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O inglês e a interculturalidade na semântica do europeu

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Academic year: 2021

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A

GRADECIMENTOS

Ao meu marido por tudo, pelo apoio, dedicação, motivação, paciência, e amor...

Aos meus sogros pelo suporte familiar sempre disponível.

Aos meus orientadores: ao professor Mário Cruz, pela partilha, rigor, e pela disponibilidade que manifestou ao longo de um ano; e à professora Edite Orange, por me despertar interesse para o tema investigado, e me fazer olhar as minhas experiências com outras culturas de forma valiosa, para o estudo académico.

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R

ESUMO

O presente projeto de investigação reporta ao ensino do Inglês, perspetivando-se no 1º Ciclo do Ensino Básico, e diverge em torno da interculturalidade, em particular na Europa, convergindo em alguns aspetos que me inquietam ao nível social, como a xenofobia. A definição de europeu para o mundo é algo em que me irei debruçar, ao nível do seu signo e significado. O meu testemunho enquanto emigrante legitima essa inquietação e interesse, pela forma como a interculturalidade é integrada no ensino, e pode ser usada no desenho de uma sociedade mais pacífica, integradora, e justa para a diversidade humana.

Deste estudo pretende-se revelar a importância da abordagem intercultural no ensino; averiguar através de uma análise, se nas metas curriculares e manuais de Inglês, Estudo do Meio, e Português existem conteúdos relevantes e prestáveis nessa abordagem; entender de que forma a abordagem intercultural contribui para o ensino do Inglês no 1º ciclo; e finalmente procurar metodologias pedagógicas inovadoras que facilitem este trabalho.

Os resultados deste estudo revelam uma parca abordagem intercultural nas representações em manuais escolares, e nas metas curriculares, e apontam para a necessidade de utilização de métodos de trabalho alternativos, como a Filosofia para Crianças, enquanto método de estudo e de pensamento. O desígnio deste estudo não pretende colocar no ensino do Inglês a ambição de resolver problemas sociais tão graves quanto a xenofobia, mas propõe um ensino de consequências comportamentais, relevantes para os jovens cidadãos deste “Velho Mundo”. Palavras chave: Interculturalidade, Empatia, Alteridade, Filosofia para Crianças, Inglês.

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A

BSTRACT

This research project reffers to the teaching of English, focusing on the 1st Cycle of Basic Education, and diverges around interculturality, particularly in Europe, converging on some aspects that worry me at the social level, such as xenophobia. The definition of European for the world is something that I will look at, at the level of its sign and meaning. My testimony as an emigrant legitimizes this concern and interest in the way interculturality is integrated into teaching and can be used in the design of a more peaceful, inclusive, and just society for human diversity. This study intends to reveal the importance of the intercultural approach in teaching; to ascertain through an analysis, if in curriculum goals and textbooks of English, Study of the Environment, and Portuguese, there are relevant and useful contents in this approach; Understand how the intercultural approach contributes to the teaching of English in the 1st cycle; And finally seek innovative pedagogical methodologies.

The results of this study reveal a weak intercultural approach in representations in school textbooks and curriculum goals, and point to the need to use alternative working methods, such as Philosophy for Children, as a method of study and thinking. The purpose of this study is not to put in the teaching of English the ambition to solve social problems as serious as xenophobia, but proposes a teaching of behavioral consequences relevant to the young citizens of this Old World. Key words: Interculturality, Empathy, Otherness, Philosophy for Children, English.

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Í

NDICE

INTRODUÇÃO ... 9 PARTE 1: A INTERCULTURALIDADE NO CONTEXTO EUROPEU: DAS MINHAS REPRESENTAÇÕES À LITERATURA CIENTÍFICA E ENSINO DE INGLÊS. ... 13 1.1. Londres e Manchester, uma imigração dentro de uma emigração – experiências de uma professora e cidadã europeia em território britânico. ... 16 1.2. A semântica do europeu ... 27 1.3. A xenofobia e o seu impacto na Europa ... 33 1.4. A Interculturalidade e a sua relevância na pedagogia. ... 43 PARTE 2: A ABORDAGEM INTERCULTURAL NO 1º CICLO DO ENSINO BÁSICO E PROPOSTAS PARA O DESENVOLVIMENTO DA INTERCULTURALIDADE. ... 53 2.1. Análise das Metas Curriculares de Inglês, do Ensino Básico: 1º Ciclo, no domínio da interculturalidade. ... 60 2.2. Análise de manuais ... 63 2.2.1. Manuais escolares de ensino do Inglês, do 1º Ciclo do Ensino Básico: ... 64 2.2.2. Manuais escolares de Português/Língua Portuguesa, e de Estudo do Meio, do 1º Ciclo do Ensino Básico. ... 78 2.3. Propostas Curriculares e Didáticas ... 82 2.3.1. A Filosofia para Crianças como método de aprendizagem. ... 83 2.3.2. Proposta para Unidade Didática integrando a Filosofia para Crianças, com o título: “Igualdade e fronteiras”. ... 95 CONSIDERAÇÕES FINAIS ... 102 BIBLIOGRAFIA ... 110

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Í

NDICE DE

F

IGURAS

Figura 1 – Equipa de trabalho que integrei, ... 19 Figura 2 – Polacos, Espanhóis, Portugueses, e Brasileiros num convívio ... 21 Figura 3 – Primeiras mudanças em Salford (Manchester), Março, 2013. ... 23 Figura 4 - Cartaz do UKIP fotografado em Liverpool por Sandra Marinho, 2013. ... 24 Figura 5 - 2014, Debating Europe - What does it mean to YOU to be “European”? ... 31 Figura 6 – World Values Survey, 2005-2009, The Atlantic. ... 36 Figura 7 - Repórter de imagem húngara filmada a pontapear refugiados em Röszke, na Hungria, filmado por Stephan Richter, repórter de imagem da televisão alemã RTL, em 09/09/2015. ... 38 Figura 8 - Tributo a Jo Cox, Moseley, UK, 2016. ... 39 Figura 9 - Nigel Farage em frente ao cartaz do UK Independence Party, usado na campanha a favor do Brexit, na Primavera de 2016. (Stewart & Mason, 2016) ... 41 Figura 10 - Sessão de P4C (Philosophy for Children) ... 85 Figura 11 - Sintese da metodologia P4C (Philosophy for Children) ... 92 Figura 12 (modificação com exclusão de texto, da Fig.12) ... 98 Figura 13 – Imagem do cartoonista australiano, Simon Kneebone, 2014. ... 100

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Í

NDICE DE

T

ABELAS

Tabela 1 - Análise de manuais escolares de Inglês do 3º ano. ... 64 Tabela 2 - Abordagens culturais nos diferentes manuais analisados do 3º ano. ... 65 Tabela 3 - Análise de manuais escolares de Inglês do 4º ano. ... 69 Tabela 4 - Abordagens culturais nos diferentes manuais analisados do 4º ano. ... 70 Tabela 5 - Análise de manuais escolares do 1º Ciclo do Ensino Básico. ... 78 Tabela 6 - Análise de manuais escolares do 1º Ciclo do Ensino Básico. ... 79

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I

NTRODUÇÃO

Este projeto de investigação parte de uma motivação pessoal, a minha experiência como emigrante em Inglaterra, concretamente em Londres e em Manchester. Esta vivência profundamente marcante possibilitou um contato intenso e próximo com outras nacionalidades, outras culturas, e outras línguas. Inicialmente o entusiasmo por outras culturas assentou nas curiosas diferenças culturais, no entanto, a aproximação com os meus pares sociais, com quem vivi e trabalhei, deu-se verdadeiramente, quando a empatia com base nas semelhanças se evidenciou. Por outro lado, nem todas as vivências foram positivas; a xenofobia e a consequente discriminação também existe num país onde a taxa de emigrantes é elevadíssima, e partidos políticos como o UKIP1 têm uma expressiva massa de seguidores, e usam campanhas populistas, disseminando cartazes onde mostram o seu desagrado para com os emigrantes convidando-os de volta ao seu país de origem. (Goodwin & Milazzo, 2015)

O fato é que, recentemente, acontecimentos globais registados pela comunicação social e redes sociais, indiciam uma crescente reação xenófoba dirigida à crise de refugiados de povos Africanos e do Médio Oriente, entre eles os Sírios. O que julgava ser um vestígio social de outros tempos revela-se afinal uma proeminente tendência europeia que me preocupa, enquanto formadora de línguas e culturas.

