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Vista do Cultura Organizacional através das Relações de Afeto

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Academic year: 2021

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Cultura Organizacional através das Relações de Afeto

Caroline Delevati Colpo

Professora dos Cursos de Comunicação Social da Universidade Feevale – Novo Hamburgo / RS. Doutora em Comunicação Social: linha de pesquisa Práticas Profissionais e Processos Sociopolíticos nas Mídias e na Comunicação das Organizações na PUC/RS. Mestre em Desenvolvimento Regional na UNISC e graduada em Relações Públicas na UFSM.

Manuela Mausa

Graduada em Relações Públicas pela Universidade Feevale Assistente de Marketing na Universidade Feevale e participante do Programa de Aperfeiçoamento Científico na Universidade Feevale, atuando como participante do aperfeiçoamento científico do projeto "A comunicação organizacional cultural e afetiva como elemento das relações criativas nas organizações". Tem experiência na área de comunicação interna e eventos, além de experiência acadêmica na elaboração de projetos de comunicação organizacional.

Resumo

O presente artigo se propõe a compreender a cultura organizacional de uma organização privada, de Novo Hamburgo/RS, por meio das relações de afeto do público interno. O estudo foi desenvolvido por meio de pesquisa exploratória e análise qualitativa. Também foi realizado um levantamento bibliográfico a fim de ampliar o conhecimento sobre cultura organizacional e seus elementos constituintes, assim como o entendimentos de afeto e as afetividades no contexto organizacional. Além disso, foram realizadas entrevistas em profundidade e associação de palavras, com funcionários da organização, para identificar a cultura da organização e as relações de afeto entre os colaboradores/colaboradores e colaboradores/organização. Dentre outros resultados, destaca-se que quanto mais os elementos constituintes da cultura organizacional forem compartilhados, melhor será a afetividade positiva entre colaboradores/colaboradores e colaboradores/organização.

Palavras-chave

Cultura Organizacional; Afetividade; Público Interno.

Abstract

This article proposes to understand the organizational culture of a private organization, in Novo Hamburgo / RS, through affective relations of the internal public. The study was developed through exploratory research and qualitative analysis. A bibliographic survey was also carried out in order to broaden the knowledge about organizational culture and its constituent elements, as well as the understandings of affection and affectivities in the organizational context. In addition, in-depth interviews and word associations were conducted with employees of the organization to identify the organization's culture and the affection relationships between employees / employees and employees / organization. Among other results, it is highlighted that the more elements that constitute the organizational culture are shared, the better the positive affectivity between employees / employees and employees / organization.

Keyword

Organizational Culture; Affectivity; Internal Public.

Contexto de pesquisa

O presente artigo se propõe a compreender a cultura organizacional por meio de relações de afeto, no qual é considerado como objeto de pesquisa uma empresa1 privada de Novo Hamburgo/RS, atuante na área da tecnologia, com mais de 30 anos de atividade no

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mercado nacional e na América Latina, mas que ainda tem muito a se desenvolver no que diz respeito à comunicação da sua cultura e suas afetividades. Esta pesquisa torna-se importante, pois a análise da cultura é imprescindível para as organizações, sempre que pontuarem a existência das relações de afeto no contexto organizacional. Este estudo ainda sinaliza a importância das organizações conhecerem sua própria cultura e a cultura dos sujeitos que a compõem, pois ajuda a detectar quais são os melhores caminhos para atingir o relacionamento afetivo com o público interno. Para que uma organização consiga consolidar sua cultura, é necessário que os elementos da cultura sejam compartilhados e comunicados com os funcionários, pois quanto mais relacionados estiverem esses elementos culturais entre organização e colaborador melhor será a afetividade entre eles.

O período de avaliação da cultura organizacional, neste trabalho, aconteceu por dois anos. A escolha deste período se deu pelo fato de que neste intervalo de tempo, se consegue chegar a um panorama geral da empresa e conhecer a cultura organizacional, as suas possibilidades de mudança e os laços de afeto da mesma. As entrevistas em profundidade e a associação de palavras, para esta coleta de dados, aconteceu com cinco funcionários da organização: um diretor, um gerente que possui mais tempo de trabalho na empresa e outro com menos tempo de atividade, assim como um funcionário da produção que possui mais tempo de trabalho e outro funcionário com menos tempo de trabalho.

