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Distribuição de renda no Brasil: uma visão sobre a desigualdade de renda no trabalho

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Academic year: 2021

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UNIVERSIDADE DO SUL DE SANTA CATARINA CARLOS EDUARDO PITZ

DISTRIBUIÇÃO DE RENDA NO BRASIL:

UMA VISÃO SOBRE A DESIGUALDADE DE RENDA DO TRABALHO

Palhoça 2018

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2 CARLOS EDUARDO PITZ

DISTRIBUIÇÃO DE RENDA NO BRASIL:

UMA VISÃO SOBRE A DESIGUALDADE DE RENDA DO TRABALHO

Projeto de pesquisa apresentado em 2018 ao Curso de Ciências Econômicas, da Universidade do Sul de Santa Catarina, como requisito parcial para obtenção do título de Bacharel em Ciências Econômicas.

Orientador: Prof. João Antolino Monteiro, Msc.

Palhoça 2018

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3 SUMÁRIO

1 INTRODUÇÃO ...3

1.1 EXPOSIÇÃODOTEMAEDOPROBLEMA ... 4

1.2 OBJETIVOS ... 5 1.2.1 Objetivo geral ... 5 1.2.2 Objetivos específicos ... 5 1.3 JUSTIFICATIVA ... 5 1.4 PROCEDIMENTOSMETODOLÓGICOS ... 6 2 REFERENCIAL TEÓRICO ... 10

2.1 RENDA:CONCEITUAÇÃOEDELIMITAÇÃOTEÓRICA ... 10

2.2 DISTRIBUIÇÃODERENDA ... 13

3 APRESENTAÇÃO E ANÁLISE DE DADOS ... 31

3.1 COLETADEDADOS ... 32

3.2 TRATAMENTODOSDADOS ... 33

CONSIDERAÇÕES FINAIS...42

ANEXOS...43

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3 1 INTRODUÇÃO

A universalização da economia de mercado, a revolução tecnológica da comunicação e a entrada da era digital no início deste século promoveram um avanço significativo nos sistemas de controle econômico nacionais e internacionais. Os diagnósticos socioeconômicos contam com uma série de fontes de pesquisa que vão dos censos nacionais até os dados agregados econômicos e de qualidade de vida em todo o mundo, como é o caso do Índice de Desenvolvimento Humano (IDH), medido pela Organização das Nações Unidas (ONU). Nunca houve tanta informação à disposição das autoridades e do cidadão, o que aumenta a percepção da sociedade sobre sua própria condição.

Em termos econômicos, percebe-se que os desafios da humanidade neste século são enormes. Não há ainda soluções consistentes para uma série as questões: a contabilidade do impacto ambiental das ações humanas sobre a natureza; a pobreza e miséria na periferia do sistema econômico; o endividamento dos estados nacionais; a perenidade da previdência social; e a capacidade de se continuar gerando emprego e renda às futuras gerações.

A questão da desigualdade na distribuição da renda está inserida neste contexto. Apesar de antigo, o tema continua em debate entre os estudiosos da economia, notadamente pelo seu impacto social. Discutir a forma como a sociedade se organiza para dividir o resultado do esforço produtivo coletivo implica a observância dos aspectos supraeconômicos, como as temáticas do direito, da igualdade, da liberdade e das relações de poder na sociedade.

No Brasil, o tema ganhou maior importância na academia a partir da década de 1960. Pesquisadores como Fernando Henrique Cardoso, Luiz Gonzaga de Mello Belluzo, Maria da Conceição Tavares, Paul Singer, Rodolfo Hoffmann e Albert Fishlow trouxeram a questão da desigualdade de renda no Brasil à luz de pesquisas sociais empíricas. Ficou evidente no resultado dos trabalhos acadêmicos daquele período a abissal desigualdade na distribuição de renda no Brasil. Adicionou-se também o debate sobre a questão da pobreza e da miséria, que levava milhões de brasileiros à margem da economia de mercado (então já pujante nas grandes cidades).

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4 Desde esse período, vai-se meio século de mudanças conjunturais e outras estruturais no país. O Brasil de hoje é democrático, tirou da linha da miséria milhões de brasileiros, universalizou a educação e o acesso a programas de saúde. No entanto, a herança da desigualdade social brasileira é de uma magnitude tamanha que ainda hoje convivemos com a dura realidade de que 50% da renda nacional está concentrada em 10% da população. (HOFFMANN, 2001). Diante desse cenário, os estudos sobre a questão da desigualdade na distribuição de renda é atual e merece aprofundamento. E não apenas no Brasil. Pesquisas recentes nos centros econômicos do mundo ressaltam a concentração de renda em grande escala entre o grupo denominado de rentistas (aqueles que auferem renda sobre o dinheiro). (PIKETTY, 2010).

Sabendo da extensa bibliografia sobre o tema da distribuição de renda, que remonta os primórdios das Ciências Econômicas ainda em Smith e Ricardo, procura-se neste trabalho ir para além da dicotomia capital/trabalho, apesar da centralidade dessa relação nos debates de Economia Política. Assim, para além da desigualdade na distribuição de renda entre o detentor dos meios de produção e o trabalhador, procura-se identificar se no Brasil ainda há o agravante de uma grande desigualdade de rendimentos entre a própria classe detentora de força de trabalho. Com isso procura-se identificar qual é o tamanho da diferença de rendimentos entre o trabalhador assalariado e aquele profissional liberal ou de notável especialização, fatia esta que parece deter grande influência social e econômica em nossa sociedade. E, assim, surgem o problema, a hipótese e o objetivo do presente Projeto de Pesquisa.

1.1 EXPOSIÇÃO DO TEMA E DO PROBLEMA

Dentro do contexto da distribuição de renda no Brasil, qual é o tamanho da diferença de rendimentos entre os detentores do fator de produção trabalho (empregados versus autônomos/profissionais liberais)? Houve variação na desigualdade de distribuição de renda entre essa classe nos últimos 20 anos?

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5 1.2 OBJETIVOS

Tomando como base o problema de pesquisa, apresentam-se, na sequência, os objetivos a serem alcançados no trabalho de conclusão de curso.

1.2.1 Objetivo geral

Verificar o nível de desigualdade na distribuição de renda entre a classe trabalhadora (profissionais assalariados, servidores públicos e os profissionais liberais/autônomos) nos últimos 10 anos no Brasil.

1.2.2 Objetivos específicos

De forma a atingir e complementar o objetivo geral, apresentam-se os objetivos específicos a serem alcançados no decorrer do trabalho:

a) Conceituar os termos “distribuição de renda” e “classes sociais” à luz da ciência;

b) Delimitar especificidades da classe social detentora da força de trabalho assalariada e as demais;

c) Verificar as variações de renda entre as classes sociais no Brasil nos últimos 10 anos.

1.3 JUSTIFICATIVA

De acordo com as informações fornecidas pela Receita Federal do Brasil, em 2014 apenas 26,9 milhões de pessoas realizaram a Declaração do Imposto de Renda Anual. Considerando os dados do IBGE para a totalidade de população brasileira em 2015, tínhamos 204 milhões de brasileiros. A tabela de piso do Imposto de Renda daquele ano era de R$ 21.453,24 anuais (ou R$ 1.787.77 por mês). Com base nisto afere-se que apenas 13,14% dos brasileiros possuem renda suficiente

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6 para recolher imposto ao fisco. Se utilizarmos como referência a população economicamente ativa, levantada em 95,4 milhões de brasileiros pelo IBGE em 2013, teremos aproximadamente 29% da população brasileira com renda anual tributável.

Assim, aquém da faixa de renda tributada pela Receita Federal está a maioria da população brasileira. Não obstante a baixa renda, o país enfrenta ainda o problema da extrema pobreza que, de acordo com o IBGE, em 2010, afeta mais de 16 milhões de brasileiros. Por isso o debate sobre a necessidade de distribuir a renda no Brasil é muito importante.

