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O Surgimento da Filosofia 1 Murilo Guedes França 2

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O Surgimento da Filosofia

1

Murilo Guedes França

2 O homem sempre se cercou de questionar sobre sua origem e sua posição dentro do universo, buscando maneiras de tentar explicar de onde vieram e qual seria seu papel nessa “imensidão” desconhecida. Foram os gregos os primeiros a “ordenar” um pensamento, ainda na Grécia Arcaica, que alcançaria seu apogeu na Grécia clássica e se expandiria no período Helenístico. A superioridade destes em relação a outros povos nesse ponto especifico, é de caráter não puramente quantitativo, mas qualitativo, porque o que eles criaram instituindo a

filosofia, constitui uma novidade que, em certo sentido, é absoluta.3

Antes do nascimento da filosofia propriamente dita, eram os poetas que tinham imensa importância na educação e na formação espiritual dos gregos muito mais do que tiveram em

outros povos.4 Em um período pré-arcaico, designado homérico (1.200 e 800 a. C.), foram os

poemas de (Homero e Hesíodo), os responsáveis por libertarem e muito, os gregos de uma mitologia de superstição mais primitiva e selvagem. A Ilíada e a Odisseia de Homero bem como a Teogonia de Hesíodo procuram diminuir a distância entre deuses e homens, também diminuem o papel de forças monstruosas e irracionais atuando no mundo, humanizam os deuses

e racionalizam os mitos de origem.5 Estes poetas imprimiram na mentalidade grega alguns

princípios que seriam de grande importância para a constituição da ética filosófica e do pensamento filosófico antigo em geral, tornam-se os precursores de uma matriz filosófica que posteriormente se organizaria e se ordenaria,

A divinização de fenômenos naturais por meio da mitologia foi, de primeiro instante uma tentativa para explicar a ciclicidade da execução destes, bem como um ensaio na tentativa de desvendar o universo, as diferentes formas de mitos assumem primordialmente um papel de solução para esses fenômenos a partir da observação, muitas vezes embasada em um medo que eles geravam. O mito dentro de seu contexto cultural apresentado deve ser entendido como uma

verdade6, pois este é carregado de significados o que nos faz perceber sobre as diferentes formas

de organização de cada cultura em relação a realidade que está em sua volta.

A função do mito é resolver, num plano imaginativo, tensões, conflitos e antagonismos sociais quem não têm como ser resolvidos no plano da realidade. A

1 Disciplina do Módulo I do Curso de Proficiência Filosófica do Instituto Ágora de Educação. 2 Acadêmico do Curso de Proficiência Filosófica do Instituto Ágora de Educação.

3 REALE, 1990, p.11. 4 Ibid, p. 15.

5 CHAUI, 2002, p. 22. 6 GLEISER, 2006, p. 21.

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narrativa os soluciona imaginativamente para que a sociedade possa continuar vivendo com eles, sem destruir a si mesma, o mito conserva a realidade social dando-lhe um instrumento imaginário para conviver com suas contradições e dificuldades.7 A mitologia foi responsável por fornecer subsídios para sair do plano da observação para a especulação das coisas, os gregos de maneira geral são responsáveis por esse despertar, saindo da observação e partindo para a reflexão, se destacam pela sua curiosidade em explicar sua origem, dentro do grande acervo cultural grego são apresentadas inúmeras teorias nessa tentativa de explicação, aliadas a estudos, observações e experimentos.

O período arcaico da Grécia se desenvolve do final do século VIII ao início do século V, nesse período surgem as cidadelas ou fortalezas, construídas por aqueles que iam se agrupando, começam a surgir as cidades como cede dos governos das comunidades. A base familiar vigente no início da Grécia arcaica constituía um obstáculo à expansão da vida social. Os princípios de tradicionalismo e hierarquia aí aparecem vinculados aos núcleos familiares, de onde emergem as realezas patriarcais com uma identidade ético-religiosa similarmente

fechada e exclusiva.8 Foi justamente a superação desse modelo familiar excludente que

possibilitou a criação das primeiras cidades gregas, a congregação de várias famílias formou as fatrias, posteriormente resultou na associação tribal e subsequente com a junção dessas tribos surgem as primeiras cidades gregas, a pólis grega. As primeiras formas de organização política terão seu início, as primeiras mediações, se dará através do chefe de cada clã que participa do governa da cidade, formando o grupo de senadores que junto com o rei, dirigem a vida pública. A ciência política buscará justificar a legalidade da pólis na legalidade natural vista pela razão como unidade orgânica, onde cada elemento tem seu justo lugar no todo e o todo se reflete em

cada elemento.9 A pólis sobreviverá na medida em que fizer valer a força da palavra,

transfigurando a individualidade do homem na comunidade política universal.

