Foco na
história
Patrimônio
Mostra:
exposição reúne trabalhos de
80 fotógrafos amadores e profissionais
que registram a restauração do prédio
da Santa Casa em vários ângulos
Vilma Gasques
vilma@rac.com.brA
s fotos contam a história do prédio de arquitetura neo-clássica construído há 139 anos, que ficou desativado e praticamente aban-donado por duas décadas antes de ressurgir restaurado e de volta à ativa. A exposição ISI Revelandoa Ala Norte da Santa Casa de Campinas
reúne ensaios de 80 fotógrafos amadores e profissionais realizados para o primeiro concurso fotográfico do Instituto de Saú-de Integrada (ISI). Em todos os trabalhos, o foco é a conclusão das obras de restauro da edificação. “A Ala Norte da Santa Casa é um trabalho que nos orgulha e nos
ins-pira”, analisa o fotógrafo Kamá Ribeiro, curador da mostra e do concurso. A ex-posição pode ser vista até 31 de julho, nos corredores dos pisos térreo e superior do instituto, das 8h às 18h. A entrada é gra-tuita.
Muito além de fazer com que os par-ticipantes documentassem detalhes do prédio, a iniciativa buscou incentivar a população a olhar e conhecer as riquezas do local que abrigou o primeiro hospital da cidade, criado para atender a pobres e escravos. “O edifício foi construído em três partes: o hospital, a capela de Nossa Senhora da Boa Morte e o Asilo das Ór-fãs, tudo idealizado pelo cônego Joaquim José Vieira. A história dele confunde-se com a trajetória de formação e
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campinas 19/6/11metrópole
vimento de Campinas, já que o prédio de-sempenhou papel importante em várias fases da cidade”, analisa Leide Mengatti, diretora executiva do ISI.
Segundo ela, o concurso é parte de uma ação cultural do ISI, que, desde a inauguração, em 2006, vem restaurando e dando uso à Ala Norte da Santa Casa. A proposta foi que cada fotógrafo focasse o patrimônio. A ideia obteve grande adesão – foram mais de 200 obras inscritas –, e o resultado surpreendeu os organizadores. “Tivemos a intenção de provocar, por meio da fotografia, uma reflexão sobre a história desse patrimônio que, depois de restaurado, fez-se recuperado e foi devol-vido à população”, comenta.
Na etapa final, 12 trabalhos foram sele-cionados, e a obra Corredor, de Matheus Spina, foi a vencedora. De acordo com a diretora, a foto conseguiu retratar, por meio de um corredor, um dos maiores objetivos do trabalho de restauração, “que é recuperar e dar uso ao prédio”. “É um detalhe do portal de acesso à Ala Norte e remete a uma reflexão, já que tem uma luz voltada para o interior”, fala Spina, sobre a imagem ganhadora. “Achei que a foto ven-cedora e a externa ficaram muito bonitas. Acredito que os trabalhos resgatam a his-tória do prédio e a reforma para chegar ao que é hoje”, diz ele, que é técnico de som e fotógrafo amador e inscreveu três das seis imagens que fez.
Leide
Mengatti:
“Tivemos
a intenção de
provocar uma
reflexão sobre a
história deste
patrimônio”
À esquerda, a foto vencedora Corredor, de
Matheus Spina; abaixo, detalhe da Mandala, por
José Roberto Magalhães: exposição que vai até
31 de julho mostra a vida de volta ao antigo prédio
FO TOS: A UGUS TO DE P AIV A/AAN
Mostra |
Foi na construção que surgiram as Faculdades
de Enfermagem da PUC e de Medicina da Unicamp
Prédio com linhas neoclássicas,
datado de 1872, foi erguido para
atender aos mais carentes
HISTÓRIA E RESTAURAÇÃO
Construída para atender à população pobre, a Santa Casa de Misericórdia de Campinas foi mantida, durante 110 anos, com doações e o trabalho de voluntários. Ficou todo esse tempo sob os cuidados das irmãs de São José de Chambery e a administração da Irmandade da Misericórdia. Foi na instituição que, em 1950, nasceu a Faculdade de Enfermagem da Pontifícia Universidade Católica de Campinas (PUC-Campinas); em 1965, surgiu ali a Faculdade de Medicina da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp).
A saída da Faculdade de Medicina, em 1986, levou ao fechamento do hospital, já que seu funcionamento era baseado num convênio com a Irmandade de Misericórdia. “Depois de quase 20 anos fechado, em 2005, o ISI deu início às obras de restauro da Ala Norte do prédio, área em que funcionou o Hospital da Santa Casa e onde hoje fica o instituto”, conta Leide Mengatti, diretora do
ISI. Ainda em 2005, foi realizada a prospecção da ala, que tem 2,5 mil metros quadrados e abriga a instituição de ensino.
