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INTEGRAÇÃO SEMÂNTICO-PRAGMÁTICA E MUDANÇA DE REFERÊNCIA NAS CLÁUSULAS 1 SUBORDINADAS ADVERBIAIS MODAIS

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Academic year: 2021

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INTEGRAÇÃO SEMÂNTICO-PRAGMÁTICA E MUDANÇA DE REFERÊNCIA NAS CLÁUSULAS1 SUBORDINADAS ADVERBIAIS MODAIS

SILVA, Anderson Godinho (UFRJ)

1. INTRODUÇÃO

Apresenta-se, neste trabalho, uma descrição das cláusulas subordinadas adverbiais modais no que tange à integração semântico-pragmática com a cláusula principal. Tal descrição justifica-se pelo fato de as cláusulas em questão não apresentarem um comportamento homogêneo.

Para uma melhor descrição, foram levados em consideração os conceitos de entrelaçamento (LEHMANN, 1988) e integração morfossintática e integração semântico-pragmática (HOPPER e TRAUGOTT, 1993).

Para o presente artigo, foram contabilizadas as cláusulas adverbiais modais encontradas nos anúncios, editoriais, notícias e entrevistas do tipo DID (Diálogo entre Informante e Documentador) referentes aos séculos XIX e XX do português brasileiro e do europeu retirados do corpus VARPORT, com os seguintes objetivos: i) estabelecer um continuum das cláusulas adverbiais modais no que tange à integração semântico-pragmática com a cláusula principal; ii) observar a mudança de referente nas cláusulas analisadas e iii) relacionar a mudança de referente nestas cláusulas com a continuidade tópica no discurso e, conseqüentemente, com a integração semântico-pragmática.

Adota-se uma visão funcionalista já que se fará um estudo em que se considera a língua em seu uso real, com dados retirados de textos produzidos com uma função específica.

2. REVISÃO BIBLIOGRÁFICA

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2.1. Orações modais: breve apresentação

Acredita-se ser relevante fazer uma apresentação do fenômeno estudado neste trabalho. As orações subordinadas adverbiais modais são aquelas que modificam o verbo da oração principal expressando a circunstância de modo. Esta estrutura, assim como as outras orações subordinadas adverbiais, equivaleriam a um adjunto adverbial. Entretanto, a Nomenclatura Gramatical Brasileira (NGB), ao listar as possíveis orações adverbiais, não contempla as modais.

Há alguns autores que tecem comentários acerca dessas orações, mas não há um consenso entre eles no que diz respeito às formas como elas se apresentam. Levando-se em conta o corpus analisado, as orações modais encontradas podem ocorrer das seguintes maneiras: desenvolvidas introduzidas por SEM QUE (cf. ex. 1), COMO (cf. ex. 2) e COMO SE (cf. ex. 3); reduzidas de gerúndio (cf. ex. 4) e reduzidas de infinitivo com a presença de uma preposição (cf. ex. 5).

1. “Joaquim José Pereira noticia saber cura Herneas no escroto com toda a perfeição [sem que fique defeituoso]”. (E-B-81-JA-026)

2. “Esperamos na espectativa sympathica, para applaudil-o e julgal-o [como merece]”. (E-B-83-JN-045)

3. “A Inspectoria, esquecida da velha legislação Brasileira, entra, [como se fora sua casa], em todos os bancos, indagando pormenorizadamente de contas particulares [como se estivera relacionando os fundos alheios para uma próxima e eqüitativa partilha]”. (E-B-92-JE-004)

4. “[Cantando] espalharei por toda parte / Fazendas, Modas e roupas brancas”. (E-B-83-JA-016)

5. “Geléa Americana de oleo de fígado de bacalhao // preparada por E.H. Treux // Para moléstias do peito / Toma-se, como indicada a instrução, [sem sentir-se o menor gosto de óleo]”. (E-B-83-JA-001)

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Os diferentes graus de integração entre cláusulas podem depender de vários parâmetros. Para uma melhor discussão sobre isto, dois trabalhos foram levados em consideração: o de LEHMANN (1988) e o de HOPPER e TRAUGOTT (1993).

