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A LITERATURA CHICANA NO ENSINO DE INGLÊS E DE ESPANHOL COMO LÍNGUA ESTRANGEIRA: NOVAS PERSPECTIVAS PARA UMA ABORDAGEM SOCIOCULTURAL Patrícia Alves de Carvalho Lobo Resumo

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Academic year: 2019

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1 Relatório de Estágio apresentado para cumprimento dos requisitos necessários à obtenção do grau de Mestre em Ensino de Inglês e de Língua Estrangeira no 3º Ciclo do Ensino Básico e no Ensino Secundário realizado sob a orientação

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2 Com um agradecimento especial:

- ao Prof. Doutor Alberto Madrona e à Prof. Doutora Ana Matos, que aceitaram orientar este trabalho

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3 A LITERATURA CHICANA NO ENSINO DE INGLÊS E DE ESPANHOL COMO LÍNGUA ESTRANGEIRA: NOVAS PERSPECTIVAS PARA UMA

ABORDAGEM SOCIOCULTURAL

Patrícia Alves de Carvalho Lobo

Resumo

O presente trabalho tem como objectivo propor a utilização de literatura nas aulas de línguas estrangeira, de modo a explorar conteúdos socioculturais e sociolinguísticos emergentes na sociedade do século XXI, como o multiculturalismo, o multilinguismo e a interacção com alteridade. Para concretizar esta abordagem optou-se pela literatura chicana, uma vez que se considera que a conjuntura socio-histórica que está na sua origem, o objectivo de activismo social que a caracteriza, bem como a sua especificidade linguística, podem fornecer o enquadramento didático a partir de novas perspectivas para uma abordagem sociocultural do ensino de inglês e de espanhol. Duas unidades didáticas, aplicadas no Instituto Español Giner de los Ríos de Lisboa, exemplificam como se podem planificar as aulas de língua estrangeira, aliando o objectivo de aprendizagem linguística às competências interculturais que importa reforçar na conjuntura actual.

Palavras-chave: literatura chicana, sociocultural, línguas estrangeiras, ensino

Abstract

This work aims to propose the use of literature in foreign language classes in order to convey sociocultural and sociolinguistic contents of the XXI century, such as multiculturalism, multilingualism and tolerance for alterity. To validate this approach Chicano literature was chosen, since it is believed that its social activism, the socio-historical context from which it emerges, and its linguistic features, can provide the educational framework for a sociocultural approach in foreign language classes. Two unit plans, taught at the Instituto Español Giner de los Ríos in Lisbon, exemplify how foreign language classes can be planned, in order to combine the linguistic aim to the intercultural skills that should be reinforced in the current century.

Key words: Chicano literature, sociocultural, foreign languages, teaching

Resumen

Este trabajo tiene como objetivo proponer el uso de la literatura en las clases de lengua extranjera para transmitir contenidos socioculturales y sociolingüísticos del siglo XXI, como el multiculturalismo, el multilingüismo y la tolerancia de la alteridad. Para validar este enfoque fue elegida la literatura chicana, ya que se considera que su contexto socio-histórico, su objetivo de activismo social, así como su especificidad lingüística, pueden proporcionar el marco educativo para un enfoque social y cultural en la enseñanza de inglés y español. Dos unidades didácticas, impartidas en el Instituto Español Giner de los Ríos de Lisboa, ejemplifican cómo se pueden planificar clases de lengua extranjera, a fin de combinar el objetivo lingüístico con las destrezas interculturales que se deberían reforzar en el entorno actual.

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4 Índice

Introdução ……….…….…6

Parte I………..…….…..10

1. Ensinar LE no século XXI: uma abordagem sociocultural com literatura chicana……….….10

1.1. Novas perspectivas para as aulas de LE: o fim das línguas ou culturas puras..10

1.1.1. Reconhecer o contexto escolar actual ………...10 1.1.2. Novas abordagens nas aulas de LE………..………..14

1.2. Fronteiras e intersecções entre língua e literatura nas aulas de LE…………....20

1.2.1. O espaço da literatura nas aulas de LE em Portugal………..………21

1.2.2. Uma proposta literária para a aulas de LE……….……23

1.3. A literatura chicana: uma chave de interpretação do novo século……….29

1.3.1. Aceitar a alteridade: ensinar valores………....29

1.3.2. Educar para o multiculturalismo e para o multilinguismo……….….32

Parte II………..……….35

2. A literatura chicana no ensino da LE- aplicações metodológicas na PES……...35

2.1. Instituto Espanhol Giner de los Ríos - características e projectos……….35

2.1.1. Caracterização do Instituto Espanhol ………...35

2.1.2. Projecto linguístico e o Projecto “Tagus”……….….37

2.2. A literatura chicana na aula de ELE - propostas e práticas da PES………….40

2.2.1 Literatura chicana para a inclusão e o multiculturalismo………..42

2.2.2 Compreender o multilinguismo com literatura chicana ………...49

2.3. Considerações finais: a literatura chicana na aula de EFL………56

Conclusão ………...…………..….58

Bibliografia……….……....61

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5

Anexo 1 ………67

Anexo 2 ………69

Anexo 3 ………71

Anexo 4 ………73

Anexo 5 ………78

Anexo 6 ………83

Anexo 7 ………85

Anexo 8 ………88

Anexo 9 ………90

Anexo 10 ………..92

Anexo 11 ………..………94

Anexo 12 ………..98

Anexo 13 ………102

Anexo 14 ………104

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6 Introdução

O presente trabalho, desenvolvido no âmbito do Mestrado em Ensino de Inglês e de Línguas Estrangeiras no 3º Ciclo do Ensino Básico e no Ensino Secundário, defende a utilização da literatura nos programas curriculares de língua estrangeira, de modo a explorar valores socioculturais e sociolinguísticos próprios da sociedade do século XXI. Crê-se que as aulas de LE estão em posição privilegiada numa nova abordagem educacional, uma vez que, o facto de se posicionarem entre línguas e culturas, facilita a apresentação da diversidade e de novas formas de interagir que importa reforçar na conjuntura actual. Aprender uma LE não implica apenas aprender uma nova língua, mas também outras culturas e formas de estar em sociedade, o que molda a própria identidade do aluno. Por isso mesmo, propõe-se uma reformulação dos programas e materiais tradicionais, que ora apresentam um pendor unicamente linguístico ora reforçam estereótipos pré-existentes e ultrapassados.

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7 negociação de dicotomias e de tradução de múltiplas culturas, resultantes do contacto com vivências linguísticas, culturais e históricas distintas.

Este trabalho pretende, pois, romper com crenças ainda generalizadas no ensino das LE em Portugal, indo ao encontro dos seguintes objectivos:

1. Questionar a noção de pertença de uma língua a determinado país, que ainda vigora nas escolas portuguesas, ignorando a forte movimentação de pessoas que caracteriza o século XXI.

2. Questionar a existência de línguas “puras” através de uma literatura na qual o espanhol e o inglês se intersectam, ora através de padrões de code-switching, ora através de empréstimos linguísticos.