Nessa inquietude, e na qualidade de professora e educadora, vejo no ensino do Inglês uma oportunidade de investigação, com a pretensão de nele estabelecer uma ponte cultural entre diferentes povos, que ajude a esbater as nossas diferenças e preconceitos. Posto isto, este projeto de investigação pretende seguir no caminho da interculturalidade, analisando como esta é abordada no Ensino do Inglês do 1º ciclo e averiguar o seu potencial enquanto agente social de mudança.

1 UK Independence Party

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A investigação iniciar-se-á com o testemunho das minhas motivações pessoais e inquietações, na qualidade de ex-emigrante, e nos pontos de vista que esse estatuto me colocou enquanto pessoa, e posteriormente enquanto estudante e investigadora. A pressão e expectativas pessoais a que estive sujeita como emigrante desempregada e desenquadrada profissionalmente no meu país de origem, e a ativação de um “modo de sobrevivência” e de integração imediata no país de acolhimento, levou-me a olhar de um modo muito crítico, e vigilante todo o cenário que me envolveu.

O testemunho deste primeiro capítulo, passará por interpretar esses acontecimentos pessoais e contextualizá-los bibliograficamente de acordo com o período económico, político, e social, que se vivia então na Europa, durante a minha primeira emigração para Londres. Terminará com a mesma análise comparando esta primeira experiência com uma nova emigração, anos depois, para Manchester, numa nova circunstância económica, política, e social.

Tratando-se esta experiência de uma experiência intercultural, vivida no espaço europeu, e não podendo ignorar os acontecimentos recentes que marcam o presente desta investigação, nomeadamente a crise humanitária que se vive relativa aos migrantes, e que me perturba não só enquanto ex-emigrante, mas enquanto cidadã europeia, no capítulo seguinte, debruçar-me-ei justamente sobre a interculturalidade, e a complexidade deste conceito. Esta abordagem intercultural será circunscrita ao espaço europeu, por onde vivi e viajei, procurando encontrar o que de promissor a Europa oferece ao mundo como destino de emigração; dar neste contexto significado ao “ser europeu”, aquilo a que chamarei de “semântica do europeu”; identificar causas para a xenofobia, racismo, e outras falhas sociais inerentes aos fenómenos de migração e intensificação da diversidade cultural em espaço europeu; e, finalmente, perceber qual o papel do Inglês enquanto idioma e meio de comunicação, para o entendimento intercultural.

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interculturalidade em sala de aula. Irá convergir na sua abordagem no ensino do Inglês, onde serão efetuadas análises de metas curriculares, bem como de manuais, com a finalidade de propor alterações curriculares e didáticas neste nível de ensino. Finalmente serão apresentadas propostas curriculares e didáticas, entre elas o recurso a métodos de estudo e pensamento usados sob a forma de Filosofia para Crianças.

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P

ARTE

1:

A

INTERCULTURALIDADE NO CONTEXTO EUROPEU

:

DAS MINHAS REPRESENTAÇÕES À LITERATURA CIENTÍFICA E

ENSINO DE INGLÊS

.

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O presente projeto de investigação para préstimo do ensino do Inglês no 1º Ciclo do Ensino Básico precede uma motivação pessoal, sendo que a abordagem da interculturalidade surge espontaneamente como resultado da minha experiência como emigrante, numa fase profissional da minha vida, que me levou a deixar o meu país, e integrar-me noutra cultura.

Uma vez que a experiência foi tão marcante e enriquecedora para mim, creio ser de grande pertinência expô-la de forma a contextualizar o que me motivou para o projeto de investigação presente, demonstrando de que forma esta experiência me valoriza enquanto professora, e como o meu contributo pessoal pode auxiliar a abordagem da interculturalidade em contexto de sala de aula, na prática do ensino do Inglês no 1º Ciclo do Ensino Básico.

Esta dupla experiência de emigração representou para mim um salto na minha formação pessoal, que considero tão enriquecedora quanto os estudos que concluí anteriormente. Não foram necessariamente as profissões que tive, mas as pessoas que conheci, que serviram de propulsor de pensamentos, ideias, e atitudes que moldaram o que surgiu a seguir na minha vida.

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1.1.

L

ONDRES E

M

ANCHESTER

,

UMA IMIGRAÇÃO DENTRO DE UMA EMIGRAÇÃO

EXPERIÊNCIAS DE UMA PROFESSORA E CIDADÃ EUROPEIA EM TERRITÓRIO BRITÂNICO

.

A minha primeira emigração surgiu como um degrau decorrente de tantos outros que subi pela minha vida fora, por sobrevivência, desde a quinta onde nasci, e cresci como pude, pelas mãos de agricultores, até à minha chegada ao ensino secundário e à minha formação superior, onde me formei professora do Primeiro Ciclo do Ensino Básico, e Segundo Ciclo em Educação Visual e Tecnológica.

As minhas escaladas pessoais, embora nem sempre constantes, à semelhança das que faço pelas montanhas, por desporto, a pé, e sem cordas, com declives e inclinações; foram sempre ascendentes, sem tempo para tomar o fôlego.

A razão que me levou a emigrar para Londres foi sobretudo a procura de emprego, e a cidade que só nessa década já havia recebido mais de um milhão de emigrantes, estava inequivocamente a absorver em todo o seu tecido laboral, desempregados vindos de todo o mundo. (Kershen, 2015)

Em 2008, Portugal começava a dar os primeiros sinais da crise que irrompia da crescente austeridade, da desigualdade social, e do endividamento público, numa Europa desequilibrada economicamente. (Habermas, 2012)

Conseguir colocação enquanto professora no Ensino Público já era então praticamente impossível; por isso, fiz as malas e fui cheia de esperanças e algumas ideias pré-concebidas sobre a cultura para a qual me ia lançar.

Uma das primeiras características sobre Londres que aprendi quando cheguei à cidade, é que tudo se dava a um ritmo veloz, alucinante, e ao contrário de Portugal, tudo acontecia.

O meu primeiro objectivo foi obter alojamento para mim e para o meu companheiro que emigrou comigo, e nesta procura debati-me entre a desilusão e a esperança. O primeiro quarto onde fiquei situava-se numa casa em Ladbroke Grove, Acton, de uma senhora de origem portuguesa que se

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encontrava a viver em Londres há mais de 30 anos. A zona era fortemente habitada por caribenhos, e indianos, a casa ao lado era habitada por indivíduos com problemas de foro psiquiátrico, de responsabilidade governamental e social que promovia a sua lenta inserção na sociedade e, por isso, viviam sozinhos de modo a atingirem competências e autonomia para se emanciparem. Logo aqui me surpreendi com a diferença no tratamento destes casos. A dona da casa onde estava chamou-me ainda a atenção para a responsabilidade da sociedade envolvente para com estes indivíduos, apontando-me para um enorme botão vermelho no exterior da casa, o qual podia ser premido por qualquer pessoa para qualquer tipo de emergência, tendo este uma ligação central à entidade responsável por esta habitação.

A casa seguinte onde morei, em Wood Green, ficava num bairro sul-africano, onde se ouviam cânticos Gospel por todos os quarteirões; os meus colegas de quarto eram todavia chineses e turcos, muito reservados, com os quais quase nada consegui socializar, também por falta de oportunidade de convívio com eles, e por existir uma barreira linguística, já que falavam muito pouco inglês.

