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CULTURA MIDIÁTICA E ADOLESCÊNCIA: O CORPO NA REVISTA CAPRICHO

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Academic year: 2021

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CULTURA MIDIÁTICA E ADOLESCÊNCIA: O CORPO NA REVISTA CAPRICHO

Flávia Mantovani Orientadora: Profª. Drª. Márcia Elisa Teté Ramos

RESUMO

O presente trabalho tem por objetivo apresentar, em linhas gerais, a pesquisa que desenvolvemos no Programa de Pós-Graduação em História Social desta universidade, na linha de História e Ensino. Tal pesquisa busca investigar as representações sobre o corpo na Revista Capricho, bem como as apropriações que fazem as suas leitoras destas representações. Considerando que a Capricho, enquanto produto da cultura midiática, veicula modelos de consumo, visões de mundo e modelos de comportamento; que ela é uma revista de consumo voltada para o público adolescente de considerável circulação; que toda leitura é uma prática inventiva onde a leitora interpreta o texto midiático conforme seus próprios códigos culturais; e ainda, que podemos entender tal revista como instância pedagógica, ou seja, como espaço extraescolar capaz de “ensinar” valores e comportamentos pois busca interferir na cultura produzindo formas de ser, fazer e pensar; e que a adolescência é um fenômeno muito particular e não natural, portanto, histórico, de nossa cultura; entendemos portanto que a cultura midiática em articulação com a cultura juvenil/adolescente nos oferece um campo de possibilidades para pensarmos questões acerca de modos de subjetivação, produção de sentidos e de identidades – principalmente ligados ao corpo e ao consumo – presentes na contemporaneidade.

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Introdução

Muito se discute atualmente, na área das ciências humanas, a emergência de uma sociedade de consumo, na qual a espetacularização, a satisfação pessoal e o individualismo são características visíveis. Neste contexto, a mídia assume um importante papel de criar e, também, fazer circular valores e sentidos para a manutenção desta sociedade, além de ser, ela própria, expressão ou produto desta cultura. Assim, podemos afirmar que a mídia, de maneira geral em todos os seus veículos – rádio, TV, internet, revista, jornal – é responsável por grande circulação de modelos de comportamento e visões de mundo. A propósito, neste processo denominado “midiatização da cultura”, observamos que o corpo humano – e também os cuidados com ele – ganham certa relevância na vida das pessoas e, em vários segmentos, circulam e são produzidos discursos e saberes sobre ele, que passa a ser o lócus por excelência de exercício da identidade e subjetividade dos sujeitos. Podemos inserir a Revista Capricho neste contexto, e entende-la como um destes espaços onde se efetuam trocas simbólicas de sentidos, formação de identidades e saberes sobre o corpo.

Voltada ao público adolescente feminino, a revista traz assuntos considerados de interesse deste público como moda, beleza e comportamento, partilhando de uma cultura adolescente atribuída a este universo de consumidoras. Entendemos ainda que, enquanto revista, a Capricho se insere no gênero “revista de consumo” configurado por algumas características específicas: a revista é sustentada pela publicidade e, o leitor, visto como um consumidor em potencial; além disso, o mercado é segmentado e, assim, o editor passa a ser um especialista em grupos de consumos; ainda, por seu baixo custo, a grande questão para uma revista de consumo não é o seu lançamento, mas a sua manutenção no mercado, o que obriga a leva a estar sempre pesquisando e acompanhando as mudanças culturais de seu público leitor. (MIRA, 2003, p. 11). Portanto, podemos inferir que uma das razões de existência de uma revista como a Capricho é o sucesso de vendas, além de fomentar o consumo já que é mantida pela publicidade. Assim, encontramos em suas páginas modos de comportamento relacionados à cultura

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adolescente, uma vez que a revista se apropria de modos de ser e códigos culturais presentes neste grupo a fim de obter boas vendagens e, ainda, de não destoar do que a adolescente espera ler em suas páginas.

