå, Suécia); University of Washington (Seattle, EUA).

A Esdi (Escola Superior de Desenho Industrial), é primeira faculdade de design da América Latina, fundada em 1962. Foi criada a partir do modelo da HfG-ULM (Hoschschule für Gestaltung

Ulm), uma escola alemã fundada nos anos de 1950 que buscou rever os ideais da Bauhaus sob a

perspectiva industrial da época. Hoje é uma unidade da Universidade Estadual do Rio de Janeiro, e oferece graduação, mestrado e doutorado em Design, além de desenvolver atividades de extensão.

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No início do segundo semestre da matéria Desenvolvimento de Projeto de Programação Visual II, ministrada para os alunos de terceiro ano da Esdi em 2019, os professores Marcos Martins e Noni Geiger propuseram, a convite da Microsoft, que a classe participasse da Microsoft Design

Expo. De início a turma foi dividida em grupos, cada um buscando desenvolver um projeto

diferente que atendesse o tema proposto, e, em seguida, foram apresentados dois funcionários designers da empresa, Eduardo Sonnino (Designer de produto) e Eric Sexauer (UX Designer) que atuaram como liaisons. Eles, junto com os professores da matéria e o aluno da pós-graduação da Esdi, Leonardo de Morais Soares, estavam responsáveis por orientarem os projetos dos alunos e, ao final, escolherem um grupo para representar a Esdi nas apresentações em Seattle.

Nesse ano, o tema foi “Empatia em escala”. A proposta consistia em: desenvolver uma solução que possibilitasse empatia para uma grande variedade e quantidade de pessoas; projetar um produto, serviço ou solução que gerasse empatia em uma escala demográfica grande e diversa; e demonstrar uma criação que fosse inovadora, que atendesse uma necessidade clara e que aproveitasse as atuais tecnologias.

No decorrer das aulas, houveram orientações constantes com os professores e entregas parciais na forma de apresentações em slides e em vídeos. No meio do semestre, inclusive, ambos os liaisons vieram ao Brasil assistir uma dessas apresentações, ver o andamento dos trabalhos e dar feedback para os alunos. Ao final, Clarify foi escolhido para representar a Esdi nas apresentações em Seattle.

2 EMPATIA

Theresa Wiseman e Jeremy Rifkin foram dois autores cujos trabalhos auxiliaram este grupo nas fases iniciais de pesquisa e análise do problema deste projeto. Ambos, apesar de realizarem abordagens diferentes, discutem a ideia de empatia, eles não apenas atribuem uma definição ao termo, mas também analisam suas ocorrências dentro da sociedade.

“Antes que a empatia ocorra deve haver uma interação envolvendo a comunicação de um sentimento, além de escutar ambos os lados, escutar os sentimentos e pensamentos dos envolvidos e escutar a empatia que está sendo transmitida.” (WISEMAN, 1995, p.1166).

Em seu artigo “A concept analysis of empathy”, Theresa Wiseman estuda o conceito de empatia. Tal estudo teve por objetivo adquirir mais conhecimento sobre esse termo, que até então era mais utilizado na área de enfermagem e não possuía uma definição clara. Questões como: o que é empatia; como ela pode ser identificada, desenvolvida e sustentada; sob que condições ela se expande e reduz; e se ela é estática ou dinâmica foram a base para essa dissertação.

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No prelúdio de seu trabalho, a autora apresenta os diferentes significados que eram atribuídos ao termo empatia, primeiramente aqueles atribuídos por enfermeiras e pacientes entrevistados e posteriormente, aqueles atribuídos por dicionários e enciclopédias de psicologia e enfermagem. Após revisar os dados dessas pesquisas, Wiseman percebeu que o uso desse termo era amplo e sua definição poderia variar do específico para o genérico.

Por conta disso, ela procurou focar nas ideias e conceitos mais utilizados para descrever a empatia. Como resultado, Theresa observou que a empatia possuía quatro atributos que a definiam: ver o mundo como o outro vê; entender os sentimentos do outro; não julgar; e comunicar o entendimento. Grande parte das referências da autora entendem tais atributos como as características que melhor definem empatia.

