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NÚCLEOS DE SIGNIFICAÇÃO: UMA PROPOSTA METODOLÓGICA EM CONSTANTE MOVIMENTO

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Academic year: 2021

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ISSN 2176-1396

Wanda Maria Junqueira de Aguiar1 - PUCSP Júlio Ribeiro Soares2 - UERN Virgínia Campos Machado3 - UFBA Grupo de Trabalho: Formação de professores e Profissionalização Docente Agência Financiadora: não contou com financiamento

Introdução

Pretendo discutir nesta apresentação a proposta metodológica de núcleos de significação como instrumento para apreensão de sentidos e significados constituídos pelo sujeito frente a realidade como uma proposta metodológica que está em constante processo de reconstrução. Desse modo, afirmo que o grupo de pesquisa “Atividade Docente e Subjetividade”, da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUCSP), assume como tarefa manter-se atento às possibilidades de avançar em relação às possibilidades de apreensão do processo de constituição das significações (articulação de sentidos e significados), sempre de modo orientado pelos pressupostos da Psicologia Sócio histórica e do materialismo histórico e dialético, assim como pelas necessidades que surgem na realização de pesquisas empíricas. A proposta dos núcleos de significação é, nesse contexto, continuamente problematizada, numa perspectiva que tem a crítica como um princípio metodológico que orienta pesquisador na construção do conhecimento científico.

Nesse sentido, recupero brevemente a história do nosso grupo de pesquisa, chamando atenção para a importância que a noção de práxis assumiu ao longo do processo de formação do mesmo, permitindo a construção de investigações que, de diferentes maneiras, se

1 Doutora em Psicologia (Psicologia Social) pela Pontifícia Universidade Católica De São Paulo em 1997.

Professora titular da PUCSP, atualmente é vice- coordenadora e professora do programa de Educação: Psicologia Da Educação e do curso de Graduação em Psicologia da mesma instituição. Dedica-se a estudos na Psicologia Sócio Histórica e dimensão subjetiva da realidade escolar. E-mail: iajunqueira@uol.com.br

2 Doutor em Educação: Psicologia da Educação pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUCSP).

Professor da Faculdade de Educação da Universidade do Estado do Rio Grande do Norte (UERN). E-mail: julioribeirosoares@yahoo.com.br

3 Doutora em Educação: Psicologia da Educação de PUCSP, Docente da área de ciências sociais e humanas

aplicadas à saúde na Escola de Nutrição da Universidade Federal da Bahia - UFBA. Atualmente dedica-se aos seguintes temas: psicologia sócio histórica, núcleos de significação e educação alimentar e nutricional, hábitos alimentares, cultura. E-mail: virginia.campos@ufba.br.

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debruçaram sobre o processo de constituição das significações frente a realidade, e também a (re)construção do procedimento de análise e interpretação acima referido.

Antes de passar a esse ponto, no entanto, trago a contribuição de Vázquez para a discussão da categoria práxis como “uma atividade prática que faz e refaz coisas, isto é, transmuta uma matéria ou uma situação” (MAYORAL, ROSA, 2007, p. 03). Para Vázquez, “a práxis é crítica da realidade, e autocrítica, porque não existem privilegiados juízes do conhecimento, e a crítica trabalha em conjunção com o comportamento preventivo cheio de valores e consciência de classe”. (idem)

Para apresentar o grupo de pesquisa “Atividade Docente e Subjetividade”, afirmamos que o mesmo está inscrito formalmente do Diretório de Grupos de Pesquisa do CNPq desde 2013, mas sua constituição tem como marco inicial o ano 2009. É formado por pesquisadores e estudantes interessados em compreender a dialética objetividade-subjetividade no desenvolvimento da atividade docente, a partir de pesquisas sobre a dimensão subjetiva da realidade escolar. Os estudos desenvolvidos focalizam as significações constituídas por professores, gestores, funcionários, alunos e responsáveis sobre esta realidade e suas relações com o processo de (trans)formação do sujeito. Além da produção de dissertações e teses, o grupo se dedica atualmente aos projetos Tecendo redes de colaboração no Ensino e na Pesquisa em Educação: um estudo sobre a Dimensão Subjetiva da realidade escolar (PROCAD/Capes/2014-2017) e Apreensão da Dimensão Subjetiva dos processos educacionais para professores, gestores, alunos, responsáveis e funcionários de uma escola pública de São Paulo (Cnpq/2014-2017), conduzidos de modo coletivo.