2.2.1. Abordagem de LEHMANN (1988)

Lehmann (1988, p.1) tenta estabelecer uma tipologia de ligação entre cláusulas (“clause linkage”) e, para isso, lança mão de alguns conceitos básicos como os de dependência, encaixamento, hipotaxe e coordenação. O autor afirma que o conceito mais geral é o de dependência.

Em seguida, são apresentadas definições para hipotaxe, encaixamento e parataxe. Algo semelhante é encontrado em HOPPER e TRAUGOTT (1993), o que pode ser conferido em 2.2.2. Segundo LEHMANN (1985, p.2), a hipotaxe é entendida como a subordinação de uma cláusula e esta definição não impõe nenhuma exigência sintática ou morfológica no elemento subordinado, correspondendo, dessa forma, ao uso comum. O encaixamento, para o autor, é a dependência de um constituinte subordinado. A partir dessas definições, o autor considera que hipotaxe e encaixamento são dois tipos particulares de subordinação em que o primeiro diz respeito ao tipo de elemento subordinado e o segundo diz respeito ao tipo de relação de subordinação. De acordo com LEHMANN (1988, p.2), a parataxe é a coordenação de cláusulas, em que não há restrições impostas ao tipo de estrutura de coordenação. O autor afirma que a parataxe pode ser sindética ou assindética.

Após apresentar as definições de hipotaxe, encaixamento e parataxe, LEHMANN (1988) tece comentários sobre os parâmetros semântico-sintáticos relevantes para a subordinação e para a ligação entre cláusulas. Para a análise feita neste artigo, três parâmetros especificamente são mais relevantes.

O primeiro parâmetro é o da dessentencialização da cláusula subordinada. Este parâmetro trata do grau em que uma cláusula subordinada é elaborada ou

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reduzida. De um lado, há a expansão de um constituinte nominal ou adverbial em uma construção totalmente desenvolvida e, de outro, há a condensação, ou seja, a redução de uma cláusula em um constituinte nominal ou adverbial da cláusula principal. De acordo com LEHMANN (1988, p.10), isto implica uma derivação de sentenças complexas que começa de um grupo de cláusulas completas, as reduz através de uma nominalização e as combina em uma sentença complexa encaixando uma na outra.

O segundo parâmetro é o do entrelaçamento (“interlacing”). Este parâmetro possui um aspecto semântico e um aspecto sintático. O primeiro refere-se ao fato de que duas proposições compartilham alguns elementos de seus significados e o segundo refere-se à não-especificação de elementos em comum nas duas proposições. Neste entrelaçamento, as duas proposições podem compartilhar seus predicadores, o tempo e o modo verbais e os actantes. Para LEHMANN (1988), o ponto central está relacionado ao compartilhamento de actantes, o que envolve o fenômeno de mudança de referência. O autor comenta que, em muitas línguas, há uma distinção na flexão de um verbo não-final dependendo se o verbo da cláusula seguinte tem o mesmo sujeito ou sujeito diferente.

O terceiro parâmetro é o da explicitação da ligação, ou seja, se as cláusulas são ligadas por meio de elementos como conjunções ou não. Mais uma vez, há um continuum que parte da presença explícita de conjunção, passa por um continuum de decréscimo de explicitação e termina com a ausência de conjunção. LEHMANN (1988) comenta que a explicitação de elos de ligação tem uma estrutura interna anafórica, isto é, de uma certa forma, se refere ao texto precedente. A partir do continuum mencionado, pode-se chegar à conclusão de que o dispositivo conectivo ou subordinativo é maximamente elaborado no início e gradualmente reduzido ao zero. Isto é ilustrado pelo autor através de um esquema que envolve os seguintes elementos respectivamente: cláusula subordinada anafórica, verbo no gerúndio, sintagma preposicional, advérbio conectivo, conjunção específica, conjunção subordinativa universal e forma infinitiva do verbo.

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Após comentar separadamente sobre cada parâmetro, LEHMANN (1988) estabelece as relações que podem ser observadas entre eles. No parágrafo seguinte, será apresentado um resumo de algumas dessas relações.