Wiseman conclui seu artigo com a ratificação da ideia de que a comunicação é de grande importância para a ocorrência da empatia. Não basta apenas haver o entendimento dos sentimentos do outro, esse entendimento deve ser comunicado.

“Empatia é o oposto de utopia. Não existe empatia no Paraíso, (...) Não existe empatia no Paraíso porque não há mortalidade. Não há empatia dentro de uma Utopia porque não há sofrimento. Empatia está fundada no reconhecimento da morte e na celebração da vida (...)” (RIFKIN, 2010, p.3).

Em maio de 2010, a RSA (Royal Society for the encouragement of Arts, Manufactures and

Commerce) publicou um vídeo intitulado “The Empathic Civilisation” que apontava algumas das

questões discutidas no livro de mesmo nome. Quem narra o vídeo é o autor do livro: Jeremy Rifkin. Nesse vídeo, o autor procura explicar como os seres humanos são naturalmente empáticos devido a questões biológicas de nossa espécie e se existe a possibilidade de expandir essa empatia por toda a biosfera.

Na introdução do vídeo, Rifkin comenta sobre alguns estudos de tomografia cerebral feitos dentro de um laboratório em Parma, Itália, em 1990. Tais estudos revelaram que todos os seres humanos e alguns primatas possuem algo que denominaram “neurônios-espelho”. Se você observa um indivíduo que está frustrado, feliz ou triste, por exemplo, os mesmos neurônios que estimularam esse sentimento nele serão acionados no seu córtex cerebral, dessa forma, você passa a ter a mesma experiência que o indivíduo.

Após apresentar esses estudos, Jeremy pergunta ao espectador o que é empatia. O autor afirma que empatia é algo complicado de se definir e que esse conceito está relacionado à biologia humana. Ao se desenvolver, uma criança adquire conhecimentos como: reconhecer a si mesma, reconhecer outras pessoas e suas experiências e entender o que é nascimento, vida e morte. A partir do momento que uma criança percebe que ela é vulnerável e que sua existência neste mundo é

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finita, ela dá mais valor a sua vida, ela compreende que os seres vivos ao seu redor estão na mesma situação e procura ser solidária com eles.

Rifkin encerra o vídeo ao ressaltar a importância da tecnologia para que a empatia ocorra de maneira mais global. Ele exemplifica isso através da atuação das mídias sociais sobre terremotos que ocorreram no Haiti e no Chile em 2010. Dentro de uma hora, usuários do Twitter já compartilhavam relatos do desastre; dentro de duas horas, já haviam vídeos no YouTube, após isso, diversos países enviaram recursos para ajudar às vítimas. Com essas tecnologias, é possível então expandir não só a comunicação entre pessoas, mas também os laços de compaixão entre elas.

3 GERAÇÃO DE ALTERNATIVAS

“Depois que, na primeira fase do processo de design, se analisa o problema com seu entorno, na segunda fase são geradas as alternativas para o mesmo. É a fase de produção de ideias baseando-se nas análises realizadas. Nesta fase de produção de ideias a mente precisa trabalhar livremente, sem restrições, para gerar a maior quantidade possível de alternativas.” (LÖBACH, 2012, p.150).

Após analisar as obras de Rifkin e Wiseman e adquirir uma maior compreensão do conceito de empatia, a proposta do projeto tornou-se mais objetiva. O problema, então, não se definia apenas como gerar empatia em escala, mas sim como auxiliar na comunicação entre indivíduos que pertencem a uma larga escala demográfica. Com isso definido, foi realizada uma geração de alternativas que, apesar do autor Bernd Löbach (2012) defender que nessa fase as alternativas devem ser geradas sem restrições, já estava restringida por comedimentos impostos pelo projeto, como visto na seção 1 deste artigo.

Para produzir soluções que atendessem os requerimentos da proposta, foram imaginados possíveis cenários em que a comunicação entre indivíduos ocorresse com dificuldade e como ela poderia ser facilitada. Isso foi feito com a intenção de trazer o problema para o mundo real, de descobrir as maneiras que esse problema ocorre, com quem ele ocorre, por que ele ocorre e como ele pode ser resolvido.