Cultura e seus elementos simbólicos

Cultura se refere a um fator capaz de promover a interação entre indivíduos de diversos grupos e promovendo as transformações culturais. Para Freitas (2012) na antropologia cognitiva a cultura é vista como “o conjunto dos conhecimentos que são compartilhados entre os membros de um mesmo grupo ou sociedade” (FREITAS, 2012, p. 11). Já na antropologia simbólica “a ênfase recai não sobre os conhecimentos, mas sobre os significados compartilhados” (FREITAS, 2012, p. 12).

Cultura é um conceito antropológico e sociológico que comporta múltiplas definições. Para alguns, a cultura é a forma pela qual uma comunidade satisfaz a suas necessidades materiais e psicossociais. Implícita nessa ideia está a noção de ambiente como fonte de sobrevivência e crescimento. Para outros, cultura é a adaptação em si, é a forma pela qual uma comunidade define seu perfil em função da necessidade de adaptação ao meio ambiente. Nesses dois casos, está presente a ideia de feedback. A adaptação bem sucedida leva à evolução nessa direção. A adaptação mal sucedida tende a levar à correção e à evolução em outra direção. (CALDAS; MOTTA, 1997, p. 16).

Com base em Kellner (2001, p. 11), a cultura “é uma forma de atividade que implica alto grau de participação, na qual as pessoas criam sociedades e identidades. A cultura modela os indivíduos, evidenciando e cultivando suas potencialidades e capacidades de fala, ação e criatividade”. Para Freitas (2012 p. 52) “a cultura refere-se aos conteúdos partilhados por um grupo e ao relacionamento entre os membros”.

Assim como a cultura compartilhada constitui a identidade dos sujeitos, a cultura de uma organização se constrói em quase tudo que ela faz, nos seus valores, seus comportamentos e até mesmo, no ambiente de trabalho. Esta cultura pode surgir, também, de seus fundadores ou líderes, implantando na organização sua visão, seus valores e sua ideologia.

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Entender a organização como uma cultura é reconhecer o papel ativo dos indivíduos na construção da realidade organizacional e no desenvolvimento de interpretações compartilhadas para as suas experiências, o que leva o pesquisador a procurar entender como o grupo cria sentido para as suas experiências, sendo necessária uma postura empática e o próprio envolvimento no processo de investigação. Entretanto, a aceitação de que a cultura é uma variável permite que ela possa ser definida e instrumentalizada tal como a estratégia e a estrutura, ou seja, trata-se de mais um ingrediente sob o controle da direção e que pode ser alterado sempre que for conveniente aos seus objetivos. (FREITAS, 2012, p. 12).

Com isto, o termo cultura organizacional explora o lado humano da organização. Segundo Edgar Schein (2009), a cultura organizacional é formada por pressupostos básicos, artefatos visíveis e outros conjuntos simbólicos que criam os valores dos indivíduos. Nas empresas, esses valores contribuem para criar parâmetros de como pensar, sentir e agir e, por isso, desempenham um papel fundamental para o sucesso das empresas. Cada empresa delimita uma cultura organizacional única, gerada e sustentada pelos mais diversos elementos e formas. Isso significa que a cultura de uma empresa sofre grande influência de seus fundadores, líderes, funcionários, do seu processo histórico e de seu mercado.

[...] a cultura organizacional é o modelo dos pressupostos básicos, que determinado grupo tem inventado, descoberto ou desenvolvido no processo de aprendizagem para lidar com os problemas de adaptação externa e integração interna. Uma vez que os pressupostos tenham funcionado bem o suficiente para serem considerados válidos, são ensinados aos demais membros da organização como a maneira correta para se perceber, se pensar e sentir-se em relação àqueles problemas. (SCHEIN, apud FREITAS, 2007, p. 13).