Nos últimos 20 anos, o Brasil realizou grandes conquistas, como a consolidação do Estado democrático no âmbito da política, a estabilidade dos preços no âmbito da economia e as reformas legais civis no campo social (como o combate à violência contra a mulher, as cotas para negros em universidades e a proteção à criança e ao adolescente). Quanto à distribuição de renda, o Brasil também lançou programas governamentais como Bolsa-Família, Auxílio-Gás e o Seguro-Desemprego, além de outros programas de inclusão social, como Minha Casa Minha Vida, Prouni e FIES. Esses programas sociais geram opiniões divergentes, principalmente no tocante à sua eficácia para a redução da pobreza e para a promoção do desenvolvimento social e econômico da nação em longo prazo.

Para dirimir as dúvidas sobre o tema, é necessário que evitemos o universo de opiniões e nos atentemos aos fatos. Justifica-se o investimento neste trabalho quando se acredita que apenas com informações fidedignas e análise detalhada é que se pode confirmar ou contestar as diversas opiniões sobre o assunto, trazendo a luz científica ao debate popular.

1.4 PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS

A metodologia organizada para atender aos preceitos científicos foi construída de maneira a alcançar o objetivo geral do trabalho. Para a determinação dos métodos e suas respectivas técnicas, realizou-se primeiramente o isolamento do objeto de estudo geral, a fim de propor um enquadramento científico aplicável à sua natureza. Partimos do pressuposto de que a ciência apresenta diferentes métodos

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7 para aferição da realidade ou aproximação da realidade. De acordo com Gil (2008), o método científico é o conjunto de processos ou operações mentais que se devem empregar na investigação. É a linha de raciocínio adotada no processo de pesquisa. Os métodos que fornecem as bases lógicas à investigação são: dedutivo, indutivo, hipotético-dedutivo, dialético e o fenomenológico.

Para fins de controle, antes do estabelecimento do método ou raciocínio principal a ser utilizado para aferição de resultados, procura-se observar o objeto de estudo em algumas perspectivas ou óticas de enquadramento. É a maneira como será encarado o objeto de estudo em suas dimensões, a priori. Primeiramente definiu-se que este trabalho tratará da questão da diferença entre os rendimentos entre as classes trabalhadoras assalariadas e aquelas autônomas/profissionais liberais no Brasil.

A partir daí indica-se que a primeira perspectiva sobre o tema-objeto de estudo é de origem qualitativa e parte dos pressupostos da revisão de literatura sobre o tema. Essa ótica parte de um princípio de que a questão da renda, das classes sociais e as suas especificidades já foram tratadas pela ciência anteriormente e possuem conceitos e classificações no atual estado da arte. “Na pesquisa qualitativa, as variáveis são definidas após a coleta e análise de dados havendo necessidade de reflexão para as construções de categorias e análise dos conteúdos que, posteriormente, transformam-se em variáveis.” (SILVEIRA, 2004). Assim, pode-se dizer que a perspectiva qualitativa tem o objetivo de posicionar o tema no tempo e no espaço à luz da ciência, apresentando os pressupostos pelos quais a pesquisa avançará adiante. Segundo Razuk (2015), o raciocínio indutivo é o mais adequado para conduzir a pesquisa na dimensão qualitativa, uma vez que a elucidação do tema dentro da literatura permite ao pesquisador realizar o debate entre diversos autores que tratam do tema em particular e estabelecer uma generalização dos conceitos principais.

A indução é um processo mental por meio do qual, partindo-se de fatos particulares, suficientemente aceitos e constatados, infere-se uma verdade geral ou universal, não contida nos fatos examinados. Portanto, o objetivo da inferência indutiva é levar a conclusões cujo conteúdo é muito mais amplo do que as premissas nas quais foram baseadas. (RAZUK, 2015, p. 18).

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8 É plausível utilizar o método ou raciocínio indutivo sobre a revisão de literatura por se tratarem de termos profundamente analisados nas ciências econômicas: “renda” e “classes sociais”. São termos abrangidos por diversos autores que contribuíram com estudos empíricos e debates que permitiram construir, neste trabalho, uma síntese do estado da arte.

Quanto ao tipo desta etapa da pesquisa, de revisão bibliográfica, pode-se dizer que é exploratória, no sentido de localizar o tema central e seus viezes de acordo com a literatura anterior, formando os pressupostos de trabalho dos métodos seguintes. Para Appolinário (2012), a pesquisa exploratória pode ser classificada como uma forma de caráter preliminar, como se o pesquisador quisesse fazer uma pesquisa simplificada em uma etapa anterior à pesquisa que, de fato, deseja realizar. Para Gil (2008), a maioria das pesquisas exploratórias envolve: (a) levantamento bibliográfico; (b) entrevistas com pessoas que tiveram experiências práticas com o problema pesquisado; e (c) análise de exemplos que estimulem a compreensão. Neste caso, utiliza-se a bibliografia como fonte principal para consolidação das premissas conceituais dos termos “renda” e “classes sociais”, que serão utilizados para a segunda parte do trabalho.

A segunda perspectiva ou ótica sobre o tema objeto de estudo é de origem quantitativa. Tem-se, nesta perspectiva, o cerne da contribuição científica deste trabalho, já que seu pressuposto parte da intenção de revelar cientificamente o tamanho da diferença de rendimentos entre a classe trabalhadora assalariada e a de profissionais liberais no Brasil. Sendo o mesmo público detentor de força de trabalho (assalariados e profissionais liberais), isolar-se-á esta característica para analisar-se, dentro desta mesma classe social, qual público detém (ou quais públicos detêm) maiores rendimentos e qual a proporção dessa diferença. Nesse sentido, estabelece-se a ótica quantitativa como adequada ao processo de análise, pois permite observar, em valores absolutos ou relativos, qual foi o tamanho dessa diferença ao longo do período de 20 anos no Brasil. As consequências da utilização dessa ótica para auferimento de resultados é a necessidade de detalhar as variáveis antes da pesquisa, tornando o trabalho científico arraigado à estatística e aos gráficos projetados. Para Appolinário (2012), a pesquisa quantitativa prevê a mensuração de variáveis predeterminadas, buscando verificar e explicar sua

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9 influência sobre as outras variáveis. Ela busca focar-se em informações matematizáveis, não se preocupando com generalizações. O raciocínio que envolve esta etapa da pesquisa é de origem dedutiva, pois parte da análise de um conjunto de variáveis observáveis matematicamente que permitirá, ao final do estudo, determinar com maior grau de certeza a realidade constatada, observando as variações da ciência estatística. O raciocínio dedutivo tem o objetivo de explicar o conteúdo das premissas. Por intermédio de uma cadeia de raciocínio em ordem descendente, de análise do geral para o particular, chega-se a uma conclusão. O método segue a construção lógica para, a partir de duas premissas, retirar uma terceira logicamente decorrente das duas primeiras, denominada conclusão. (GIL, 2008).

Em vista da perspectiva sobre o objeto de estudo nesta etapa da pesquisa, o tipo de metodologia a ser utilizada para a redação do texto será descritivo, o que permitirá analisar gráficos projetados e estabelecer o relacionamento entre variáveis predeterminadas. O trabalho descritivo possui como principal característica a análise de variáveis em comparação com outras, procurando estabelecer relações de causa e efeito. Para Silveira (2004), a pesquisa descritiva é mais avançada que a exploratória e busca a resposta em análises de variáveis preestabelecidas. “A análise de dados coletados permite adoção de uma série de métodos estatísticos, para explanação das diferenças significativas e do relacionamento entre as variáveis.” (SILVEIRA, 2004, p. 69).

Estabelecidos os limites de estudo sobre o objeto de pesquisa nesta etapa do trabalho, realiza-se a organização das técnicas de aplicação do método e das ferramentas de controle. Nesta etapa do trabalho, serão apresentadas as fontes de pesquisa para coleta de dados, o tipo de material a ser tratado de acordo com a sua apresentação ao pesquisador e a técnica de cálculos e a confecção de gráficos. A análise dos dados se dará de forma dedutiva.

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10 2 REFERENCIAL TEÓRICO

2.1 RENDA: CONCEITUAÇÃO E DELIMITAÇÃO TEÓRICA

Os pagamentos recebidos, em forma monetária, pela prestação de um serviço pessoal, um aluguel ou a venda de um bem de propriedade privada são a representação do senso comum que a nossa sociedade define como “rendimento”. Outra forma de caracterizar o rendimento é o simples fato de auferir-se dinheiro, uma representação monetária que garante o fluxo de pagamentos de mercadorias e serviços que se comercializam em um lugar denominado mercado.

