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FORMAS DE DESRESPEITO NA REPRESENTAÇÃO LATINO- AMERICANA DE HOLLYWOOD, ATRAVÉS DE CARMEN MIRANDA ( ) Káritha Bernardo de Macedo 1

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FORMAS DE DESRESPEITO NA REPRESENTAÇÃO

LATINO-AMERICANA DE HOLLYWOOD, ATRAVÉS DE CARMEN MIRANDA

(1940-1945)

Káritha Bernardo de Macedo1

Resumo: Este artigo discute como as formas de desrespeito apontadas por Axel Honeth, atuam sobre as representações latino-americanas nos filmes de Carmen Miranda produzidos durante a Política da Boa Vizinhança e sobre a imagem da artista. Nesse âmbito, Carmen Miranda tinha como papel naturalizar e disseminar as narrativas interamericanas propostas pelos Estados Unidos. Assim, o conjunto de seus filmes deu vida a uma série de representações acerca da América Latina e da mulher latino-americana, que podem ser entendidas como formas de desrespeito. Partindo dos filmes de Carmen Miranda, foram selecionadas algumas cenas e situações que personificam tangencialmente a teoria de Honneth. Por fim, observou-se que os filmes e a performance de Carmen Miranda autorizaram e naturalizaram um modelo feminino e de civilização delineados em oposição ao padrão estadunidense, em grande parte, voltados para o desfrute dos Estados Unidos. Palavras-chave: Carmen Miranda. Desrespeito. América Latina.

Durante a Política da Boa Vizinhança (1933-1945) o cinema hollywoodiano foi utilizado pelo governo dos Estados Unidos como instrumento político, a fim de facilitar as relações interamericanas. O uso de temas e artistas latino-americanos pelos grandes estúdios de Hollywood, era uma exigência do governo estadunidense e nesse âmbito, Carmen Miranda teve um importante papel político através de seus filmes musicais. Entretanto, o conjunto de seus filmes deu vida a uma série de representações acerca da América Latina e da mulher latino-americana, que podem ser entendidas como formas de desrespeito. Assim, este artigo quer discutir como as formas de desrespeito apontadas por Axel Honeth (apud FERES, 2004, p.33-34), operam sobre as representações latino-americanas nos filmes de Carmen Miranda e sobre a própria imagem da artista, durante o período da Política da Boa Vizinhança em que atuou em Hollywood (1940 a 1945). Partindo dos filmes de Carmen Miranda, foram selecionadas algumas cenas e situações que personificam tangencialmente a teoria de Honneth.

A Boa Vizinhança foi o momento em que os interesses políticos e industriais encontraram no cinema um instrumento de mobilização e articulação de suas ideologias, através de representações que transmitiam suas expectativas em relação aos países vizinhos e ao seu próprio povo. O ponto alto dessas produções cinematográficas foi entre 1940 e 1945, que contavam com a interferência praticamente coercitiva de órgãos especiais do governo, particularmente do Office of

the Coordinator of Inter-American Affairs-OCIAA (MOURA, 1986) e com a com a presença da

1 Mestranda do Programa de Pós-Graduação em História da Universidade do Estados de Santa Catarina-UDESC, bolsista CAPES, Florianópolis, Brasil.

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luso-brasileira Carmen Miranda nos “filmes-banana”. O OCIAA era encarregado das relações culturais e comerciais dos Estados Unidos com a América Latina. Dentre suas múltiplas funções, a agência deveria promover o intercâmbio cultural entre artistas latino-americanos e estadunidenses e incentivar a produção de filmes comerciais com temáticas, locações e artistas latino-americanos. A ideia era atrair a parceria política e comercial dos países latino-americanos pelo do cinema, mas sob a égide de uma perspectiva de superioridade da civilização estadunidense, impregnando suas mentalidades com o ponto de vista de que este país era o portador do progresso e guiaria todos os demais.

Por esse motivo Carmen Miranda saiu das casas de show brasileiras, passou pela Broadway e em seguida ancorou no cinema de Hollywood. Ao lado de outros artistas latino-americanos, seu papel era suavizar, naturalizar e disseminar as narrativas interamericanas citadas e re-citadas nos filmes, por meio da comédia, da música, de suas curvas, das piscadelas e do grande sorriso. Sutilmente, eram transportadas as razões que justificavam certas políticas diplomáticas em relação a América Latina, a posição de hegemonia dos Estados Unidos e as ocasionais invenções das “matérias-primas simbólicas sobre as quais essas políticas foram construídas.” (MELGOSA, 2012, p.249, tradução nossa).