Por último, a minha residência mais prolongada foi numa casa de brasileiros, num bairro Judeu, com um senhorio também ele brasileiro. Não foi apenas a localização e o preço que me levou a escolher o nº 20 de Lealand

Road, em Seven Sisters, Haringey, mas a nacionalidade brasileira dos restantes

inquilinos, levou-me a pensar que, por falarmos a mesma língua, nos entenderíamos melhor. Se calhar, saber que na casa onde iria morar se falava português me confortava, num país de muitas outras línguas.

Por todas as casas por onde passei, notei uma constante: o facto de os bairros se organizarem por comunidades ora de Judeus, ora de Brasileiros, ou Caribenhos, Polacos, Paquistaneses, Indianos, entre outros... O que me forçou a questionar as razões que levam os emigrantes a se juntarem em comunidades quase fechadas. É assim em quase todo o nordeste de Londres, uma rede de comunidades urbanas segregadas em bairros de culturas

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distintas. Estas culturas estão organizadas num urbanismo de justaposição, não de mistura, essa, só se vê nos transportes públicos...

O meu segundo objetivo foi conseguir emprego. Percorri Londres de metro, autocarro, mas sobretudo a pé. Caminhei muito, e ouvi muitas línguas, e algum inglês também. Caminhar numa grande cidade e usar os seus transportes públicos fez-me contactar de forma mais próxima com os seus habitantes, que apesar de serem de várias culturas pareciam estar em uniformidade na forma como seguiam as regras, hábitos e modos de estar neste país. Entreguei currículos em tantos sítios que perdi a conta, mais de 300 certamente, mas em duas semanas estava já a trabalhar em High Street

Kensington, numa loja de desportos de montanha e outdoor, pois para além

de professora, faço montanhismo há mais de 10 anos, e a minha experiência pelas montanhas portuguesas foi-me gratificantemente reconhecida e valorizada pela diferença. Lembro-me do entusiasmo que senti ao ver 24 colegas de trabalho de países como Espanha, França, República Checa, Polónia, Áustria, Peru, Brasil, Austrália, Suécia, Eslováquia e também dois colegas ingleses. Achei tudo isto fascinante, uma oportunidade única de conviver com culturas tão diferentes, mas que se revelaram tão semelhantes. De facto, a língua inglesa facilitou a comunicação entre nacionalidades e línguas tão diferentes, pois a língua inglesa foi o primeiro elemento que observamos em comum.

A foto seguinte (Fig.1) mostra todos os colegas de trabalho de múltiplas nacionalidades com quem convivi. Nesta empresa, no primeiro dia de trabalho, recebiam os novos funcionários com uma festa, singela, de latas de cerveja e bolos de supermercado, mas de um calor humano que contrariava o frio lá de fora... Queriam conhecer os novos funcionários antes de os pôr a trabalhar, saber do seu país, dos seus costumes, das suas espectativas em Londres.

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Figura 1 – Equipa de trabalho que integrei,

na Ellis Brigham Mountain Sports, em Outubro de 2008.

O terceiro objetivo era abrir uma conta bancária, e registar-me como trabalhadora, e aqui encontrei a minha maior dificuldade, pois tive várias reuniões em diferentes bancos, os quais dias mais tarde, cordialmente, me negaram a abertura de conta sem justificação, até que consegui por fim abrir conta num banco mostrando o meu contrato de trabalho. No entanto, conseguir um registo na segurança social como trabalhadora foi fácil, tendo sido numa primeira instância realizado por telefone, e posteriormente formalizado em balcão. Segundo a opinião dos meus colegas de trabalho estrangeiros, parecia-lhes que esta resistência por parte dos bancos, tinha possivelmente por trás uma intenção em deter a emigração não laboral, uma resistência dirigida aos emigrantes em busca dos benefícios sociais oferecidos pelo governo...

Apesar de tudo, a minha integração profissional foi imediata, senti um acolhimento genuíno por parte dos colegas e superiores, e um apoio profissional que nunca tinha experimentado na vida. Estive em formação intensiva durante quase um mês, e após essa formação, de imediato,

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depositaram em mim uma confiança e responsabilidades que podem levar anos a ser atingidas em Portugal. Este apoio profissional foi sobretudo responsabilidade do gerente da loja, um premiado montanhista austríaco.

O apoio era tão grande, quanto o entusiasmo e a excitação parte a parte em descobrir outra cultura. Recordo-me que, inicialmente, os meus colegas de trabalho tentavam descobrir curiosidades da minha cultura, algo diferente da deles, e da minha parte também, queria saber o que fazia de nós tão diferentes, o que nos distinguia para além da língua. Mas com o tempo, havia cada vez menos diferenças entre nós; o dia a dia, mostrou o quão semelhantes éramos, emigrantes, de proveniências distintas, e tantas fragilidades em comum... Foram precisamente essas fragilidades que alavancaram os nossos relacionamentos, as aprendizagens provenientes das nossas diferenças que se manifestavam em cada conversa, tinham por base uma empatia alicerçada nas semelhanças, nos sentimentos partilhados, nas espectativas em melhorar de vida, por exemplo. Por vezes enquanto conversava em inglês com um polaco, falhava-nos uma expressão, uma falta de vocabulário, a ambos os interlocutores. Acontecia muitas vezes em discussões existencialistas, sobre o nosso lugar no mundo, e geravam-se silêncios, curtos, mas que valiam como a melhor das palavras, trocavam-se olhares, inquietações, gerava-se uma forma de comunicação tão eficaz, apoiada unicamente no sentimento humano que existia em comum. As nossas relações eram interculturais, sem sequer sabermos o que isso significava enquanto prática, aproveitávamos o melhor dos nossos mundos para produzir pensamentos e ideias para o futuro.

A foto seguinte (Fig.2) retrata um conjunto de amigos em noite da passagem da ano, em que todos passaram sem a sua família, pela distância, pelos preços das viagens que decuplicavam nessa época do ano. Nessa altura fomos família uns dos outros, fomos o ombro e fomos peito. Todos sentiam a saudade.

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Figura 2 – Polacos, Espanhóis, Portugueses, e Brasileiros num convívio

em vésperas de fim de ano, Paddington, Londres, Dezembro de 2008.

Julgo que a interajuda, e colaboração num objectivo comum, revelou a forma de pensar, agir, estar, e saber, tão idêntica, e foi nesse momento que senti uma ligação que nos uniu até hoje, e surpreendentemente, anos após o meu regresso a Portugal pude contar com uma mão cheia destes amigos no dia do meu casamento.

Pouco tempo depois voltei a Portugal, mas por poucos anos, pois a plena crise económica, agravada sobretudo em alguns países, incluindo Portugal, colocou-me de regresso a Inglaterra, o país que tão bem me acolheu; o qual apesar de não querer tornar-me sua cidadã, vejo como segunda casa, e como escapatória, principalmente a nível profissional. A segunda vez não é como a primeira, é um retorno e não uma emigração, pelo menos assim o vejo, retorno ao que já conheço, e por isso, não se deu uma emigração para o desconhecido. Não fosse o tempo passado em Portugal, entre as duas emigrações, e teria sido antes, uma imigração.

Apesar de conhecido o país, escolhi uma cidade diferente, Manchester; bem a Norte fica uma cidade com um clima bem mais exigente do que a

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capital inglesa, mas que me atraiu por ser mais barata, com o mesmo salário mínimo e com mais oportunidades de emprego na área da educação, e que após conseguir a obtenção do Qualified Teacher Status2 se tornou uma oportunidade quase imediata.

Nesta segunda vez, quase tudo foi mais fácil, apesar da escassez de poupanças, já tinha conta bancária e número de segurança social, comecei por procurar quarto, o qual consegui, mais rápido e barato, encontrando novamente a oportunidade de conviver com outras culturas. No entanto, Manchester, apesar de ter uma taxa relativamente expressiva de emigrantes, não é como Londres, conserva a sua maioria britânica, e desta forma finalmente consegui conhecer melhor e entrosar-me na cultura inglesa.

