A Constituição Federal Brasileira em seu artigo 206, inciso I e a Lei de Diretrizes e Bases (LDB) de
1996 em seu artigo 3º, inciso I estabelecem que o ensino seja ministrado respeitando-se o princípio da igualdade de condições para o acesso e permanência na escola, vejamos:
Artigo 206, da CF
O ensino será ministrado com base nos seguintes princípios:
I - igualdade de condições para o acesso e permanência na escola; Artigo 3º, da LDB
Art. 3º O ensino será ministrado com base nos seguintes princípios: I - igualdade de condições para o acesso e permanência na escola;
Embasados em tal alguns Estados têm aprovado leis com o objetivo de garantir a reserva de percentual em suas universidades públicas aos estudantes com base em critérios de
A expressão “ação afirmativa” surgiu no bojo do movimento pelos direitos civis
nos Estados Unidos. Naquela oportunidade observou-se que a mera revogação das leis segregacionistas era insuficiente para promover os grupos discriminados.
Passou-se, desse modo, a se propugnar por medidas positivas.
No início do século XX, com o surgimento do Estado do Bem-estar social,
avultaram-se ações direcionadas e focalizadas na promoção daquilo que
posteriormente denominou-se “discriminação positiva”, ou seja, identificação de setores sociais problemáticos para canalização de recursos e ações para atendê-los.
Diversos doutrinadores tem entendido que as ações afirmativas são como
ferramentas para a busca de uma igualdade material, isto é, que considere o contexto social constituído, por exemplo, por grupos minoritários.
Os defensores dos programas afirmativos procuram justificar a opção por tais
medidas a partir, basicamente de duas teorias:
1. Teoria da Justiça Compensatória 2. Teoria da Justiça Distributiva
A Justiça compensatória , está baseada na retificação de injustiças ou falhas
cometidas contra grupos no passado, ora por particulares, ora pelo governo, em relação aos membros de determinado grupo minoritário.
O princípio é simples: quando uma parte lesiona a outra, tem o dever de reparar o
dano, retornando ao status anterior a lesão.
Por meio dessa teoria, assevera-se que o objetivo dos programas afirmativos para
afro-descentes seria promover o resgate da dívida histórica, e que tal dívida teria sido o período de escravidão a que foram submetidos os negros.
O problema dessa teoria é responsabilizar inocentes pela prática de atos dos quais
discordam.
As políticas indenizatórias também enfrentam problemas no que tange aqueles
Sob a ótica da justiça distributiva as ações afirmativas estariam relacionadas a uma
distribuição mais igualitária das oportunidades, de modo, a facilitar o acesso dos desfavorecidos a bens que alcançariam, caso não fossem excluídos histórica e culturalmente.
A igualdade proporcional poderia ser implementada com base em parâmetros
como a igualdade de oportunidades, a necessidade individual e a utilidade dentre outros.
Os opositores dessa teoria entendem que a tal programa além de desconsiderar o
O Ministro Marco Aurélio de Mello, aos referir-se ao artigo 208, V da constituição
de 1988, asseverou que:
“(...) a cláusula, “segundo a capacidade de cada um” somente pode fazer
referência à igualdade plena, considerada a vida pregressa e as oportunidades que a sociedade ofereceu às pessoas. A meritocracia “sem igualdade de
pontos de partida” é apenas forma velada de aristocracia.
Afigura-se evidente que, para o ministro do Supremo Tribunal Federal citado, o
mérito não pode ser aferido em uma perspectiva puramente linear, sem observar-se o princípio da igualdade material.
É importante a análise do desenvolvimento dos programas positivos nos Estados
Unidos e França para situarmos a discussão da ações afirmativas no Brasil, e
podemos realizar a comparação com os respectivos modelos para questionarmos a viabilidade e os desafios de implantação da ações afirmativas no País.
A França, os Estados Unidos e o Brasil são signatários da Convenção Internacional
sobre a Eliminação de Todas as Formas de Discriminação Racial, que reconheceu, no plano internacional, a existência da concretização da igualdade material. No Brasil, a referida convenção foi promulgada pelo Decreto nº 65.810, de 8 de
dezembro de 1969.
O parágrafo quarto do artigo 1º da referida Convenção exclui do âmbito da
discriminação racial as diferenciações feitas com o intuito de garantir a igualdade de condições de grupos raciais e étnicos desfavorecidos.
No Brasil, a questão racial está a ligada ao fato de que o processo de abolição da
escravatura, que iniciou-se muito antes de 1888, consistiu em uma estratégia econômica da Inglaterra – criar mercado consumidor para seus produtos
manufaturados - e não foi acompanhado de nenhuma política de integração social dos muitos negros que deixaram de ser escravos. Como consequência, os negros, que não eram mais interessantes como mão de obra, conseguiram a “liberdade”, mas sem trabalho, sem acesso à educação e sem condições de moradia.
Assim, não constitui surpresa o fato de que as estatísticas relativas à educação de
negro também sejam desanimadoras no que se refere a as várias categorias como por exemplo: analfabetismo, anos de estudo, salários percebidos, ingressos em cursos e nas universidades de maior prestigio, dentre outros.
Segundo dados do IBGE, no Brasil 98% dos afrodescendentes na idade de 18 a 25
anos não tiveram acesso à educação superior.
Em face da iniquidade do sistema público de educação básica e do difícil acesso
de estudantes negros de baixa renda, as cotas representam uma forma, ainda que paliativa, ação afirmativa que aumenta a possibilidade de acesso ao ensino
superior.
É imperioso reconhecer que as políticas públicas de ação afirmativa que
possibilitam o acesso às universidades não maculam o princípio constitucional da isonomia, pois, como julgou o STF, são práticas diferenciadas que permitem
compensar desigualdades existentes e justificam-se em virtude de discriminações impostas pela sociedade.
Dados recentes informam que
Pretos e Pardos representam 27%
das matrículas em curso superior
antes das cotas, eram 8%
Para que o critério a ser adotado na política afirmativa brasileira não fira o
princípio da igualdade, deve passar pelo crivo da proporcionalidade, a partir da análise dos seus subprincípios.
É importante que as Comissões de Avaliação das Universidades Federais sejam
plurais e, contando com representantes de diversos perfis, façam uso de estatísticas e estudos, de forma, a acompanhar os avanços sociais, afim de
minimizar os riscos de arbitrariedades e de perpetuação das políticas afirmativas, que só se justificam se tiverem respeitado seu caráter temporário.
Após anos de debates e controversas o STF em 26 de abril de 2012 decidiu, por
unanimidade de votos, pela constitucionalidade das cotas raciais, há que se observar que tal ação afirmativa possui caráter temporário.
A política de cotas terá cumprido a sua finalidade quando houver melhora efetiva
na educação básica de qualidade e o espaço universitário transformar-se em locus não só de formação acadêmica, mas também de formação de lideres que
representam a diversidade de grupos sociais e sejam sensíveis aos benefícios para a sociedade advindos do pluralismo de ideias.