3. Desconstruir a ideia de que a variedade linguística padrão é a mais correcta, o que apenas mantém a supremacia de um grupo, ao perpassar a cultura, o conhecimento, a estrutura social, a educação e os valores a que se referem essa variedade, universalizando-os.

4. Desconstruir a crença da existência de culturas “puras” ou principais, fomentando os valores do multiculturalismo, da tolerância pela alteridade, da sociedade inclusiva e da união de diferentes povos.

5. Promover a aceitação da existência de culturas híbridas ou mestiças, com origem na intersecção de diferentes realidades e experiências.

6. Propor uma alternativa aos conceitos socioculturais enraizados nos programas portugueses, que continuam a veicular noções superficiais e desfasadas da realidade, perpassando estereótipos ou evidenciando diferenças entre culturas e povos, criando uma barreira entre o “eu” e o “outro”.

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8 inglesa, apresentando-lhes realidades mais complexas, conduzindo-os a uma visão mais abrangente e a uma problematização da realidade sociolinguística e sociocultural.

Na prossecução dos objectivos acima referidos, optou-se por dividir este trabalho em duas partes. Na primeira parte, evidencia-se o papel do ensino das línguas estrangeiras na ruptura de padrões de superioridade, assentes em noções infundadas de pureza cultural e linguística, que cada vez mais se invalidam pela multiplicidade e intersecção de experiências que caracteriza o século XXI. Neste âmbito, demonstra-se o modo como os textos literários podem funcionar como ferramenta didático-pedagógica nas aulas de LE, constatando-se que a literatura chicana encontra aplicabilidade na abordagem que se propõe, pelos temas que aborda, pelo seu propósito cultural e pela sua natureza bilingue e de intersecção a vários níveis entre o inglês e o espanhol.

Na segunda parte deste trabalho, o enquadramento teórico anterior irá ser validado com propostas metodológicas e actividades práticas, que exemplificam como este tipo de literatura pode ser utilizado nas aulas de língua inglesa e espanhola no 3º ciclo do ensino básico e no ensino secundário. São propostas e actividades que foram aplicadas a duas turmas no Instituto Espanhol Giner de los Ríos de Lisboa (IE) no ano lectivo 2014/2015, no âmbito da Prática de Ensino Supervisionada (PES), do Mestrado em Ensino de Inglês e de Línguas Estrangeiras no 3º Ciclo do Ensino Básico e no Ensino Secundário. Neste sentido, depois de caraterizado o IE, analisam-se as unidades didáticas que exemplificam esta nova abordagem nas aulas de LE, que se pretende mais condizente com o paradigma do século XXI.

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9 integra as escolas públicas portuguesas. Este contexto escolar apresentou a grande condicionante de não se conseguir medir, de modo imediato, a eficácia das unidades em termos linguísticos, o que seria possível com alunos de uma escola portuguesa. No entanto, ressalva-se que, dentro dos objectivos estabelecidos para estas unidades didáticas, e de acordo com o propósito deste trabalho, a aprendizagem de conhecimentos meramente linguísticos assume um papel secundário. Apesar desta limitação, o perfil multicultural e multilingue do IE permitiu trazer a própria experiência dos alunos aos temas a tratar, através de diversas actividades e tipos de interacção. Além da utilização de textos literários, integraram-se ainda outros materiais complementares de apoio, como documentários, entrevistas, música e arte chicana.

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10 Parte I

1. Ensinar LE no século XXI: uma abordagem sociocultural com literatura chicana

A primeira parte deste trabalho começa por evidenciar o papel do ensino das línguas estrangeiras na desconstrução de modelos de superioridade e estruturas opressoras dentro e fora do espaço escolar, modelos ainda veiculados por noções desfasadas de pureza cultural e linguística, comprovadamente invalidadas pela multiplicidade e intersecção de experiências que caracteriza o século XXI. Seguidamente, demonstra-se o modo como esse objectivo pode ser logrado através da interligação entre a literatura e o ensino das línguas, nomeadamente com a utilização de textos literários que representem as diferentes realidades, vivências e problemáticas da sociedade multicultural e multilingue actual. Por último, verifica-se que a literatura chicana encontra aplicabilidade neste contexto pelos temas que aborda, pelo seu propósito cultural e pela sua natureza linguística.

1.1.Novas perspectivas para as aulas de LE: o fim das línguas ou culturas puras

Student´s travel toward conocimiento is facilitated when teachers choose to be a bridge rather than a wall and provide an invitation to travel on a biliteracy highway rather than demand travel on a parallel English-only thoroughfare. (María Fránquiz, 2010)

1.1.1. Reconhecer o contexto escolar actual

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11 atribuídos a cada um dos intervenientes encontram-se agora desfasados das exigências da sociedade do novo século; por outro lado, a própria realidade escolar assenta numa lógica que difere da do século anterior, já que o acesso à educação não é suficiente para garantir um lugar num mercado de trabalho saturado e competitivo, levando a sentimentos de frustração na escola e nas famílias. Os currículos das várias disciplinas adaptam-se à globalização, esbatendo-se particularidades locais com os claros paralelismos que existem entre os programas de vários países, no entanto, em Portugal, continuam a secundarizar a diversidade étnica, linguística e cultural que emerge dentro e fora do espaço escolar, como se pode verificar pela selecção de textos e temas que integram os manuais escolares de LE.

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12 No espaço escolar português, uma das principais alterações deste século decorre da intensificação dos fluxos migratórios. Nas salas de aula, tanto o professor como os alunos enfrentam novos desafios nas relações com os vários intervenientes de um sistema que faz coexistir várias etnias, línguas e culturas. Uma experiência directa em escolas portuguesas constata que, muitas vezes, é o próprio professor a insistir na homogeneização ao confrontar-se com um contexto multicultural e multilingue, utilizando uma mesma fórmula aprendida no início da sua prática pedagógica, sem estar consciente das implicações que decorrem da sua acção: ignorar a diversidade de experiências que coexistem na sua aula, não só reprime os traços identitários dos alunos que não pertencem ao modelo maioritário e que ficam impedidos de manifestar a própria língua e cultura, como pode mesmo incentivar os restantes alunos à intolerância pela alteridade, devido à pressão para que se apaguem as diferenças. Kubota denuncia esta realidade no caso de alunos afro-descendentes:

Educators often claim that in order to provide students and parents with equal access to services, it is best to avoid differential treatment of various groups and to remain neutral in terms of policies and practices. (…) A difference blind vision fails to recognize the social and economic inequalities and institutional racism that actually exists in schools and society. Color blindness conveniently eliminates the possibility that racism affects the experiences of people of color. (2004, p. 32-33)

Apesar de a denúncia de Kubota encontrar eco no exemplo português, que integra muitos alunos das antigas colónias africanas, não se pode esquecer que a discriminação opera para além da cor da pele. Na verdade, não ter em conta a cultura, a etnia ou a língua de cada aluno, conduz a que não se adequem procedimentos às necessidades especiais dos estudantes, que são coagidos a uma rápida assimilação.