Neste grupo, podemos dizer que a necessidade de refletir sobre nossas ações foi sempre algo essencial, vital para o desenvolvimento da produção do grupo. Em todo o percurso analítico e interpretativo, é essencial a clareza de que, como afirma Prado Jr. (1980) “o objeto do pensamento com que [o pesquisador] elabora seus conhecimentos é sempre uma realidade em vias de transformação por ele mesmo provocada” (idem, p. 557).

Um momento exemplar desta situação foi quando o grupo de pesquisa se aproximou de perspectivas mais interventivas nos procedimentos de construção de informações para a pesquisa, fato que se deu por nos aproximarmos inicialmente da Clínica da Atividade [e os procedimentos de autoconfrontação simples e cruzada, (CLOT, 1999; 2006; 2010)] e, depois, da Pesquisa Crítica de Colaboração (PCCOL) (MAGALHÃES, 1990/2007; 2009; 2011).

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Aranha e Machado (2013) retomando a aproximação do nosso grupo de pesquisa em relação à Pesquisa Crítica de Colaboração, afirmam que a mesma foi desenvolvida por Magalhães a partir das questões sobre dificuldades na aprendizagem de leitura e escrita em uma classe de alfabetização, enfrentadas em seu trabalho de doutoramento em 1990 (MAGALHÃES, 1990/2007). Desde então, Magalhães e seus colaboradores têm aprofundado os pressupostos e desenvolvido procedimentos para uma abordagem que integra pesquisa e formação. Embora este tipo de pesquisa seja utilizado para investigar diferentes temas em vários campos profissionais, se firmou em contexto de formação de educadores.

Além disso, a proposta de Magalhães está embasada na perspectiva da Teoria Sócio histórica (Vygotsky e seus seguidores) e também em outros pesquisadores que se apoiam nessa mesma perspectiva4. Sendo assim, compartilha da concepção de homem postulada pelo arcabouço teórico que o grupo “Atividade Docente e Subjetividade” adota, entendendo, desse modo, que o sujeito se constitui “numa relação dialética com o social e a história, um homem que, ao mesmo tempo, é único, singular e histórico” (AGUIAR E OZELLA, 2006, p. 224) e que se humaniza em contextos de atividade, na relação com os outros e com a ajuda de instrumentos, dos quais o mais importante é a linguagem.

Em pesquisas que se apoiam na perspectiva acima apontada as entrevistas, sessões de discussão, entre outros instrumentos de produção de dados que priorizam a linguagem, se constituem em espaços que representam não apenas a possibilidade de apreensão dos sentidos e significados que homens concretos, em condições reais de existência, atribuem a um dado fenômeno, mas também a possibilidade de utilizar a própria linguagem nesta situação como possibilidade de aprendizagem e desenvolvimento. A linguagem é fundamental por carregar/conter os sentidos, tornando-os passíveis de serem desvelados pelo pesquisador no processo construtivo e interpretativo de análise e também como mediadora do processo de aprendizagem que se pretende estabelecer.

Frente a esta nova maneira de conduzir a pesquisa, passamos a obter informações em maior quantidade e diversidade, se comparadas às entrevistas antes realizadas. Uma vez que passamos a utilizar discussões em grupo com maior frequência, contávamos com um número maior de sujeitos/colaboradores e estes, muitas vezes, exerciam funções diferentes dentro da Instituição – principalmente escolas públicas de ensino fundamental – em que a pesquisa era desenvolvida.

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Tal situação nos obrigou a refletir sobre o potencial analítico dos núcleos de significação: Esse procedimento era adequado para analisar uma quantidade e variedade

maior de dados? Poderia ser utilizado para análise e interpretação das falas produzidas por vários sujeitos? Como?