A alta integração de um elemento subordinado na cláusula principal correlaciona-se com sua dessentencialização, ou seja, construções subordinadas nominalizadas adquirem propriedades de uma expressão nominal e se tornam mais dependentes. O entrelaçamento de cláusulas pressupõe integração da cláusula subordinada e leva à dessentencialização desta. Isto pode ser mais bem explicado pelo fato de que o controle de sujeito dependente significa não-finitude do verbo dependente e isto significa forte dessentencialização. A explicitação de um elo de ligação tem alguma relação com a dessentencialização. Isto pode ser explicado pelo fato de que uma conjunção explícita, seja coordenativa seja subordinativa, pode ter uma função adverbial na cláusula a que se liga enquanto que subordinadores puros são apenas operadores aplicados à cláusula em que se encontram. Por fim, a não-explicitação de um elo de ligação correlaciona-se com o controle de sujeito dependente e, conseqüentemente, com o entrelaçamento.

2.2.2. Abordagem de HOPPER e TRAUGOTT (1993)

LEHMANN (1988) apresenta vários parâmetros que podem estar relacionados ao processo de ligação de cláusulas. HOPPER e TRAUGOTT (1993), ao tratarem da gramaticalização através das cláusulas, fazem um estudo que aborda a interligação de cláusulas. Com isso, acredita-se que os dois trabalhos mencionados anteriormente são complementares.

Da mesma forma que LEHMANN (1988), HOPPER e TRAUGOTT (1993) citam a dessentencialização e afirmam que o declive da dependência se correlaciona com um declive da integração gramatical, em que a finitude estaria à esquerda, ou seja, representa menor integração e a não-finitude estaria à direita, ou seja, representa a maior integração. Os autores citam GIVÓN (1990) quando discutem a existência de um paralelismo cognitivo entre forma e função: “Quanto

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mais integrados semanticamente ou pragmaticamente forem dois conteúdos, mais as cláusulas que os codificam estarão integradas gramaticalmente” (GIVÓN, 1990, p.826; apud HOPPER e TRAUGOTT, 1993, p.171).

HOPPER e TRAUGOTT (1993) apresentam um esquema que explica a relação entre a explicitação morfossintática e integração entre as cláusulas, mostrado aqui sob esquema 2.

Esquema 2:

Parataxe--- Hipotaxe---Subordinação núcleo---margem

integração mínima---integração máxima máxima combinação explícita---mínima combinação explícita

3. METODOLOGIA E ANÁLISE DO CORPUS

3.1. Descrição do corpus

O corpus analisado foi retirado do VARPORT (Projeto de Variação Contrastiva do Português), disponível no site www.letras.ufrj.br/varport, que contém textos pertencentes às modalidades escrita e falada do português e às variedades brasileira e européia. Os textos de língua escrita são divididos em três gêneros: anúncios, editoriais e notícias e os textos de língua falada são entrevistas do tipo DID (Diálogo entre Documentador e Informante). Além disso, os textos são divididos por séculos (XIX e XX).

A análise feita aqui leva em conta todas as cláusulas subordinadas adverbiais modais encontradas no VARPORT, isto é, 264 cláusulas. A distribuição delas bem como a forma como elas se articulam com a cláusula principal podem ser conferidas em 3.2.

Os pressupostos teóricos utilizados neste trabalho são os do funcionalismo, pois se observa a língua em uso, utilizando-se exemplos reais.

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3.2. Cláusulas modais e integração semântico-pragmática

O estudo feito neste trabalho pretende mostrar que as cláusulas adverbiais modais podem se apresentar de maneiras distintas e, conseqüentemente, não possuem um comportamento homogêneo. Para comprovar isto, as cláusulas em questão foram observadas no que tange à integração semântico-pragmática (cf. HOPPER e TRAUGOTT, 1993) que possuem com a cláusula principal e à mudança de referência (cf. LEHMANN, 1985).