4 COMUNICAÇÃO

Uma das primeiras etapas para gerar alternativas foi pesquisar sobre comunicação: como ela pode ser definida e classificada. Essa parte foi necessária tanto para maior aprofundamento sobre o tema, quanto para incentivar brainstorming de caminhos possíveis e servir de base para justificar decisões. Por definição de dicionário, comunicação pode ser considerado:

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“1. ato ou efeito de comunicar(-se); 2. ato ou efeito de emitir, transmitir e receber mensagens por meio de métodos e/ou processos convencionados, quer através da linguagem falada ou escrita, quer de outros sinais, signos ou símbolos, quer de aparelho técnico especializado, sonoro e/ou visual”. (AURELIO, 1999, p.517).

Nessa acepção, fica claro que comunicação abrange uma área muito maior que a linguagem verbal (escrita e falada), embora esta seja importante não só para promover relações empáticas, mas no próprio desenvolvimento da humanidade, segundo FRANÇA e LUCENA: “(...)sociedades derivaram o princípio básico da construção das culturas, na qual, a evolução da linguagem verbal teve o papel de mantenedora e precursora destas”.

No entanto, soluções que buscam diminuir as barreiras de comunicação verbal, existem várias, e já são pensadas há muito tempo, como: o ensino de línguas, a tradução de livros e outras mídias, e, mais recentemente, a criação de tradutores instantâneos como o Google Tradutor ou o

SayHi.

Assim, os integrantes do grupo decidiram focar no campo da linguagem não verbal, que pode abranger desde imagens, até expressões gestuais e entonações vocais. Essa forma de comunicação vem ganhando relevância; estudiosos da área cada vez mais ressaltam sua importância dentro do discurso. BIRDWHISTELL propõe que “apenas 35% do significado social de qualquer interação corresponde às palavras pronunciadas, pois o homem é um ser multissensorial que, de vez em quando, verbaliza”.

Ao contrário do que diz a crença popular, a linguagem não-verbal nem sempre é tão universal quanto muitos acreditam. Por instância, uma pessoa não consegue entender linguagem de sinais sem antes ter aprendido o significado de seus signos. Porém, o mesmo pode ocorrer com gesticulações mais simples, que não fazem parte de uma língua específica. Em seu livro, Histórias dos Nossos Gestos, CASCUDO fala sobre como alguns pequenos gestos podem ser interpretados de formas diferentes dependendo do contexto e das convenções culturais nas quais os interlocutores estão inseridos.

“Na famosa estória popular da Disputa por Acenos, cada antagonista entendia o gesto contrário de acordo com seu interesse. Negativa e afirmativa, gesto de cabeça na horizontal e vertical, têm significação inversa para chineses e ocidentais. Estirar a língua é insulto na Europa e América, é saudação respeitosa no Tibete.” (CASCUDO, 2012, pg.8).

5 APROXIMAÇÃO COM O PÚBLICO

À medida que as pesquisas sobre comunicação se aproximavam de categorias de linguagem não-verbal, como a linguagem gestual, o grupo foi notando a semelhança entre essas questões, com

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o caso de Maria Eduarda, irmã de uma das integrantes do grupo. Maria Eduarda, é uma autista não-verbal que dialoga principalmente por gestos pantomímicos.

Maria Eduarda Martins tem Síndrome de Down e autismo. Devido este ser tardiamente diagnosticado, Maria seguiu, até completar dez anos, com tratamentos malfadados de falar. No entanto, pela necessidade de se comunicar e informar suas vontades, Maria desenvolveu seu próprio sistema de gestos que está sempre em desenvolvimento e seus familiares aprendem com ela (Figura 1). Os gestos vão desde mímicas simples – como tocar a língua para dizer que está com sede – a mais complexos de efetuar – como imitar o ralador com o queijo sendo ralado e caindo do ralador.

Figura 1: Exemplo de Maria Eduarda performando gestos que significam “dor de cabeça” e “sede” respectivamente. Crédito: Autores. Fonte Própria.

