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LEITURA LITERÁRIA: REFLEXÕES SOBRE UMA EXPERIÊNCIA NA ESCOLA

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Academic year: 2021

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LEITURA LITERÁRIA: REFLEXÕES SOBRE UMA EXPERIÊNCIA NA ESCOLA

BORTTOLIN, A. M. P. – LITTERA/UNESC SILVEIRA, R. de F. K. da – LITTERA/UNESC

O presente texto mostra uma experiência de leitura literária na escola1 que teve como foco incentivar a leitura da literatura de maneira compartilhada e lúdica entre estudantes2 de diferentes séries, difundir o gosto pela leitura e criar um ambiente favorável ao letramento literário no espaço/tempo da escola. Inscrevendo essa experiência no contexto da pesquisa questiona-se sobre possíveis ações que possam despertar e consolidar o interesse das crianças pela leitura e em especial pela leitura da literatura e, com isso, aguçar a curiosidade pelas histórias de ficção. Analisou-se a participação dos estudantes, registrando suas opiniões acerca da prática leitora realizada com o intuito de perceber as possibilidades ali suscitadas.

A fundamentação teórica está ancorada entre outros estudos, em Bakhtin (2002), o qual trata da importância da linguagem na constituição do sujeito e da interação entre o eu e o

outro; Bamberger (1986), que aponta formas de incentivar as práticas leitoras; e Soares

(2004) que mostra o valor do ato de ler e o direito ao seu acesso. Estes autores tratam da relevância que assume o ato da leitura no processo de constituição e socialização dos sujeitos. Ao fazer esse relato apresentam-se as falas dos participantes envolvidos, seus apontamentos e suas críticas ressaltando alguns resultados alcançados com a experiência, problematizando o papel da leitura literária no contexto escolar e na formação dos leitores.

O aprendizado da leitura é uma experiência contínua e permanente, que se materializa no contato com as diferentes narrativas, bem como com as diferentes formas de experimentá-lo, mas é principalmente no encontro entre o eu (leitor) e o outro (autor), assumindo e alternando papéis sociais numa constante interação. A linguagem é social e é por meio dela

1 Escola de Educação Básica Natálio Vassoler, em Forquilhinha-SC. Uma das autoras do texto atua como

professora nesta Unidade Escolar.

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Participaram desta experiência de leitura: uma turma do segundo ano do Ensino Médio, com 38 estudantes entre 15 e 16 anos de idade, e quatro turmas de quintas séries do Ensino Fundamental, com 140 estudantes com idade entre onze e doze anos.

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que o ser humano, segundo Bakhtin (2002) se constitui enquanto sujeito e isso só acontece na presença do outro que possibilitam a interação, pois as pessoas vivem num universo de relações sociais e o pensamento é construído na medida em que elas interagem entre si. Trazendo esses princípios para o ato da leitura, percebe-se que isso representa uma experiência de diálogo na relação entre o eu e o outro. É uma prática de interação social que se intensificou entre os estudantes de diferentes séries ao realizarem uma mesma leitura. Um intercâmbio pelo qual um sensibiliza o outro e logo, ambos aprendem.

Silva (1985, p. 56) diz que a aprendizagem humana pode ocorrer por meio da observação do comportamento de outras pessoas e que os indivíduos, e particularmente as crianças, se inspiram e tendem a seguir o exemplo das pessoas que fazem parte do seu círculo de convivência social. Na visão do autor, a aproximação diária e a participação em diálogos a partir de textos com adultos ou com outras crianças já alfabetizadas ajudam a criança a estabelecer relações entre a linguagem oral e a estrutura do texto escrito. Nesta ótica, o adulto e, sobretudo, o professor têm um papel fundamental na formação dos novos leitores. Quando lê para e com os seus alunos, ele instiga a prática leitora concretizada no próprio modelo.

O leitor iniciante começa a perceber que a leitura é uma forma de descoberta em que permite vivenciar diferentes experiências e adquirir conhecimentos sobre a realidade na qual está inserido a partir da ficção. Do mesmo modo, Terzi (1995, p. 93) afirma que, “quando a criança é exposta à leitura de livros, ela apropria-se do conhecimento da estrutura textual sobre a escrita de contos”. Esse encontro entre objeto escrito e criança acontece pelo contato com o livro que vai inserindo o sujeito na sociedade letrada. Com base no exposto, entendemos que o estudante precisa ser instigado a ler, a falar do que leu e a expor suas ideias, pois a leitura literária é capaz de satisfazê-lo a partir das suas narrativas e personagens. Para Zilberman (1982), a leitura da literatura em sala de aula assume papel importante na integração do aluno com as obras de ficção. Para a autora, a literatura pode desencadear um novo pacto entre as crianças ou jovens e o texto, assim como entre o aluno e o professor porque estimula uma vivência com a obra escrita, sem cobranças corriqueiras e, uma vez que “a leitura é necessariamente uma descoberta de mundo, procedida segundo a imaginação e a experiência individual, cumpre deixar tão somente que este processo se viabilize na sua plenitude” (ZILBERMAN, 1982, p. 21), ampliando habilidades de lidar com a linguagem escrita e promovendo o letramento literário. Os diferentes gêneros e formas de praticar a leitura são interessantes, contudo, a linguagem literária proporciona experiências múltiplas pelas quais permitem as “viagens” imaginárias, o colocar-se ao lado ou contrariamente às atitudes das personagens. Essa prática coloca em confronto com as próprias ideias e criações,