Ao trazer o tema à luz das Ciências Econômicas, percebe-se que a questão da renda possui conotações diferentes em cada lugar de estudo, e isto influencia o debate entre os pensadores do tema. O primeiro lugar de estudo da renda é no âmbito da economia positiva, que pretende explicar do que se trata o tema sem seu julgamento de valor, ou seja, sem deter-se sobre como a renda e seus elementos devem ser socialmente geridos. O lugar seguinte refere-se à economia normativa, aquela que se dedica a prescrever como a economia deveria ser gerida para alcançar-se o aumento do bem-estar social. (FILELLINI, 1989).

Entretanto, nem sempre é possível identificar na literatura a fissão entre a economia normativa e a positiva, visto que as concepções dos termos não advêm necessariamente apenas de dados empíricos de um lado, contra argumentos normativos de outro. O conhecimento apresenta-se de uma maneira mais dialética, em que o pesquisador busca nos dados empíricos uma base sólida comprovável que, logo adiante, lhe permitirá um raciocínio e, frequentemente, um posicionamento carregado de valores humanos e sociais, uma vez que a economia repercute sobremaneira no bem-estar social. (HALL; LIEBERMAN, 2003).

Os primeiros pensadores que se dedicaram a compreender o fenômeno econômico dado nas relações de troca e, consequentemente, na acumulação de riqueza, foram os chamados fisiocratas. Esses pensadores observaram que a riqueza nacional advinha da renda da terra. O excesso produtivo advindo da produção agrícola era a fonte principal da renda, aumentando-se de safra em safra e gerando a riqueza. “Para a teoria fisiocrática, o produto líquido da agricultura possui

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11 a característica singular de resultar da capacidade reprodutiva da natureza, sendo ele apropriado pela classe dos agricultores.” (SCHWARZ, 2009, p. 41). Schwarz complementa ainda que, de acordo com os fisiocratas, os proprietários da terra levavam em conta não só o custo da mão de obra que empregavam, mas também a própria produtividade do solo, que os fazia auferirem uma renda ainda maior.

Ao considerar-se a relação de gênese da riqueza com a renda, necessariamente considera-se que a discussão sobre distribuição de renda só faz sentido, para os fisiocratas, se observada a sua acumulação. E a medida da produção agrícola é empiricamente perfeita para o observador fisiocrata, pois ele argumenta que, ao contrário da manufatura que apenas adiciona trabalho ao produto, a terra gera a riqueza, porque é fonte de toda a matéria. (MONZANI, 2014).

Com esse modelo de trabalho, os fisiocratas conseguiram realizar um passo importantíssimo para o estudo da economia. É nesta escola que surgem as primeiras teorias que tratam da economia como um todo sistemático e analisável em suas partes. Apesar de colocar a geração da riqueza como objeto principal do estudo, os fisiocratas acabaram contribuindo para o entendimento do fluxo circular de renda, mesmo que acreditassem que esse fluxo era naturalmente fechado e repetitivo. (MONZANI, 2014).

Após a escola fisiocrata, o conceito de renda geradora da riqueza segue um fluxo de adição de conhecimento em Adam Smith. O principal pensador da escola clássica é responsável pela definição científica de renda, que perdura na academia até os dias atuais. No conjunto da teoria do valor-trabalho, Smith consegue discernir o valor nominal e o valor real das mercadorias, base empírica a partir da qual inicia um debate filosófico em torno do sistema de trocas na sociedade. E esse debate culmina, finalmente, em sua proposta de que a riqueza advém do trabalho (ao contrário do que propunham seus antecessores fisiocratas). Ele utiliza como argumento a análise dos preços do trigo e das moedas cunhadas, cuja variação do preço nominal é de altíssima variação histórica. Numa perspectiva de valor real, Smith passa a considerar que o valor do trabalho é aquele primeiro, ou seja, aquele pelo qual se iniciam os termos de troca na sociedade. Para Smith, a condição do trabalho é de uma medição mais próxima do valor real, uma vez que o

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12 preço da troca do trabalhador será sempre o mesmo: a quantidade de trabalho empreendida.

Portanto, o valor de qualquer mercadoria, para a pessoa que a possui, mas não tenciona usá-la ou consumi-la, senão trocá-la por outros bens, é igual à quantidade de trabalho que essa mercadoria lhe dá condições de comprar ou comandar. Consequentemente, o trabalho é a medida real do valor de troca de todas as mercadorias. (SMITH, 1988).

Smith conclui que o trabalho é o preço real das mercadorias e o valor em dinheiro é apenas o preço nominal delas. Não obstante o quanto isso possa parecer estranho, Smith esclarece que tal princípio é observável quando se considera o estado natural das forças de mercado, em que cada trabalhador é dono de sua própria força de trabalho e a utiliza para gerar seus excedentes e negociá-los.

Cada trabalhador tem para vender uma grande quantidade do seu próprio trabalho, além daquela de que ele mesmo necessita. E, pelo fato de todos os outros trabalhadores estarem exatamente na mesma situação, ele pode trocar grande parte de seus próprios bens por uma grande quantidade, ou – o que é a mesma coisa – pelo preço de grande quantidade de bens desses outros. (SMITH, 1988, p. 42).

Essa linha de raciocínio de Smith é fundamental para que ele estabeleça um avanço empírico extraordinário ao observar as relações de troca nas sociedades modernas, notadamente entre aqueles que já detêm patrimônio e aqueles que negociam sua força de trabalho. Após fazer a análise do preço real das mercadorias com base no trabalho, Smith faz uma síntese do processo de compra e venda do trabalho em termos nominais, estabelecendo o funcionamento do mercado de trabalho. Ele percebe que a posse de patrimônio (terras e capital), quando concentrados nas mãos de particulares, é a principal demanda da força de trabalho remunerada. Ao fornecer remuneração e matérias-primas ao trabalhador, o empresário calcula que a venda do produto acabado deverá ser suficiente para pagar o fornecedor da matéria-prima e o trabalhador, sendo o excedente nominal a sua própria remuneração na forma de lucro, basicamente pelo risco que o empresário assumiu em empreender o negócio. (SMITH, 1988).

A análise de Adam Smith determinará o conceito principal de renda nas Ciências Econômicas: se a mercadoria quando negociada a um preço nominal é

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13 fruto da união de terras, capital e trabalho, logo a renda do negócio é distribuída entre esses três fatores. Conclui Adam Smith:

Todo aquele que aufere sua renda de um fundo que lhe pertence necessariamente a aufere de seu trabalho, de seu patrimônio ou de sua terra. A renda auferida do trabalho denomina-se salário. A renda auferida do patrimônio ou capital, pela pessoa que o administra ou o emprega, chama-se lucro. A renda auferida por uma pessoa que não emprega ela mesma seu capital, mas o empresta a outra, denomina-se juros ou uso do dinheiro. É a compensação que o tomador paga a quem empresta, pelo lucro que pode auferir fazendo uso do dinheiro. (SMITH, 1988, p. 56).

Considerando que o tratamento ao tema poderia levar à contestação simplista do auferimento de rendas advindas do Estado ou semelhança, Smith afirma categoricamente que todo tipo de renda provém, direta ou indiretamente, do capital, da terra ou do trabalho. (SMITH, 1988). Rendas secundárias não passam de simples transferências das rendas principais.

A concepção de renda em Smith é o pilar conceitual, de base empírica, do qual partem os economistas seguintes em análise do sistema capitalista. No espaço do debate normativo, os sucessores de Smith discordam quanto ao trato dado à prática econômica, mas assumem o conceitual básico da distribuição social da renda na tripartite remuneração do trabalho, do capital e da terra. As Ciências Econômicas assumirão este conceito de distribuição de renda como remuneração dos fatores de produção.