É, justamente aí nesse período que alguns historiadores datam o nascimento da filosofia, entre o final do século VII e início do século VI a. C., nas colônias gregas da Ásia

Menor, sendo o primeiro filosofo Tales da cidade de Mileto.10 As novas condições de vida das

colônias gregas dessa região acentuam-se devido à revolução econômica representada pelo regime monetário, a moeda, facilitando as trocas, fortalece a economia dos que vivem do comércio, da navegação e do artesanato, marcando definitivamente a decadência da

organização social baseada na aristocracia de sangue.11 Além disso, a invenção do calendário,

7 CHAUI, 2002, p. 36. 8 ANDRADE, 1978, p. 26. 9 ANDRADE, 1978, p. 42. 10 CHAUI, 2002, p. 16. 11 SOUZA,1999, p. 14.

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o desenvolvimento de novas técnicas e com o aparecimento de uma rica classe de comerciantes que rivaliza e supera a antiga aristocracia agrária, a sociedade grega vai se tornando citadina e urbana e a cultura vai se laicizando, as formulações mítico-religiosas vão cedendo o passo a

explicações racionais.12 Os traços principais dessa filosofia nascente podem ser apresentados

da seguinte maneira de acordo com Chaui, 2002:

 Tendência a racionalidade: a razão é tomada como critério da verdade, acima

das limitações da experiência imediata e da fantasia mítica. A razão ou o pensamento (logos) vê o visível e compreende o invisível, que é seu princípio imutável e verdadeiro.

 Busca de respostas concludentes: colocando um problema, sua solução é sempre

submetida à discussão e a análise crítica, em vez de ser sumária e dogmaticamente aceita; o discurso (logos) deve ser capaz de provar, demonstrar e garantir aquilo que é dito;

 Acatamento às imposições de um pensamento organizado de acordo com certos

princípios universais que precisam ser respeitados para que o pensamento (logos) e o discurso sejam aceitos como verdadeiros, são princípios lógicos;

 Ausência de explicações preestabelecidas e, portanto, exigência de investigação

para responder aos problemas postos pela natureza;

 Tendência à generalização, isto é, oferecer explicações de alcance geral

percebendo, sob a variação e multiplicidade das coisas e fatos singulares, norma e regras ou leis gerais da realidade.

Como se vê, foram vários os critérios que contribuíram para a evolução do pensamento, e foram estes, os gregos, àqueles que melhor ordenou tais pensamentos, estruturando-os de forma a se alcançar o surgimento da filosofia. Muitos contribuíram para evolução desse pensamento, desde os Jônicos da Ásia Menor cujo principal representante é Tales de Mileto com forte característica especulativa, a escola Pitagórica com Pitágoras de Samos como seu maior representante, contribuíram com seus conhecimentos matemáticos e geométricos, os Eleáticos, passando pelos Atomistas até chegarem nas ideias de Platão e Aristóteles que evoluíram significativamente os pensamentos destes anteriores.

A maior parte dos primeiros filósofos considerava como os únicos princípios de todas as coisas que são da natureza da matéria. Aquilo de que todos os seres são constituídos e de que primeiro são gerados e em que por fim se dissolvem, tal é para eles o elemento, o principio dos

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seres; e por isso julgam que nada se cria nem se destrói, como se tal natureza subsistisse para sempre. (ARISTÓTELES in Metafísica apud CHAUI, 2002).

Essa filosofia nascente, nasce como uma cosmologia, explicando racionalmente a ordem presente e atual do mundo, seu pressuposto básico é que “ nada não surge do nada”, o que é real é imortal e eterno, é a physis o fundo imortal de onde tudo brota e regressa, por isso uma preocupação dos filósofos naturais com o devir das coisas, com seus movimentos, a verdade ou a essência do mundo é alcançada por este devir.

Procurando reduzir a multiplicidade percebida à unidade exigida pela razão, os pensadores de Mileto propuseram sucessivas versões de uma física e de uma cosmologia constituídas em termos qualitativos: as qualidades sensíveis eram entendidas como realidades em si.13

Os pitagóricos por sua vez se dedicaram a matemática e a fizeram progredir. Nutridos por ela, acreditaram que seus princípios fossem os princípios de todas as coisas que existem... os números são os princípios primeiros, mais do que no fogo, na terra e na água, eles

acreditavam ver muitas semelhanças entre os números e as coisas que existem e se geram.14

Já os Eleáticos por sua vez teriam inaugurado explicitamente tanto a problemática lógica quanto a ontologia: as especulações sobre o conhecer e o sobre o ser, destacando-se a figura de Parmênides como um dos principais defensores dessa escola.