A constituição da cultura organizacional acaba por se revelar envolvente e completa de detalhes, que passam despercebidos na vida organizacional cotidiana, podendo causar certas surpresas, tanto para a empresa, quanto para os colaboradores quando se reconhecem nesta cultura. Frequentemente, esses elementos culturais fornecem uma interpretação, ou uma mensagem, para os membros da organização sobre o que se considera importante e válido. Segundo Freitas (2012) dentre os elementos da cultura organizacional estão: os valores, as crenças e pressupostos, os ritos, rituais e cerimônias, as estórias, os tabus, as normas e as sagas.

Os valores são os elementos mais importantes da cultura organizacional e mostram o que a organização enxerga como sucesso para seus funcionários. Eles ainda podem ser reforçados por outros elementos da cultura, como estórias, rituais, cerimônias e normas. As crenças e pressupostos mostram o que é entendido como verdade para a organização. Segundo Freitas (2012), quando uma verdade não é questionada nem discutida, ela é natural. Os ritos, rituais e cerimonias são eventos organizacionais que podem ser transformados em rotinas na organização. Os heróis personificam as histórias de coragem, tornando o sucesso humano atingível. Estes heróis são responsáveis por motivar alguns colaboradores, levantando a bandeira da organização, despertando interesse e conquistando seguidores, que ajudarão essas organizações a cumprir sua missão. Ainda segundo Freitas, “as estórias são narrativas baseadas em eventos reais que informam sobre a organização, reforçam o comportamento existente e enfatizam como esse comportamento se ajusta ao ambiente organizacional desejado” (FREITAS, 2012, p. 23). Já os tabus mostram o que não deve ser feito dentro da organização e conforme Freitas (2012), “são escondidos e silenciosos, as empresas

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normalmente não gostam de falar sobre eles, pois podem causar certo mal-estar”. Outro elemento da cultura organizacional são as normas, que “dizem respeito aos procedimentos ou comportamentos considerados o padrão, a regra, para a maior parte das situações e eventos organizacionais” (FREITAS, 2012, p. 29). As normas de uma organização devem ser seguidas por todos, inclusive pelo seu criador.

Para Hofstede (1991, p. 19), sob outra perspectiva, “a cultura organizacional é adquirida e não herdada. Ela provém do ambiente social do indivíduo, não dos genes”. Ainda para o autor, a cultura é sempre um fenômeno coletivo, uma vez que é, pelo menos em parte, partilhada por pessoas que vivem no mesmo ambiente social onde é adquirida. Hofstede (1991) afirma que as diferenças culturais manifestam-se de diferentes formas. Entre os vários termos para descrever as manifestações da cultura o autor destaca quatro que cobrem a totalidade do conceito de forma minuciosa: símbolos, heróis, rituais e valores.

Segundo Hofstede (1991, p. 22) “os símbolos são palavras, gestos, figuras ou objetos que transportam um significado particular que é apenas reconhecido pelos que partilham a cultura”. As palavras em uma língua pertencem a esta categoria, assim como o modo de se vestir, o estilo de cabelo, bandeiras e símbolos de estatutos. Sendo assim, novos símbolos aparecem constantemente, ao mesmo tempo em que os antigos desaparecem. Segundo o autor os símbolos de um grupo cultural são, com frequência, copiados por outros.

Os heróis “são pessoas vivas ou falecidas, reais ou imaginárias, que possuem características altamente valorizadas numa determinada cultura e que por isso servem de modelos de comportamento” (HOFSTEDE 1991, p. 22). Para Hofstede (1991) os rituais são atividades coletivas, tecnicamente supérfluas, utilizadas para atingir fins desejados, mas considerados como essenciais em uma determinada cultura, pois são realizados para o seu próprio bem. Já os valores, segundo Hofstede (1991), podem ser definidos como uma tendência para se preferir certo estado de coisas face a outro. É um sentimento orientado, com um lado positivo e outro negativo, como por exemplo: o mau e o bom, o sujo e o limpo, o feio e o bonito etc.