Reconhecimento e não-reconhecimento

Após a Grande Depressão, o mercado doméstico dos Estados Unidos entrou em colapso, tornando-se fundamental expandir o mercado externo para voltar a equilibrar a economia do país e devolver a confiança aos industriais locais. Haviam fortes pressões políticas e econômicas dentro do projeto de nação dos EUA, que perturbavam sua própria auto-imagem. Com a Segunda Mundial, a questão da segurança nacional motivaria o país a buscar com mais veemência a aliança com os países vizinhos através da Política da Boa Vizinhança, sob o pretexto de proteger o hemisfério da influência “maligna” do Eixo. Por outro lado, entrar em uma guerra reanimava o sentimento de patriotismo dentro do país que se unia contra o inimigo comum, mas que ao mesmo tempo deveria aprender a aceitar como aliados aqueles “Outros” que a política internacional estadunidense havia rechaçado e discriminado, que tinham aprendido a olhar como inferiores por sua etnia, cultura, religião e intelecto. (MELGOSA, 2012, p.258).

Nesse âmbito, havia um projeto de reestruturação dos papéis sociais e políticos e de reorganização dos imaginários a ser articulado pelo cinema. Assim, as narrativas cinematográficas insistiam na complementariedade entre a América Latina feminilizada, apresentada como reserva

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econômica natural à espera de um desbravador eficiente, e os Estados Unidos masculinizado, como o ápice da tecnologia, dos meios de produção e hegemônico (MELGOSA, 2012, p.253). Deste modo, nos filmes de Carmen Miranda foi conduzido um processo pedagogizante de reconhecimento mútuo e atribuidor de identidades que foram incorporadas aos imaginários sociais.

Uma vez que o discurso era enunciado pelos Estados Unidos e projetado sobretudo em Carmen Miranda, a imagem que prevalecia de América Latina em seus filmes correspondia a uma “representação distorcida daqueles que os americanos percebem como Latin American” (latino-americano), definidos em oposição a auto-imagem glorificada de “America” (em inglês correspondente aos Estados Unidos). (FERES, 2004, p.10). Portanto, tão importante quanto atribuir um “lugar” para os latino-americanos no cenário internacional que se formava, era esclarecer quem eram os estadunidenses, quais eram os seus valores e o que cabia a eles naquele momento de transição. Nesse sentido, a demarcação cinematográfica de latino-americano pelos estadunidenses correspondia a um impulso de auto-reconhecimento, que dependia do confronto de si com outros que também são reconhecíveis—ou ao menos identificáveis. Aqui, ser reconhecido pressupõe “ser ‘respeitado’ por outros”. (apud FERES, 2004, p.30).

Em contrapartida, algo que fica evidente nos filmes de Carmen Miranda, é que o reconhecimento de si, no caso dos estadunidenses, acionava o não-reconhecimento dos outros com os quais se confrontavam, convertidos em um só Outro. Pasteurizados sob a alcunha de latino-americanos, desconsiderava-se que existiam mais vinte países ao sul do Rio Grande e que seus costumes pudessem divergir, de fato, sequer se dava valor suficiente a essas culturas para que houvesse maior preocupação em retratá-las com autenticidade. A postura do não-reconhecimento foi institucionalizada pelo próprio Departamento de Estado, que em sua documentação tratava dos demais países do continente pela vaga, porém, potente expressão “Outras Américas”. (TOTA, 2005, 36). Conforme Charles Taylor, a falta de reconhecimento “‘é danosa, pois constitui uma forma de opressão que aprisiona o indivíduo em um modo-de-ser tolhido, falso e distorcido’” (apud FERES JR., 2005, p.33). Essa postura era percebida pela América Latina, que por vezes rechaçou os “filmes-bananas” de Carmen Miranda. Apesar dos esforços da Divisão de Cinema da OCIAA (Motion Pictures), algumas vezes as equivocadas representações fílmicas causavam o efeito contrário ao pretendido, provocando o incômodo dos países que retratavam na tela. (LEITE, 2004, p.59).