2.2 DISTRIBUIÇÃO DE RENDA

A remuneração dos fatores de produção é um dos pilares de estudo dos economistas, notadamente pelo seu peso no objeto de estudo geral da economia. Para Bêrni (2011), as Ciências Econômicas dedicam-se a estudar os fenômenos que ocorrem na esfera das atividades voltadas à produção de bens e serviços que atendam às necessidades materiais humanas. A Economia Política, primeira terminologia lançada para definir essa ciência, cuidava especialmente em discutir a questão do capital, do trabalho e do valor. (SANDRONI, 1999).

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14 Para Piketty (2014), a distribuição de renda entre os fatores de produção leva em consideração a diferença entre os rendimentos auferidos do trabalho (salários, emolumentos, gratificações, bônus e demais rendas do trabalho não assalariado) e a renda do capital (aluguéis, dividendos, juros, lucros, ganhos de capital, royalties e outros rendimentos obtidos pelo simples fato de ser dono do capital sob a forma de terras, imóveis, ativos financeiros, equipamentos industriais etc.). Assim, sob a perspectiva da economia positiva, Piketty reedita o que os economistas já compreendem desde Smith: a renda advinda da produção social divide-se entre o capital e o trabalho (sendo a terra, neste caso, um patrimônio que compõe o capital).

O resultado da remuneração entre os fatores de produção é o epicentro do debate entre os estudiosos da Economia Política, notadamente pelo conflito social gerado quando a distribuição é auferida de maneira desigual. De acordo com Belluzzo (1973, p. 16), “as relações antagônicas de produção entre trabalho e capital se traduzem de distribuição igualmente antagônicas: o desejo dos trabalhadores de melhorar suas condições de vida se contrapõe ao impulso dos capitalistas em expandir o valor de capital”. Para Belluzzo, envolto ao conflito acerca da distribuição da renda, está também a questão do crescimento econômico, da industrialização e do subdesenvolvimento.

Comumente as questões da distribuição e da desigualdade de renda e as condições de pobreza são debatidas em conjunto pelos estudiosos. Assim é fundamental que seja distinguida a questão da distribuição de renda entre os fatores da questão da pobreza, em seu termo mais amplo. Enquanto a pobreza é fruto da desigualdade social ao longo da história, a distribuição de renda entre os fatores de produção pressupõe a existência de uma divisão do trabalho observada a partir de Adam Smith. Assim, a divisão da renda entre trabalho e capital não significa ordinariamente a diferença entre pobreza e riqueza, e sim que os fatores capital e trabalho recebem, cada um, uma fatia do produto social em forma de renda. No entanto, isso não significa que não possa haver uma relação de causa e efeito entre a desigualdade na distribuição de renda e a existência da pobreza. Quando a distribuição de renda entre os fatores de produção (capital e trabalho) assume proporção de extrema disparidade, como observado por Marx e Engels na Europa

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15 do século XIX, a classe trabalhadora é levada a um crescente empobrecimento e até a condições de miserabilidade.

Outra diferença relevante e necessária citar é a distinção entre o conceito de distribuição de renda entre fatores de produção e desigualdade de rendas na sociedade. É possível identificar desigualdade de rendas dentro de uma mesma classe social, como entre os trabalhadores. Ou seja, além da distribuição de renda entre os fatores de produção, é possível verificar uma desigualdade de rendas intrafatores de produção, que se depreende sobre a desigualdade de rendas por dentro das próprias classes sociais. Essa perspectiva analisa a diferença das fatias da renda nacional entre o grande detentor do capital em função do pequeno empreendedor, bem como os rendimentos de executivos e profissionais liberais em função dos operários e comerciários de outro. Os primeiros têm em comum a disputa pelo lucro, enquanto que os segundos têm em comum o fato de venderem sua própria força de trabalho para auferir renda. No contexto do debate normativo, Piketty realiza um prognóstico que serve como exemplo da desigualdade de rendas intrafatores de produção: “No futuro, poderemos reencontrar uma combinação de dois mundos: de um lado, o retorno das fortes desigualdades do capital herdado e, de outro, as desigualdades salariais exacerbadas e justificadas por mérito e produtividade (cujo fundamento se mostra escasso).” (PIKETTY, 2014, p. 407).

A desigualdade de rendas intrafatores de produção não é contextualizada em Smith. Marx faz uma introdução ao tema quando descreve a divisão do trabalho entre simples e complexo e distingue a renda entre os trabalhadores de diversas camadas sociais como burocratas, especialistas, analistas, gerentes e outras atividades melhores remuneradas em vista do grau de complexidade. (SINGER, 1996).

Quando se fala em questão de distribuição de renda, é necessário perceber que a desigualdade não ocorre apenas entre o capital e o trabalho, mas também pode dar-se em classes não inseridas no processo produtivo diretamente, como entre profissionais liberais, burocratas e analistas, entre outros.

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16 2.2.1 A distribuição de renda entre os fatores de produção

A divisão do trabalho parte do pressuposto de que a troca de mercadorias é o método social pelo qual os homens ganham eficiência produtiva. Neste sentido, a sua teoria do valor trabalho se pauta na troca de mercadorias advinda da divisão social do trabalho. Motivo pelo qual o sistema econômico tende ao equilíbrio quando em liberdade: ocorre a livre a troca de mercadorias pelos preços decorrentes do valor trabalho. (SMITH, 1988). Mesmo observada a desigualdade na distribuição de renda, Smith (apud BELTRAN, 2000), acredita que esta composição é fundamental para a manutenção da estabilidade da ordem social e que, futuramente, a acumulação de capital também promoverá o aumento de salários.

Mas para David Ricardo e mais tarde para Marx, o que acontece na prática é um desequilíbrio na distribuição de renda provocada pela remuneração desproporcional de outros fatores em função do trabalho – a terra e o capital. Para Lima (1974), a teoria da distribuição de renda em David Ricardo e Marx dedica-se a demonstrar o quanto o valor trabalho é subtraído pela remuneração do capital a fim de financiar sua própria expansão, mesmo sendo o trabalho o único fator sine qua non do sistema.

O que esta teoria ressalta é a diferença de natureza entre a remuneração dos assalariados e a remuneração dos proprietários ou capitalistas, uma vez que é tecnicamente possível que os bens eventualmente apropriados – a terra, por exemplo – continuem contribuindo para o processo de produção sem nenhum tipo de remuneração a seus proprietários, ao passo que, não se pagando aos trabalhadores o necessário à sua subsistência, ou não se contratando novos trabalhadores para repor o equipamento depreciado, a força de trabalho e as máquinas simplesmente deixarão de existir. (LIMA, 1974).

Ricardo é o primeiro estudioso a relacionar a pobreza diretamente com a desigualdade na distribuição de renda, ao estudar o impacto do capital e da remuneração dos trabalhadores na produção agrícola. (BELTRAN, 2000). Para Ricardo (2001), a principal razão do estudo da Economia Política é determinar as leis que regulam a distribuição do produto socialmente concebido. Por isso, de acordo com Beltran (2000), diferentemente de Smith, David Ricardo não considera a

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17 desigualdade na distribuição de renda algo necessário, mas um problema social que faz piorar o crescimento exponencial da pobreza na Inglaterra do Século XVIII, operando em conjunto com as instituições governamentais e as forças demográficas de cada região.

Para Ricardo (2001), a interferência do governo (instituição) através do assistencialismo (lei dos pobres) ajudava a promover a pobreza, o que facilitava o crescimento deste contingente populacional de maneira cíclica. Assim, David Ricardo recomenda a retirada de benefícios governamentais à pobreza em conjunto com uma reforma tributária que facilite o desenvolvimento agrícola, o que geraria emprego para este contingente de mão de obra ociosa e dependente do governo.

Percebe-se, aqui, que se concordam na leitura sobre a distribuição de renda, Ricardo e Marx discordam no desfecho. Marx (1996) toma de Smith e Ricardo a noção de distribuição de renda entre os fatores de produção para descrever o que definiu como mais-valia. Assim, com uma perspectiva diferente da visão ricardiana, Marx descreve como funciona o processo de acumulação do capital em função da expropriação (e não exploração) do trabalho. Em termos de distribuição, pode-se dizer que Marx lê o capitalismo como a expropriação da renda que deveria ser destinada ao proprietário da força de trabalho, enquanto Ricardo observa um sistema funcional que poderia ser melhorado com uma reforma tributária, necessária para a geração de mais empregos.