Segundo Marchiori (2009) cultura e comunicação possuem uma das relações mais íntimas do mundo humano do conhecimento. A cultura se forma pela atuação e comunicação dos grupos e fomenta o que pode chamar de “personalidade da organização”. Os grupos de uma empresa relacionam-se, desenvolvendo formas de agir que vão sendo incorporadas pelos demais membros do grupo. A partir do momento que o grupo passa a agir, a cultura está enraizada, ou seja, os comportamentos surgem naturalmente no grupo e são respeitados em razão de serem entendidos como a maneira correta de interpretar e agir sobre uma determinada situação, até que um novo comportamento venha a ser valorizado em detrimento de outro.

Assim sendo, culturas são sempre formadas e transformadas pela comunicação estabelecida, entre os sujeitos, nos espaços empresariais. “A comunicação é a fase fundamental nesse processo, uma vez que a cultura se forma a partir do momento em que as pessoas se relacionam. Se elas se relacionam, estão se comunicando” (MARCHIORI, 2009, p. 294). Ainda segundo a autora, a cultura organizacional se modificará somente se os indivíduos de uma empresa desejarem a mudança. Portanto, entende-se que a cultura é constituída, mantida e reproduzida pelas pessoas, pois são elas que criam significados e entendimentos. Com isso, as empresas olham para seu público interno de forma mais atenta, já que é ele o principal canal dos acontecimentos da empresa.

A única forma efetiva de modificar uma organização é por meio de sua cultura. Sua sedimentação está ligada ao processo de conhecimento e relacionamento por intermédio da construção de significados [...] É preciso conexão entre cultura, prática social e os aspectos emocionais que conduzem

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a vida das pessoas nas organizações. É preciso existir um entendimento, uma visão que o indivíduo compartilhe, para que ele possa encontrar sentido em sua trajetória organizacional. (MARCHIORI, 2009, p. 61).

Para Freitas (2006) através da cultura organizacional se define e transmite o que é importante, qual a maneira apropriada de pensar e agir em relação aos ambientes interno e externo da organização e quais são as condutas e os comportamentos aceitáveis para a empresa. Uma das funções da cultura organizacional é conseguir a adesão, o consentimento, ou seja, a coparticipação dos indivíduos e grupos de uma empresa. Segundo Freitas (2006, p. 98) “o modo como se obtém esse consentimento passa pela conquista do amor e pela busca da perfeição”.

Dentre os diversos conceitos já citados para definição de cultura e seus elementos no contexto organizacional, este trabalho apropria-se, principalmente, das ideias de Freitas e de Hofstede. Entende-se que estes entendimentos melhor se aplicam em um ambiente empresarial, pois valorizam a individualidade dos seres, acreditando que são eles os responsáveis pela construção da cultura, sua manutenção, sua reprodução e suas mudanças. No entanto, algumas características do conceito de Marchiori também são consideradas importantes e fundamentalmente aplicáveis nos contextos organizacionais contemporâneo.

Relações de Afeto

Entende-se, nesta pesquisa, que a forma mais de efetiva de efetuar mudanças significativas em uma cultura organizacional é atingir o íntimo de cada indivíduo que está presente no ambiente organizacional. Para isso, é necessário estabelecer relação de afetividade entre os indivíduos.

A afetividade é definida como base da vida psíquica. É graças a afetividade que nos ligamos aos outros, ao mundo e a nós próprios. É, na verdade, a afetividade que dá aos nossos atos e pensamentos o encanto, a razão de ser, o impulso final. (GAUQUELIN, 1978, p. 20).

Para Souza (2003, p. 54) “o teórico Piaget defende a tese da correspondência entre as construções afetivas (emoção) e cognitivas (razão), ao longo da vida dos indivíduos, e recorre às relações entre afetividade, inteligência e vida social”. Para Piaget (1998), o papel da afetividade é praticável na inteligência não existindo estados afetivos sem elementos cognitivos. Ou seja, a afetividade é o que conduz a cognição ao seu funcionamento. Porém, o autor não vê a afetividade só como emoções e sentimentos, mas também, incluindo as tendências de conduta e a vontade, neste sentido, as estruturas da inteligência seriam inatas, não sendo afetadas pela dimensão afetiva do indivíduo.