Axel Honneth (apud FERES JR., 2005, p.33) levanta o ponto crucial que o não-reconhecimento é uma forma de desrespeito que priva os sujeitos da liberdade de ação, pois os

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deslegitima pela via social e pela interferência nas subjetividades que se identificam com o padrão coletivo negativado e estereotipado. Portanto, mesmo que houvessem resistências na América Latina à forma estereotipada das representações de Hollywood, o poder da imagem fílmica, sua perenidade e a larga difusão interferiam negativamente na compreensão que os latino-americanos tinham de si próprios (HONNETH, apud FERES JR., 2005, p.33).

Honneth identifica três formas essenciais do desrespeito, que podem ser pensadas no interior dos filmes de Carmen Miranda e de sua própria trajetória enquanto artista, são elas: 1) Maus-tratos físicos (morte psicológica); 2) Negação dos direitos de uma pessoa (morte social); e 3) Depreciação do estilo de vida individual ou de grupo. (apud FERES, 2004, p.33-34). As três formas de desrespeito não necessariamente agem de forma isolada, elementos de mais de uma modalidade podem ser identificados nas práticas sociais e nas representações cinematográficas.

As formas de desrespeito de Axel Honneth nos filmes de Carmen Miranda

A primeira modalidade, maus-tratos físicos, surge principalmente na forma de violências contra o corpo e repercute no sentimento de perda de autonomia corporal, a pessoa é ferida em sua auto-imagem. (FERES, 2004, p.33). Consoante Michel Foucault, é precisamente sobre o corpo que o poder social é mais intensamente exercido pela sociedade ocidental. (XING, 2009, p.130). Nas personagens de Carmen Miranda não se observa propriamente a violência física ou abusos de fato. Entretanto, é notável como a latinidade é definida a partir de seu corpo, moldado para ser sensual.

A necessidade de deixar o abdômen, os braços e o colo sempre à mostra, a boca e as longas unhas rubras e o sorriso convidativo, indicam uma perda da autonomia sobre sua auto-imagem e sobre o próprio corpo, que não poderia ser apresentado por Hollywood de outro modo. Com o tempo, novos elementos ancoraram, particularmente as belas pernas evidenciadas pela profunda fenda na saia—o novo modelo foi provavelmente inspirado nos trajes caribenhos ou rumbeiros. O figurino à la baiana se tornou uma segunda pele para Carmen e igualmente um aglutinador das referências de “latino-americanidade”, que junto com a performance, compunham uma aura de sensualidade sobre esse e todos os outros corpos latino-americanos.

Em meados dos anos 1940, os estereótipos antigos de depreciação e menosprezo tinham se reestabelecido em Hollywood como a abordagem padrão dos latino-americanos. Segundo F. Pike (1993, p.291), Carmen Miranda era quem melhor os representava no cinema, retratando a sexualidade aflorada e a falta de inibição que eram imaginadas nos latino-americanos, a “Brazilian

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personagens de Aconteceu em Havana (Weekend in Havana,1941) e Uma Noite no Rio (That Night

in Rio, 1941). A canção “Rum e Coca-Cola” (1944) das Andrews Sisters nutre o paradigma que as

latino-americanas eram objetos de desejo, que forneciam sexo e cor à vida do mundo essencialmente branco e civilizado. Tão exóticas quanto a América Latina, podiam satisfazer os desejos proibidos, impróprios para as mulheres estadunidenses, geralmente loiras de olhos azuis– às vezes morenas- como nos filmes de Carmen. De acordo com a letra da música, além do “amor tropical” que poderia durar a noite toda, os latino-americanos não teriam outra utilidade, “tinham que ser mantidos em seu lugar, ‘trabalhando [servindo os homens estadunidenses] para ganhar o dólar ianque’”. (PIKE, 1993, p.291, tradução nossa).

Desde que os ianques vieram a Trinidad Eles deixaram todas as meninas doidas As meninas dizem que eles as tratam bem Fazem de Trinidad o Paraíso (....) Bebendo Rum e Coca-Cola Desça ao Ponto Koomahnah Mãe e filha

Trabalhando pelo dólar ianque Lá na Praia Manzanella

Um romance do soldado estadunidense [G.I.] com a bela nativa Durante toda a noite, fazendo amor tropical

No dia seguinte, sentando no sol quente e se refrescando2 (ANDREWS SISTERS, Rum and Coca Cola, 1944, tradução nossa).