Segundo HOPPER e TRAUGOTT (1993), pode-se estabelecer uma escala que parte da menor para a maior integração semântico-pragmática entre uma cláusula principal e uma cláusula subordinada. Quanto mais explícita a integração morfossintática, menor a integração semântico-pragmática. Os autores sugerem que cláusulas desenvolvidas, ou seja, aquelas que apresentam um elo de ligação com a cláusula principal, seja por meio de conjunção seja por locução conjuntiva, possuem uma menor integração semântico-pragmática com a cláusula principal. As cláusulas que são representadas por nominalizações, isto é, por formas nominais do verbo como o infinitivo e o gerúndio, tendem a ser mais integradas no nível semântico-pragmático às cláusulas principais. Partindo desta escala proposta por HOPPER e TRAUGOTT (1993), pode-se propor uma escala de integração semântico-pragmática no que se refere às cláusulas modais (cf. quadro 1).

Quadro 1: Níveis de integração semântico-pragmática das cláusulas modais

Níveis de Integração Formas de articulação Integração Mínima Modais desenvolvidas Integração Intermediária Modais reduzidas de infinitivo

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A seguir são apresentados alguns exemplos de cláusulas modais. Em 6, há um caso de cláusula modal desenvolvida; em 7, há um caso de modal reduzida de infinitivo e, em 8, há um caso de cláusula reduzida de gerúndio.

6. “Annuncia-se a sahida do 2º Tomo das Memórias Historicas do Rio de Janeiro por Monsenhor Pizarro para que possão os Senhores subscritores procurá-lo nos lugares, [sem que fizerão as suas Assignaturas]”. (E-B-81-JA- 036)

7. “Há quatro ou cinco anos, aquelas que ainda não tinham tido a iniciação musical na, nas primárias nem havia ainda isto do c[...], do ciclo já a entrarem com ensino musical, entravam com bastante relutância e [sem saber absolutamente nada]”. (OC-P-70-3F-003)

8. “Os líderes não morrem. Quando muito hibernam. E acordam sempre renovados, por mais longo que seja o sono, [professando as mesmas idéias]”. (E-B-94-JE-006)

Os exemplos anteriores representam cláusulas modais que mantêm o mesmo referente das cláusulas principais e esta manutenção é feita pela mesma expressão: a anáfora zero, que, de acordo com GIVÓN (1983, p.56), equivale a uma alta continuidade tópica no discurso. O exemplo 6 foi retirado de um anúncio do século XIX referente ao português brasileiro, o exemplo 7 foi retirado de uma entrevista feita com uma informante do gênero feminino na década de 70 referente ao português europeu culto e o exemplo 8 foi retirado de um editorial do século XX referente ao português brasileiro. Para a análise do corpus, serão feitas considerações gerais a respeito do comportamento das cláusulas adverbiais modais e, por isso, não foi feita uma distribuição destas cláusulas no que tange ao gênero textual em que se encontram nem no que tange ao século em que os textos foram publicados.

Para comprovar a maior integração semântico-pragmática das cláusulas reduzidas comparadas às cláusulas desenvolvidas, foi feita uma contabilização de todas as cláusulas modais encontradas no que diz respeito à mudança de referência, o que é denominado por LEHMANN (1988) de entrelaçamento de actantes (participantes). Este é um dos parâmetros apresentados pelo autor que

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contribuem para uma maior ou menor ligação da cláusula subordinada à cláusula principal. É importante mencionar que, neste trabalho, foi considerada mudança de tópico / referente quando há mudança de sujeito da cláusula principal para a cláusula modal. Portanto, um participante específico foi levado em conta: o sujeito.

Como foi dito em 3.1, a partir da leitura de todos os textos presentes no VARPORT, foram encontradas 264 cláusulas modais. Destas 264 modais, 189 se apresentam na forma reduzida de gerúndio, 54 se apresentam na forma reduzida de infinitivo e 21 se apresentam na forma desenvolvida. Percebe-se que a maior parte dessas cláusulas se apresenta na forma reduzida de gerúndio e que o número de dados não é tão grande. Portanto, os resultados obtidos aqui são preliminares e, para permitir uma melhor visualização do comportamento das cláusulas em questão, foi feita uma distribuição delas considerando-se dois aspectos: a explicitação ou não de um elo de ligação entre elas e as cláusulas principais e a mudança ou não de referente. A tabela 1 apresenta estes resultados, em que, na horizontal, encontram-se as formas de articulação das cláusulas modais, com o total de cada uma na terceira coluna e, na vertical, a freqüência destas cláusulas que contêm o mesmo referente em relação às cláusulas principais.