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13 a “desaprender” comportamentos de objectificação do outro e de aversão pela alteridade, de modo a que se evitem as situações de confronto e discriminação frequentes nas escolas portuguesas.1 A crença de que as diferenças étnicas põem em causa a cultura e a tradição do país de acolhimento deve ser desconstruída, uma vez que só serve para reforçar preconceitos e legitimar comportamentos discriminatórios. Como referem Byram, Gribkova e Starkey:

The 'best' teacher is neither the native nor the non-native speaker, but the person who can help learners see relationships between their own and other cultures, can help them acquire interest in and curiosity about 'otherness', and an awareness of themselves and their own cultures seen from other people's perspectives. (2002, p. 11)

É de realçar que, na escola do século XXI, a demarcação das diversas realidades continua a ser imposta pelo grupo maioritário, que esquece que a própria cultura oferece limites e condicionalismos, questão que deve ser alvo de uma discussão urgente. Ensinar para a globalização pressupõe então oferecer a todos os alunos uma educação multicultural e multilingue aos diversos níveis, não só programáticos mas também sociais e morais. Como aliás defende Kubota (2004, p. 37), uma educação multicultural crítica deve ser implementada em todo o contexto escolar, o que pressupõe que quer os professores quer os alunos possam examinar criticamente o modo como os programas, os materiais e as interacções sociais são construídos e legitimados de acordo com relações desiguais de poder. Tendo em conta a nova realidade, defende-se que o professor deve orientar os seus alunos no contexto dos direitos morais e civis, por exemplo, ensinando-os a defender os seus interesses e convicções com base em argumentos responsáveis e não em respostas violentas, irreflectidas ou demonstrações

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14 de poder, atitudes comuns nas escolas portuguesas.2 Crê-se que esta nova abordagem deve ser transversal a todas as áreas disciplinares e interligada com os conteúdos programáticos de cada uma delas, com as disciplinas de língua estrangeira a assumirem especial relevo na transmissão de novos valores condizentes com o contexto socialcultural actual.

1.1.2. Novas abordagens nas aulas de LE

Crê-se que, as aulas de LE estão, na verdade, em posição privilegiada numa nova abordagem educacional, uma vez que a sua especificidade facilita a apresentação da diversidade e o ensino de valores e formas de interagir compatíveis com a realidade deste século. Aprender uma LE não implica apenas aprender uma nova língua, mas também uma nova cultura e forma de estar em sociedade, o que molda a própria identidade do aluno. Assim, a reformulação dos programas e materiais tradicionais, que ora apresentam um pendor unicamente linguístico ora reforçam estereótipos, deve ser empreendida, tal como se exemplificará nas unidades curriculares apresentadas na segunda parte deste trabalho. Para tal, os conteúdos programáticos não devem veicular que uma cultura ou língua pertencem a um país em particular, perpetuando a crença de que os indivíduos com determinada língua materna estão (ou devem estar) circunscritos ao contexto do país onde nasceram; não devem igualmente associar uma cultura a determinados estereótipos ou características fixas e delimitadas, já que, indo ao

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15 encontro do que defende Kubota (2004, p. 35), celebram a diferença cultural como um fim em si mesma, criando barreiras entre os vários grupos. São visões que obliteram que a cultura é uma construção assente na intersecção de vários elementos, que não são fixos nem tampouco delimitados.

Se é evidente que o contexto multicultural, na escola e na sociedade, implica a coexistência de várias culturas e línguas, pressupõe ainda uma realidade que gera desconfiança na maioria dos professores, incluindo os de LE - a existência de múltiplas variedades da mesma língua, algumas distanciadas da considerada padrão. Uma experiência directa com vários departamentos de LE permite verificar que, no caso do sistema educativo português, os alunos são normalmente encorajados a utilizar o português de Portugal, o inglês do Reino Unido e o espanhol de Espanha. Não raras vezes são corrigidos quando utilizam outras variedades, como o português do Brasil ou o espanhol da América Latina, o que leva a que eles mesmos interiorizem que uma certa variedade é superior e mais correcta em relação às outras. Deste modo, os próprios professores de LE parecem não estar conscientes de que a inclusão das diversas variedades linguísticas conduz a um alargamento da compreensão do aluno em relação à alteridade e, consequentemente à desconstrução de noções de supremacia de culturas e línguas. Também a crença de que o aluno deve ser inibido de se expressar na sua própria variedade, para que consiga aprender “correctamente” a variedade padrão deve ser questionada, tal como já se defendia há 40 anos nos EUA:

If speakers remain in contact with their native culture, their native language proficiency, expands to include expression of the new concepts they develop, the new domains in which they function, and the new role-relationships in which they participate. (Saville-Troike, 1978, p. 7)

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16 por explicar a existência de falantes de várias línguas. Sabe-se inclusive que ser bilingue ou multilingue é aceder a outras culturas e realidades, sem recusar ou esquecer qualquer uma delas, expandindo a sua zona de conforto e o conhecimento que o indivíduo tem de si mesmo e do mundo que o rodeia.

Crê-se, portanto, que língua alvo deve ser ensinada de uma forma pluralista, já que o uso exclusivo de modelos considerados “superiores” limita a compreensão da experiência de grupos minoritários e a da sociedade pluralista actual, perpetuando preconceitos e estereótipos e limitando as competências sociocultural e sociolinguística dos alunos previstas no Marco Común Europeo de Referencia de las Lenguas (MCERL).3 Além disso, tendo em conta que a língua é parte da cultura e traduz determinada identidade, os alunos com uma língua ou variedade linguística diferente devem poder transmitir a sua própria vivência no contexto escolar, sem serem rotulados de se expressarem incorrectamente ou de serem intelectualmente inferiores. De facto, já em 1978, se afirmava em relação ao sistema americano:

Formal education (including the American educational system) is itself a cultural invention. In the United States, it is a system which serves primarily to prepare middle-class children to participate in their own culture. Students who come into the system from other cultures, including the lower social classes, have generally been considered 'disadvantaged' or 'deficient' to the degree that their own cultural experiences differ from the mainstream, middle class 'norms'. (Saville-Troike, 1978, p. 5)

Se tal desconsideração linguística não é uma realidade exclusiva da nação americana, é curioso como a observação de Saville-Troike encontra paralelismo com o que acontece nas salas de aula em Portugal nos dias de hoje, onde as experiências dos grupos

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17 minoritários continuam desvalorizadas. Como aliás defende Pennycook (1994, p. 34-36), deve oferecer-se ao aluno uma abordagem crítica do padrão linguístico, de modo a expor modelos de dominação e subordinação, uma vez que não existe uma única forma correcta e universal de uma determinada língua.