Morin (1979, p. 151) afirma que sua concepção acerca do humano é aberta, de maneira que apresenta um homem possuidor de diversas faces que precisam ser unidas, sendo necessário ligar o homem racional (sapiens) ao homem louco (demens). Ou seja, o homem é simultaneamente: sapiens e demens (sábio e louco); faber e ludens (trabalhador/técnico e lúdico); empiricus e imaginarius (empírico e imaginário); economicus e consumans (econômico e consumista); prosaicus e poeticus (prosaico e poético). São esses caracteres que remetem à compreensão de que “existe ao mesmo tempo unidade e dualidade entre Homo faber, Homo ludens, Homo sapiens e Homo demens. E, no ser humano, o desenvolvimento do conhecimento racional-empírico-técnico jamais anulou o conhecimento simbólico, mítico,

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mágico ou poético” (MORIN, 2000, p. 59). O homem da racionalidade é também o da afetividade, do mito e do delírio (demens). O homem do trabalho é também o homem do jogo (ludens). O homem empírico é também o homem imaginário (imaginarius). O homem da economia é também o do consumismo (consumans). O homem prosaico é também o da poesia, isto é, do fervor, da participação, do amor, do êxtase (MORIN, 2000).

O ser humano não vive só de racionalidade e de instrumentos, entrega-se nas danças, transes, mitos, magias, ritos, crê nas virtudes do sacrifício. As atividades do jogo, de festa, de rito, não são simples distrações para se recuperar com vistas à vida prática ou do trabalho e as crenças em deuses e nas ideias não podem ser reduzidas a ilusões ou superstições, mas têm raízes que mergulham nas profundezas humanas. Há relação manifesta ou subterrânea entre o psiquismo, a afetividade, a magia, o imaginário, o mito, a religião, o jogo, a despesa, a estética, a poesia. (MORIN, 2002, p. 141).

A partir dos conceitos apresentados, é possível fazer uma relação entre as teorias de Piaget e de Morin, na medida em que o ser humano sempre terá seu lado afetivo e cognitivo coexistindo e interagindo entre si, no qual os elementos de afetividade interferem na cognição, assim como elementos cognitivos interferem na afetividade. Essas interações e interferências, tornam o ser único e exclusivo, formando seu caráter e contribuindo para construção de sua cultura. Por este motivo, a cultura organizacional, que é construída pelos indivíduos, será sempre afetada por aspectos cognitivos e afetivos. As ações e decisões tomadas em uma organização são sempre movidas por um lado inteligente – razão -, e por um lado afetivo – emoção -, mesmo que de forma inconsciente.

Vygotsky (1993, p. 25), também discute a relação entre afetividade e a cognição, e destaca que, ao se relacionar com o mundo, o sujeito passa-se a compreendê-lo e, além disso, compreende a si mesmo. Vygotsky (1993) também fala sobre o processo de construção cultural da significação, no qual o indivíduo aprende do mundo que o cerca, a cultura e as formas de ver e agir sobre esse mundo.

Wallon (2003) também compartilha da ideia de que a razão e a emoção estão conectadas. O autor possui uma visão integradora do desenvolvimento humano, levando em conta as relações que o sujeito estabelece com o meio. Wallon (2003) considera a emoção uma ferramenta de sobrevivência para o indivíduo, sendo esta, a manifestação da afetividade. Tanto a afetividade quanto a cognição, evoluem no processo de desenvolvimento do indivíduo, e podem ser construídas e modificadas, pois, quando o indivíduo se desenvolve, as necessidades afetivas tornam-se cognitivas.

A partir deste contexto, pode-se dizer que a cultura e a afetividade estão intrinsecamente conectadas. O indivíduo constrói sua identidade, suas crenças, suas atitudes, seus afetos e valores através da interação com seus pares e com a cultura da realidade em que vive, sendo que, muitas vezes, esta realidade é composta também pelo contexto organizacional. Desta maneira, quanto mais a cultura de uma organização estiver conectada com a cultura dos seus indivíduos, melhor será a relação de afeto entre as partes.