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motivo pelo qual é preciso experimentá-la, assumindo uma atitude de incentivo à própria prática junto às novas gerações.

A escola promoveu o encontro entre seus estudantes e a leitura literária, construindo um projeto com atividades divertidas, no intuito de levar algumas das histórias que fazem parte do nosso acervo cultural às crianças da comunidade escolar. A ideia foi a de propiciar uma troca entre os próprios estudantes de faixas etárias e cursos diferentes, no exercício e fruição da leitura literária. As obras escolhidas pertencem aos gêneros infantis e infanto-juvenis como: Chapeuzinho Vermelho, A Moça Tecelã, O Lobo e o Carneiro no Sonho da

Menina e O Gato Barbudo. As histórias foram ouvidas com muita atenção pelas crianças. O

registro escrito dos estudantes envolvidos na experiência de leitura dá conta da importância que a atividade assumiu neste contexto. Os alunos das quintas séries, em sua maioria afirmaram ter tido gosto e interesse pela leitura. Para Mayara3 seria melhor “se tivesse mais histórias de romance, mais animações [...] [e inclusive a possibilidade de] fazer livrinhos”, tudo isso como forma de incentivar a experiência de leitura. Juliana4 percebe a importância que a leitura assume no processo de ensino e aprendizagem, sugerindo que na escola “deveria ter uma equipe de incentivação à leitura”. Esses alunos discutem a necessidade de saber ler e os usos na prática social da leitura, destacando a importância da leitura da literatura. Na opinião de Letícia5, é preciso saber ler “[...] para conhecer mais as histórias de livrinhos, [...] e poder criar histórias e ler em público e saber o significado de cada palavra que lemos”.

Da mesma forma, os jovens estudantes que leram as histórias para os colegas menores perceberam que as crianças “gostaram bastante do que nós fizemos e se divertiram assim como nós. Eu acho que ajudou um pouco para eles saberem que ler um livro não é só ler por ler, é ler e ao mesmo tempo imaginar o que o livro está mostrando” (Angélica6, grifo nosso).

Para despertar o interesse dos menores pelas dinâmicas de leitura, os jovens do Ensino Médio convidaram as crianças a compartilhar a história, imitar os personagens, rir, espantar-se e vivenciar momentos de fruição imaginando, criando outras possibilidades, pois, conforme diz Azevedo (2003, p. 79), “falar em literatura significa falar em ficção e em discurso poético”, mas, no entanto, isso não é suficiente. Experimentar a leitura literária é “remeter ao imaginário. Significa entrar em contato com especulações e não com lições” (Ibidem, p. 79).

3 Mayara da Silva. Os nomes próprios aparecem no texto sob sua permissão e pelo fato de que suas opiniões,

uma vez publicadas, não implicam em risco de qualquer natureza para os estudantes. Sobre isso, ver: KRAMER, 2002.

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Juliana Machado da Silva.

5 Letícia Gomes Silvério. 6 Maria Angélica Goulart.

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Dentre os estudantes que compartilharam a leitura de histórias com os menores e que relataram suas percepções acerca da experiência, está Sabrina7, que entendeu que isso serviu de incentivo à prática leitora e espera que aconteça de novo. Francieli8 também diz que os alunos precisam de mais incentivo e, “com as nossas histórias, passaram a ver de outra forma a literatura”. Satisfeita com o resultado disse que, “além de fazer bem às crianças, também foi bom para nós, porque passamos a fazer releitura dos livros [que já conhecíamos]”.

Ler por prazer, ler para o outro e com o outro. Diferentes possibilidades leitoras. É preciso despertar o interesse do leitor iniciante para que à medida que ele avança no seu processo de letramento, possa se envolver em diferentes práticas leitoras, de forma significativa e constante. Chartier (2005, p. 129) diz: “se deseja formar o gosto de alguém pela leitura, todos sabem que não se pode prometer a essa pessoa o prazer imediato e durante todo o tempo”. Esse é um ato que exige muito tempo, dedicação e muitas vezes corre-se o risco de nem mesmo atingir o que se deseja imediatamente.