De acordo com a quinta edição do Manual do Diagnóstico e Estatística de Transtornos Mentais (2013) da American Psychiatric Association, as características mais comuns de identificação de um autista pelo deficit de comunicação e interação social e padrões restritos e repetitivos de comportamento. Contudo o Center for Disease Control and Prevention (Centro de Controle e Prevenção de Doenças), estimou que menos de um terço dos autistas não conseguem desenvolver propriamente a fala.

Para desenvolvimento do projeto, foram catalogados alguns gestos da Eduarda (Figura 2), e depois observou-se seu dia a dia e como ela usava essa forma de comunicação. Essa etapa tinha finalidade de pesquisa e fazer os projetistas entenderem melhor o problema. “A descoberta de um problema constitui o ponto de partida e motivação para o processo de design, que depois se define melhor no se desenrolar, dependendo do tipo de problema.” (LÖBACH, 2012, p.143).

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Figura 2: Catálogo de gestos de Maria Eduarda. Crédito: Autores. Fonte Própria.

A menina não mostrava grandes problemas para expressar suas necessidades e angústias para os membros de sua família ou para sua mediadora da escola; porém quando necessário lidar com estranhos, ela precisava de uma terceira pessoa, um intermediário, para traduzir sua mímica. Seus maiores obstáculos são atendentes de estabelecimentos comerciais, visitas em suas casas e quando quer formar novos amigos.

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Entre outros pontos, Maria Eduarda aparentava ser extremamente dependente, uma vez que há a indispensabilidade de um acompanhante em qualquer lugar que ela vá. Ademais, outro ponto que foi anotado pelos seus familiares, como a mãe Luciana Martins, é que as pessoas com quem a menina tenta se comunicar não dão atenção diretamente a ela; mas costumam redirecionar a conversa para o acompanhante e muitas vezes acabam por ignorar a presença da filha.

6 JUSTIFICATIVA DE PÚBLICO

Foi necessário fazer uma pesquisa para entender melhor sobre a forma como a Maria Eduarda se comunica, e saber se existem outras pessoas em condições parecidas, encarando problemas similares. Outra das principais funções dessa etapa é coletar dados e justificar a amplitude do problema, visto que a proposta não é tratar somente de empatia, mas “empatia em escala”. Em 2013, havia mais de 4 milhões de pessoas, somente nos EUA, que não conseguem se comunicar verbalmente ou o fazem com grande dificuldade (BEUKEMAN; MIRANDA, 2013). De acordo com a liga de ONGS, The Communication Trust, essa deficiência pode ser permanente ou apenas temporárias, e causada por fatores diversos como: dificuldade de fala, dificuldade de aprendizado, limitações físicas (como paralisia cerebral), transtorno do espectro autista, etc.

Embora essas pessoas não consigam ou tenham dificuldade em usar suas vozes, elas podem usar outros meios, para se comunicarem, chamados de Comunicação Aumentativa e Alternativa (CAA). “Comunicação Aumentativa e Alternativa (CAA) é o termo usado para descrever vários métodos de comunicação que são usados para lidar com problemas da fala comum.” (COMMUNICATION MATTERS, 2015, p. 2).

Segundo a liga, algumas das formas mais comuns de CAA são: linguagem de sinais, uso de imagens e uso gestos e expressões faciais, como no caso da Maria Eduarda. Estes podem ser desenvolvidos espontaneamente pelo próprio usuário, ou aprendidos a partir da ajuda de pessoas próximas.

A partir dessas novas informações e abordagem, as primeiras ideias de projeto foram descartadas e o público alvo foi definido como: pessoas que utilizam CAA. A princípio somente aquelas que usam gestos para se comunicarem, como Maria Eduarda, embora a possibilidade de se trabalhar com outros meios tenha ficado em aberto como uma possibilidade futura.

Assim, foi possível pensar em novas ideias de projeto que considerassem as características e necessidades do público. Decidiu-se no fim por fazer uma ferramenta capaz de traduzir o significado dos gestos do usuário em palavras, para que outras pessoas conseguissem entender o que ele quer dizer sem a necessidade de outra pessoa intermediar.

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Essa é uma solução que poderia deixar mais fácil, para alguns usuários de CAA, contornar algumas das barreiras de comunicação que eles enfrentam. Alinhado com o discurso de RIFKIN, esse projeto poderia, por consequência, possibilitar maior alcance da empatia para com eles (e deles para com os outros).