Tendo em vista estas considerações, Objetivamos nesta pesquisa analisar o corpo representado na Revista Capricho, e os modos pelos quais ela dialoga com a adolescência, bem como a apropriação que as adolescentes fazem da mesma. Neste sentido, buscamos investigar o processo de midiatização da cultura, ou seja, a mídia enquanto um espaço de circulação de “bens simbólicos”, bem como a apreensão da Revista Capricho enquanto um destes espaços; a compreensão do sujeito adolescente em sua historicidade, além de suas representações sociais; a relevância dos cuidados com o corpo frente a uma dita “sociedade de consumo” que privilegia uma “ética da estética”; e, principalmente, a compreensão do gênero “revista de consumo” em sua função pedagógica, na medida em que pretende “educar” sua leitora através de orientações específicas, sobretudo, voltadas ao corpo. Além do trabalho com a revista como texto/discurso, também há que perceber como as adolescentes interpretam a mesma, quais as assimilações, reelaborações ou mesmo transgressões.

Algumas considerações sobre a Revista Capricho.

A Revista Capricho é atualmente editada quinzenalmente pela Editora Abril, tem circulação nacional, tiragem aproximada de 300.000 mil exemplares1 e público leitor concentrado em meninas de entre 10 e 19 anos2.

O público alvo visado pelos editores da revista compõe-se, em sua maioria, de adolescentes3, o que faz da Capricho uma das mais influentes revistas teen4 do

mercado atual. Quanto ao recorte temporal, nossa pesquisa compreende aos exemplares entre o número 944 da revista, publicado em julho de 2004, e o

1 Ver http://www.publiabril.com.br/marcas/capricho/revista/informacoes-gerais 2 Idem.

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O adolescente é aqui definido, em termos de faixa etária, como o sujeito entre 12 e 20 anos. Não há,

contudo, uma idade determinante para adolescência, conforme veremos adiante neste trabalho.

4 Os termos “adolescência” e teen serão questionados no decorrer da pesquisa, na relação com o modo que a Revista Capricho interpela seus leitores.

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número 986, publicado em fevereiro de 2006. A escolha deste corpus documental sustenta-se a partir da necessidade de investigar a cultura circulante da geração de jovens recente, geralmente vista como uma “juventude global”, identificada com uma cultura virtual, ligada a internet. O ano de 2004 data o surgimento de duas redes sociais importantes na compreensão destes novos modos de ser adolescentes: o Orkut e o Facebook.

Lançada em 1952 pela Editora Abril, a Capricho era, inicialmente, uma publicação de fotonovelas. Durante trinta anos seguintes a Capricho foi a mais importante das publicações de fotonovela do país; a partir de meados de 1970, aproximadamente, esta fórmula entrou em declínio e a Capricho perdeu sua receita editorial. No ano de 1982, mudou radicalmente: passou a ser a “revista da gatinha”; a campanha publicitária criada por Washington Oliveto fez renascer o sucesso da revista. Sua fórmula editorial desde então assume os aspectos básicos que a caracterizam até hoje – moda, beleza e comportamento. Esta fórmula marcou a descoberta do mercado adolescente, trazendo assuntos relacionados a este universo, como, sexo, camisinha, homossexualidade, pessoas famosas, etc. (BUITONI, 2009; MIRA, 2003).

As revistas abarcadas pela nossa pesquisa mantêm este padrão editorial, embora com outra roupagem. A edição da primeira quinzena de abril/2005 traz, pela primeira vez, o slogan “seja diferente, seja você”. Segundo a própria revista, é a primeira vez que a Capricho volta a ter um slogan desde o famoso “a revista da gatinha”. Observamos que este projeto editorial atual veicula a imagem de uma menina “descolada”, “autêntica”, “moderna”, em consonância com a questão de identidade pessoal pela qual passa, supostamente, o adolescente no mundo contemporâneo.

O corpo na Revista Capricho.

Ao longo das páginas da Revista Capricho fica de certo modo evidente a centralidade assumida pelo corpo: tanto nas matérias, que abordam cuidados com ele, quanto nas imagens, enfim, a totalidade discursiva da revista

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parece evidenciar, constantemente, o corpo enquanto um lugar privilegiado de identidade, um projeto a ser sempre cuidado. Diante disso, para esta pesquisa, buscamos observar o a representação do corpo em relação à cultura de consumo.

Uma revista é caracterizada, entre outras coisas, por sua função pedagógica: pretende orientar modos de ser e de pensar aos seus leitores. Na Capricho, podemos observar esta intenção “educativa” pois, quase como um manual, a revista vai ensinando normas, condutas, regras de cuidados com o corpo. Deste modo, a Capricho se configura como um espaço informal de aprendizagem, que participa na busca da adolescente pelo aperfeiçoamento de “si mesma” através de cuidados voltados ao seu corpo.