A canção levanta outro ponto fundamental, que países como Trinidad ou qualquer outro da América Latina, somente se tornaram o “Paraíso” a partir do reconhecimento dos Estados Unidos, pois é somente a sua presença – positivada– que dá valor ao Outro e ao seu espaço. São os soldados estadunidenses (G.I.) que fazem as mulheres latino-americanas felizes, eles as tratam bem, mas na verdade o que elas querem é o seu dinheiro.

O que remete a segunda modalidade de despeito de A. Honneth, a negação dos direitos de uma pessoa. Enquanto membros de uma sociedade, na medida em que os direitos civis e sociais são repetidamente negados a um grupo de sujeitos, um processo de inferiorização moral recai sobre estes, que são tolhidos da capacidade de se relacionar com outras pessoas em nível de igualdade. (FERES, 2004, p.33). No âmbito da indústria cinematográfica, a negação dos direitos foi subsidiada pelo racismo, institucionalizado pelos mecanismos internos desse sistema e propagado pelas representações dos estereótipos. Nesse sentido, algo que sobressaía nas películas era a produção da diferença, manipulada pela estética, pelas atitudes e caracterização dos personagens e pela distribuição de papéis.

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Existia uma dicotomia ainda maior que Estados Unidos e América Latina, tratava-se da separação entre os países desenvolvidos e os demais. Não apenas os latino-americanos eram tratados com diferença, o mesmo acontecia com os asiáticos e outras etnias. Essa prática de institucionalização das diferenças em Hollywood, pode ser melhor observada na dimensão das representações dos atores. Jung Xing (2009, p.133) ao debater as representações de asiáticos no cinema de Hollywood, levanta três formas de práticas de representação: segregação dos papéis, estratificação dos papéis e delimitação dos papéis. (XING, 2009, p.133). Estas práticas são igualmente notadas para o elenco latino-americano, posto que implicam no mesmo fenômeno de distanciamento do Outro e da criação da diferença.

A segregação de papéis significa que Carmen Miranda não poderia atuar como outra personagem que não fosse latino-americana, por outro lado, não havia problema que estadunidenses interpretassem latino-americanos, apontando para a existência de um duplo-padrão. (XING, 2009, p.135). O mais próximo de que esteve do hemisfério norte foi no filme de 1942, Minha Secretária

Brasileira (Springtime in the Rockies), quando interpretou Rosita Murphy, filha de um pai irlandês

que abandonou a mãe brasileira. Entretanto, a ascendência irlandesa pouco lhe rende no escalão civilizatório, já que este país despertava sentimentos de um povo atrasado e bruto. O perfil de cidadã de “segunda classe” fica completo quando se descobre que Rosita é “imigrante, sem profissão definida, mulher e só”. (GARCIA, 2004, p.165). A outra personagem de Carmen que flertou com a civilização foi no filme Copacabana de 1947, após o fim da Política da Boa Vizinhança. Carmen interpreta uma cantora brasileira, Carmen Navarro, que é forçada pelo empresário e namorado a se passar por uma francesa, Mademoiselle Fifi. Perdendo sua auto-imagem, assim como a autonomia sobre o corpo e se submetendo a outrem. Naturalmente, no filme o público e os empresários preferem a “fictícia” francesa à burlesca brasileira.

Conforme Eugene Wong, a estratificação de papéis é a horizontalização da segregação (apud, XING, 2009, p.135), isso corresponde ao fato de que o papel principal não era dado a Carmen ou a outra atriz latino-americana. Entre 1940 a 1945, por mais que sua imagem aparecesse com muito impacto nos cartazes dos filmes e seu nome fosse dos primeiros no elenco, na trama Carmen não passava de coadjuvante. Notadamente nas primeiras participações nos filmes, sua presença estava destinada a criar uma atmosfera cinematográfica étnica. O papel principal de “mocinha” nos musicais geralmente era dado a alguma loira de olhos claros, como Alice Faye e Betty Grable, e somente o amor dessas se concretizava. Enquanto, as relações amorosas das personagens de Carmen Miranda sempre envolviam grandes fiascos e tipos pilantras. Por

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conseguinte, implicando na sexualização do racismo, pois Carmen Miranda—representando todas as latino-americanas—, é a mulher por quem os homens não se apaixonam, apenas desfrutam.