A fotografia abaixo (Fig.3) mostra o quão valiosas eram as minhas poupanças em período de estabelecimento na região. As casas em Manchester não são prontas a habitar, como em Londres, são mais abundantes os alugueres de longa duração, mais baratos, mas em casas com pouca ou nenhuma mobília, sem almofadas, sem roupa de cama, sem talheres, etc. Nesta foto podemos ver o aproveitamento de uma mochila de montanha recheada de talheres, lençóis e uma almofada, numa caminhada que não foi pela frescura das montanhas, mas sim pelo gelo dos caminhos ladeiros aos canais de Salford, e que nos poupou uma viagem de táxi, cujo custo daria para mais um dia de alimentação. 2 Qualified Teacher Status - Estatuto de Professor Qualificado. Qualificação essencial para lecionar no Reino Unido, conseguida por equivalência ao meu diploma português e

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Figura 3 – Primeiras mudanças em Salford (Manchester), Março, 2013.

Manchester, cidade berço da Revolução Industrial, é desenhada pelos canais e pelas suas centenas de antigas fábricas que contrastam com a nova sede da BBC, numa cidade envidraçada dentro de Manchester, chamada de

Salford Quays, com centros comerciais, museus, e yuppies3 com vão de fato

montados em bicicletas para o trabalho. Aqui o sotaque inglês afinca-se, e os Mancunians4 com os quais contactei foram bastante amáveis e acolhedores.

A cidade era ainda semi-circunscrita por uma cordilheira de montanhas que em muito me atraiu como potencial espaço de lazer e desporto; a cordilheira chama-se Peak District, prolonga-se até à Escócia, e vê-se de qualquer ponto por entre os prédios de Manchester.

As minhas espectativas como futura mancunian apoiavam-se em alguns aspetos interessantes, nomeadamente ao nível geográfico, com montanhas e mar a menos de 50kms, e ao nível humano, onde contava com um casal

3 Yuppies, de YUP (Young Urban Professional)

4 Habitantes de Manchester (de Mancunium, província romana que antecedeu a região de

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vizinho de amigos polacos com quem tinha trabalhado anos antes em Londres.

A integração profissional e social na cidade deu-se de forma heterogénea; se por um lado socializava sem barreiras aparentes com os meus colegas de casa, a nível profissional o distanciamento era mantido.

O período em que vivi em Manchester foi marcado pelo crescente populismo de um partido político chamado UKIP5 liderado por Nigel Farage, que sempre se insurgiu contra a entrada de emigrantes no Reino Unido, sobretudo os do leste da Europa, aquando da integração na União Europeia de países como a Bulgária. Percorrer as ruas de Manchester e ver cartazes políticos contra os emigrantes, provocou em mim uma fragmentação emocional, e um súbito distanciamento daquela sociedade inglesa que outrora me acolhia tão abertamente... Os cartazes rodeavam a cidade, e aí tantas vezes me perguntava, onde estão os ideais europeus e o pensamento intercultural...?

Figura 4 - Cartaz do UKIP fotografado em Liverpool por Sandra Marinho, 2013.

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Em pouco tempo senti a cidade de Manchester estéril de esperanças, iam-se percebendo as barreiras culturais ocultas na contratação profissional. Dava-me a sensação que os estrangeiros ocupavam aqui cargos menores e temporários, ao contrário da cidade de Londres onde altos dirigentes são efetivamente estrangeiros.

Caminhando pela cidade, de uma entrevista a outra no mesmo dia, percorriam-se as ruas cruzando com vários cartazes do UKIP, porque haviam os empregadores então querer aceitar emigrantes na sua força laboral?

Parecia-me difícil acreditar num futuro permanente naquele território, onde testemunhei a sua multiculturalidade, mas não a sua interculturalidade. (Os dois conceitos encontram-se na presença de diversas culturas, mas afastam-se na forma como essas culturas se relacionam, sendo que na multiculturalidade as culturas se agregam, mas mantêm-se isoladas, e na interculturalidade relacionam-se, de modo a gerar conhecimento e a enriquecer a identidade a todas as culturas envolvidas nesse relacionamento.) (Aguado, 2003, p. 13)

A ideia construída em torno dos estrangeiros, segundo o meu ponto de vista pessoal, era diariamente manchada por cartazes populistas, para se poderem integrar produtivamente outras culturas.

Manchester também se afigurou socialmente um local demasiado hostil para os meus padrões portugueses, sobretudo nas camadas mais jovens. Desta hostilidade fui tomando conhecimento nas escolas que fui contactando, assim como nos pubs, do bullying ao stabbing, quase como um vestígio da cultura do scuttling6 de Manchester (Park, 2014).

No Museum Of Science and Industry de Manchester, aprendi que a decadência do final da Revolução Industrial atirou a cidade para o desemprego massivo, para a violência e vandalismo que a caracterizou durante décadas, e tenta agora passar despercebido, embora o que se lê nos

6 Os scuttlers eram membros de gangues jovens dos subúrbios de Manchester formados

por desempregados da ex-classe trabalhadora da falida Indústria de Manchester, nomeadamente em Salford durante o final do século XIX. (Park, 2014)

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jornais locais, é que subitamente qualquer coisa faz estalar esta passividade construída pelo novo urbanismo, e lá aparece mais um jovem morto à saída do pub, degolado pelo bojo de uma garrafa partida, durante uma discussão sobre futebol...7 Ouvi demasiados destes casos em muito pouco tempo, e sem me conseguir imaginar a ter que educar um filho, em tal ambiente, regressei a Portugal na primeira oportunidade profissional que tive.

7 Noticiado por Manchester Evening News:

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http://www.manchestereveningnews.co.uk/news/greater-manchester-news/boy-16-1.2.

A

SEMÂNTICA DO EUROPEU

…pela forma se chega ao fundo, pelo continente ao conteúdo, pelo som da palavra ao significado dela.8

(Saramago, 2012)

No estudo da interculturalidade e do papel do Ensino do Inglês como potencial idioma de suporte entre diferentes culturas, importa saber situar a existência de interculturalidade no espaço europeu, onde habito, abrangido nesta investigação, e interessa-me sobretudo aproximar-me do que me inquieta neste projeto de investigação, e me leva a valorizar essa interculturalidade.

O que me inquieta são os fenómenos sociais, como a xenofobia, assunto sobre o qual adiante me irei debruçar, e sobretudo a distância que vai daquilo que idealizamos ser, enquanto cidadãos europeus, e o que praticamos ser na realidade, e que ecoa nas políticas europeias.

Parece existir uma diferença entre o signo9 ou conotação de “europeu” (ampliando a semântica10 da palavra “europeu” como uma finalidade a atingir), e o significado e denotação de “europeu”, o europeu que se constata na realidade. Procuro entender deste modo, o que possui de atraente o signo “europeu”, para se tornar contentor e continente, de tantos emigrantes, que preferiram o refúgio europeu, em vez dos países ricos do Médio Oriente, aquando da guerra na Síria.