Assim, as dinâmicas que acontecem dentro das organizações ocorrem em um cenário de influências mutuas, e para Spinoza (2009) isso nada mais é do que a dinâmica dos afetos. Para o autor, os corpos afetam uns aos outros de maneira ininterrupta, ou seja, a partir do momento em que há o primeiro afeto, seguem-se diversos outros que afetam outros corpos. Nas palavras de Spinoza (2009, p.63):

Todas as maneiras pelas quais um corpo qualquer é afetado por outro seguem-se da natureza do corpo afetado e, ao mesmo tempo, da natureza do corpo que o afeta. Assim, um só e mesmo corpo, em razão da diferença de natureza dos corpos que o movem, é movido de

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diferentes maneiras, e, inversamente, corpos diferentes são movidos de diferentes maneiras por um só e mesmo corpo.

Então, a dinâmica dos afetos nunca para e, além disso, cada afeto tem uma consequência diferente nos corpos. Diferentes corpos respondem diferentes maneiras aos afetos que recebem e, em troca, afetam outros corpos de diferentes formas. Independente da equação usada, o resultado é o mesmo: os afetos nunca param. Enquanto existirem os encontros dos corpos, existirão os afetos. No ambiente organizacional isso jamais poderia ser diferente e, por causa dos diferentes afetos, não se pode dizer que uma organização é sempre a mesma. No ambiente organizacional é possível delinear essa cadeia de afeto pelas trocas culturais entre sujeitos/sujeitos e sujeitos/organização que acontecem constantemente renovando e reconstruindo a cultura organizacional e a cultura dos seus indivíduos.

A cultura organizacional e das relações de afeto na prática

Metodologicamente este estudo realizou pesquisa bibliográfica, documental e realizou-se, também, entrevistas em profundidade semiestruturada, que segundo Duarte (2008), configura-se em uma pseudoconversa a partir das informações do referencial teórico já realizado e de outras questões já levantadas na pesquisa. Nas entrevistas, realizadas com os cinco membros da organização (um diretor e dois funcionários em dois níveis hierárquicos diferentes), foram levantas questões relativas aos elementos da cultura organizacional, como: valores, crenças e pressupostos, ritos, rituais e cerimonias, estórias, tabus, heróis e normas e questões referentes à comunicação da organização.

Essas entrevistas resultaram em diversas narrativas sobre a cultura organizacional e alguns elementos de sua comunicação, sob a perspectiva dos sujeitos organizacionais e sua experiência na empresa. Para tal, com os dois gerentes (um com maior tempo de trabalho e o outro com menor tempo de trabalho) e com os dois funcionários da produção, (um com maior tempo de trabalho e o outro com menor tempo de trabalho) foi utilizado, também a técnica de associação de palavras. Das respostas dadas pelos funcionários, na entrevista em profundidade, foram tiradas de 13 a 30 palavras ou expressões repetidas. Estas expressões foram, em um segundo momento, citadas uma a uma para que o entrevistado (gerente ou funcionário) falasse o que lhe viesse em mente. Quando as respostas tinham semelhança, podia-se considerar que possuía relações de afeto positivas, e quando as respostas divergiam que possuía relações de afeto negativas.

Dentro da cultura organizacional, a afetividade é um fator importante a ser analisado. Compreendida como um agente motivador para as atividades cognitivas, a afetividade representa o envolvimento emocional entre um indivíduo e outro, ou entre um indivíduo e um objeto. Neste caso, a análise das relações de afeto entre os colaboradores e a organização, visa determinar o grau de envolvimento entre as partes e as relações entre as culturas dos indivíduos e a cultura da organização, tanto nos aspectos positivos, no qual os ideais são semelhantes, quanto nos aspectos negativos, no qual ocorre divergência de opiniões ou objetivos. Das respostas dadas pelos gerentes, na entrevista em profundidade, foram tiradas de 20 a 30 palavras ou expressões que foram amplamente repetidas na entrevista em profundidade, e estas foram, em outro momento, citadas uma a uma para que o entrevistado falasse o que lhe viesse em mente. As respostas da associação de palavras foram, então relacionadas com as respostas da primeira entrevista. A partir desta relação avaliou-se a afetividade entre os gerentes e a organização.