Os projetos foram encaminhados ao Conselho de Defesa do Patrimônio Cultural de Campinas (Condepacc) para análise e aprovação. O restauro teve início com a recuperação do telhado e, desde então, foram recuperados os espaços do pronto atendimento pelo Sistema Único de Saúde (SUS), a fachada e o antigo necrotério. “No interior, os serviços acompanharam as obras de adequação dos ambientes para uso como salas de aula, laboratórios, biblioteca, administração, copa e cozinha, instalações sanitárias e centro de vivência. Em novembro do ano passado, houve a recuperação e o restauro das paredes, da fachada e da mandala”, informa a diretora.
Atualmente, o trabalho está focado no anfiteatro que abrigará o centro cultural do ISI. “A vida voltou a fluir no edifício histórico, trazendo de volta mais de 1,5 mil alunos de cursos técnicos para a área de saúde”, destaca Leide. Em 1896, o prédio era frequentado por mais de 400 alunos.
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O tempo e a falta de cuidados deixaram marcas visíveis
na edificação, como a deterioração de portas e janelas;
uma das primeiras etapas foi consertar o telhado
FO TOS: DIVUL G A Ç Ã O
Resgate da
identidade
A
s obras de recuperação ficaram a cargo do restaurador Antonio Sarasá, que, em Campinas, foi responsável pela restauração do Palácio dos Azulejos, desenvolveu projetos para a Estação Tanquinho e fa-zendas históricas de Joaquim Egídio. Atu-almente, ele trabalha na Casa Bandeiran-te, em Santana de Parnaíba, e na Casa da Baronesa de Dourados, em Rio Claro. “Na Santa Casa de Campinas, antes da efetivaO Instituto de Saúde Integrada (ISI) é uma organização não governamental, sem fins lucrativos, instituída em 2006, para promover ações humanizadas por meio de educação, cultura, ação social, ensino e pesquisa para a sociedade e, especialmente, os trabalhadores da saúde. Fundado e mantido pelo Sindicato
dos Empregados em Estabelecimentos de Saúde de Campinas e Região (Sinsaúde), teve em sua fundação a participação da Irmandade de Misericórdia de Campinas e Região (ela dirige a Santa Casa de Campinas e o Hospital Irmãos Penteado) e da Casa de Saúde. Hoje, tem parceria com mais de 40 instituições de saúde e
oferece cursos de técnico de enfermagem, complementação para auxiliares,
informática, cursos de atualização, preparatórios para concursos, de aperfeiçoamento e de pós-graduação em enfermagem. Também desenvolve cursos personalizados para atender às necessidades de empresas.
Mostra |
Desde 2006, já foram investidos R$ 3 milhões em
serviços como o restauro das paredes, fachadas e mandala
SAIBA MAIS
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restauração da materialidade ou do pro-cesso de recompor argamassas, tijolos e janelas, trabalhamos com o resgate da identidade e da autenticidade do edifício, incorporando o que pertence à socieda-de”, destaca. O hospital foi construído num tempo em que a varíola, a cólera, a febre amarela e outras enfermidades di-zimavam boa parte da população campi-neira, e representava a possibilidade de cura e alento.
Desde 2006, R$ 3 milhões foram inves-tidos nos serviços. “No edifício do hos-pital e da capela, encontrei pinturas de diversas épocas que foram incorporadas na comunicação com o prédio e tipolo-gias de construção, incluindo técnicas inovadoras para aqueles tempos. E fiquei surpreso com a participação de várias ge-rações no restauro, até mesmo das que vi-veram no prédio, como as internas, já que
o local funcionou também como Casa de Órfãs”, relata.
Novas fi nalidades
Com as novas cores e contornos das pare-des, a edificação adquiriu também outras finalidades. Caso do antigo salão localiza-do num localiza-dos extremos localiza-do pavimento su-perior. Erguido por mãos escravas e antes destinado a tratar dos mais enfermos, hoje tem um auditório para 120 pessoas, anexo ao salão de eventos, este com ca-pacidade para 200 pessoas.
O complexo conta com sete salas de aula, três laboratórios de informática e de enfermagem, biblioteca e um com-plexo pedagógico, que recebe, em mé-dia, 500 alunos por ano e milhares de trabalhadores da saúde que frequentam os cursos livres, oferecidos periodica-mente.