As tentativas de responder essas questões enfatizaram tanto a dimensão histórico-dialética como essencial para a apreensão da referida proposta e quanto a necessidade de reflexão sobre os desdobramentos de sua escolha para o processo de construção do conhecimento científico sobre as significações. Certamente ajustes foram feitos; novas formas específicas de organizar as informações que contemplassem a singularidade da situação foram criadas, o que, certamente, permitiu que um salto qualitativo na teorização produzida. O movimento gerado pelo grupo quando da incorporação de um novo modo de produzir informações teve como consequência a necessidade de criação de novas e melhores estratégias que captassem/organizassem o empírico, para que pudesse ser devidamente analisado e interpretado.

Nesse processo, nos mantivemos atentos a Kosik (2002, p. 54), quando afirma que, dada a não transparência da realidade, o método científico “é o meio graças ao qual se pode decifrar os fatos”. Por isso, entendemos que a compreensão do objeto investigado só ocorre quando o pesquisador se aproxima das determinações sociais e históricas do mesmo, o que exige coerência entre o referencial teórico-metodológico e os procedimentos utilizados para produção de análise dos dados da pesquisa deve ser observada. Nossas reflexões evidenciaram que nossa preocupação de apreender as significações produzidas pelos sujeitos – professores, gestores, pais – não era abandonada, assim como nossos pressupostos teóricos e metodológicos e a necessidade de sermos coerentes com eles.

Nossa intenção nessa apresentação, ao retomarmos o procedimento metodológico em questão – já discutido em textos anteriores, a saber, Aguiar e Ozella (2006, 2013) – é a de não apenas debater os aspectos relativos as etapas (pré-indicadores, indicadores e núcleos de significação) de utilização do procedimento, mas compreender a dimensão histórico-dialética do método que fundamenta seus procedimentos e, neste processo, tecer algumas considerações críticas necessárias a uma explicitação mais rigorosa de seus aspectos essenciais, de modo a orientar o pesquisador em relação ao processo de análise e interpretação das palavras enunciadas pelo sujeito frente a realidade. Temos esta preocupação porque, caso o procedimento de núcleos de significação se distancie dos pressupostos

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teórico-metodológicos que nortearam sua concepção (a psicologia sócio histórica e o materialismo histórico-dialético), perderá potencial de penetração na realidade e, assim, o rigor na compreensão das categorias metodológicas, e seu potencial de penetração e explicitação da realidade, tornando-se incapaz de apreender e explicar as determinações da totalidade.

Embora a sistematização dos núcleos de significação seja realizada por etapas (levantamento de pré-indicadores, sistematização de indicadores e sistematização propriamente dita dos núcleos de significação), esse processo não deve ser entendido como uma sequência linear. Trata-se de um processo dialético em que o pesquisador não pode deixar de lado alguns princípios, como a totalidade dos elementos objetivos e subjetivos que constituem as significações produzidas pelo sujeito, as contradições que engendram a relação entre as partes e o todo, bem como deve considerar que as significações constituídas pelo sujeito não são produções estáticas, e sim que elas se transformam na atividade da qual o sujeito participa.

Assim sendo, o caminho de apreensão das significações é continuamente marcado por um processo de idas e vindas que implica tanto num fazer/refazer contínuo do inventário de pré-indicadores como num fazer/refazer contínuo de indicadores e núcleos de significação. Por isso, a organização de uma etapa é sempre constituída pela sistematização de outra.

Faremos a seguir uma breve introdução sobre a proposta metodológica (sendo que a mesma será aprofundada nas demais falas que compõem a mesa redonda) tendo a finalidade de contribuir para seu entendimento, sobretudo para aqueles que ainda não a conhecem. Para isso, privilegiamos três questões: a necessidade de estudo dos processos de significação, o objetivo da construção dessa proposta e as etapas propriamente ditas da proposta.

A necessidade de estudo dos processos de significação

Para a realização do pretendido movimento de análise e síntese compreendido na proposta dos núcleos de significação, Aguiar e Ozella (2013, p. 304) apontam que “os significados constituem o ponto de partida”. Mas, por compreenderem que os significados são histórica e socialmente determinados, não se reduzindo a si mesmos, os autores afirmam que “eles contêm mais do que aparentam”. Por isso, os significados de uma palavra não se reduzem nem à dimensão linguística do pensamento nem à dimensão intelectual da fala.

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Nessa apresentação, quando falamos em significações nos referimos à articulação entre sentidos e significados. Sentido e significado são duas categorias centrais na obra de Vygotsky representam duas faces do signo.