Ao comparar as respostas da primeira entrevista, com as respostas dadas durante a associação de palavras concluiu-se, em relação ao gerente A, que possui menos tempo de

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trabalho na organização, que 16 das 23 palavras ou expressões citadas convergem para uma relação de afetividade positiva, pois as respostas dadas na associação de palavras apresentam semelhança com o que havia sido dito na entrevista em profundidade, ou seja, 70%. Nota-se que há um bom nível de afetividade positiva na relação entre o gerente A e a organização, o que comprova as teorias de Piaget (1998) e Morin (2000), no sentido em que todas as ações e pensamentos do ser humano possuem um aspecto cognitivo e um aspecto afetivo. Em relação ao gerente B, que possui mais tempo de trabalho na organização, o índice de respostas que convergem para a relação de afetividade positiva foi de 75%, pois 15 das 20 palavras ou expressões foram respondidas de forma semelhante nas duas vezes.

Analisando os índices do gerente A que foi de 70% (16 de 23 palavras convergem para relação de afetividade positiva) e do gerente B que foi de 75% (15 de 20 palavras convergem para relação de afetividade positiva) e fazendo um somatório dos dois resultados, verifica-se que 31 das 43 palavras ou expressões tiverem convergência. Isto aponta para uma relação afetiva positiva com a organização, o que corresponde a 72%. Este índice resultante, de 72%, indica que a cultura dos gerentes se relaciona com a cultura da organização, com um bom nível de afetividade, ou seja, há um envolvimento emocional importante, na interação entre a organização e os gerentes. As ações e decisões tomadas e a comunicação no ambiente organizacional possuem um cunho cognitivo e um cunho emocional, ou seja, são objetos de conhecimento e objetos de afeto ao mesmo tempo. Segundo Vygotski (1993), os interesses e valores que a organização possui são compartilhados e, por isso, possuem uma interligação com os interesses e valores dos indivíduos (gerentes), o que demonstra uma interligação entre a razão e a emoção dentro da organização, o que acaba construindo a cultura organizacional e influenciando na cultura de cada indivíduo (gerentes).

No entanto, cabe comentar que essa relação de afetividade positiva ainda pode crescer, pois observou-se questões, ou pontos, no qual as respostas da entrevista divergiram se comparadas com as respostas da associação de palavras e até mesmo com as respostas dadas pelo diretor da empresa, quando entrevistado sobre a cultura organizacional. Em se tratando de uma empresa de pequeno porte, com poucos funcionários, a participação do diretor acaba sendo constante e explícita, e neste caso, ponto fundamental de necessidade de convergência afetiva.

A partir da entrevista em profundidade realizada com os dois funcionários da linha de produção, foram retiradas as expressões para a associação de palavras. A partir desta relação também avaliou-se a afetividade entre funcionários e a organização. Neste caso, a análise das relações de afeto entre os colaboradores e a organização, também visa determinar o grau de envolvimento entre as partes, e as relações entre as culturas dos indivíduos e a cultura da organização, tanto nos aspectos positivos, no qual os ideais são semelhantes, quanto nos aspectos negativos, no qual ocorre divergência de opiniões ou objetivos.

Analisando os índices do funcionário da produção A (com mais tempo de trabalho na empresa) que foi de 47% (7 de 15 palavras convergem para relação de afetividade positiva) e do funcionário da produção B (com menos tempo de trabalho na empresa) que foi de 46% (6 de 13 palavras convergem para relação de afetividade positiva) e realizando um somatório dos dois resultados verifica-se que 13 das 28 palavras ou expressões apontam para a relação afetiva positiva com a organização, o que corresponde a 46%. Este índice resultante, indica que a cultura dos funcionários da produção se relaciona com a cultura da organização, com um nível de afetividade regular, ou seja, há um leve envolvimento emocional, na interação entre a organização e os funcionários da produção. Neste caso entende-se que a empresa poderia realizar ações comunicativas visando o aumento de características emocionais positivas nesta relação.