O que significa ser europeu tem-se revelado diacrónico, tem evoluído ao longo da História, e se por um lado a Europa já sofreu no tempo um sentido ligado à guerra, à fragmentação, ou ao imperialismo, (McCormick & Olsen, 8 Excerto da Jangada de Pedra, obra de José Saramago, rica em metáforas à Europa, e à suposta identidade dos que nela foram anexados, e ficcionalmente desanexados... 9 Signo: indicador, sinal, (uma representação simplificada de algo mais complexo). (Porto Editora, 2016) 10 Semântica: ramo linguístico que estuda o significado das palavras e das relações de sentido que estabelecem entre si, e que na Semiótica estuda as relações dos signos com os objetos a que estes se referem. (Porto Editora, 2016)

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The European Union: Politics and Policies, 2014) agora no nosso tempo, transparece valores que a tornam atrativa. Posto isto, acredito que significar ser europeu, é um pouco diferente, do que é realmente ser europeu, como se a Europa ou o europeísmo, como matriz etnocultural única, pretendesse significar algo que não atinge, algo semântico, derivado apenas dos sinais que emite, e que enseja concretizar... Podemo-nos questionar se ser europeu é uma forma de ideologia para os europeus, pois a significação que lhe é atribuída, produz-se na interação entre a informação (os signos) que nos chega pelos meios de comunicação sobre a imagem da Europa, e a audiência que é feita de uma cultura, ou subcultura, europeia, em que essa informação assenta. Esta ideologia, como tantas outras, assenta num sistema de crenças determinadas de uma classe, que podem ou não ser ilusórias, e que geram conhecimento que se crê ser verdadeiro e científico. (Fiske, 1997)

No ano de 2013, no livro The European Union: Politics and Policies, o professor Jonathan Olsen, da Texas Woman's University, co-autor de John C. McCormick, cientista político, da Universidade do Indiana, e autor do famoso livro, Europeanism, referem que esses sinais, atrativos, emanados pela Europa, manifestam-se em alguns valores como a “percepção de paz”, o “cosmopolitismo e comunitarismo”, o “multiculturalismo” e o “secularismo”.

A percepção de paz é identificada pelos europeus como uma rejeição filosófica da violência. Apesar de perpetuarem um papel importante em conflitos internacionais, os europeus já não se veem mais como opositores entre si, assumindo-se como parte da mesma organização. A ideia de um conflito violento dentro da Europa passou a ser algo impensável. No entanto, como organismo político bem armado, e disposto a utilizar em sua defesa ou interesse a sua força bélica, a Europa não parece querer encorajar o uso de força, já que os europeus preferem soluções diplomáticas e focadas no poder do povo, sem deixar nunca de contar com a sua retaguarda militar... (McCormick, 2013)

(30)

Quanto ao cosmopolitismo e ao comunitarismo, os europeus gostam de se ver como uma comunidade, associando a sua imagem a seres que transcendem as ideias universais e que possuem uma moralidade comum que está acima das suas fronteiras e identidades nacionais. Enquanto comunidade, os europeus partilham a ideia de que a sociedade é quem melhor pode julgar um indivíduo e não o contrário, admitindo que, por vezes, o estado possa ter mão nesse julgamento, aceitando-o como mediador e nivelador do bem estar geral, da economia, da saúde e da igualdade de oportunidades. (McCormick, 2013)

Decorrente das culturas com as quais historicamente a Europa foi tendo contacto, surge uma diversidade social e um hábito de integração de características e valores de outras culturas dominantes. Por isso o multiculturalismo assume-se como um valor ou mesmo uma tradição na Europa, apesar do racismo e a descriminação religiosa não terem desaparecido totalmente. (McCormick, 2013)

O secularismo manifesta-se também como valor europeu, pois apesar da religião continuar a ter um papel preponderante, e até crescente, no resto do globo, na Europa o seu papel é cada vez mais marginalizado, com o abandono dos locais de culto, e cada vez mais raras manifestações de fé. Os temas atuais, como o aborto e a eutanásia, refletem uma Europa que cada vez mais se reconhece no ateísmo e agnosticismo. (McCormick & Olsen, 2014)

A plataforma Debating Europe, criada em 2011 pela Secretaria Geral da União Europeia, permite desde então, aos cidadão europeus, discutir as suas ideias diretamente com os líderes políticos europeus, de forma a encorajar ligações genuínas entre o povo e o parlamento europeu, e em Outubro de 2014, esta plataforma esteve interessada em saber o que significa para SI ser

“europeu”. (Debating Europe, 2014)

A questão sobre o que significa ser europeu surge regularmente na plataforma Debating Europe. Já havia sido debatido no passado a identidade ou o sentimento europeu, e o que significa a cidadania europeia para os europeus, estas questões ganham importância nos debates sobre a imigração,

(31)

ou os resgates financeiros, ou até mesmo na nossas relações com a Rússia. Os valores debatidos incidem frequentemente na democracia liberal e nos direitos humanos. (Debating Europe, 2014)

Jo Leinen, alemão, membro do parlamento europeu, presidente do

European Movement International, afirma que existe “Uma forma de estar

europeia”, baseado num modelo social comum europeu (embora variando de país para país), identificando os valores dominantes como a solidariedade, igualdade, e inclusão, como fundamentais, nesta forma de estar. (Debating Europe, 2014)

O gráfico que se segue abaixo (Fig.5), mostra-nos algo muito interessante, pois revela que os 1060 participantes da plataforma, neste assunto (What

does it mean to YOU to be “European”?), elegem mesmo acima da economia,

a cultura europeia, como o valor mais importante na identidade europeia. No entanto é precisamente na área da cultura que incide este estudo, e que se pretende fundamentar adiante, que esta, nas políticas educativas, carece de uma abordagem intercultural, que combata as insuficiências sociais que permitem a existência de xenofobia. E a imagem de uma Europa com xenofobia, creio não combinar com o que desejamos ou acreditamos ser como povo, no espaço europeu...

(32)

Figura 5 - 2014, Debating Europe - What does it mean to YOU to be “European”?

(33)

Lévi-Strauss defende que a principal fronteira a que todas as sociedades procuram inferir sentido, existe na diferença entre natureza e cultura. A cultura é um processo de produção de sentido, atribuindo-o não só à realidade ou natureza, mas também ao plano social a que ela pertence. (Fiske, 1997, p. 162)

A ideia que produzimos de nós mesmos, da forma como nos relacionamos socialmente, é concebida pelos mesmos processos culturais, muito embora a maioria das culturas, não aceite a continuidade entre a forma como nos vemos, e a forma como vemos a natureza. A maioria das culturas, distingue claramente natureza de cultura, tentando inferir significações (ou categorias) que julgam estar inerentes à natureza, para atribuir sentido a conceptualizações culturais. Ora verifica-se aqui uma contradição, as culturas procuram distinguir-se da natureza de modo a fincarem a sua própria identidade, e depois legitimam essa identidade voltando a estabelecer uma comparação direta com a natureza. (Fiske, 1997, p. 163)

Isto faz-me pensar na forma como os europeus enquanto sociedade parecem querer defender a paz e a igualdade, como uma identidade alternativa à nossa natureza animal que é desigual e agressiva; depois constatamos que, para defender essa igualdade e paz, necessitamos de proteger a nossa cultura com políticas de violência que envolvem armamento, muros, e propaganda xenófoba, como falaremos no capítulo seguinte (capítulo 1.3.).

(34)

1.3.

A

XENOFOBIA E O SEU IMPACTO NA

E

UROPA

Esta Europa que atraiu a imigração, está nas últimas décadas, sobretudo nos últimos dois anos, a receber quantidades massivas de migrantes de diversas proveniências, nomeadamente do Médio Oriente, consequência da guerra e da destruição dos seus países. Com o acolhimento destes imigrantes, acentuam-se os fenómenos sociais mais sórdidos, como é o caso da xenofobia, inverso da identidade inclusiva e vanguardista europeia. (Frantescu, 2007)

Identificar e assumir estes fenómenos sociais como um problema europeu a extinguir pode ser uma forma de os enfrentar nas gerações futuras; e acredito que no ensino do Inglês, no 1º Ciclo do Ensino Básico, existe algum espaço e uma oportunidade real e apropriada para introduzir uma pedagogia intercultural, sobretudo por tratar-se de uma disciplina em que se desenvolve um competência linguística, e logo uma oportunidade eminente e promissora de futuros contactos com outras culturas, no exercício do Inglês.