O significado é o elemento mais estável do signo, é “dicionarizado” e partilhado socialmente, servindo para a comunicação e socialização de experiências entre os sujeitos. O sentido, por sua vez, revela a apreensão individual do significado, atualizado na própria história do sujeito e a partir de suas experiências pessoais (LEONTIEV, 1978). O sentido é pessoal, constituído pelo indivíduo a partir de suas experiências e sua história e faz parte do significado, mas não foi fixado por ele.

Como aponta Vigotski (2001, p. 398), os significados são, “ao mesmo tempo, um fenômeno de discurso e intelectual”. Eles são a unidade constitutiva da contradição pensamento e linguagem. Para Vigotski (2001, p. 409) “o pensamento não se expressa na palavra, mas nela se realiza”. Sendo assim, é importante que não se considere que o pensamento seja expresso em palavras num reflexo especular, não há uma relação direta entre pensamento e palavra, podemos dizer que existe um movimento que vai “do pensamento à palavra e da palavra ao pensamento” (VIGOTSKI, 2001).

O pensamento se realiza na palavra e nesse processo, pode-se considerar que muito do pensamento do sujeito fracassa e fica contido no “não dito”. O processo que permite ao pensamento se realizar em palavras, ou que o faz fracassar, certamente é tensionado pela subjetividade, pelas contradições que são constitutivas do sujeito. Nessa medida, consideramos que, partindo das falas do sujeito, podemos, num esforço analítico-interpretativo, apreender zonas de sentido constituídas pelos sujeitos.

Estes não são apreendidos facilmente, de modo imediato, são produções singulares e históricas ao mesmo tempo. Como afirmam Aguiar et. al. (2009), “constituem-se a partir de complexas reorganizações e arranjos, em que a vivência afetiva e cognitiva do sujeito, totalmente imbricadas na forma de sentidos, é acionada e mobilizada” (p. 63). A palavra com significado contém mais do que aparenta e, por isso, se confirma a necessidade de construção de um método científico que, ao contrário de reduzir os significados à mera descrição descontextualizada de palavras, luta por apreender e explicar, por meio de categorias metodológicas fundamentais, a riqueza das mediações que neles se ocultam e os remetem aos sentidos.

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Afirmamos, deste modo, a inseparabilidade dos sentidos e significados (significações), mas ao mesmo tempo a não identidade entre eles, dado que compõem uma unidade de contrários. Só podemos compreendê-los de modo não dicotomizado, numa relação de constituição mútua, em que um não é sem o outro, mas um não é o outro – devem, portanto, ser compreendidos na sua singularidade.

Isto posto, compreendendo que a palavra com significado tem origem na articulação dialética do pensamento com a linguagem, concordamos com Aguiar e Ozella (2013, p. 304) quando afirmam que somente “por meio de um trabalho de análise e interpretação [é que] pode-se caminhar para as zonas mais instáveis, fluidas e profundas, ou seja, para as zonas de sentido”.

Tendo isso em vista, passaremos à discussão do procedimento dos núcleos de significação propriamente dito. Abordaremos a seguir o objetivo de sua construção e, após, passaremos às suas etapas.

O objetivo da proposta dos núcleos de significação

Proponho abordar neste item o objetivo da construção da proposta metodológica dos

núcleos de significação. Pretendo explicitar a necessidade da construção de um procedimento

metodológico que possibilite ao pesquisador apreender esse processo de constituição das significações para além do empírico para que, assim, ultrapasse a aparência das palavras em direção à sua dimensão concreta.

Assim sendo, cabe ressaltar que, quando escreveram sobre o assunto, o objetivo de Aguiar e Ozella (2006; 2013) consistia fundamentalmente em instrumentalizar o pesquisador, a partir dos fundamentos epistemológicos da perspectiva sócio histórica, para o processo de apreensão das significações5 constituídas pelo sujeito acerca da realidade com a qual se relaciona. Os autores também objetivavam, implicitamente, socializar o modo como realizavam suas pesquisas tendo como base o método histórico-dialético.