Tabela 1: Cláusulas modais que apresentam mesmo referente em relação às cláusulas principais

Forma de articulação Mesmo referente TOTAL Reduzidas de gerúndio 186 (98%) 189 (100%)

Reduzidas de infinitivo 52 (96%) 54 (100%) Desenvolvidas 6 (21%) 21 (100%)

TOTAL 244 264

Pela tabela 1, é possível verificar que não há muita diferença, em termos percentuais, entre as cláusulas modais reduzidas de gerúndio e reduzidas de infinitivo quanto à manutenção do referente (cf. ex. 9 e 10, respectivamente). Já em relação às modais desenvolvidas, constata-se que uma pequena parcela (6 –

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21%) mantém o referente / sujeito da cláusula principal. Por isso, optou-se por apresentar um exemplo de oração modal desenvolvida em que há mudança de referente (cf. ex. 11).

9. “Scientificamos aos excelentíssimos amigos que nos honraram, [subscrevendo acções para a fundação da empresa]”. (E-B-83-JA-010)

10. “O sulfureto de carbono, Cruzeiro do Sul, é o único que, sendo preparado especialmente para a lavoura, é puro, e por isso mesmo extingue os insetos, [sem offender as plantas], nem estragar os terrenos”. (E-B-83-JA-047)

11. ““Quantas vezes lá, sua esposa chegou a V.S. alarmada para contar-lhe um sonho em que ella o viu envolvido em circumstancias tragicas, em que ella sentiu, [como se fosse real], a oppressão de um grande perigo a ameaçar a felicidade da familia...” (E-B-92-JA-035)

Em 9, a cláusula principal é “que nos honraram” e a cláusula modal está destacada. O gerúndio “subscrevendo” da cláusula subordinada tem como sujeito “eles”, que é o mesmo sujeito da cláusula principal. É relevante ressaltar que, em ambas as cláusulas, o sujeito está elíptico. Em 10, a cláusula principal é “(O sulfureto de carbono, Cruzeiro do Sul) extingue os insetos” e a cláusula subordinada está em destaque. A construção composta pela preposição SEM acrescida do verbo no infinitivo “offender” tem como sujeito o mesmo da cláusula principal, que é retomado pela anáfora zero. Em 11, o sujeito da cláusula principal é “ella” e o da cláusula modal pode ser interpretado como indeterminado: “como se algo / isto fosse real”.

Como já mostrado na tabela 1, cláusulas modais reduzidas de gerúndio e de infinitivo que apresentam mudança de referente são raros no corpus analisado (cf. ex. 12 e 13).

12. “Está informado que o que houve foi erro de arrecadação, mas pede que o caso se esclareça, [ouvindo-se o prefeito]. Sr. Smith de Vasconcellos requer cópia da planta cadastral da capital, para facilitar os pareceres da commissão de que faz parte, resolvendo-se providenciar

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nesse sentido. Sr. Maggieh pediu e obteve dispensa de inters// para o projecto n.7 que entrara hoje /em ordem do dia”. (E-B-91-JN-001)

13. “...a revista passou a ir lá para casa, mas e [...] eu só li o primeiro número e achei de tal maneira mau, que agora vai [sem abrir] para a cozinha”. (OC-P-70-2F-003)

Em 12, o sujeito da cláusula principal é “o caso” e o da cláusula modal pode ser entendido como indeterminado se for dada a ela a seguinte interpretação: pede que o caso se esclareça com alguém ouvindo o prefeito. Em 13, o sujeito da cláusula principal é “a revista”, que se encontra elíptico nesta cláusula, e o da cláusula modal é “eu”, que também se encontra elíptico.

Com isso, pode-se concluir que é raro que cláusulas modais reduzidas estejam relacionadas à descontinuidade tópica. Já exemplos como 11, isto é, cláusulas modais desenvolvidas que apresentam mudança de referente, são os mais freqüentes no corpus analisado. Com isso, pode-se concluir que é comum que cláusulas modais desenvolvidas estejam relacionadas à descontinuidade tópica.