Marx considera que o resultado da produção é essencialmente concebido pelo fator trabalho, pois “a Natureza não produz de um lado possuidores de dinheiro e de mercadorias e, do outro, meros possuidores das próprias forças de trabalho. Essa relação não faz parte da história natural nem tampouco é social, comum a todos os períodos históricos.” (MARX, 1996, p. 287). Assim, Marx traz consigo uma reflexão sobre como o direito à propriedade privada leva à exploração do homem pelo homem, cuja determinação não é naturalmente concebida, mas historicamente construída a partir dos conflitos sociais em uma espiral dialética ao longo do tempo. (FURTADO, 1964).

A explicação de Marx para o modelo de distribuição de renda no capitalismo parte do princípio de que o trabalhador antes não assalariado (camponês, artesão e ferreiro, entre outros) detinha o trabalho como sua

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18 propriedade e o resultado do seu labor garantia-lhe condição de vida e consumo. Cabia apenas a si a decisão do sobretrabalho, ou seja, aquele tempo de trabalho que lhe daria uma renda extra. (MARX, 1996).

Com o advento da transformação da força trabalho em mercadoria, o tempo de trabalho passa a ter um preço. Por este preço o trabalhador aliena a sua força de trabalho pelo tempo contratado com o capitalista, independentemente do resultado de sua produção. Assim, tudo aquilo que o trabalhador produz a mais do que produziria em um dia de trabalho no campo ou na manufatura artesanal, o capital apropria para si na forma de lucro. (MARX, 1996).

A este excedente de produção Marx define como mais-valia:

Conhecemos agora a maneira pela qual é determinado o valor, que é pago ao possuidor dessa mercadoria peculiar, a força de trabalho, pelo possuidor de dinheiro. O valor de uso, que este último recebe por sua vez na troca, só se mostra na utilização real, no processo de consumo da força de trabalho. Todas as coisas necessárias a esse processo, como matéria-prima etc., o possuidor de dinheiro compra no mercado e paga seu preço integral. O processo de consumo da força de trabalho é, simultaneamente, o processo de produção de mercadoria e de mais-valia. (MARX, 1996 p. 292).

Marx afirma ainda que a mais-valia é a maneira única pela qual o capital se multiplica, ampliando o processo produtivo. O excedente produtivo cria condições de ampliação da produção e reprodução do sistema capitalista. “Aqui há de se mostrar não só como o capital produz, mas também como ele mesmo é produzido, o capital. O segredo da fabricação de mais-valia há de se finalmente desvendar.” (MARX, 1996, p. 293).

O ingrediente na fórmula do capital que o sustenta enquanto modo de produção legítimo da sociedade industrial é a maneira como se define o preço do trabalho assalariado. Havendo a distribuição da renda entre o capital e o trabalho, qual fatia é cabida ao trabalho? Para Marx, o valor de referência do salário é aquele mínimo que permite que o trabalhador aliene seu tempo de trabalho, ou seja, aquela renda que garanta os artigos de primeira necessidade do homem:

Vimos que o valor da força de trabalho, ou, em termos mais populares, o valor do trabalho, é determinado pelo valor dos artigos de primeira necessidade ou pela quantidade de trabalho necessária à sua produção. Por conseguinte, se num determinado país o valor dos artigos de primeira necessidade, em média diária consumidos por um operário, representa 6

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19 horas de trabalho, expressa em 3 xelins, esse trabalhador terá de trabalhar 6 horas por dia a fim de produzir um equivalente do seu sustento diário. (MARX, 1996, p. 108).

Por fim, Marx contextualiza a maneira como se distribui a renda entre os fatores de produção, citando a renda da terra, a renda dos lucros da propriedade do capital e a renda dos juros da propriedade do dinheiro. E conclui que todas elas fazem parte de uma cesta de expropriação da renda do trabalho. “A renda territorial, o juro e o lucro industrial nada mais são que nomes diferentes para exprimir as diferentes partes da mais-valia de uma mercadoria ou do trabalho não remunerado, que nela se materializa, e todos provêm por igual dessa fonte e só dessa fonte”. (MARX, 1996, p. 104).

Sob essa perspectiva, fica claro que a distribuição da renda entre os fatores de produção não ocorre a posteriori, ou seja, não é dividida entre o capital e o trabalho de acordo com o resultado das vendas das mercadorias. A distribuição da renda entre os fatores ocorre a priori para o fator trabalho contratado previamente à produção, na forma de salário de sobrevivência (sua remuneração ocorre sempre após o serviço prestado), e a posteriori ao fator capital, na forma lucros, juros, aluguéis e demais rendas derivadas da utilização capital.

Em sua obra, muito além da mais-valia, Marx aprofunda a descrição do sistema capitalista desde o período da acumulação primitiva na Europa e também refunda a dialética de Hegel em forma de materialismo histórico. A contribuição de Marx para a ciência extrapola as Ciências Econômicas e afeta todas as ciências sociais.

A partir do final do século XIX, o estudo da distribuição de renda entre os fatores de produção ganha uma nova investida teórica, decorrente debate sobre a teoria do valor para as ciências econômicas. Os primeiros pensadores que passaram a rever a perspectiva sobre a teoria da distribuição foram denominados marginalistas. O termo “marginalista” advém do conceito de utilidade marginal dos bens, mas ficou mais marcado pelo princípio da utilidade decrescente, segundo o qual quantidades sucessivas de um bem geram acréscimos de satisfação progressivamente menores ao consumidor. (NETTO, 1996). Os principais expoentes da teoria da utilidade marginal são Carl Menger (1840-1921), Willian Jevons (1835-1882) e Leon Walras (1834-1910).

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20 De acordo com a perspectiva marginalista, o valor econômico dos bens não deve ser medido pelo trabalho, mas pelas leis de mercado que regem o sistema econômico, as quais, em instância mais elementar, representam as necessidades infinitas dos seres humanos em um mundo com disponibilidades escassas. (HAYEK, 1934).

Um dos pensadores mais influentes desta escola de pensamento foi Carl Menger, importante estudioso austríaco que se dedicou a estudar a teoria do valor e do preço e sua relação com a alocação dos fatores de produção em função da demanda.

Para Menger (1983), a economia como relação social é essencialmente concebida pelo atendimento às necessidades do homem. E todo mecanismo econômico movimenta-se em torno deste princípio de demanda, pois, independentemente de onde vivem, “as pessoas utilizam as quantidades disponíveis de bens (meios de consumo e meios de produção) para o atendimento mais completo possível de suas necessidades.” (MENGER, 1983, p. 269). Para ele, a realidade só pode ser compreendida como uma relação de causa e efeito, sendo que a demanda gerada pelas necessidades do homem gera, na outra ponta, uma oferta de força equivalente. Quando a relação entre oferta e demanda é deficitária, ou seja, há uma menor oferta para atender à demanda das infinitas necessidades do homem, o mercado regula o valor dos bens e serviços em forma de preços, o que obedece especificamente à lei da escassez. (MENGER, 1983).

Sempre que ocorre essa situação com referência a determinado período de tempo - isto é, as pessoas constatarem ser a demanda bem maior do que a quantidade disponível do bem-, as pessoas chegam à conclusão de que necessariamente algumas de suas necessidades deixarão de ser atendidas, ou então serão atendidas apenas em parte. (MENGER, 1983, p. 269).

Nessa perspectiva, Menger “vira de cabeça para baixo” a lei de Say, partindo do pressuposto de que a demanda gera a oferta, ou seja, a humanidade se organiza economicamente para atender às necessidades do homem.

Denominamos economia o conjunto total das atividades do homem orientadas para os objetivos acima descritos; os mencionados bens, na situação que caracterizamos (de grande demanda e pouca oferta), denominamo-los bens econômicos (objeto exclusivo da Economia no

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21 sentido que acabamos de descrever), em contraposição àqueles outros bens para cuja aquisição as pessoas não precisam desenvolver a atividade econômica descrita, bens (não econômicos). (MENGER, 1983, p. 269).