Desde então, a proposta vem sendo amplamente utilizada em diversos projetos de pesquisa, o que tem contribuído para termos uma compreensão cada vez mais crítica sobre seu uso, isto é, vem ajudando a apreender seus pontos frágeis, pouco coerentes e/ou não suficientemente claros. Retomamos, desse modo, a importância de que a crítica seja

5 A ideia de significação destacada neste trabalho remete-se à dialética que configura a relação entre sentidos e

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compreendida como princípio metodológico, como condição para a produção de conhecimento.

A intenção de Aguiar e Ozella (2006; 2013), conforme já fora explicitado acima, não era construir um procedimento qualquer de investigação, mas um recurso metodológico que permitisse a apropriação das significações constituídas pelo sujeito frente a realidade. Essa necessidade de construção de um procedimento específico se justifica porque, segundo a abordagem teórico-metodológica dos autores, os elementos determinantes das formas de significação da realidade não estão ao alcance imediato do pesquisador. O real não se resume à sua aparência. De acordo com Vigotski (2004, p. 150) – inspirado em Marx e Engels –, “se as coisas fossem diretamente o que parecem, não seria necessária nenhuma pesquisa científica. Essas coisas deveriam ser registradas, contadas, mas não pesquisadas”.

Oportuno lembrar neste momento a discussão feita por Mészáros (2013, p. 59) sobre o quanto foi importante a “luta” empreendida por Lukács, para a explicitação da “ausência de significado da imediaticidade” e, assim, da importância da análise das mediações que constituem a realidade investigada. Para que possamos, portanto, nos apropriar das significações, é necessário superar qualquer perspectiva pautada na sua unilateralidade para alcançar as mediações sociais e históricas que as configuram como unidades dialéticas da fala e do pensamento. É necessário, portanto, apreender suas relações, qualidades, contradições – o processo de constituição das formas de significação da realidade pelo sujeito.

A seguir, discorremos brevemente sobre as etapas que constituem o percurso de análise e interpretação de dados qualitativos a partir dos núcleos de significação, na tentativa de esclarecer, ainda que brevemente, como essa proposta permite que a imediaticidade das falas dos sujeitos seja superada.

As etapas de construção da proposta metodológica: levantamento de pré-indicadores, sistematização de indicadores e sistematização dos núcleos de significação.

Passando para as considerações sobre as etapas de construção dos núcleos de significação, destaco inicialmente que nessa apresentação faço uma breve apresentação de suas etapas, com o objetivo de permitir uma noção geral do procedimento, principalmente para aqueles que ainda não o conhecem. Tal procedimento é composto pelas seguintes etapas: seleção de pré-indicadores; sistematização dos indicadores e conteúdos temáticos; construção dos Núcleos de Significação e análise dos Núcleos de Significação (intra e internúcleos)

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(idem). Esses são os movimentos que orientam o processo construtivo-interpretativo realizado pelo pesquisador.

A etapa referente ao levantamento de pré-indicadores consiste na identificação de

palavras que já revelam indícios da forma de pensar, sentir e agir do sujeito que, como ser

mediado pela história, se apropria das características da sua cultura e as converte em funções psicológicas. Ao destacarmos a importância da palavra no levantamento de pré-indicadores, referimo-nos não a qualquer palavra, e sim, conforme pontua Vigotski (2001), à unidade do pensamento verbal e da fala intelectual, isto é, à palavra com significado.

Além disso, ainda cabe ressaltar que não se trata de palavras isoladas. De acordo com Aguiar e Ozella (2013, p. 309), os pré-indicadores referem-se a “trechos de fala compostos por palavras articuladas que compõem um significado”. Por isso, compreende-se, ainda com base nos autores citados (idem), que eles são constituídos não de palavras vazias, mas de palavras cujos significados carregam e expressam sempre a materialidade histórica do sujeito, isto é, aspectos afetivos e cognitivos da realidade da qual participa. Vale realçar, contudo, que, sendo o ponto de partida do pesquisador, os pré-indicadores revelam não o sujeito concreto (histórico), e sim, por meio de indícios que devem ser investigados, apenas o sujeito empírico. Esse é apenas um momento em que o pesquisador se dedica, por meio de leituras flutuantes do material de pesquisa – registro de palavras –, ao primeiro inventário das

significações constituídas pelo sujeito acerca da realidade.