A delimitação dos papéis se dá no âmbito numérico e dimensional. Indica precisamente a repetição e citacionalidade dos papéis, que não ultrapassavam os estereótipos e clichês, limitando o desenvolvimento dimensional e estético dos personagens. (WONG, apud XING, 2009, p.136-137). As personagens de Carmen eram sempre sensuais de uma maneira exótica e permissiva, espalhafatosas, temperamentais e irracionais, além de ser sempre uma derivação da sua “baiana estilizada”. Carmen Miranda reforçava essas percepções, incorporando a personagem também fora dos palcos e do cinema, já em sua primeira entrevista em solo estadunidense alimentou a imagem de boba e interesseira: “‘Eu sei dizer money, money, money e hot dog. (...) Digo yes e no e money,

money, money e turkey sandwich e grape juice’”. (CARMEN MIRANDA, apud GI-MONTEIRO,

1989, p.81). Em Alegria, Rapazes! (Something For The Boys, 1944), a sua última performance musical no filme apela para a sensualidade de Carmen e lhe retira a parte da frente da saia de baiana, deixando suas pernas totalmente visíveis em um body que tem uma cauda na parte de trás. Mas a cena não é composta sem um chapéu de frutas em Chiquita Hart (Carmen Miranda), muitos tambores tocando e sombras artificiais verdes e vermelhas de palmeiras e hibiscos ao fundo. Assim como em outros filmes, quando não está vestida de “baiana” para os shows, o figurino oscila entre o ultra-colorido, modelagens pouco convencionais e o exagero.

O sotaque forte foi outra exigência que se aderiu a sua interpretação. Conforme Tânia Garcia (2004, p.210), “Carmen, de fato, teve dificuldades em aprender o inglês, posteriormente, mesmo sabendo falar muito bem, teve que permanecer com um sotaque e com confusões de pronúncias, perpetuando o estereótipo cômico e ridículo das personagens latino-americanas em Hollywood”. O sotaque era associado a uma linguagem universal, entendida muito mais por seu corpo do que por suas palavras, sinuoso, acentuado pela “’voz ardente e apimentada’” (Crítico desconhecido, apud GIL-MONTEIRO, 1989, p.88). Unindo todos esses elementos, Carmen se tornou o protótipo da mulher latino-americana, exatamente como afirmou o The New York Times: “A Srta. Miranda, sua explosiva dança rebolada, o cantar com o forte sotaque e os figurinos berrantes se tornaram o protótipo da dinâmica mulher latina”. (06 ago. 1955, p.15, tradução nossa).

Assim, a repetição desses papéis só reforçava os estereótipos e sua institucionalização (XING, 2009, p.136-137), habilitando que o tratamento desigual fosse praticado para os latino-americanos enquanto artistas e personagens. Em conclusão, estas são algumas possibilidades de desrespeito na forma de negação dos direitos pelas práticas de representação de Hollywood,

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institucionalizadas pela própria natureza desse setor que é portador de um domínio cultural. Em outras palavras, além dos filmes por si só proporem representações, a veiculação por Hollywood significava uma institucionalização desses modos de representação. (WONG, apud XING, 2009, p.133).

A última das formas de desrespeito elencadas por Honneth, é a depreciação do estilo de vida individual ou de grupo. Essa modalidade diz respeito às representações dos projetos e estilos de vida dos países latino-americanos, que não eram vistos como algo de valor para a comunidade estadunidense (FERES, 2004, p.34), pouco preocupada em ultrapassar as barreiras de suas ideias pré-concebidas sobre essas culturas e pautadas em estereótipos generalizantes. Essa prática sintetizava a auto-imagem de superioridade dos Estados Unidos e rebaixava os demais povos da América em um nível de equivalência que transitava entre o atraso e o escapismo. O olhar de reprovação da câmera era sutil e se constituía, sobretudo, pelos contrastes entres as paisagens e hábitos dos estadunidenses e dos latino-americanos.

Nas películas, aparentemente o maior valor que se poderia atribuir às terras dos novos amigos era como destino turístico e lócus escapista, haréns de prazer, diversão, calor e romance, alheios e isolados das tensões e privações causadas pela guerra. Com esse objetivo em mente, os produtores de Hollywood e os agentes do OCIAA acertaram em escolher as comédias musicais hiper coloridas e os cenários românticos. Entretanto, o ingrediente principal dessas produções era a fantasia, muito mais voltada ao gosto do público dos Estados Unidos, que a uma tentativa de aproximação com a realidade dos países ou culturas que abordavam.