Do Mare Nostrum

11

ao Triton

12

:

Como reação ao naufrágio da ilha de Lampedusa em Itália, no ano de 2013, uma catástrofe com 400 mortos, entre a costa do sul da Itália, e a costa leste da Tunísia, ilha fustigada há algumas décadas por este tipo de tragédias, o governo italiano iniciou uma operação humanitária chamada de Mare

Nostrum, que monitorizou o mar mediterrâneo, e até outubro de 2014 salvou

a vida a mais de 150000 migrantes ilegais, não conseguindo salvar todavia quase 3000 pessoas de morrer afogadas neste mar. 11 Nome dado pelos Romanos ao Mar Mediterrâneo. 12 Nome do deus grego filho de Poseidon e Anfitrite, um masculino de sereia, representado com rabo de peixe, e cabeça e tronco humanos, conhecido como o Rei dos Mares.

(35)

A Eslovénia foi o único país que tentou ajudar Itália nos elevados custos desta operação humanitária, mas os restantes membros da União Europeia acreditaram que esta operação servia de convite à emigração clandestina, e com a pressão política e o aumento de emigrantes ilegais em finais de 2014, a operação Mare Nostrum foi extinta, dando lugar à organização europeia

Triton. (Eisinger, 2015)

Cerca de vinte países passaram a contribuir para uma fiscalização do mar mediterrâneo, bem como das restantes fronteiras europeias, com vista sobretudo a impedir a emigração, com preocupações mais limítrofes à geografia europeia do que humanitárias, tratando-se sobretudo de uma diferença de ação entre salvamento e vigilância, as vidas humanas passaram assim para segundo plano, em benefício da “proteção” da Europa, e apesar da emigração não poder na Europa ser impedida por leis, é-o por politicas fronteiriças. (Eisinger, 2015)

Segundo Kees Van der Veer, o autor principal de um artigo resultante de um inquérito europeu para o famoso jornal “The Atlantic” em 2015, a pesquisa sistemática sobre a xenofobia está apenas no seu início. O medo da ameaça pela chegada de novos indivíduos, o medo da mudança cultural, o medo de perda de identidade, o medo de deslealdade dos estrangeiros, o medo de perder o controle do sistema político, estão no foco da xenofobia na Europa.

Kees Van der Veer refere ainda neste inquérito a França como um dos países mais xenófobos, mais do que muitos países da Europa de Leste. (Veer & Horn, 2015) Enquanto uma maior percentagem de inquiridos húngaros (24 por cento) alegaram que não gostaria de viver perto de imigrantes ou trabalhadores estrangeiros em comparação com os entrevistados alemães (13 por cento), os inquiridos franceses manifestaram-se como os mais hostis sendo mais de 36 por cento.

Numa pesquisa mais recente, que ocorreu entre 2010 e 2014 e que exclui a França e a Hungria, a percentagem de alemães que diz que não gostar de ter

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trabalhadores estrangeiros ou imigrantes como seus vizinhos subiu de 13 por cento para 21 por cento. (Veer & Horn, 2015) O seguinte mapa do Jornal The Atlantic (fig.6), mostra-nos a percentagem de europeus que não deseja ter imigrantes como vizinhos ou trabalhadores. Não me parece surpreendente, que estes países sejam precisamente, na sua maioria, os países de leste, que formam fronteira entre a Europa, a Ásia e o Médio Oriente, assim como a França, que apesar de não possuir uma fronteira terrestre com outros países não europeus, tem no mediterrâneo um veículo de entrada para países como a Argélia ou a Tunísia... Coincidência ou não, segundo a International Campaign to Abolish Nuclear Weapons, os mesmos países retratados a seguir, são na sua maioria, os mais bem armados da Europa ao nível bélico, nomeadamente com potencial nuclear (França e Rússia). (Federation of American Scientists, 2016)

(37)

Figura 6 – World Values Survey, 2005-2009, The Atlantic.

(38)

Na Hungria, sucedeu-se um pequeno, porém simbólico, exemplo de acontecimentos xenófobos na Europa, aquando da recente onda de emigração de refugiados sírios, e está retratado nas imagens abaixo deste texto. Estas imagens (fig.7) que comecei por usar na apresentação da ideia inicial deste projeto de investigação, poderão ser imagens indutoras de uma discussão filosófica, são imagens que pelo seu poder simbólico poderão marcar um tempo que vivemos, como me marcaram a mim, de forma angustiante, como europeia, como professora, e como mãe.

Foi em Setembro de 2015, na Hungria, aquando da entrada de refugiados na Europa, vindos maioritariamente da Síria, que a repórter de imagem húngara Petra Laszló da N1TV, foi filmada a pontapear refugiados, entre eles uma criança, e um homem com um bebé de colo, enquanto estes fugiam da polícia. As imagens que rapidamente se tornaram “virais”13 por via do

Facebook e Twitter, acabaram por chegar à televisão alemã RTL, e resultaram

do despedimento imediato da repórter, dando origem a inúmeras discussões sobre xenofobia, um pouco por todo a Europa. (Guardian, 2015)

Segundo a Radio Villa Francia, a repórter Petra Laszló, que se veio a revelar militante do partido filofascista14 húngaro denominado Jobbik (RVF, 2015), pediu publicamente desculpas pelo sucedido, justificando: “something

snapped in me” (algo quebrou em mim)...

A repórter acabou todavia por ameaçar processar o Facebook por se recusar em retirar as suas imagens da rede social. (Guardian, 2015) 13 “Viral” no contexto das redes sociais, representa a propagação “epidémica” de um conteúdo multiplicado milhares de vezes por disseminação de republicações pessoais repetidamente. 14 De Filofascismo: O prefixo filo de phílos que significa "ama"; “amor pelo fascismo”.

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Figura 7 - Repórter de imagem húngara filmada a pontapear refugiados em Röszke, na Hungria,

filmado por Stephan Richter, repórter de imagem da televisão alemã RTL, em 09/09/2015.

(40)

Um outro acontecimento simbólico, porém bem mais dramático aconteceu durante o mesmo período, em que o Reino Unido se encontrava em campanha, para a saída ou permanência britânica da União Europeia. No dia 16 de Junho de 2016, em West Yorkshire, a política e ativista de direitos humanos, Jo Cox, membro do parlamento Inglês, foi brutalmente assassinada na rua, baleada e esfaqueada por um transeunte que gritou “Britain First!” enquanto a esfaqueava antes de fugir. Jo Cox, acreditava num mundo melhor, e estaria até à data do seu assassinato envolvida em assuntos relacionados com os direitos humanos, dos refugiados da Síria que se encontravam em Calais a aguardar permissão para entrada e exílio no Reino Unido.

Uma das afirmações com que dei início a este estudo no capítulo 1.1., onde refiro que: a primeira forma de relação cultural que tive com os meus pares foi com base nas semelhanças que detetei neles, e não nas as diferenças que nos separam. Pois uma das frases que marcou os persuasivos e influentes discursos de Jo Cox foi precisamente neste sentido, e pode ser vista na imagem seguinte (fig.8), que surgiu pela mão de um autor desconhecido, espontaneamente, poucas horas depois da sua morte, em Moseley (Booth, Dodd, & Parveen, 2016):

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O poder da imagem, ao serviço da propaganda:

Na Primavera de 2016, durante a campanha do partido UKIP, a favor da saída britânica da União Europeia, um cartaz “anti-migrante” que foi exibido por Nigel Farage, líder do partido, foi reportado à polícia por incitar o ódio racial e violar as leis raciais britânicas.