Concluída a primeira etapa da proposta, passa-se para o processo de articulação dos pré-indicadores, cujo processo, embasado nos critérios de “similaridade”, “complementaridade” e/ou contraposição (AGUIAR e OZELLA, 2006; 2013), resultará na sistematização de indicadores acerca da realidade estudada.

Na terceira etapa, o que se pretende é a sistematização dos núcleos de significação. Por articular e sintetizar todos os possíveis conteúdos resultantes do processo de análise empreendido desde o levantamento dos pré-indicadores, esta é a que mais se distancia do empírico e se aproxima da realidade concreta, isto é, dos sentidos constituídos pelo sujeito acerca da realidade na qual atua. Nos Núcleos de Significação é fundamental buscar entender os conteúdos a partir de aspectos particulares do sujeito a que se referem, e, simultaneamente, entender as relações que estabelecem com outras pessoas e eventos.

Um movimento de interpretação internúcleos deverá ser realizado pelo pesquisador, com vistas à elaboração de sínteses mais complexas. Nesse momento realiza-se uma reflexão

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sobre as contribuições teóricas que se pôde alcançar, retoma-se o objetivo de pesquisa e destacam-se os resultados que permitem responder da melhor maneira a questão formulada. Trata-se de discutir “a emergência de modos parciais, incompletos e reais de decisão e intervenção de cada ser humano sobre sua própria vida e sobre a vida coletiva” (DELARI Jr, 2013, p. 116), sem esquecer que a história dos sujeitos se dá sob certas condições histórica e socialmente determinadas ou, nas palavras de Vigotski, buscar a gênese social do individual.

Considerações finais

Com essa apresentação, tive como objetivo colocar em evidência algumas das condições que estimularam as reflexões sobre o procedimento metodológico referido, destacando tanto a importância do referencial teórico-metodológico que o norteia, da coerência entre a teoria adotada e os procedimentos de análise e interpretação das informações, quanto às experiências vivenciadas no desenvolvimento de pesquisas que geraram dúvidas, apontaram fragilidades e contradições e contribuíram para que melhores condições de superação fossem construídas. Procuramos, ainda, tecer considerações críticas sobre a relação entre o pesquisador e seu objeto de pesquisa, na tentativa de destacar que a perspectiva crítica da produção de conhecimento se relaciona intimamente ao compromisso de transformação da realidade – o que contradiz o imperativo da neutralidade que subjaz uma perspectiva positivista de produção do conhecimento. Assim sendo, as explicações gestadas nos núcleos de significação jamais deveriam difundir uma concepção de homem que seja naturalizante, a-histórica ou fragmentada, pois isso negaria o movimento histórico e dialético da realidade social.

O objetivo dos que trabalham com essa proposta é o de contribuir para produzir um conhecimento que revele o não dito, as múltiplas e contraditórias determinações que constituem a realidade estudada, crendo que deste modo se iluminará zonas do real, como afirma Gonzáles Rey (2005) criaremos “zonas de inteligibilidade” que exporão contradições com potencial de impulsionar transformações, quem sabe, em direção à emancipação do homem.

Além do domínio da técnica de sequenciar as etapas da proposta, a construção dos núcleos de significação pressupõe o domínio do referencial teórico-metodológico por parte do pesquisador, pois este forma a base orientadora do processo de análise e interpretação das formas de significação da realidade pelo sujeito. Esta observação se faz necessária para que se

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evite que a proposta dos núcleos de significação se torne algo instrumental, um procedimento meramente técnico.

Afirmamos que, partindo de uma concepção movente da realidade, é tarefa do grupo de pesquisa estar sempre atento a identificar pontos frágeis, pouco coerentes, e/ou não suficientemente claros dos núcleos de significação, tanto na teorização que elaborada sobre o procedimento, quanto na sua utilização como instrumento de análise e interpretação em pesquisas empíricas. A identificação desses pontos torna possível manter o movimento, marcado por rupturas e continuidades, que contribui significativamente para o desenvolvimento da proposta e da produção do conhecimento a partir dela. Assim sendo, enfatizamos não apenas a possibilidade de que melhores explicações sobre tal instrumento possam ser elaboradas, mas que, a partir delas, outras maneiras de analisar e interpretar dados qualitativos, que contribuam para a apreensão do processo de constituição das significações, sejam criadas.

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Referências

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