Em uma comunicação interna do OCIAA, se esclarecia que a “América Latina é composta de ignorantes, pobres, e sem voz na decisão de seus governos”, portanto, se nos filmes fossem evitados os problemas da região como “relações raciais, pobreza, política e religião”, essa receita que incluía novos talentos latino-americanos seria suficiente para agradar o público ao sul. (GIL-MONTEIRO, 1989, p.122). Não obstante, o primeiro filme da leva de comédias-musicais da Fox com Carmen Miranda, mostraria que a receita precisava ser aprimorada, já que havia causado ainda mais problemas com a vizinha Argentina, que tentava retratar no filme.

No filme Serenata Tropical (Down Argentine Way, 1940), que se passa principalmente na Argentina, os funcionários nativos de uma fazenda tem uma caracterização bastante bruta, com pele escura, barba por fazer, expressões de debilidade, são servis, ignorantes e sujos. Na análise de Ruy Castro (2005, p.266), os únicos argentinos “dignos” são os aristocratas que tem uma fazenda de cavalos e estudaram em Paris, já Buenos Aires se resume a um hotel de luxo, uma hacienda de

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cavalos e camponeses que se vestem de mexicanos—o padrão se repetiria em outros filmes, enfatizando belos hotéis e casas de shows. Segundo Tânia da Costa Garcia (2004, p.148-149), estes personagens, peculiarmente

Os empregados de Don Diego: vestem-se como gaúchos, mas possuem uma péssima aparência - são sujos, gordos e têm dentes estragados. Os gaúchos são morenos e de estatura pequena. Diferente de Don Diego e Ricardo que dialogam na língua inglesa, os gaúchos conversam em espanhol. Idioma que supostamente é também compreendido pelos cavalos, pois falam com os animais enquanto trabalham.

O filme causou grande polêmica e teve seu lançamento adiado pelo governo da Argentina

por conta das representações depreciativas e inverossímeis deste país e de seu povo3.Somente após

a intervenção do OCIAA e um investimento de cerca de quarenta mil dólares para a refilmagem das cenas mais ofensivas, ao fim de 1941 o filme foi liberado para reprodução na Argentina. (CASTRO, 2005, p.267). Mesmo com as mudanças, o filme continuou não agradando o público argentino, mas nos Estados Unidos foi sucesso de bilheterias, para esse público pouco importava se o que cantavam era rumba e não tango (GIL-MONTEIRO, 1989, p.124, 127). Afinal, a visão que imperava sobre os latino-americanos em geral, ainda se baseava nas confusas impressões sobre o México e talvez o Caribe.

Era uma preocupação do OCIAA, e que cresceria com a progressão da Segunda Guerra Mundial, promover um melhor entendimento da América do Sul e das especificidades culturais de cada região, a fim de prevenir perturbações nas relações políticas e comerciais. Contudo, nem mesmo as fortes pressões da agência, que era munida de seções especializadas, fiscalização direta em Hollywood e manuais restritivos sobre o que não poderia aparecer no cinema sobre a América Latina, foram capazes de superar as percepções que estavam arraigadas na cultura estadunidense como estereótipos já naturalizados. Enfim, as relações comerciais e políticas que estavam sendo