Em Junho de 2016, Dave Prentis, do sindicato Unison, afirmou ter denunciado à Metropolitan Police o cartaz, que exibia uma fila de migrantes e refugiados na sua maioria não-brancos, com o slogan "Ponto de ruptura: a UE falhou a todos". O cartaz foi descrito por Prentis como uma "tentativa flagrante de incitar ao ódio racial":

"To pretend that migration to the UK is only about people who are not white is to peddle the racism that has no place in a modern, caring society. That’s why Unison has complained about this blatant attempt to incite racial hatred and breach UK race laws."15

(Stewart & Mason, 2016)

Mais tarde, a controvérsia sobre o cartaz levou Boris Johnson, líder do partido conservador britânico, a distanciar-se da campanha do UKIP, assim como vários políticos desde Nicola Sturgeon até Yvette Cooper também condenaram o cartaz, que se segue abaixo deste texto. (Stewart & Mason, 2016) 15 “Fingir que a migração para o Reino Unido é apenas de pessoas que não são brancas é vender um racismo que não tem lugar numa sociedade moderna e atenciosa. É por isso que a Unison queixou-se desta tentativa flagrante de incitar o ódio racial e violar as leis raciais

(42)

Figura 9 - Nigel Farage em frente ao cartaz do UK Independence Party, usado na campanha a favor do Brexit, na Primavera de 2016. (Stewart & Mason, 2016)

Durante a campanha política Brexit16, Nigel Farage, exibiu o cartaz (Fig.9)

em Westminster com o subtítulo: "Temos de nos libertar da UE e retomar o controlo das nossas fronteiras". No entanto a fotografia utilizada não figuravam os refugiados de Calais, fronteiriços do Reino Unido, mas sim migrantes que atravessavam a fronteira Croácia-Eslovénia em 201517, onde a única pessoa branca distinta na fotografia, se encontrava obscurecida por uma caixa de texto. (Stewart & Mason, 2016)

A propósito do Brexit, como fenómeno social, uma investigação realizada em Agosto de 2016, pelo cientista político norte-americano, Ronald F. Inglehart, da Universidade de Michigan, em conjunto com a Professora de política comparativa, Pippa Norris, da Universidade de Harvard, propõe que o 16 Brexit: termo usado na campanha pela saída do Reino Unido da União Europeia em 2016, que resulta da fusão das palavras Britain e Exit. 17 Um porta-voz da Getty Images confirmou que a foto havia sido licenciada por eles e capturada na Eslovênia em 2015 pelo seu fotógrafo Jeff Mitchell. (Stewart & Mason, 2016)

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populismo de que somos vítimas, quase sempre enfatiza o nativismo ou o nacionalismo xenófobo, que parte do princípio de que o "povo" é um todo uniforme, e que os países devem expulsar as pessoas de outras culturas. O populismo patrocina o monoculturalismo, as fronteiras fechadas, e um autoritarismo xenófobo, que se estende pelo mundo ocidental como no caso do fenómeno Brexit. (Inglehart & Norris, 2016, p. 7)

Imagens como esta encontram-se portanto na origem e prática do populismo que tem levado ao poder partidos e políticos extremistas por todo o mundo, e que pelo seu carácter impostor, ludibriam através do medo e da instigação das fragilidades do povo, promovendo o ódio e a separação cultural. (Inglehart & Norris, 2016)

O uso da imagem, descontextualizado da sua origem, pode ser usado para disseminar o medo e favorecer artifícios. A forma como foi exibida foi na verdade uma forma de falácia, com o objectivo de enganar, confundir, e persuadir o público.

No entanto, terão as mesmas imagens da propaganda, um potencial inexplorado, se revertidas a favor do pensamento filosófico? Poderão imagens como esta ser usadas em benefício do bem, na aplicação de uma estratégia pedagógica de interculturalidade...? Adiante debruçar-me-ei nesta questão, da utilização de imagens em propostas pedagógicas.

(44)

1.4.

A

I

NTERCULTURALIDADE E A SUA RELEVÂNCIA NA PEDAGOGIA

.

A interculturalidade assume uma grande relevância na pedagogia, como uma oposta à visão monocultural no mundo e na educação, ou seja, à abordagem pedagógica delimitada por uma só cultura, e à perpetuação desta mesma em que vivemos; uma visão cada vez mais globalizada ao nível económico, político e ideológico. (Aguado, 2003, p. 13)

A pedagogia intercultural integra a complexidade humana na cultura, e conceptualmente não aspira à compreensão total dos fenómenos culturais, caracterizando-se e definindo-se a si mesma, num processo contínuo e dinâmico, de análise, e reflexão destes fenómenos. (Aguado, 2003, p. 13) Bem diferente do conceito de multiculturalidade, que estuda as diferenças estáticas de uma sociedade etiquetada por categorias como, idade, religião, género ou nacionalidade; a interculturalidade estuda precisamente a diversidade humana como ponto de partida para a construção de algo novo. (Aguado, 2003, p. 13)

Assim a pedagogia intercultural define-se justamente, no objetivo de focar a sua reflexão nas diferenças culturais. As diferenças culturais são dinâmicas, mutáveis, e nunca estáticas, e são vistas como a norma, nunca como algo fora de um padrão. Estas diferenças referem-se sobretudo aos significados que para uma determinada cultura, são partilhados num determinado grupo, e geram valores de conduta. Estes valores legitimam o conhecimento dirigido a todos os sectores da sociedade, em prol da igualdade de oportunidades e dignidade, e podem ser proporcionados pela educação.

A pedagogia intercultural objectiva o desenvolvimento de competências

interculturais nos alunos, que podem ajudar na sua finalidade, a ultrapassar o

racismo e a descriminação, contribuindo para uma coesão social. (Aguado, 2003, p. 15)

A prática da interculturalidade manifesta-se assim como um desafio à nossa forma de estar e ver o mundo pela perspetiva de cada cultura, partindo

(45)

da realidade e referências de cada indivíduo em causa, tendo em conta a significância que cada indivíduo tem, e o que significa para si o mundo em que vive; contribuindo desta forma para construirmos um mundo mais rico, advogado da diferença humana, divergente no pensamento, e acredito que acima de tudo, facilita na convergência dos valores que nos levam à paz.

Acredito que a pedagogia intercultural pode tornar-se uma ferramenta contra a emergente globalização ideológica, que parece querer normalizar a sociedade, e por sua vez, extinguindo a diversidade cultural que a ameaça. Assim, qualquer estudo neste sentido, será uma forma de resistência, que resultará da intercompreensão e aceitação das diferentes culturas que caracterizam o nosso mundo.

Competências Interculturais: Numa Europa que se define como multicultural, e se alicerça numa história de numerosas influências culturais na sua formação geopolítica, a escola tem um papel fundamental na gestão da diversidade cultural, criando bases para uma aprendizagem que se preste à interculturalidade. E esta escola requer dos professores uma preparação inicial, não só para gerir a diversidade cultural dentro da sua sala de aula, mas também para preparar e sensibilizar os alunos para o contacto com outras culturas, sobretudo em aulas de línguas estrangeiras, onde é mais oportuna a inserção da interculturalidade como pedagogia. Por isto, e olhando o mundo em que vivemos hoje, é preciso cada vez mais adequar as práticas pedagógicas de modo ir ao encontro das capacidades e necessidades de que os nossos alunos carecem para se prepararem para o futuro.

No documento da UNESCO - Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura, publicado em 2014, e intitulado de “Educação para a cidadania global - preparando alunos para os desafios do século XXI”, a Educação para a cidadania global, surge como um tema solicitado pela

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organização, a dar passos para promover a paz, o bem-estar, a prosperidade e a sustentabilidade da comunidade internacional. Como? Na verdade o próprio documento admite não existir ainda um consenso sobre o significado de Cidadania Global, e logo sobre o que a Educação para a mesma deve promover... Todavia há uma ideia por onde começar, e é pelo desenvolvimento de competências capazes de equipar os alunos para o complexo e globalizado mundo em que vivemos. (UNESCO, 2015) E essas competências são:

“- uma atitude apoiada por um entendimento de múltiplos níveis de identidade e também o potencial para a construção de uma identidade coletiva que transcenda diferenças individuais culturais, religiosas, éticas ou outras (como o sentimento de pertencer a uma humanidade comum e o respeito pela diversidade);

- um profundo conhecimento de questões globais e valores universais, como justiça, igualdade, dignidade e respeito (como entendimento do processo de globalização, interdependência/interconectividade e dos desafios globais que não podem ser abordados adequada ou unicamente por Estados-nação, tendo “sustentabilidade” como o principal conceito do futuro);