Os interesses e valores que a organização possui são pouco compartilhados e por isso carecem de uma maior interligação com os interesses e valores dos funcionários da produção,

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o que demonstra uma fraca interligação entre a razão e a emoção dentro da organização. Por estes motivos, cabe comentar que essa relação de afetividade deve crescer para positiva, pois mais da metade das questões da entrevista divergiram se comparadas com as respostas da associação de palavras e até mesmo com as respostas dadas pelo diretor da empresa.

Os resultados obtidos na avaliação da afetividade, através da associação de palavras, indicam que a organização se envolve mais os gerentes, do que os funcionários da produção nas ações de comunicação, possuindo um melhor relacionamento com os gerentes, e desta forma, fazem com que estes se sintam mais parte da organização. Isso se comprova, pois o índice de relação de afetividade positiva dos gerentes com a empresa foi de 72%, já o índice dos funcionários da produção foi 46%.

Ressalta-se que o índice de afetividade dos dois funcionários da produção entrevistados resultou em valores bastante próximos, 46% para um e 47% para o outro, o que indica que há uma percepção semelhante da comunicação por parte dos funcionários da produção e, possivelmente, as ações de comunicação sejam direcionadas de igual forma para todos os estes funcionários. Já em relação aos gerentes, os índices tiveram uma diferença um pouco maior, 70% para um e 75% para o outro, indicando a possibilidade de que a comunicação entre a empresa e cada gerente seja realizada de forma diferente. Foi percebido também que os maiores índices de relação de afetividade positiva com a organização são os dos funcionários com mais tempo de empresa, o que pode indicar que, quanto maior o tempo em que o indivíduo trabalha na organização, maior é o laço entre sua cultura e a cultura da organização.

Considerações finais

A partir desta pesquisa realizada, pode-se dizer, que para efetuar mudanças significativas em uma cultura organizacional é preciso atingir o íntimo de cada indivíduo que está presente no ambiente organizacional, além de ter uma relação de troca e diálogo com os mesmos. Percebe-se que, para isso, é necessário estabelecer uma relação de afetividade entre os indivíduos e entre cada indivíduo e a organização.

Outra percepção que pode ser considerada é que a cultura e afetividade estão intrinsecamente conectadas. O indivíduo constrói sua identidade, suas crenças, suas atitudes, seus afetos e valores através da interação com seus pares e com a cultura da realidade em que vive. Sendo assim, pode-se dizer que, quanto mais a cultura de uma organização estiver conectada com a cultura dos seus indivíduos, melhor será a relação entre as partes e consequentemente a afetividade positiva.

Com esta análise, foi possível identificar que a organização estudada possui alguns valores, como o respeito, a transparência e a valorização dos funcionários, mostrando assim o que é importante para a organização. Possuem ritos, rituais e cerimônias que fazem parte da rotina organizacional, assim como também relatam estórias que reforçam sua cultura, como o alcance de um grande desafio ou até mesmo a consolidação da organização.

A hipótese inicialmente levantada foi de que quanto mais a cultura da organização está relacionada com a cultura dos indivíduos, melhor será o relacionamento afetivo positivo entre as partes. Com a análise, pode-se identificar que a hipótese se confirma, pois com os gerentes, que possuem uma maior relação com a cultura da empresa, os índices de relações de afeto positivas foram maiores do que com os funcionários da produção, que possuem menor relação com a cultura da empresa. Sendo assim, quanto mais os elementos da cultura organizacional forem compartilhados, melhor será a afetividade entre colaboradores/colaboradores e colaboradores/organização.

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Ainda foi possível perceber que, dentro de uma percepção organizacional, no qual a cultura organizacional é acompanhada pela comunicação interna, consegue-se demonstrar que uma comunicação adequada e alinhada com a cultura organizacional pode melhorar o relacionamento afetivo entre organização e colaborador. Por fim, é essencial destacar que a comunicação deve ser valor cultural desenvolvido constantemente pela organização, havendo maior existência real e credibilidade com os colaboradores, sendo, também, um fator estratégico nos processos de mudança.

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Referências

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