Algumas características que pontuam o gênero revista são: “a constituição de textos que viabilizem uma leitura leve e ligeira; conteúdo para entretenimento, informação e ensino; e, sob propósito político e/ou pedagógico, orientação para se formar o indivíduo moderno, em condições de modernizar a sociedade.” (RAMOS, 2009, p. 44) Dentre elas, destacamos o aspecto da “informação e ensino” – constantemente a leitura de revistas de consumo é justificada pela facilidade e fluidez de seu texto, que pode ser “consumido” rapidamente, dando ao indivíduo uma condição de mobilidade no momento de obter a informação.

Um outro aspecto a ser abordado em relação à representação do corpo na Revista Capricho é a questão da personalização através do estilo. Na revista a ideia de personalização aparece, ou seja, existe um discurso que chama a leitora para ser “ela mesma”, autêntica, espontânea, enfim, exercer a sua individualidade, mas a totalidade discursiva da revista, isto é, fotos, imagens, texto, legendas, títulos, subtítulos, box, etc., demonstra que ela tem liberdade de ser desde que obedeça aos parâmetros estipulados pela revista. Em outras palavras, podemos dizer que a revista encoraja um estilo único e autêntico da leitora, mas se contradiz, pois busca, através do seu discurso, disciplinar e padronizar esteticamente a garota. Portanto, ainda que sutil, podemos perceber uma forma de disciplinarização já que para construir a

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“identidade” nestes moldes, nos moldes da sedução, importa muito a estética, e, em consequencia, o consumo daquilo que supostamente agrega ao sujeito a diferença, a autenticidade, o modo de ser fiel a si mesmo.

A imagem abaixo, capa da edição da primeira quinzena de abril de 2005 inaugura o slogan “seja diferente, seja você”, que traduz o que dissemos anteriormente. Fica clara já na capa a ideia de autenticidade. Usa-se o recurso de uma celebridade para legitimar o discurso que a revista quer transmitir. Para tanto, o uso de imperativos é uma constante em sua linguagem: “Seja autêntica!” é a frase que precede as orientações para a garota “encontrar-se”. Nota-se que, apesar da autenticidade colocada pela chamada na capa, a atriz que a estampa usa maquiagem. Pretendemos, em nosso projeto de pesquisa, aprofundar estes aspectos, fazendo uma análise desta problemática em todas as edições de que dispomos da Revista Capricho.

Capa da Capricho em abril/2005, n. 963.

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Algumas considerações teóricas e metodológicas.

A Revista Capricho, enquanto fonte histórica se mostra também convidativa, ao passo que apresenta uma cultura onde roupas, marcas, cosméticos, moda e beleza, enfim, o culto ao corpo, ocupa uma intrigante centralidade. Neste sentido, a consideramos aqui enquanto um produto da cultura midiática. Tal consideração tem algumas implicações teóricas a respeito do olhar que lançamos sobre a fonte, que modifica sua interpretação.

Enquanto produto da cultura midiática veicula significados e é responsável por um grande volume de trocas simbólicas e significados. A Capricho seria uma dessas instâncias produtoras de identidades, neste caso, da adolescente. Segundo Fischer:

Ora, esse processo de criação de tipos de homens e mulheres, de jovens e crianças, imaginados e vendidos na publicidade e na mídia de um modo geral, quando submetido a uma análise mais rigorosa, acaba expondo não exatamente um mundo apaziguado, mas a manifestação de uma verdadeira batalha pela imposição de determinados sentidos [...] (FISCHER, 1999, p. 25)

Neste sentido, a questão da “cultura de consumo” assume grande importância. Questões sobre o consumo, nas ciências humanas, foram primeiramente problematizadas pelos autores ligados à “Teoria Crítica”, cunhando o conceito de “indústria cultural”. Tal conceito aparece nos estudos de Adorno e Horkheimer, autores da escola de Frankfurt; segundo esta idéia, “a mesma lógica da mercadoria e racionalidade instrumental que se manifestam na esfera da produção pode ser percebida na esfera do consumo”, ou seja, “as atividades de lazer, a arte e a cultura de modo geral são filtradas pela indústria cultural”. Por esta perspectiva, uma revista, por exemplo, seria um produto desta indústria, o que implica em dizer que, por ser ela uma mercadoria produzida, impressa e distribuída em processo fabril, a ela estaria agregado o caráter de massificação, isto é, seria então, um artefato da cultura de massa.