A escola dos atomistas sugeriu as primeiras ideias da existência dos átomos, afirmando a existência de espaços vazios entre as coisas. E nesse vazio é que moveriam átomos, partículas corpóreas, insecáveis. Para eles, estes átomos seriam plenos, em números infinitos invisíveis, móveis, sem distinções qualitativas, distinguiam-se apenas em atributos geométricos, de forma,

tamanho e posição e se arranjariam distintamente.15

Todos os modelos apresentados por cada corrente naturalista do chamado período pré-socrático contribuíram para chegada de um modelo Platônico/Aristotélico que perdurou por muito tempo e que influenciou durante muito tempo a forma de se pensar, exercendo também influencias religiosas. Surge, então, o período clássico da Grécia, do século V a. C. ao IV a. C. o período antropológico metafísico, que abrange, principalmente, Sócrates, Platão e Aristóteles. Outros autores ainda como Windelband, ainda dividem esse período clássico em duas partes designando-o primeiramente em período antropológico composto pelos grandes pensadores racionalistas gregos, os sofistas, Sócrates e socráticos menores e o período sistemático,

13 SOUZA, 1999, p. 14. 14 REALE, 1990, p. 40. 15 SOUZA, 1999, p. 31.

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comportando Platão e Aristóteles apenas.16 Nesse período as grandes mudanças sociais,

econômicas e políticas consolidam a pólis, e tornam-se questionáveis e problemáticos os ensinamentos apenas por tradição.

Por fim a filosofia helenístico-romana é marcada pelas questões éticas, pelo ceticismo e pela erudição, pelas disputas neoplatônicas e as doutrinas cristãs, a patrística, chegando ao século VI d. C. Neste período, a Grécia passa para o domínio da Macedônia, com Filipe e Alexandre, e, depois, para o domínio de Roma, integrando-se num mercado mundial e tornando-se colônia de um império universal, numa sociedade organizada regionalmente, agrupada por corporações profissionais e desenvolvendo um pensamento cosmopolita que se

abre para o Oriente, ao mesmo tempo que passa a influenciá-lo intelectual e artisticamente.17

Uma corrente de pensadores defende a ideia de uma filosofia orientalista, reforçada pelo fato de que as religiões e mitos orientais apresentam algumas concepções que reaparecem nas religiões e mitos gregos e posteriormente na filosofia, essa tese orientalista não é descabida, pois havia um começo de ciência, matemática, medicina e astrologia no Egito e na Babilônia. A tese orientalista ganhará força durante a Renascença, quando filósofos ligados a corrente mística e ocultistas afirmarem a origem egípcia de todos os saberes e de todas as práticas, baseando tal afirmação no fato de Platão haver considerado os gregos crianças, se comparada a

sabedoria deles com a dos antigos sacerdócios egípcios.18

Entretanto é consenso afirmar e reconhecer a importância dos gregos na sistematização de todo pensamento e estrutura-lo de forma ordenada, de maneira racional, foram estes, os primeiros povos a elucidar a ideia de uma filosofia, os amigos da sabedoria, foram capazes de realizar o verdadeiro “milagre grego”, quando desenvolveram e evoluíram sua forma de pensar. A filosofia apresenta uma característica de invenção e reinvenção, permitida através da reflexão, a capacidade do homem de pensar criticamente sobre sua realidade, sobre sua existência lhe proporciona o surgimento de novas ideias e consequentemente o “ressurgimento da filosofia”, como é possível observar ao longo de toda a história da humanidade.

16 CHAUI, 2002, p. 49. 17 CHAUI, 2002, p. 17. 18 Ibid, p. 20.

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Bibliografia:

ANDRADE, S. M. V.; A Cidade Grega. In Kriterion, Revista da Faculdade de Filosofia e Ciências Humanas da Universidade Federal de Minas Gerais, Vol. XXIV, Nº 71, p. 20-44, 1978.

CHAUI, M.; Introdução à História da Filosofia – dos pré-socráticos a Aristóteles. Vol. 1, São Paulo, SP: Cia. das Letras, 2002.

GLEISER, M.; A Dança do Universo: dos mitos da criação ao Big Bang. São Paulo, SP: Campainha das letras, 2006.

PRÉ-SOCRÁTICOS.; Vida e Obra. Col. “Os Pensadores”, vol. 1, seleção de textos e supervisão do prof. Dr. José Cavalcante de Souza, São Paulo, SP: Ed. Nova Cultural Ltda., 1999.

REALE, Giovanni.; História da Filosofia – Antiguidade e Idade Média. Vol. 1, São Paulo, SP: Paulus, 1990.

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