Seria praticamente ingênuo concluir que essa abordagem de Menger sacudiria o estado da arte da Economia Política da época, uma vez que a sua visão apenas muda a perspectiva com que se observa o fluxo circular da renda: as pessoas têm necessidades e vão ao mercado consumir bens que foram anteriormente produzidos pelos fatores de produção capital e trabalho, cuja renda se destina aos trabalhadores e capitalistas que têm necessidades e comparecem ao mercado, num fluxo circular já apresentado por seus antecessores.

Ocorre que Menger de fato surpreende quando utiliza a perspectiva da demanda à base da necessidade humana para justificar o nascimento da propriedade privada num desdobramento de causa efeito quase que natural.

[…] a Economia humana e a propriedade têm origem econômica comum, pois ambas encontram seu fundamento último no fato de haver bens cuja oferta é menor do que a respectiva demanda; por conseguinte, a propriedade, da mesma forma que a Economia, não é invenção arbitrária, mas simplesmente a única solução prática possível que a própria natureza (isto é, a defasagem entre a demanda e a oferta de bens) nos impõe, no caso de todos os bens denominados econômicos. (MENGER, 1983, p. 271). Admitir em qualquer manifestação de estudo de Economia Política ao final do Século XIX que a propriedade privada não é uma invenção arbitrária, mas sim concomitante ao surgimento da própria economia de uma forma natural, é, sem dúvida, uma “chacoalhada” nos fundamentos teóricos da própria economia. E Menger não se furta em concluir: “eis porque a propriedade, neste sentido, é inseparável da economia humana em sua dimensão social; e qualquer plano de reforma social só poderá empenhar-se a uma adequada distribuição dos bens econômicos – mas não poderá abolir a instituição da propriedade como tal.” (MENGER, 1983, p. 271).

O sentido desta proposição de Menger coloca qualquer perspectiva de reforma social de coletivização dos meios de produção e da propriedade privada como a morte certa da economia tal qual foi concebida pela sociedade humana. E com ela a oportunidade de permitir que a divisão do trabalho continue atendendo da

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22 maneira mais eficiente possível, com os recursos naturais limitados, as necessidades individuais do homem.

A partir dessa perspectiva, desenvolve-se uma série de trabalhos em Economia Política que procura compreender qual é o papel dos fatores de produção na definição dos preços dos bens, de maneira que se tenta identificar qual é o valor agregado que os fatores capital e trabalho empregam nos produtos levados ao mercado.

Walras (1996), contemporâneo de Menger, utiliza o caminho inverso ao de Marx e Ricardo para chegar ao valor da remuneração dos fatores de produção. Enquanto Marx parte do pressuposto de que o capitalista é indutor determinante do preço do trabalho (aquele básico de sustentação primária do trabalhador), Walras procura entender a relação entre fatores de produção tal qual a lei de mercado, assemelhando-se a Menger no que concerne ao peso da demanda no mercado.

Para entendermos como Walras chega até as relações de remuneração entre os fatores de produção, é importante que seja compreendida a teoria central do seu trabalho: o equilíbrio geral do mercado. De acordo com Morishima (1996), Walras é o primeiro teórico que apresenta as relações entre oferta e procura, apesar de os termos serem cunhados apenas por Alfred Marshal posteriormente. Quando Walras descreve a regra de que os preços de cada mercadoria relativos ao numéraire aumentarão sempre que houver falta da mercadoria e diminuirão sempre que o total disponível for inferior à soma das quantidades desejadas pelos agentes, ele está postulando ao seu modo a “lei da oferta e da procura”.

Nas palavras de Walras:

Sendo dadas duas mercadorias no estado de equilíbrio de um mercado, se todas as coisas permanecerem iguais e a utilidade de uma dessas mercadorias aumentar ou diminuir para um ou para vários permutadores, o valor dessa mercadoria em relação ao valor da outra, ou seu preço, aumentará ou diminuirá. Se todas as coisas permanecerem iguais e a quantidade de uma das duas mercadorias aumentar ou diminuir em um ou em vários portadores, o preço dessa mercadoria diminuirá ou aumentará. (WALRAS, 1996, p. 112).

Quando chega a esta conclusão, Walras se propõe a aplicar o modelo de equilíbrio também ao mercado de trabalho e serviços, pois acredita ser um espaço legítimo de aplicação da fórmula dos preços. Nessa perspectiva, a relação entre os

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23 fatores de produção capital e trabalho não advém da indução do capitalista a priori, mas sim das relações entre oferta e procura dadas pelo próprio mercado. Da mesma maneira que uma mercadoria tem maior valor quanto mais ela é rara em função de grande procura, assim se comporta a remuneração do capital e do trabalho:

Um é o mercado de serviços. Nele encontram-se os proprietários fundiários, os trabalhadores e os capitalistas como vendedores, e os empresários como compradores de serviços produtivos, isto é, de renda da terra, de trabalho e de lucro. [...] Por ora, devemos estudar principalmente a compra dos serviços como serviços produtivos. Esses serviços produtivos são trocados segundo o mecanismo da livre-concorrência com intervenção de numerário. Anuncia-se, para cada um deles, um preço em numerário; se a esse preço assim anunciado a demanda efetiva é superior à oferta efetiva, os empresários começam a oferecer lances mais altos e há alta; se a oferta efetiva é superior à demanda efetiva, os proprietários fundiários, os trabalhadores e os capitalistas começam a liquidar e há baixa. O preço corrente de cada serviço é aquele para o qual a oferta e a demanda efetiva são iguais. O preço corrente convencionado, assim debatido, da renda da terra em numerário será chamado por nós de arrendamento. O preço corrente convencionado do trabalho em numerário será chamado de salário. O preço corrente convencionado do lucro em numerário será chamado de juro. (WALRAS, 1996, p. 170).

Walras faz uma leitura semelhante a Menger no pressuposto do atendimento à necessidade humana do consumo e conclui que o verdadeiro mandatário do preço é o mercado. Estando o comprador sempre às voltas para pagar o menor valor possível pela mercadoria, pressiona o preço para baixo. Estando o vendedor sempre à procura de auferir maior rendimento na venda da mercadoria, pressiona o preço para cima. Os fatores de produção que produzem esta mercadoria são remunerados no mesmo sistema, por qual a remuneração de cada fator é legítima por tratar-se de sua natureza:

Faz parte da essência dos capitais dar nascimento aos rendimentos; e faz parte da essência dos rendimentos nascer, direta ou indiretamente, dos capitais. Eis como: os capitais, por definição, sobrevivem à primeira utilização que se faz deles; fazem-se, pois, diversas utilizações sucessivas; a sucessão dessas utilizações é evidentemente uma sucessão de rendimentos. [...] Um operário trabalha todos os dias na oficina; um advogado e um médico dão consulta diariamente; esse trabalho e essas consultas são os rendimentos diários desses trabalhadores. A mesma coisa se passa com os rendimentos das máquinas, instrumentos, utensílios, móveis e roupas. Muitos escritores ficaram na obscuridade e na confusão porque não consideraram, assim separadamente, os capitais e seus rendimentos. (WALRAS, 1996, p. 159).

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24 Não surpreende, nesse sentido, que Walras submeta as pessoas detentoras de força de trabalho à condição de capital, pelo qual coloca todos os fatores de produção na mesma perspectiva. “As terras, as pessoas e os capitais propriamente ditos são capitais; o serviço das terras, ou a renda das terras, o serviço das pessoas, ou o trabalho, e o serviço dos capitais propriamente ditos, ou o lucro são rendimentos.” (WALRAS, 1996, p. 162).

Por entender tão bem a dinâmica do mercado, os pensadores marginalistas passam a observar a economia através do comportamento dos agentes econômicos em geral (consumidores e empresas), focando seus estudos na dimensão microeconômica. (PAULANI; BRAGA, 2013).

Do ponto de vista da formação de preços, ao qual a escola marginalista submete também as relações comerciais entre os fatores de produção capital e trabalho, Alfred Marshal (1890) consolida o que conhecemos hoje como lei da oferta e da procura. Para Marshal, a quantidade de um produto que certa empresa decide produzir é determinada pelo preço a que ela consegue vendê-lo. A teoria parte do pressuposto de que a empresa não tem influência sobre o preço de mercado e deve aceitar o que o mercado oferece. (O LIVRO DA ECONOMIA, 2013).