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Diante do processo de massificação da cultura, o papel da mídia então é o de reproduzir uma cultura massificada e “sem profundidade”. Concomitantemente, estas noções nos levariam a concluir que há então uma distinção entre uma cultura de massa, e outra, de “alto-valor”. (FEATHERSTONE, 1995, p. 32)

Ainda que a indústria cultural siga a lógica da expansão da mercadoria através da “sedução”, esta reflexão não nos dá a uma noção satisfatória sobre as experiências de consumo. Mesmo a Capricho uma revista produzida nestes moldes, não temo poder de impor determinar ou infundir suas visões de mundo às leitoras.

Em síntese, o individuo é compreendido, neste contexto, como sujeito ativo na produção de sentidos quando da prática da leitura. Toda leitura é uma prática inventiva, onde o receptor, aliás, o leitor, recebe os conteúdos e texto e os “interpreta” de acordo com sua cultura, num processo complexo de ressignificação e reconstrução de sentidos, e não um ato passivo do leitor. Esta interpretação tem ganhado força pelos chamados Estudos Culturais: “[...] o sujeito passa a ser visto como produtor ativo de sentido, interpretando os materiais midiáticos conforme seus próprios códigos culturais criados em uma formação social determinada, em que também pesam sua classe, gênero, idade, religião, profissão e etnia [...]” (RAMOS, 2009, p. 25)

Portanto, não entendemos a Capricho como um texto com um sentido único e absoluto; desta forma, várias apropriações podem ser feitas em relação a ela: a própria leitura aqui explicitada é apenas uma dentre as infinitas possíveis. Deste modo, seria impossível mapear com precisão os modos específicos de cada apropriação da revista; porém, traçaremos o que se entende o contexto em que vivem cotidianamente as adolescentes que, em mais número, são quem a lêem. Parte-se do pressuposto que a vida cotidiana, atualmente, é dinamizada pela educação dos sujeitos para uma cultura do consumo.

Deste modo, apreendemos a Revista Capricho segundo uma relação entrecruzável – de um lado a revista procurando estabelecer

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determinados valores e comportamentos, de outro, valores e comportamentos existentes na cultura que são cooptados pela revista –, portanto, nossa pesquisa estende-se à forma como “adolescentes” se apropriam deste material midiático. Através de uma amostragem de aproximadamente 80-100 alunas do Ensino Médio de duas escolas públicas de Londrina (Paraná), buscaremos saber como esta revista é lida, destacando a questão do corpo e do consumo, por intermédio de questionário semi-estruturado. As respostas serão tabuladas, categorizadas e analisadas.

Neste questionário, algumas indagações serão direcionadas no sentido de que a adolescente responda se o modo como vemos o corpo hoje, ou o modo como a revista o expõe, seria diferente do modo como o corpo foi entendido, cuidado, visto em tempos passados. A intenção é compreender se estes sujeitos contextualizam e/ou comparam, de forma histórica ou anacrônica, as racionalidades, as sensibilidades e experiências, do passado e do presente. Este procedimento implica na ideia de que a forma de “ler” o mundo através de um “raciocínio” histórico, no caso, sobre os usos/costumes referentes ao corpo, pode interferir na maneira em que se interpretam os enunciados discursivos da revista.

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REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

BUITONI, Dulcília Schroeder. Mulher de papel: a representação da mulher na imprensa feminina. São Paulo: Summus Editorial, 2009.

FEATHERSTONE, Mike. Teorias da cultura de consumo. In Cultura de

Consumo e Pós-Modernismo. Trad. Julio Assis Simões. São Paulo, Studio

Nobel, 1995.

FISCHER, R. M. B. Identidade, cultura e mídia: a complexidade de novas questões educacionais na contemporaneidade. In SILVA, Luiz Heron da.

Século XXI: Qual Conhecimento? Qual currículo? Petrópolis: Editora Vozes,

1999.

MIRA, Maria Celeste. O leitor e a banca de revistas. A segmentação da cultura no século XX. São Paulo, Olho D’Água/Fapesp. 2003.

RAMOS, Márcia Elisa Teté. O ensino de história na revista Nova Escola (1986-2002): cultura midiática, currículo e ação docente / Márcia Elisa Teté Ramos. – Tese (Doutorado em Educação) Universidade Federal do Paraná, Programa de Pós-Graduação em Educação, Curitiba, 2009.

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