- habilidades cognitivas para pensar de forma crítica, sistêmica e criativa, incluindo a adoção de uma abordagem de múltiplas perspectivas, que reconheça diferentes dimensões, perspectivas e ângulos de questões (como habilidades de raciocínio e de resoluções de problemas, apoiadas por uma abordagem de múltiplas perspectivas);

- habilidades não cognitivas, incluindo habilidades sociais, como empatia e resolução de conflitos, e habilidades de comunicação e aptidões para

networking e para a interação com pessoas de diferentes contextos, origens,

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- capacidades comportamentais para agir de forma colaborativa e responsável, de encontrar soluções globais para desafios globais, bem como para lutar pelo bem coletivo (como sentimento de compromisso e habilidades de tomadas de decisão).“ (UNESCO, 2015) Para viver num mundo globalizado, que se tornou tão exigente e diverso, parece-me particularmente interessante o quarto ponto supra escrito, ou seja, promover a empatia como habilidade social, e para tal, encontrar nos outros as semelhanças, antes de ver as diferenças. Este poderá ser um caminho para aspirar à igualdade. Essas semelhanças encontram-se ao nível mais humano mais básico, e constatam-se antes da religião, da política, ou de qualquer forma histórica de categorização social, por debaixo da cor da pele. Por isso conjeturo que quanto mais cedo conferirmos essas semelhanças, com os outros seres humanos, de outras culturas, quanto mais essa confirmação se der em tenra idade, mais produtiva será, pois essa influência histórica, política, ou religiosa, será ainda pequena e logo, menos dominante. O Ensino Precoce do Inglês ocorre justamente nessa tenra idade, e promover estas competências dentro desta disciplina é uma ideia que surge com naturalidade.

Algumas destas competências, nomeadamente o exercício da empatia, foram para mim eficazes, enquanto emigrante, e enquanto ser social, que agora se reviu no seu passado emigrante, como um ser um tanto ou quanto intercultural.

Pessoalmente, a interculturalidade deu-se sem pretensão de o atingir, espontaneamente, e para minha sorte, eficazmente, resolvendo as diferenças que tive com outras culturas, ao nível pessoal, e ao nível profissional.

Com as minhas emigrações, pude experienciar que o sentimento de empatia pelas outras culturas que contactei abriu caminho para uma relação

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concebidas, dando lugar a uma verdadeira aproximação. A empatia está do lado oposto da diferença, e a diferença pode ser um caminho que leva à discriminação.

Michael Byram, linguista, investigador em interculturalidade, e professor da Universidade de Durham, defende justamente isto, no seu livro “Young

People Facing Difference: Some Proposals for Teachers” (1995), passando a

citar:

“The concept of empathy offers a solution at the level of the individual for the approach to irreducible cultural diversity. Based in social psychology, this approach neglects the historical, economic, and political dimension. This concept under-estimates the unconscious effects of socialization and assumes that explicit willingness to share the other’s point of view as an individual, can resolve the differences between cultures.”18 (Byram & Zarate, 1995, p. 10) As competências interculturais, são as capacidades e práticas cognitivas e afetivas, essenciais para alguém se desenvolver num meio intercultural. Estão direcionadas para a criação de um ambiente educativo, no qual as pessoas se sintam aceites, e compreendidas nas suas próprias características e habilidades sociais. As três principais dimensões das competências interculturais defendidas por Teresa Aguado (2003), são as atitudes, o

conhecimento, e as habilidades ou capacidades, que se complementam com

os valores trazidos pela sociedade composta pelos vastos grupos sociais que a integram. (Aguado, 2003, p. 153)

A primeira dimensão das competências interculturais são as atitudes. As atitudes contemplam a curiosidade e abertura às outras culturas. Isto passa por aceitar que outras culturas são tão valiosas quanto a nossa própria, 18 O conceito de empatia oferece uma solução ao nível do indivíduo, para a abordagem da diversidade cultural irredutível. Baseada na psicologia social, essa abordagem negligencia a dimensão histórica, econômica e política. Este conceito subestima os efeitos inconscientes da socialização, e assume que a vontade explícita de compartilhar o ponto de vista do outro como indivíduo, pode resolver as diferenças entre as culturas.

(49)

assumindo desde logo uma vontade em questionar os nossos próprios valores, modos de agir, e credos, diante dos outros de outra cultura, aceitando que os nossos próprios valores não serão os únicos possíveis, nem necessariamente os mais corretos. O mesmo será dizer que nos devemos colocar no lugar do outro, e para isso desenvolver uma empatia humanista.

A segunda dimensão destas competências é o conhecimento sobre os grupos sociais que compõe a sociedade diversa. Implica conhecer os costumes, tanto da nossa própria cultura, quanto da cultura do nosso interlocutor. Conhecer a forma como somos vistos pela outra cultura, e dar a conhecer como vemos a outra cultura, revelando a identidade de ambas, e a ideia que ambas tem de si próprias no contexto global. Por isto considerei oportuno o estudo sobre a nossa identidade enquanto europeus no ponto 1.2.

A terceira dimensão são as habilidades, ou capacidades, e ainda designadas como “destrezas” por Teresa Aguado (2003). Estas habilidades estão relacionadas com a interpretação e comparação: capacidade para interpretar a partir de diferentes pontos de vista, ações, ideias, ou informações provenientes de outras culturas. Explicar e relacionar, confrontando com a nossa própria cultura, estas ações, ideias, ou informações, de modo a compreender como facilmente se podem criar equívocos, más interpretações, ou detetar más interpretações, como os sofismos e os paralogismos19.

Estas habilidades estão ainda relacionadas com a aprendizagem e a interação: a habilidade de conseguir por em prática os conhecimentos em situações de interação social, aprendendo a questionar as pessoas de outras culturas, sobre as suas crenças, valores, e comportamentos. (Aguado, 2003, p. 142)

Michael Byram (1997), no seu livro “Teaching and Assessing Intercultural

Communicative Competence”, também definiu algo semelhante a Teresa

19 Sofismos e Paralogismos são argumentos pela lógica inconsistentes, sem fundamento,

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Aguado, e concordante em vários pontos, com as diretrizes da UNESCO na Educação para a Cidadania Global; com aquilo a que chamou “Competências Interculturais Comunicativas”. (Byram, 1997)

As Competências Interculturais Comunicativas foram pensadas no contexto do ensino de línguas estrangeiras, onde o estudo da Interculturalidade tem maior pertinência, não obstante o facto de estas poderem ser trabalhadas noutras áreas disciplinares como a Geografia ou a História. Todavia é no ensino de línguas estrangeiras, que podemos talvez exercitar melhor competências de comunicação com outras culturas.

São essencialmente cinco as competências esboçadas por Byram: o

conhecimento; as capacidades de interpretação e relacionamento; a consciência cultural crítica; as atitudes (o saber ser); e as capacidades de descoberta e interação (o saber fazer).

O conhecimento não surge como algo primário inerente a uma cultura em específico, mas no modo como os grupos sociais e respetivas identidades funcionam. Neste caso os nossos grupos sociais e os das outras culturas. O conhecimento em causa ilustra os processos e os produtos resultantes da forma como nos vemos, como vemos os outros, como os outros se veem, e finalmente como os outros nos veem a nós. Este conhecimento dá-se num interação individual e social, considerando os preconceitos inerentes a ambos os intervenientes, e pode ser trabalhado pedagogicamente com recurso a imagens, filmes, textos, e material genuíno que exponha e confronte esses mesmos preconceitos nas diversas culturas.

As capacidades de interpretação e relacionamento tratam a capacidade de interpretar um documento ou evento de outra cultura, explicando-o e relacionando-o com documentos ou eventos da própria cultura. Os sujeitos aqui devem desenvolver e relacionar essa informação entre si, e tentar interpretar cada um deles à luz do outro, envolvendo dos mesmos uma certa habilidade de mediação. Estas capacidades tem o objectivo de alcançar uma mudança de perspetiva usando simulações na troca de identidades.

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