Marshal (1890) faz uma crítica aberta ao conceito do valor trabalho desenvolvido por Smith, deslocando o sentido do valor para os termos de troca, que estão sujeitos à lei da oferta e da procura no mercado.

O valor, isto é, o valor de troca de uma coisa em termos de outra num lugar e tempo qualquer, é a quantidade da segunda coisa que pode ser obtida ali e na ocasião dada, em troca da primeira. Assim, o termo valor é relativo e exprime a relação entre duas coisas num lugar e tempo determinados (MARSHAL, 1996, p. 125).

O autor conclui que “assim, o preço de qualquer coisa será tomado como representativo do seu valor de troca relativamente às coisas em geral ou, em outras palavras, como representativo do seu poder aquisitivo geral.” (MARSHAL, 1996, p. 127).

Marshal apresenta, assim, um continuum à escola marginalista, aplicando a lei da oferta e da procura ao mercado dos fatores de produção (bens, serviços e trabalho), demonstrando que a variação de renda entre a classe trabalhadora é

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25 regida pelo valor agregado. “Os salários serão gastos exatamente com a soma de sabedoria, previdência e desprendimento, que prevalece de fato na classe em exame.” (MARSHAL, 1996, p. 134). Ele acrescenta que o aumento no rendimento do trabalhador somente será auferido quando for percebido que um aumento real em seu salário elevará a eficiência produtiva mais que proporcional.

Assim entendendo, podemos dizer que a renda de alguma classe de operários está abaixo do seu nível necessário, quando um aumento na sua renda viria a produzir, no curso do tempo, um aumento mais que proporcional em sua eficiência. O consumo pode ser diminuído pela mudança de hábitos, mas qualquer privação dos objetos de necessidade é ruinosa (MARSHAL, 1996, p. 134).

É perceptível, na escola marginalista e no conjunto da obra dos autores neoclássicos, o apontamento do livre comércio como determinante nos preços de todas as relações de trocas advindas da divisão do trabalho apresentada por Smith, na alvorada do capitalismo. Não obstante, a remuneração dos fatores de produção, para os marginalistas, deve seguir esse princípio. Ou seja, aquela influência do capital sobre o trabalho em Marx (que para ele é determinante nas relações sociais) é relativizada. Trata-se agora da submissão dos fatores de produção aos preços estabelecidos pelo mercado, no qual pesam de um lado os desejos do consumidor e do outro lado a quantidade de bens disponíveis no mercado para atender à sua necessidade. Assim, os próprios fatores de produção capital e trabalho estão em pé de concorrência livre, pois as suas respectivas remunerações se darão de acordo com seu valor marginal. A remuneração dos fatores deverá se dar, então, de acordo com seu peso no processo produtivo, de maneira que garanta o atendimento à necessidade do consumidor a um preço estabelecido pelo mercado. Segundo Belluzzo (1973), os marginalistas entendem que os fatores de produção estão de um lado recebendo uma remuneração proporcional à sua contribuição para o processo produtivo. E “na outra extremidade da avenida estão os consumidores com suas escalas de preferência que, filtradas através do sistema de preços, vão determinar o que deve ser produzido.” (BELLUZZO, 1973, p. 20).

Uma expoente abordagem teórica neoclássica procurou explicar como é possível o alcance do bem-estar social através do princípio do livre mercado. Vildredo Pareto (1909), com metodologia de avaliação econômica não histórica,

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26 realizou seus estudos com base no princípio do comportamento por preferências e restrições dos agentes econômicos, acreditando que consumidores, produtores, Estado e sociedade eram entidades semelhantes em essência: todos buscavam satisfazer da melhor forma possível seus próprios interesses, dados os meios disponíveis. (GARCIA, 1996).

Na questão da distribuição de renda, a contribuição de Pareto foi sua percepção de que o bem-estar social pode ser concebido como uma fotografia do estado real da sociedade e, a partir dela, observar se houve um aumento de bem-estar de um indivíduo sem que piorasse o bem-bem-estar de outrem. Nessas condições, para Pareto, não havendo outro estado de bem-estar que possibilite a melhoria do bem-estar social de um indivíduo sem prejudicar os demais, este estado será considerado ótimo. (GARCIA, 1996).

Pareto (1996) acredita que o crescimento econômico em si promove o bem-estar social, uma vez que o aumento da renda per capita, distribuída ou não, é geradora de riqueza. Desde que a ascensão de renda de um indivíduo não signifique a piora para outro:

Esse fato é a proporção de riqueza, ou melhor, de capitais por habitante. A civilização é tanto mais desenvolvida quanto maior essa proporção. É preciso, portanto, que nos lembremos que somos obrigados a avaliar a riqueza em numerário e que a unidade de numerário nada tem de fixo, de onde resulta que a riqueza por habitante não nos é conhecida senão de maneira mais ou menos aproximada. Um grande número de pessoas acredita que as novas formas sociais são determinadas muito mais pelas variações na distribuição da riqueza do que pelas variações da quantia média de riqueza por habitante. Esta é uma opinião absolutamente inexata; observamos que as mudanças na repartição têm pouca importância, enquanto as variações na quantidade média podem ser muito importantes. (PARETO, 1996, p. 325).

Ainda de acordo com Pareto, ficam autorizadas as desigualdades sociais desde que aquele menos privilegiado na distribuição do produto social não seja expropriado de sua condição, no mínimo, atual. Isso demonstra que a geração de riqueza em um resultado único geral em determinado período de tempo não necessita, necessariamente, de uma distribuição social equânime.

De Marx para Pareto, em termos de condição da situação trabalhadora da Europa, vão-se pelo menos 100 anos de conflitos de classes, em que a classe trabalhadora ameaçou, por não poucas vezes, uma revolução proletariada de cunho

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27 socialista. Por isso não se surpreende que Pareto tenha observado uma condição social no início do século XX muito menos perversa e de miserabilidade que Marx presenciou no final do século XIX, resultado das conquistas sociais da classe trabalhadora no período. Mas isso não inviabiliza sua teoria conhecida como Ótimo de Pareto. De fato é possível (senão provável) que no capitalismo o bem-estar social ocorra em determinado período conforme as condições de ampliação da melhoria na qualidade de vida de uns, sem necessariamente haver o detrimento da qualidade de vida de outros.

O resultado da revolução marginalista abriu o caminho, no início do século XX, para a análise do capitalismo sob a perspectiva financeira, a partir da qual surgem os principais pensadores monetaristas: Irving Fischer, George Stigler e Milton Friedman. Não obstante a importância de suas obras sob a perspectiva monetarista para as Ciências Econômicas, seus conceitos não serão aprofundados neste trabalho, pois esses pensadores já partem do princípio da remuneração do capital como dada. Suas contribuições teóricas vão, portanto, para além da discussão da remuneração entre os fatores de produção, pois objetivam aprofundar os estudos sobre a maneira como os juros, a moeda e o papel dos agentes econômicos se comportam ceteris paribus.

O tema da distribuição de renda volta a ganhar força após a revolução marginalista, apenas a partir de Keynes sob a perspectiva da macroeconomia. Keynes foi um exímio analista das circunstâncias da depressão pós-guerra na Europa e, posteriormente, da depressão econômica provocada pelo crash da Bolsa de Valores de Nova Iorque, em 1929. Através de sua obra, conseguiu demonstrar que, quando a preferência dos capitalistas pelos investimentos de alta liquidez (títulos) aumenta, provocada pela baixa expectativa de retorno do investimento produtivo frente ao risco de retorno do mercado de bens e serviços, a economia passa a frear a demanda agregada por bens de produção. Isso gera uma queda na produção de bens de capital e, consequentemente, o desemprego nesta indústria. Tal desemprego faz cair a renda do trabalhador, o que diminui o consumo de bens finais. A queda nas vendas provoca nova onda de desemprego, criando, assim, um ciclo de depressão na economia. (SILVA, 1996).

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28 A grande contribuição de Keynes para a saída da depressão econômica que assolava o primeiro mundo foi a intervenção do Estado como investidor, através da captação de recursos privados poupados e investimentos diretos em infraestrutura, endividando o Estado para propiciar a retomada do emprego e da renda, voltado a fazer a engrenagem produtiva funcionar em uma espiral positiva. (SILVA, 1996).