No caso da Eduarda, ela possivelmente teria maior autonomia para andar sozinha e criar interações sociais por conta própria, visto que a menina não precisaria mais estar sempre na presença de um intermediário/acompanhante.

Sobre a questão da escala geográfica, ela está presente visto que 4 milhões de pessoas corresponde a aproximadamente 1,2% da atual população estadunidense. Essa porcentagem pode aparentar ser pequena, mas esse número de pessoas equivale à quantidade total de habitantes da cidade de Los Angeles (em 2017). Pensando de outra forma, quando se fala desse assunto, é interessante também observar a diversidade entre os casos das pessoas que utilizam CAA (no que diz respeito tanto a suas limitações; quanto nos signos e pequenos gestos que eles podem usar para se comunicar): cada um desses indivíduos pode parecer ter condições tão únicas, que seria necessário pensar em soluções diferentes e individuais. No entanto, o objetivo era fazer um único projeto, que pudesse ser usado atender pessoas distintas e, ao mesmo tempo, respeitar as suas diferenças e as formas com as quais eles estão mais acostumados a se comunicar.

7 PROTÓTIPO

Uma vez definido o projeto, passou-se a pensar sobre detalhes do funcionamento de Clarify. Na Microsoft Design Expo 2019, essa informação foi apresentada na forma de vídeo que mostrava uma simulação da ferramenta sendo utilizada na forma de um aplicativo para mobile. A reprodução mostrava uma menina se utilizando da tradução para pedir comida em um restaurante e conversar com um estranho no parque. Essa forma de recurso áudio visual funcionou de forma tanto a ilustrar o passo a passo, quanto para mostrar como o aplicativo poderia, idealmente, ajudar a fornecer mais confiança e independência para algumas pessoas realizarem tarefas do dia-a-dia.

Sobre o sistema Clarify, decidiu-se que a estrutura deveria ter duas funções chaves: uma para a gravação e armazenamento da compilação de gestos, e outra para a tradução, e comunicação do cotidiano. A primeira seria importante para permitir que o sistema possa se adaptar às diferentes formas de linguagem: ele permite aos usuários criar uma biblioteca com seus símbolos particulares. No primeiro uso, a biblioteca está vazia. (Figura 3).

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Figura 3: Protótipos da interface do sistema. O usuário realiza o login e adiciona gestos em sua biblioteca respectivamente. Crédito: Autores. Fonte Própria.

Para começar a usar o sistema, é preciso que se realizem filmagens de pequenos clipes do usuário performando gestos tais quais ele utiliza para se comunicar. É necessário também informar ao sistema o significado de cada gesto em algumas palavras. Depois disso, essas informações são salvas e armazenadas. (Figura 4).

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Figura 4: Protótipos da interface do sistema. O usuário grava um gesto, informa seu significado e por fim o salva em sua biblioteca. Crédito: Autores. Fonte Própria.

Pressupõe-se que nessa primeira etapa mais burocrática de catalogação, os usuários poderiam ser auxiliados por familiares ou pessoas próximas.

Sobre a tradução e a comunicação do dia-a-dia, ela funcionaria com o auxílio de um dispositivo com tela e câmera. A pessoa com dificuldade de fala traria o dispositivo e o emprestaria para o outro com quem se deseja conversar (Figura 5). Através de softwares de reconhecimento de gesto, a ferramenta compararia a imagem que estiver sendo captada pela câmera, com as armazenadas previamente no sistema, e o significado correspondente a cada gesto apareceria na tela em forma de legenda (Figura 6).

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Figura 5: Cenas das simulações realizadas para o vídeo da apresentação (CSRVA). A garota com dificuldade de fala entrega o celular ao garçom. Crédito: Autores. Fonte Própria.

Figura 6: (CSRVA). Na tela do celular, há uma mensagem instruindo o usuário “Olá! Eu tenho dificuldade em falar. Por favor, pressione o botão e aponte a câmera para mim”. O garçom então utiliza o sistema para traduzir os gestos da garota. Crédito: Autores. Fonte Própria.