3 Um adido da embaixada estadunidense em Buenos Aires elencou alguns motivos da rejeição do filme no país. “Carmen Miranda, uma estrela brasileira canta em português uma rumba de baixa categoria intitulada Down Argentine Way, que fala de tangos e rumbas sendo tocada à luz de uma lua dos pampas. Henry Stephenson, que faz o papel de um rico proprietário de cavalos de raça expressa-se num dialeto atroz. Muitos argentinos, sobretudo pessoas ricas, falam um perfeito inglês de Oxford. Don Ameche executa uma rumba em castelhano com castanholas e fala em orquídeas, tão raras na Argentina quanto em Nova York. Betty Grable dança uma conga aos solavancos. Quando Betty Grable e Don ameche chegam ao aeroporto de Buenos Aires, são recebidos por uma dupla de cavalheiros com um ar imbecil que desempenham as funções de distribuidores de produtos do pai dela, o que não fica nada bem para todos os distribuidores americanos daqui. Os Nicholas Brothers dançam um sapateado num horrível castelhano e acrescentam à impressão dos argentinos de que todos aqueles ianques julgam que eles são índios os africanos. Uma pessoa de cor é vista em Buenos Aires com tanta freqüência (sic) quanto um hindu em Los Angeles. Há uma fiesta com mantilhas e pentes espanhóis. Uma das canções termina com a expressão espanhola ‘Olé’, nunca usada aqui exceto por dançarinos espanhóis. Há piadas como ‘Sempre que dez argentinos se juntam, há uma corrida de cavalos’. Todos os que retratam um argentino, do primeiro ao último, são afrontosamente ridículos na opinião dos argentinos, desde os mais categorizados até o empregado do hotel”. (apud GIL-MONTEIRO, p.104-105).

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edificadas e que privilegiariam os Estados Unidos, dependiam fortemente da identificação dos Estados Unidos com uma potência, uma entidade superior, habilmente veiculada pelo cinema.

A tradução da América Latina para os filmes, arquitetava uma imagem que correspondia a própria aspiração estadunidense de “estimular o desejo de sobreviver e gozar a vida”. (GIL-MONTEIRO, 1989, p.123). As mensagens de depreciação ficavam subjacentes ao escapismo. Em

Aconteceu em Havana (Week-End in Havana, 1941), enquanto os Estados Unidos tinha

arranha-céus, a monumental Brooklin Bridge, linhas aéreas, potentes navios e escritórios trabalhando a todo vapor, Havana, seguia outro ritmo, poucos carros, hotéis de luxo, cassinos, nightclubs, pista de corrida de cavalo e o mar, tudo do melhor para satisfazer os turistas ianques.

A primeira cena desse filme demarca importantes lugares, logo após a imagem em plano aberto da gelada Brooklin Bridge (NY) coberta de neve, a câmera se aproxima e em fade in são mostrados alguns panfletos de Cuba, destacando três deles em sobreposições transparentes e curtíssimas pausas. O primeiro mostra um grande navio soltando sua fumaça no mar azul, é um panfleto de propaganda da linha de navegação West Indies e seus navios S.S. Cuban Queen e S.S.

Caribbean Queen. O segundo, com um close maior, sobre um panfleto de caloroso fundo amarelo

canário, a imagem de uma negra com turbante na cabeça, vestido tomara-que-caia de listras brancas e vermelhas, que carrega uma grande cesta de flores sobre a cabeça — coordenando com o figurino que Carmen Miranda veste na sequência desta cena—, e a legenda “Cuba, a ilha de férias dos

trópicos”4 (Week-End in Havana, 1941, tradução nossa). A última e também a de maior dificuldade

de visualização, mostra uma mulher branquíssima de biquíni duas peças verde florido e turbante combinando, cujo corpo recobre desproporcionalmente praticamente todo o espaço de uma ilha. Além da moça, a ilha tem também uma árvore e algumas flores. Inicialmente se tem a impressão de que a moça está em uma praia, mas o formato da ilha e as legendas rapidamente correspondem a

Cuba. As legendas informam, no topo “Havana, o parque de diversões o ano todo”5 e abaixo o

nome da companhia de navios a vapor, “Cracken Steamship Company”.

Os navios, ramo comercial que está no centro da trama, representam a tecnologia e o progresso que os Estados Unidos trazem à América Latina. Terra vazia com apenas alguma vegetação e aspirações, é perfeita para o deleite e ocupação dos “brancos”— correspondente a auto-imagem dos estadunidenses—, como a moça alva de biquíni comunica através de seu corpo que ocupa todo o país. A “mulher negra” adverte engenhosamente que o tipo de população dessa terra é o de pele escura, praticante de trabalhos braçais que não exigem o intelecto. Essa imagem por um

4 “Cuba, the holiday isle of the tropics”. (Week-End in Havana, 1941). 5 “Havana, the year-round playground”. (Idem).