Esse modelo só tomou força entre os economistas porque a teoria de Keynes criou uma fissão entre pensamento ortodoxo, notadamente a lei de Say, e as teorias marginalistas do equilíbrio geral. E, assim, estabeleceu o princípio de que o capitalismo só pode gerar pleno emprego se continuados os investimentos advindos da expectativa de lucros e acumulação do capitalista. (KEYNES, 1996). Apenas com uma expectativa de retorno marginal da atividade produtiva sendo muito mais atraente do que a preferência pela liquidez (poupança) é que o capitalista, nas palavras de Shcumpeter (1997), demonstra seu “espírito animal” e investe na atividade produtiva. Ou seja, para Keynes, o capitalismo só faz sentido enquanto fluxo de capital e renda, motivo pelo qual o excesso de poupança pode contrair a atividade produtiva que daria conta de acompanhar o crescimento demográfico em termos de vagas de trabalho.

Para colocar em prática a contribuição de Keynes para as Ciências Econômicas, seus sucessores passaram a trabalhar a teoria macroeconômica sob o aspecto da gestão das contas nacionais, uma metodologia que permitiu realizar o balanço geral da atividade produtiva de uma nação em determinado período. Essa percepção da realidade fez os economistas estabelecerem padrões para mensurar o andamento da economia em termos agregados, numa perspectiva macro, de maneira que os agentes econômicos pudessem tomar decisões em cima do balanço econômico nacional. “A partir da Teoria Geral de Keynes que ganham contornos definitivos os conceitos fundamentais de contabilidade social, bem como a existência de identidades no nível macro e a relação entre os diferentes agregados.” (BRAGA; PAULANI, 2013, p. 4).

Assim, a revolução keyneisiana, como costuma ser chamada a intervenção de Keynes no debate acadêmico, conferiu aos economistas a capacidade de verificar o comportamento e a evolução da economia de um país numa dimensão sistêmica. Ou seja, não só medindo a produção, renda e

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29 consumo, mas fazendo isso de modo a perceber exatamente a relação entre esses agregados e a lógica do sistema econômico como um todo. (BRAGA; PAULANI, 2013, p. 4).

Se até então o laissez-faire conduzia os princípios econômicos e, logo, governamentais, de agora em diante o Estado passa a ter a função de levantar os dados agregados da economia, separá-los em contas nacionais e comparar os seus resultados com períodos de tempo anteriores, em demonstrações anuais, por exemplo.

Com Keynes o foco dos estudos em economia deslocou-se da esfera microeconômica para a macroeconômica, ou seja, para a explicação do que determina o nível agregado de produto e de renda no curto prazo […] ou seja, o comportamento agregado da economia e seus desdobramentos. (LIMA, 2013, p. 5).

Para que os agentes econômicos possam decidir sobre como comportar-se em uma economia, os fluxos de produção, renda e despesa devem comportar-ser acompanhados a partir de um sistema de contabilidade que identifique e relacione transações econômicas relevantes de serem medidas ao longo do tempo. (LIMA, 2013).

Afora a importância da contabilidade social para as Ciências Econômicas, interessa-se aqui saber de que maneira seus princípios podem influenciar na questão da distribuição de renda entre os fatores de produção. Ocorre, então, que o princípio da contabilidade social apresenta, antes de tudo, o fluxo circular de renda da economia. O fluxo circular de renda demonstra, sob uma ótica monetária, como funciona o fluxo da economia real (trabalho, bens e serviços) em seu respectivo contrafluxo monetário (pagamentos em moeda).

De acordo com Lima (2013), em uma economia sem governo, o fluxo circular renda pode ser observado pelas seguintes etapas: a) o fluxo de produção gera renda na forma de remuneração dos fatores de produção – trabalho e capital; b) a renda dos fatores gera demanda por bens e serviços de consumo das famílias, assim como de bens e serviços de investimento pelo capital; c) a renda não consumida é disponibilizada no sistema financeiro, que disponibiliza este recurso para financiar as empresas. A renda não consumida corresponde à poupança que, ex post, é igual ao investimento.

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30 O principal pensador contemporâneo que formulou uma teoria de apresentação dos resultados agregados da economia foi Wassily Leontief (1928). De acordo com Guilhoto (2000), o que Leontief conseguiu realizar foi a construção de uma “fotografia econômica” da própria economia; nessa fotografia, ele mostrou como os setores estão relacionados entre si, ou seja, quais setores suprem os outros de serviços e produtos e quais setores compram de quem. O resultado foi uma visão única e compreensiva de como a economia funciona – como cada setor se torna mais ou menos dependente dos outros. (GUILHOTO, 2000).

Sobre o sistema de contabilidade criado a partir do Insumo-Produto de Leontief, cabe separar o que importa observar neste modelo, ou seja, que a “fotografia” possível do sistema de contas nacionais permite verificar o fluxo de renda e poupança. Havendo a possibilidade de se verificarem os dados agregados de renda e poupança, é possível, na visão keyneisiana, intervir na economia através de maior investimento produtivo.

Como os agregados macroeconômicos não permitem o detalhamento dos níveis de desigualdade de um país, a partir da contabilidade social foram se somando novos indicadores sociais para a distribuição de renda, índice de desenvolvimento humano (IDH) e suas respectivas diferenças entre países. (BRAGA; PAULANI, 2013).

O Índice de Desenvolvimento Humano (IDH) é um resumo do desempenho médio em dimensões-chave do desenvolvimento humano: uma vida longa e saudável, ser instruído e ter um padrão de vida decente. O HDI é a média geométrica dos índices normalizados para cada uma das três dimensões. (ONU, 2015, tradução nossa).

Esses indicadores procuram abarcar os estudos populacionais como um todo, abrangendo a questão da pobreza e do desenvolvimento humano muito além das questões de distribuição de renda entre os fatores de produção. Como tem abrangência mundial, o IDH parte das premissas estatísticas e de senso, não estando restrito às relações entre capital e trabalho dentro da perspectiva capitalista. No entanto, é consenso que os indicadores de saúde, educação e expectativa de vida apresentam melhor desempenho naqueles países cujo modo de produção capitalista está em estágio mais avançado.

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31 3 APRESENTAÇÃO E ANÁLISE DE DADOS

A desigualdade social brasileira é consenso no meio acadêmico e motivo de estudos há vários anos. A novidade deste trabalho é trazer o tema sob a perspectiva de números oficiais publicados pela Receita Federal do Brasil. Os dados levantados complementam as informações oficiais do IBGE, que dependem da resposta dos entrevistados sobre a renda familiar e não trazem informações sobre o patrimônio das famílias. Além disto, os dados do IBGE utilizam metodologia de amostragem e a divulgação dos dados possuem defasagem maior do que os dados da Receita Federal.

As informações coletadas no sítio da Receita Federal trazem os dados oficiais de renda e patrimônio da maneira agregada, com base nas Declarações de Imposto de Renda Pessoa Física (IRPF). Apresentam-se também subdivisões sobre a natureza da principal ocupação dos declarantes de renda, cujas informações serão utilizadas

A legislação brasileira exige declaração de IRPF para todos os brasileiros com renda superior a R$ 28.559,70 por ano1 e/ou quem tem bens ou direitos com valor superior a R$ 300 mil reais, considerando o valor do bem na data de sua aquisição.

Para alcançar o objetivo do trabalho foram levantados os dados de declarações de Imposto de Renda da Receita Federal, o que exclui do modelo brasileiros com renda inferior ao teto do imposto de renda e/ou patrimônio no período de 10 anos.

Neste sentido, há de se registrar que o estudo sobre a desigualdade de renda entre a classe trabalhadora (profissionais assalariados, servidores públicos e os profissionais liberais/autônomis) presente neste trabalho desconsidera brasileiros que não realizaram a declaração do Imposto de Renda. Isto compreende aproximadamente 75% da população economicamente ativa. O gráfico a seguir demonstra a evolução demográfica brasileira. A tabela demonstra os dados demográficos do IBGE em comparação à quantidade de declarantes da Receita Federal em 2007 e 2010.

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