Voltando ao relato da experiência, os alunos expressam em seus depoimentos a necessidade e o desejo de ir à “biblioteca e ter uma aula de leitura”. O que estas palavras de Ketlen9 querem dizer é que ela quer ir à biblioteca e ficar lá, lendo. Mas, nem todas as escolas podem contar com uma biblioteca estruturada. A da escola em que a pesquisa se realizou está precária e não tem condições para receber uma turma de alunos e o atendimento ao público é feito em apenas alguns dias da semana. Desta forma a iniciativa com projetos que incentivem a leitura na escola a cada ano letivo é bem aceita pela comunidade e pode beneficiar à formação de leitores.

Essa experiência leitora se confirmou como uma fonte de incentivo ao ato de ler. Os sujeitos envolvidos sugerem que ela seja repetida por várias vezes durante os próximos anos. Isso aparece nos registros feitos pelos alunos, professores e demais profissionais que acompanharam o trabalho. Conforme a Professora Claudia10 “o objetivo foi atingido, visto que conseguiram desenvolver o interesse pelas histórias, aguçando a curiosidade das crianças no momento em que estavam interagindo com as mesmas. [...] foi o primeiro passo em busca do interesse, entusiasmo e motivação de leitores que buscam lazer e informação”.

Enfim, essa experiência com a leitura na escola articulou os estudantes do Ensino Médio e do Ensino Fundamental. A atividade foi planejada e desenvolvida de maneira

7 Sabrina Valnier da Silva.

8

Francieli Goulart.

9 Ketlen dos Santos, aluna da quinta série do Ensino Fundamental. 10 Claudia Maria Romancini Daleffe – Professora de Língua Portuguesa.

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interativa e não se configurou como um único momento, mas uma alternativa que promoveu o envolvimento da comunidade escolar numa experiência compartilhada.

Percebemos que a comunidade escolar reconhece a importância de ampliar os momentos de leitura literária na escola e incentivar sua leitura constante, pois acredita que isso possa formar leitores de maneira geral. É necessário proporcionar condições de leituras literárias individuais e coletivas aos nossos estudantes, pois estas experiências se fazem molas propulsoras, engendrando outras formas de leitura, compreensão e expressão de sujeitos que se mostram ansiosos por percorrer territórios ainda não explorados.

Palavras-chave: Prática de leitura. Leitura literária. Escola.

REFERÊNCIAS

AZEVEDO, Ricardo. A didatização e a precária divisão de pessoas em faixas etárias: dois fatores no processo de (não) formação de leitores. In: PAIVA, Aparecida. et. al. Literatura e

letramento: espaços, suportes e interfaces – o jogo do livro. Belo Horizonte: Autêntica, 2003.

p. 75-83.

BAKHTIN, Mikhail. Marxismo e filosofia da linguagem. Tradução de Michel Lahud e Yara Frateschi Vieira. São Paulo: Hucitec, 2002.

BAMBERG, Richard. Como incentivar o hábito da leitura. São Paulo: Ática, 1986.

CHAPEUZINHO Vermelho. São Paulo: Editora FTD S.A., s/d. (Coleção Contos de Sempre) CHARTIER, Anne-Marie. Que leitores queremos formar na literatura infanto-juvenil? In: PAIVA, Aparecida. et. al. Leituras literárias: discursos transitivos. São Paulo: Autêntica, 2005. p. 127-144.

COLASANTI, Marina. A moça tecelã. São Paulo: Global, 2004. (Coleção Marina Colasanti) ______. O lobo e o carneiro no sonho da menina. Ilustrações da autora. São Paulo: Global, 2008.

KRAMER, Sônia. Autoria e autorização: questões éticas na pesquisa com crianças. Cadernos

de Pesquisa, São Paulo, SP, n. 116, p. 41-59, jul. 2002.

SOARES, Magda. Democratizando a leitura: pesquisas e práticas. Belo Horizonte: Ceale; Autêntica, 2004.

STEEN, Edla Van. O gato barbudo. Ilustrações de Ana Ciça. São Paulo: Global, 2000. (Coleção Cuca Legal)

SILVA, Ezequiel Theodoro da. Leitura e realidade brasileira. 2 ed. Porto Alegre: Mercado Aberto, 1985.

TERZI, Sylvia Bueno. A oralidade e a construção da leitura por crianças de meios populares. In: KLEIMAN, Ângela B. (Org.). Os significados do letramento: uma nova perspectiva sobre a prática social da escrita. Campinas: Mercado de Letras, 1995. p. 91-117.

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ZILBERMAN, Regina. A leitura na escola. In: AGUIAR, Vera Teixeira de. (Org.) et al.

Leitura em crise na escola: as alternativas do professor. Porto Alegre: Mercado Aberto,

Referências

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