No contexto acima descrito, o fenómeno de code-switching, uma estratégia discursiva de falantes bilingues e multilingues, está hoje no centro de um intenso debate.4 No meio académico, a mistura de códigos linguísticos no mesmo discurso é seriamente desencorajada, uma vez que permanece o preconceito de que os falantes que usam esta estratégia não são proficientes em nenhuma das línguas e, portanto, reproduzem versões incorrectas de cada uma delas.Tal preconceito assenta na crença de que o code-switching deturpa as regras fonéticas e morfossintáticas das línguas, dificulta a assimilação de grupos minoritários e confunde os alunos na fase de aquisição de uma nova língua. No entanto, alguns sociolinguistas, como Holmes (2002) ou Stavans (2008), consideram que é necessário certo grau de proficiência e controlo de ambos os códigos linguísticos para que possa haver code-switching, o que anula as ideias pre-concebidas já enumeradas e apresenta uma lógica coerente com a experiência dos alunos bilingues ou multilingues das salas de aula portuguesas.

Se no século passado, fenómenos de code-switching surgiam limitados a contextos familiares ou comunitários, com a intensificação dos fluxos migratórios e da globalização, cada vez mais esta realidade se impõe no espaço escolar e na sociedade em geral. Como esclarece Hualde, esta estratégia discursiva está ligada às redes sociais que o individuo apresenta, redes cada vez mais pluralizadas e menos delimitadas: “Estas

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18 redes sociales se refieren a los entornos sociales dentro de la familia, dentro de su comunidad e incluso fuera de su comunidad. Igualmente hacen referencia al contacto que tiene el individuo con las lenguas y sus variedades en la sociedad mayor” (2010, p. 483). O code-switching reflecte, pois, a experiência actual de viver entre várias culturas e transmite essa mesma realidade, bem como a das novas identidades híbridas que se formam.

Num século caracterizado por um paradigma multicultural, a crença de que a escola é um espaço de “pureza” linguística invalida-se pela própria realidade que se impõe, tal como têm vindo a defender todos estes autores. Nas aulas de LE, a aceitação de fenómenos até agora considerados desvirtuadores da correcção linguística, como diversas variedades afastadas do padrão ou o code-switching, torna-se pertinente, tanto mais que o multilinguismo gradualmente se impõe como o paradigma, deixando de ser a excepção. De facto, são fenómenos que coexistem de modo cada vez mais evidente nas cidades, comunidades, escolas, e famílias, tornando-se incontornável inclui-los nos programas curriculares das LE. Defende-se, pois, a importância do papel dos docentes de línguas do século XXI quer na alteração dos currículos que herdaram, currículos esses que assentam em noções desfasadas desta nova realidade, quer no forjar de uma abordagem que aceite tais fenómenos na aprendizagem dos seus alunos, reforçando a competência plurilingue e pluricultural, que o MCERL define do seguinte modo:

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19 A competência plurilingue e pluricultural distancia-se da dicotomia língua materna/língua estrangeira, dando lugar a uma abordagem de intersecção linguística e, consequentemente cultural, de reconhecimento de um repertório de competências muito mais complexo do que a compartimentação ainda veiculada. Os novos currículos deverão ter em conta que o conhecimento de uma língua não é estanque, mas é transversal a outras línguas; no entanto, os programas curriculares de LE das escolas portuguesas continuam a assumir cada uma das línguas separadamente, sendo planificados sem prever a transversalidade de competências e sem um suporte sociolinguístico, como a experiência nas escolas portuguesas facilmente comprova. São programas que continuam a ignorar que, quando se amplia a competência linguística e cultural do aluno, ele desenvolve uma competência comunicativa de maior entendimento do mundo, devido à interligação de todos os saberes e contextos que provêm de cada uma das realidades linguísticas. No fundo, trata-se de assumir a proposta do Conselho da Europa (2002), desenvolvendo-se uma dimensão intercultural mais abrangente nas aulas de LE:

The 'intercultural dimension' in language teaching aims to develop learners as intercultural speakers or mediators who are able to engage with complexity and multiple identities and to avoid the stereotyping which accompanies perceiving someone through a single identity. It is based on perceiving the interlocutor as an individual whose qualities are to be discovered, rather than as a representative of an externally ascribed identity. Intercultural communication is communication on the basis of respect for individuals and equality of human rights as the democratic basis for social interaction. (Byram, Gribkova e Starkey, 2002, p. 13).

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20 Concluindo, as aulas de LE ocupam uma posição privilegiada no âmbito educacional, oferecendo aos alunos a possibilidade de compreender a multiplicidade e a intersecção de experiências que caracterizam o novo século, quer expondo realidades para além da sua própria língua e cultura, quer conduzindo-os a uma abordagem inclusiva e de respeito pela diferença. Recuperando a citação da epígrafe, defende-se neste trabalho, que os professores devem ser uma ponte entre várias realidades, apresentando modelos multiculturais e multilingues, e não uma parede com um conjunto de conteúdos programáticos inflexíveis e, na maioria das vezes, sem grande aplicação sociocultural no contexto actual. Crê-se que o professor de LE deve abraçar esta nova abordagem, repensando criticamente as suas práticas pedagógicas, planificações, materiais e actividades que propõe, de modo a reforçar quer as competências sociocultural e sociolinguística, quer a competência pluricultural e plurilingue nos alunos. Como se demonstrará seguidamente, defende-se que este objectivo pode ser logrado através da utilização de textos literários, textos que se apresentem não apenas como representação do novo sistema multicultural e multilingue, mas também como reflexo das exigências e problemáticas que emergem desta conjuntura. Para tal, outros preconceitos necessitam de ser desconstruídos, nomeadamente a separação que se tem verificado entre literatura e língua, uma questão que será abordada no seguinte ponto.

1.2.Fronteiras e intersecções entre língua e literatura nas aulas de LE

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21 1.2.1. O espaço da literatura nas aulas de LE em Portugal

Uma análise aos conteúdos programáticos de LE das últimas décadas, bem como aos respectivos manuais escolares, permite verificar o modo como a literatura no ensino das línguas estrangeiras nos ensinos básico e secundário português tem vindo a assumir um papel acessório, muito provavelmente porque as actividades de leitura extensiva ou com textos literários são pouco apelativas na perspectiva dos alunos. Em Portugal, a globalização, as inovações tecnológicas, a influência dos valores consumistas e a valorização do imediatismo e do comodismo, inibem a capacidade de reflexão, a criatividade e autonomia dos alunos. São valores que, ao fomentarem o individualismo, geram personalidades demasiado centradas em si e/ou na satisfação dos próprios desejos imediatos, inibindo sentimentos de empatia pelo outro e respeito pela alteridade, como facilmente um convívio directo com turmas desta faixa etária permite verificar. Nas aulas de LE, o aborrecimento em relação a tarefas que não provoquem um sentimento de constante novidade coexiste, na maior parte das vezes, com um quadro generalizado de indisciplina e fracos resultados escolares, remetendo o professor a uma perpétua busca pela motivação perdida (ou nunca obtida), o que implica a escolha de actividades mais próximas dos interesses dos seus alunos, por vezes entendidos de forma redutora, e, portanto, a exclusão dos textos que encontram maior resistência, ou seja, os literários.