As cláusulas modais desenvolvidas que possuem um referente / sujeito diferente do da cláusula principal são freqüentemente introduzidas pelas locuções SEM QUE e COMO SE. Acrescenta-se a isso, o fato de que estas locuções juntamente com os verbos das cláusulas, em alguns casos, formam construções existenciais, isto é, utiliza-se o verbo HAVER com sentido de EXISTIR (cf. ex. 14 e 15). Esta construção é interpretada em muitas gramáticas tradicionais como orações sem sujeito ou orações com sujeito inexistente.

14. “Consta-nos que o Governo tomára algumas prevenções, não despresando o annuncio dos inimigos; e sabemos que a revista se passou, como é costume, [sem que ouvesse a mais leve alteração do socego]”. (E-P-81-JN-006)

15. “A mulher, em quanto todos os da freguezia estavam consternadissimos pela morte, ella andava muito fresca arranjando os negocios da casa, [como se não houvesse um cadaver em casa!]”. (E-P-82-JN-022)

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Há um comentário que merece destaque no que tange à mudança de referente nas cláusulas modais desenvolvidas.

Trata-se do fato de que, ao mudar de referente, o código utilizado é o Sintagma Nominal definido (cf. ex. 16), isto é, o sujeito da cláusula subordinada, por ser diferente do da cláusula principal, aparece definido para facilitar seu reconhecimento.

16. “Esta pomada tem a vantagem de não se misturar com cabellos, e de fixar o chinó por espaço de dous ou tres mezes, [sem que a mais abundante transpiração o despegue]”. (E-P-82-JA-005).

Em 16, observa-se que o sujeito da cláusula principal é “Esta pomada” e o da cláusula subordinada adverbial modal é representado pelo Sintagma Nominal definido “a mais abundante transpiração”.

Acredita-se, portanto, que as cláusulas modais desenvolvidas contribuem para uma maior descontinuidade tópica no discurso e, conseqüentemente, possuem uma menor integração semântico-pragmática com a cláusula principal.

4. CONCLUSÃO

Foi observado que as cláusulas adverbiais modais desenvolvidas apresentaram mais freqüentemente mudança de referente e uma integração semântico-pragmática mínima com a cláusula principal enquanto que as cláusulas reduzidas apresentaram mais freqüentemente manutenção de referente e uma maior integração semântico-pragmática com a cláusula principal.

Acredita-se que este estudo contribui para um aprofundamento no que tange ao comportamento das cláusulas subordinadas adverbiais modais no português. Além disso, este trabalho é importante por mostrar que as cláusulas subordinadas adverbiais modais não são homogêneas e podem ter níveis de integração semântico-pragmática diferentes com a cláusula principal.

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REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

GIVÓN, T.Topic continuity in discourse: the functional domain of switch-reference. In: J. HAIMAN & P. MUNRO (eds.) Switch reference and universal grammar. Amsterdam/Philadelphia: John Benjamins Publishing, 1983

HOPPER, Paul e TRAUGOTT, Elizabeth. Grammaticalization across clauses. In: Grammaticalization, CUP: Cambridge, 1993.

LEHMANN, Christian. Towards a typology of clause linkage. In: HAIMAN, John & THOMPSON, Sandra A. Clause combining in grammar and discourse. Amsterdam/Philadelphia: John Benjamins Publishing, 1988.

CURRÍCULO

Anderson Godinho Silva

Mestrado em Letras Vernáculas (Língua Portuguesa) – UFRJ, 2005-2007. Doutorado em Letras Vernáculas (Língua Portuguesa) – UFRJ, em andamento. Publicações: “Uso das orações modais em anúncios, editoriais, notícias e receitas” em Cadernos do IX CNLF; “Transitividade e os planos discursivos ‘figura’ e ‘fundo’ nas orações subordinadas adverbiais modais” em Cadernos do X CNLF (2007). ENDEREÇO ELETRÔNICO: godinho.anderson@gmail.com

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