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Se o sistema não for capaz de traduzir algum gesto, para reduzirem as possibilidades de erro, ele está programado para disponibilizar opções de possíveis significados. Tal função acontece através de uma comparação com uma database maior, que inclui também os gestos das bibliotecas de outros usuários. Isso é possível, porque alguns gestos são recorrentes em culturas similares. Considerando fatores como: proximidade geográfica, crenças religiosas, nacionalidade, dentre outros. (Figura 7).

“Toda a bibliografia sobre o Gesto, tradutor da Ideia e primeira linguagem humana, demonstra a universalidade de alguns acenos sobre os próprios vocábulos mais essenciais e vivos. Há gestos cobrindo áreas demarcadas de uso, jamais correspondentes à equivalência verbal.” (CASCUDO, 2012, p.7).

Figura 7: (CSRVA). Exemplo de como o sistema lida com gestos que não reconhece. Crédito: Autores. Fonte Própria.

No que diz respeito ao dispositivo, o projeto foi pensado para não depender de um aparelho específico, considerando que em alguns casos um aparelho pode servir melhor que outro. Por exemplo, muitos autistas usam AAC, e, para vários deles, o uso de um smartglass pode ser mais interessante por ser discreto. “Crianças e adultos com TEA (Transtorno do Espectro Autista) podem (...) ter problemas em se relacionar com outros; (...) podem evitar contato visual e preferir ficar sozinhas (...)” (cdc.gov, 2019) ; enquanto que, para outra pessoa, um aplicativo de celular pode ser melhor por ser mais simples e acessível.

8 CONCLUSÕES FINAIS

Nesse ponto é importante ressaltar que a proposta da Microsoft não incluía produzir e exibir um protótipo funcional. Era possível simplesmente, se basear em uma forma de tecnologia existente, e incorporá-la, mesmo que ela ainda não esteja em níveis de desenvolvimento suficientes

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para tornar a solução possível atualmente. A ideia do evento tratava de mostrar diferentes iniciativas para resolver um mesmo problema, e vislumbrar o que poderia ser possível num futuro próximo.

Para fins de dar continuidade ao projeto fora do ambiente do evento, as próximas etapas incluiriam ampliação e aprofundamento sobre programas de reconhecimento de gestos existentes e viabilidade tecnológica; testes com usuários e possivelmente o estudo da incorporação de outras formas de CAA no sistema, como linguagem de sinais (que usa os mesmos princípios de gestos), uso de imagens, etc.

Em linhas gerais, o projeto Clarify procura promover maior abertura de um canal empático para a aceitação e o entendimento. Como um projeto de experience design, ele busca melhorar interações de comunicação específicas de uma forma inclusiva, além de propiciar a experiência mais ampla de ser entendido.

AGRADECIMENTOS

Às instituições Faperj, Capes, CNPq e o PPDESD, e à professora Lígia Medeiro, sem os quais não seria possível a publicação do artigo;

À Esdi/Uerj, e seus professores Marcos Martins, Noni Geiger, e aluno Leonardo Santos pela orientação e incentivo;

À Microsoft pela oportunidade e pelo apoio, principalmente ao March Rogers, Eduardo Sonnino, Eric Sexauer, Erin Decker e Angela Nelson; e

Aos amigos Mariana Maia, Gilda Carvalho, João Vitor do Amaral, e ao restaurante Me Gusta (R. das Marrecas, 15 - Centro, Rio de Janeiro - RJ, 20031-120) pela ajuda na preparação de materiais para apresentação.

REFERÊNCIAS

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CASCUDO, Luís da Câmara. História dos nossos gestos. 1ª edição digital. São Paulo: Editora Global, 2012.

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Figura  1: Exemplo de  Maria  Eduarda  performando gestos  que  significam  “dor de  cabeça” e  “sede” respectivamente
Figura 2: Catálogo de gestos de Maria Eduarda. Crédito: Autores. Fonte Própria.
Figura  3:  Protótipos  da  interface  do  sistema.    O  usuário  realiza  o  login  e  adiciona  gestos  em  sua  biblioteca  respectivamente
Figura 4: Protótipos da interface do sistema.  O usuário grava um gesto, informa seu significado e por fim o salva em  sua biblioteca
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