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22 disponíveis para concretizar, impede o acesso a matérias geradoras de novos conhecimentos que não acedem no quotidiano; terceiro, o professor que se remete a uma constante procura de aceitação, sacrificando o que ele próprio crê ser a aprendizagem que deve verdadeiramente oferecer, a médio prazo, conduz a que os alunos desvalorizem o próprio processo de ensino-aprendizagem.

Em Portugal, o ensino da literatura e da língua são geralmente perspectivados de forma desconectada. Na verdade, a tendência que Carter apontava em 1996, no artigo “Look both ways before crossing: developments in the language and literature

classroom”, não se verificou na realidade portuguesa:

The balance has moved away from the teaching of literature per se and towards the teaching of literature at the interface with language teaching. Likewise, discussions of the kinds of text used in the EFL/ESL classroom now only rarely takes place without reference to literary texts and to how they might be integrated with more familiar language teaching materials. (1996, p. 1)

Se os planos curriculares de LE, no final da década de 90, continham, pelo menos, uma obra literária de leitura extensiva obrigatória, os planos actuais remetem os docentes para a opção de incluir apenas excertos de obras literárias.5 Embora, através dos manuais escolares, os jovens contactem obrigatoriamente com (excertos de) textos literários na disciplina de Português, no caso da aprendizagem da LE - inglês ou espanhol - continua a privilegiar-se materiais didáticos assentes em estereótipos culturais, filmes ou com uma relação directa com situações do dia-a-dia dos alunos. São precisamente estas ferramentas pedagógicas a que os professores de LE recorrem para ensinar os conteúdos culturais e linguísticos dos programas em vigor. Todavia, são

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23 materiais que reforçam as diferenças entre a vivência dos alunos e a da cultura estrangeira, transmitindo valores desfasados da sociedade actual, que se quer a caminhar para a tolerância, para a inclusão e aproximação entre todos os povos.

De facto, cada vez mais, a escola deixa de oferecer conhecimentos baseados nas diversas ciências e artes para se aproximar da realidade das famílias, limitando os alunos ao que o seu próprio contexto sociocultural oferece. Quando confrontados com materiais didáticos mais exigentes ou que requerem alguma capacidade de reflexão, como manifestações artísticas ou textos literários, os jovens desta faixa etária normalmente têm uma atitude de rejeição, quer porque não encontram uma ligação entre esses materiais e a sua experiência, quer porque creem que a internet lhes suprime a necessidade de toda e qualquer informação. Esquecem que tal informação, constantemente disponibilizada, requer capacidades de seleção e interpretação, competências que os alunos pouco aprendem a desenvolver no sistema escolar português actual, sendo esta uma lacuna facilmente identificável por qualquer professor dos ensinos básico e secundário.

1.2.2. Uma proposta literária para a aulas de LE

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24 literatura aos clássicos da literatura inglesa ou espanhola, obras que normalmente contêm vocabulário complexo/em desuso, ou estruturas gramaticais quase impossíveis de dissecar em aula, para alunos dos ensinos básicos e secundário.

Se a barreira entre texto literário e não literário nas aulas de LE parece intensificar-se, paradoxalmente, essa mesma barreira tem vindo a esvanecer-se nas literaturas contemporânea e pós-moderna, menos focadas na técnica e estética dos cânones tradicionais e bem mais próximas da vida, dos problemas e da língua quotidianos. Na verdade, a literatura de expressão inglesa ou espanhola vai muito para além daquela normalmente escolhida para os planos curriculares de formação de professores de línguas e cabe ao professor descobrir isso mesmo, oferecendo aos alunos a possibilidade de desmitificar a noção de que o texto literário é inacessível e não encontra eco na realidade. Relembra-se que, desde o final do século XX, a literatura de expressões inglesa e espanhola tem vindo a englobar as vozes de grupos minoritários ou historicamente subalternos, refletindo as problemáticas que tais grupos enfrentam, problemáticas em discussão na sociedade actual. Defende-se, assim, a proposta de Carter:

There are alternative ways of examining texts than from within a chronological line from Beowulf to Virginia Woolf or from Caedmon to Angela Carter. There are many texts which in some English departments are excluded from this kind of assembly: for example, much contemporary literature, writing by women or from different ethnic groups as well as literatures written in English in different parts of the world. (1996, p. 7)

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25 literárias. Como a própria noção de linguagem literária já não se limita àquela expressa nos antigos cânones, a ideia de que não encontra eco no contexto social quotidiano, torna-se inviável. O uso da literatura nas aulas de LE não impede, deste modo, uma abordagem comunicativa, uma vez que ao fornecer conteúdos linguísticos e culturais autênticos, potencia as várias competências na língua alvo tal como defende Hall (2005, p. 47-57).

Já na década de 90, Duff e Maley (1990) apontavam os benefícios resultantes da integração da literatura nas aulas de LE, considerando razões linguísticas, metodológicas e motivacionais: os textos literários são particularmente ricos em vocabulário e estruturas que podem ser aproveitadas para diversos conteúdos programáticos; os alunos aprendem estratégias de leitura, devido à diversidade de géneros e subgéneros, à necessidade de interpretar e à extensão de diferentes textos; o próprio acto da leitura pode ser aprendido, evitando a sensação de obrigação e aborrecimento que os alunos, normalmente, lhe associam. No início do século, Parkinson e Reid (2000, p. 9-11) sublinham o facto de os textos literários fornecerem óptimos exemplos de registos escritos, ajudando os alunos a escrever e a organizar os seus próprios textos, reconhecendo as particularidades dos vários tipos de escrita. Recentemente, Van (2009) resume as razões que tornam imprescindível a utilização da literatura nas aulas de LE, ao fornecer contextos significativos, apresentar uma grande variedade de vocabulário e tipos de texto, fomentar a criatividade e a imaginação, desenvolver a consciência cultural, gerar pensamento crítico e ir ao encontro do que a abordagem comunicativa propõe. Crê-se, portanto, que estas linhas de actuação devem ser valorizadas na reformulação dos currículos de LE.