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lado, indica que cabe às “mulheres brancas” tirar férias e desfrutar do sol em frente ao mar, e por outro, que a forma de trabalho tradicional dessas regiões era arcaica e novas tecnologias já substituíam a força humana bruta. Com o filme pronto, o representante da Divisão de Cinema do OCIAA na Twentieth Century Fox escreveu ao estúdio que estava “feliz em relatar que parece não haver nada na história básica que possa causar ofensa aos nossos vizinhos latino-americanos”, mas ele estava errado, como aconteceria com frequência, porque a “maioria dos cubanos julgou o filme grotesco”. (GIL-MONTEIRO, 1989, p.130). As críticas iam em várias direções, desde a falta dos elementos étnicos, ao equívoco dos ritmos musicais e das danças que não tinham absolutamente nada de cubanas, e os luxuosos cenários de hotéis e cassinos que jamais existiram em Cuba.

Considerações Finais

Os discursos veiculados por Carmen Miranda e seus filmes eram extremamente sedutores tanto para o público estadunidense, quanto para o público latino-americano e especialmente o brasileiro. Para os Estados Unidos eram uma promessa de domínio e de felicidade nos trópicos. Para a América Latina representava a possibilidade de sucesso social no exterior, dentro da Meca do entretenimento se tinha a sensação de pertencimento a algo maior, um “reconhecimento” às avessas. No caso do Brasil, apesar das controvertidas opiniões que circundavam a aceitação das atuações burlescas e caricatas de Carmen Miranda, acima de tudo era uma representante do Brasil que estava pela primeira vez em Hollywood, com a perspectiva de aparecer nas telas de todo o mundo.

Desta forma, pode-se concluir que no interior dos filmes em questão, existia uma difusão massiva dos valores que permeavam interesses políticos e econômicos da sociedade estadunidense, por meio de narrativas que promoviam a naturalização de relações desiguais e o desrespeito às singularidades. Dentro da linguagem cinematográfica, o corpo de Carmen Miranda subsidiava a feminilização da América Latina, atraindo por seus atributos naturais o olhar imperialista dos Estados Unidos que a quer como um objeto sexual submisso.

Assim, esses e outros filmes criavam fantasias idílicas que acalentavam os Estados Unidos, enquanto estes desenhavam uma América Latina que lhes era conveniente. Um espelho invertido de si próprios, com as severas consequências de objetificação e desrespeito do Outro, que o isolam e o identificam nas representações cinematográficas. Configurando um processo de desumanização alicerçado na caracterização do estrangeiro, que os despe da dignidade individual ao passo que integram um grupo de pessoas indistintas (sem rostos), remove as inibições sociais e psicológicas contra as possíveis violências sobre esse Outro ser humano. (XING, 2009, P.127-128).

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Portanto, é possível observar que os filmes e a performance de Carmen Miranda autorizaram e naturalizaram um modelo feminino e de civilização delineados em oposição ao padrão estadunidense—bem como ao europeu—, cuja penetração global foi tão potente, que já na segunda década do século XXI nota-se a constante revitalização e reinstituição desses discursos pretéritos e a manutenção de uma posição de hegemonia.

Referências

CASTRO, Ruy. Carmen: uma biografia. São Paulo: Companhia das Letras, 2005.

FERES JÚNIOR, João. A história do conceito de Latin America nos Estados Unidos. Bauru (SP): EDUSC, 2005. 317 p.

GARCIA, Tânia da Costa. O “it verde e amarelo” de Carmen Miranda (1930-1946). São Paulo: Annablume; Fapesc, 2004.

GIL-MONTERO, Martha. Carmen Miranda, a Pequena Notável. Trad. Tati de Moraes. Rio de Janeiro: Record, 1989.

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Forms of misrecognition in Hollywood’s representations of Latin Americans, through Carmen Miranda’s movies (1940-1945)

Abstract: This paper discusses how Axel Honneth’s forms of misrecognition, act on the representations of Latin American in Carmen Miranda’s movies produced during the Good Neighbor Policy and on the image of the artist. In this context, Carmen Miranda’s role was to naturalize and disseminate the inter-American narratives proposed by the United States. Thus, the set of her films gave life to a series of representations of Latin America and Latin American women, which can be read as forms of misrecognition. Based on the films of Carmen Miranda, there were selected scenes and situations that embody tangentially Honneth’s theory. Finally, it was observed that the films and the performance of Carmen Miranda authorized and naturalized a female model and civilization outlined in opposition to the American standard, mostly focused on the delight of Latin America by the United States.

Referências

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