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26 personificações, alusões culturais e históricas. Assim, é urgente que as aulas de LE deixem de perpassar aos alunos a ideia de que a língua se constrói unicamente a partir de vocabulário e estruturas, sem ter em conta o grande feixe de sentidos que oferece, sentidos que os alunos devem conseguir compreender e expressar. De facto, adquirir uma competência linguística é mais do que adquirir conhecimentos metalinguísticos, inclui também conseguir um domínio pragmático de adequação às mais diversas situações comunicativas. É neste sentido que Fillola afirma:

Con la selección de textos se accede a una amplia muestra de usos en lenguaje literario y se recogen muestras de la diversidad expresiva, de modo que a partir de ellos, los profesores y los aprendices extraen conocimientos y aplicaciones prácticas, pragmáticas y funcionales. Las actividades formativas de LE relacionadas con la lectura de obras y/o fragmentos literarios no habrían de resultar más difíciles que saber/poder leer un artículo de prensa, un anuncio publicitario (…) cada modalidad discursiva tiene su especificidad, y en su conjunto, forman la riqueza expresiva de una lengua. (2004, p. 2)

O professor de LE deverá, pois, aprender a selecionar os textos literários com significado para os objectivos do seu programa, interligando-os com textos não literários, de forma contínua, sem estabelecer uma barreira entre eles, uma vez que o objectivo é linguístico e não literário. Deve ter ainda em conta uma gradação no grau de complexidade, adequando os textos à faixa etária e nível linguístico dos alunos - a introdução de textos literários nas aulas de LE deve ser efetuada o mais cedo possível, isto é, logo nos primeiros níveis, uma vez que torna os alunos mais recetivos à crescente de complexidade de tais materiais nos últimos anos de aprendizagem. As propostas da segunda parte deste trabalho assumem esta abordagem.6 Além disso, tendo em conta os modelos de aprendizagem enunciados por Carter e Long (1991), entende-se que os alunos beneficiam de uma interligação dos modelos cultural, linguístico e de

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27 crescimento pessoal, de forma a gerar conhecimentos que se estendam a diferentes dimensões.7

Se as capacidades de leitura melhoram a compreensão da língua alvo e, portanto, as competências linguísticas, crê-se que aprender com o acto da leitura pode mesmo gerar respostas nos alunos sobre o mundo, relacionadas com a nova capacidade de reflexão que emerge, tal como a citação em epígrafe relembra - finalmente percebem que as suas necessidades e anseios podem ser comuns a todos os indivíduos e culturas. Os alunos melhoram a capacidade de expressar a sua subjetividade e são compelidos a adoptar valores de inclusão e tolerância para com outras subjetividades, realidades e circunstâncias. São vantagens incontornáveis na escola pluralizada actual.

A literatura pode ser, deste modo, uma ferramenta pedagógica valiosa, não só porque é língua e a língua pode ser literária (Bedi, 2011, p. 1), mas também porque estes textos possibilitam expandir horizontes através dos novos significados que se oferecem à leitura. Aprender uma língua estrangeira é muito mais do que adquirir um conjunto de regras e memorizar vocabulário - é aceder a toda uma nova subjectividade e forma de viver, elementos especialmente valorizados nos textos literários. Aprender uma nova língua através dos sentidos que se oferecem em tais materiais é também sinónimo de poder, não só porque o próprio conhecimento é uma clara vantagem na sociedade competitiva e massificada da actualidade, mas também porque o acesso a outras realidades gera uma maior compreensão no aluno do seu papel no mundo e da sua relação com o outro.

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28 Como aparece referido no MCERL: “Los estudios literarios cumplen muchos más fines educativos, intelectuales, morales, emocionales, lingüísticos y culturales que los puramente estéticos” (2002, p. 60). Como este documento prevê, pela aquisição da LE, os alunos devem poder desenvolver uma consciência intercultural, resultante do contraste entre o seu mundo e o da cultura/língua alvo, consciência que lhes permite encontrar o próprio espaço na diversidade de experiências multiculturais e multilingues da realidade actual, bem como reforçar a sua competência sociocultural, aprendendo e adequando modos de interacção com a alteridade Os alunos devem ser preparados para o papel de intermediários culturais, assumindo uma atitude de diálogo entre si e o “outro”. Para tal, crê-se que o professor não deve ser resistente à mudança, devendo sim abdicar de crenças monolíticas de cultura e língua, repensar o seu próprio universo de referência em interligação com outros universos e adequar as práticas pedagógicas a uma abordagem que não seja, à partida, delimitadora das várias realidades. É fulcral que o próprio professor se converta num mediador intercultural, rompendo com a tradição das aulas de LE que interpreta as diferentes culturas através de estereótipos, transmitindo estratégias correctas de negociação entre a cultura/língua dos alunos e a cultura/língua abordadas na sua aula.

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29 competências sociocultural e intercultural. Como se procurará demonstrar seguidamente, a literatura chicana, quer pela forma quer pelo conteúdo, permite validar estes argumentos, bem como ir ao encontro de uma nova realidade das aulas de LE do século XXI - a intersecção cultural e linguística, uma realidade que surge dos novos contextos socioculturais da escola do novo século, reflexo das grandes alterações que a própria sociedade actual tem vindo a experienciar.

1.3. A literatura chicana nas aulas de LE: uma chave de interpretação do novo século

Hay tantísimas fronteras que dividen a la gente, pero por cada frontera existe también un puente. (Gina Valdés, 1982)

1.3.1. Aceitar a alteridade: ensinar valores

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30 canónica, como também intersecta as línguas inglesa e espanhola, o que permite abordagens fora dos padrões da pureza linguística.

Identificam-se três temas na literatura chicana, com maior pertinência para a compreensão da conjuntura do novo século, temas que podem ser utilizados nas aulas de LE e interligados com os objectivos linguísticos: a denúncia da segregação das minorias ou grupos historicamente subalternos e os problemas decorrentes de tal contexto; o hibridismo identitário devido à intersecção de várias culturas; e o uso de várias línguas como representação identitária. Importante ainda é realçar o objectivo de mudança social que estes textos literários incluem, nomeadamente pela desconstrução de modelos de superioridade e inferioridade, que podem levar os alunos a reflectir sobre constrangimentos que enfrentam no próprio espaço escolar ou na sociedade em geral. Deste modo, como se verá com as propostas práticas da segunda parte deste trabalho, a literatura chicana pode ser utilizada como ferramenta pedagógica para expor o modo como a alteridade, em pleno século XXI, continua a ser encarada com insegurança, aversão, ou mesmo considerada um desvio de uma determinada norma. Ao expor tal conjuntura, permite romper com modelos que se universalizam sempre que os grupos privilegiados assumem a supressão ou a rejeição das diferenças.

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31 they can whitewash and distort history. Ignorance splits people, creates prejudices” (Anzaldúa, 1999, p. 108). Assim, creem que se o grupo privilegiado ganhar plena consciência das consequências dos seus actos, deixará de objectificar o “outro”, reconhecendo o direito à diferença. Este poderá ser também o propósito dos professores com a utilização desta literatura - passar uma mensagem sobre a aceitação da alteridade, de modo a configurar uma nova maneira de forjar elos numa sociedade caracterizada pelo pluralismo e diferença. Como refere o escritor chicano Gómez-Peña:

The real tasks ahead of us are to embrace more fluid and tolerant notions of personal and national identity, and to develop models of peaceful coexistence and multilateral cooperation across nationality, race, gender and religion (…) we need more and better information about one another. (1996, p. 70)

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32 1.3.2. Educar para o multiculturalismo e para o multilinguismo

A literatura chicana é ferramenta privilegiada para uma abordagem multicultural e intercultural nas aulas de LE, ao evidenciar a intersecção entre várias culturas, sublinhando os elementos comuns e, simultaneamente, dialogando a partir da diferença. Como advogam os defensores do interculturalismo, a sociedade multicultural deverá sair de uma posição de coexistência passiva e promover o diálogo e a interação entre as culturas, encontrando formas de aproximação. No entanto, como já se referiu, os programas curriculares de língua estrangeira em Portugal insistem repetidamente em características culturais que (supostamente) pertencem a determinado país e que qualquer aluno não hesitará em enunciar.8 De facto, esta literatura comprova que as barreiras entre culturas, etnias e indivíduos devem ser questionadas, ao expor o modo como os processos de hibridização decorrem, sendo a cultura um elemento flexível. Tal como demonstram as propostas da segunda parte deste trabalho, nomeadamente na unidade didática aplicada à turma 1º ESO, a literatura chicana conduz os alunos a uma reflexão sobre os modelos culturais da sociedade actual, cujos paradigmas se tornam maleáveis e permeáveis, rompendo com os dogmas pré-existentes.

A literatura chicana oferece-se também como espaço de desconstrução do ideal de pureza linguística. Por um lado, retrata experiências de opressão linguística, no espaço escolar e na sociedade maioritária, relacionada com situações em que os

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33 chicanos se exprimem fora da língua ou do sotaque padrão.9 Por outro lado, denuncia o modo como a língua pode acentuar as disparidades sociais, dificultando o acesso às mesmas oportunidades do grupo dominante. Os escritores chicanos creem que as múltiplas culturas e línguas devem poder ser exprimidas livremente, através da interseção de códigos linguísticos. O hibridismo linguístico reforça, pois, o cultural, desconstruindo-se a crença da superioridade de línguas e de culturas “puras”, como aliás se exemplifica no seguinte excerto:

My English, Spanish, Spanglish, and other lengualidades have danced around each other and together en mi boca, casi forever, like seasoned partners on the dance floor, se siguen bien, sus vueltas e pasos bien coreografiados. (Sanchéz, 2003, p. 21)

Ao utilizar diferentes códigos linguísticos, estes escritores pretendem, não só validar a sua própria identidade híbrida, mas também agir na sociedade, alterando um paradigma assente em dicotomias, pela desconstrução de dogmas falaciosos. Esta é uma lição que pode ser aplicada às aulas de LE. Crê-se que os alunos devem tomar consciência de que, com o multiculturalismo e a globalização, cada vez mais, existem registos linguísticos longe do padrão e que a superioridade linguística não é um valor absoluto. Para que tal aconteça, também o professor deve repensar a sua prática, uma vez que a tendência é a de corrigir quaisquer variedades linguísticas fora da veiculada nos manuais. A unidade didática aplicada à turma COE, como se verificará na segunda parte deste trabalho, valida estes argumentos.

Concluindo, na literatura chicana, quando a questão identitária se funde com a linguística, comprova-se, por um lado, que as fronteiras culturais e linguísticas podem

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35 Parte II

2. A literatura chicana no ensino da LE- aplicações metodológicas na PES

A segunda parte deste trabalho tem como objectivo demonstrar a validade e aplicabilidade do enquadramento teórico já exposto, nas aulas de LE, do 3º ciclo do ensino básico e ensino secundário. As aplicações metodológicas e as propostas para actividades didáticas a apresentar nesta parte decorreram no Instituto Espanhol Giner de los Ríos (IE), no âmbito da Prática de Ensino Supervisionada do Mestrado em Ensino de Inglês e de Línguas Estrangeiras no 3º Ciclo do Ensino Básico e no Ensino Secundário.

Primeiro, caracteriza-se o IE, evidenciando-se os projectos que integra e que se relacionam com este trabalho; segundo, propõem-se metodologias e actividades concretas com a literatura chicana, de modo a forjar uma nova abordagem nas aulas de LE, condizente com a realidade do século XXI.

2.1. Instituto Espanhol Giner de los Ríos - características e projectos

La formación en el respeto y reconocimiento de la pluralidad e interculturalidad. (Proyecto Educativo Instituto Español Giner de los Ríos,2011)

2.1.1. Caracterização do Instituto Espanhol

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36 España e homologada pelo Ministério de Educação e Ciência português, que se organiza segundo os programas curriculares, os objectivos pedagógicos e o calendário escolar propostos pelo governo espanhol. Por isso mesmo, embora o Instituto Espanhol esteja situado em Algés, distrito de Lisboa, a língua utilizada no quotidiano escolar é o espanhol castelhano. Esta opção linguística é obrigatória e está estipulada nos documentos que regulamentam o IE:

Todos los profesores debemos exigir a nuestros alumnos la utilización del español tanto como lengua vehicular, como en todas las circunstancias que se den en el centro (…) debemos comprometernos a utilizar correctamente el español tanto oralmente como por escrito atenuando, en la medida de lo posible, los localismos inherentes a las diversas procedencias del profesorado de un centro en el exterior. (Proyecto Lingüistico, 2014, p. 6)

É de notar que, se dentro do IE a língua obrigatória é o espanhol, nos pátios e áreas comuns os alunos expressam-se frequentemente em português com os seus pares, ignorando esta obrigatoriedade. No entanto, em caso algum, o fazem na comunicação com professores ou funcionários. A fluência na língua espanhola é, aliás, um dos requisitos de admissão, apesar de a língua portuguesa ser ensinada a partir do nível correspondente ao 1º ciclo do ensino básico. Os alunos com nacionalidade espanhola ou com dupla nacionalidade têm prioridade na admissão, embora existam alguns alunos de países da América Latina ou de nacionalidade portuguesa.

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37 ensino tem uma proposta curricular, que está disponível na página do IE para consulta de todos os intervenientes, incluindo as famílias.

O projecto educativo do Instituto Espanhol assenta na educação intercultural, uma vez que tem em conta que os próprios alunos provêm de diversos entornos culturais. É de notar que muitos dos objetivos previstos neste documento vão claramente ao encontro do tipo de educação do novo século que se defende neste trabalho, ou seja, de respeito pela alteridade, pelo multiculturismo e multilinguismo. Neste âmbito, destacam-se os seguintes propósitos do Proyecto Educativo (2011, p. 9): educar para a tolerância e liberdade, com respeito pelos direitos e liberdades fundamentais e pela igualdade de género, recusando qualquer tipo de discriminação; utilizar as línguas como meio de entender diversos povos e culturas, levando o aluno ao enriquecimento pessoal; salvaguardar os fenómenos de bilinguismo do espaço escolar; e contribuir para a formação de espírito crítico, como ferramenta de interpretação do mundo actual. Neste âmbito, a realização da PES em turmas do IE permitiu planificar as aulas de LE, de modo a interligar as propostas deste trabalho com o próprio projecto educativo do local de estágio.

2.1.2. Projecto linguístico e o Projecto “Tagus”

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38 La importancia y la complejidad de la competencia en comunicación lingüística y del fomento del plurilingüismo en un mundo multilingüe exigen de la comunidad educativa de un centro de enseñanza una respuesta coordinada y bien planificada. El Proyecto Lingüístico de Centro supone, en este sentido, una propuesta educativa de calidad para esta realidad compleja. (Proyecto Lingüístico, 2014, p. 6)

Uma das prioridades do projecto linguístico é o domínio de uma terceira língua estrangeira, de forma a preparar os alunos para uma vivência globalizada, de acordo com a competência plurilingue e pluricultural prevista no MCERL. Como se referiu na primeira parte deste trabalho, de acordo com este conceito, o aluno não adquire um repertório de competências diferenciadas e separadas consoante as línguas, mas uma competência plurilingue e pluricultural caracterizada pela interligação entre o domínio linguístico de várias línguas e as conexões que estabelece com outras culturas (MCERL 2002, p. 167). Assim, o projecto linguístico do IE prevê que o aluno possa recorrer a diferentes línguas para conseguir comunicar com um interlocutor específico, o que na verdade, vai ao encontro da sua identidade pluricultural.10 Ainda assim, realça-se que, segundo o que está regulamentado neste projecto, os alunos deverão estar conscientes das interferências entre as línguas espanhola e portuguesa, de modo a conseguirem evitá-las. Os próprios professores, mesmo os que não ensinam Lengua Castellana y Literatura, deverão corrigir todas e quaisquer interferências que surjam nas respectivas aulas, encorajando ainda o uso do espanhol castelhano em todo o espaço escolar. Salienta-se que esta exigência tem de ser relembrada aos alunos dia após dia, já que o seu próprio contexto pluricultural engloba a língua portuguesa, que facilmente se intersecta.

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39 No ano lectivo de 2014/2015, o Instituto Espanhol iniciou ainda um novo projecto cultural e linguístico, em colaboração com a Escola Secundária Luís de Camões, o qual se centra no rio Tejo como símbolo da união e colaboração entre Portugal e Espanha. O rio converte-se no elemento de ligação e comunicação entre os povos da Península Ibérica. Utilizando como mote a célebre frase de Alberto Caeiro, “pelo Tejo vai-se para o mundo”, o projecto tem o intuito de promover a troca de experiências e o trabalho colaborativo entre alunos e professores das realidades portuguesa e espanhola. O documento que rege este projecto assume os seguintes objectivos:

Contrastar el estudio de diferentes aspectos a ambos lados de la frontera, facilitando el intercambio cultural y el establecimiento de paralelismos, influencias mutuas e interconexiones. (…) Al escoger un río como objeto de estudio, se abre un abanico de posibilidades de ser tratado desde las diferentes disciplinas que componen el currículum de nuestros alumnos, desde las ciencias naturales, geografía, economía, hasta la literatura o la música, pasando por la historia o la lengua (toponimia, léxico de los habitantes ribereños, etc.). ( Proyecto Tagus, 2015, p. 2)

O Projecto Tagus evidencia, então, a interdependência e a base comum de ambos os países, ao mesmo tempo que incentiva atitudes e valores de respeito pela diversidade cultural.

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40 evidenciem essa realidade e experiência, optando-se pela literatura chicana para propor e validar a nova abordagem que se demonstrará de seguida.

2.2. A literatura chicana na aula de ELE - propostas e práticas da PES

True teachers are those who use themselves as bridges over which they invite their students to cross; then, having facilitated their crossing, joyfully collapse, encouraging them to create their own. (Nikos Kazantzakis, 1952)

Caminante, no hay puentes, se hace puentes al andar. (Gloria E. Anzaldúa, 1981)

A PES decorreu em duas disciplinas de diferentes turmas, Lengua Castellana y Literatura da turma de 1º ESO e Comunicación Oral y Escrita (COE), formada por um grupo de alunos de diferentes turmas de ESO com dificuldades linguísticas em castelhano.

As actividades implementadas em cada unidade didática promovem a utilização das diferentes competências e tipos de interacção e, sempre que possível, têm como ponto de partida e chegada a própria experiência dos alunos, interrelacionando-se a mesma com a literatura chicana escolhida. Além da utilização de textos literários, integraram-se outros materiais didácticos de apoio, como documentários, música e arte chicana, de forma a evidenciar a experiência multicultural e multilingue. Esta abordagem vai, pois, ao encontro dos objectivos de Collie e Slater (1987) na sua proposta para a utilização de literatura nas aulas de LE, uma proposta que se mantém actual:

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41 own responses to literature; using the target language; integrating language with literature. (1987, p. 8-10).

Foram ainda realizados inquéritos antes e depois da leccionação, com o propósito de entender quais as crenças dos alunos face aos temas abordados e o modo como reagem à nova perspectiva que se lhes oferece. Tais inquéritos permitiram ainda aferir o modo como foram atingidos os objectivos de cada unidade. Os textos literários, assim como os outros materiais de suporte, foram cuidadosamente selecionados e, apesar de apresentarem uma grande riqueza linguística, remetendo os alunos para uma outra experiência hispânica com a qual não estão familiarizados, estão escritos numa linguagem adequada ao seu nível linguístico e etário.

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42 2.2.1. Literatura chicana para a inclusão e o multiculturalismo

A unidade didática aplicada à turma 1º ESO teve como objectivo fomentar valores de tolerância e inclusão, conduzindo os alunos à aceitação de realidades multiculturais e de outras experiências hispânicas. O tema escolhido, “La segregación racial y cultural: una frontera entre pueblos”, relaciona-se directamente com a proposta que se apresenta na primeira parte deste trabalho e com o Proyecto Tagus iniciado pelo IE no corrente ano lectivo. Além disso, como a turma em questão integra essencialmente alunos bilingues ou multilingues, de herança espanhola a viver em Portugal, conseguiu-se interrelacionar a sua vivência com os temas abordados.11 A elaboração desta unidade didática teve como base o programa curricular da disciplina de Lengua Castellana y Literatura, havendo o cuidado de interligar os conteúdos previstos neste programa com a literatura chicana, de modo a atingir os objectivos sociocultural e sociolinguístico pretendidos.

A aplicação da unidade foi precedida por um período de observação de aulas, durante o qual se tornou evidente não só a dinâmica do grupo (tipos de interação, tempo destinado às actividades e ritmos de trabalho), como também as dificuldades/facilidades individuais de cada aluno. Durante esta fase verificou-se a existência de um padrão nas aulas da professora responsável pela turma: os primeiros 30 minutos são destinados à correcção do trabalho de casa, no decorrer da qual podem ser feitas algumas revisões da aula anterior; segue-se um momento em que ora existe exposição de conteúdos ora os alunos resolvem exercícios no livro; nos últimos minutos, atribuem-se trabalhos de casa para a aula seguinte. Numa altura em que se discute um processo de ensino-aprendizagem centrado no aluno, crê-se que tal estrutura de aulas revela uma

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43 abordagem excessivamente tradicional, centrada na figura do professor e demasiado expositiva. Como mencionam Griffin e Cashin (1989), usar unicamente o método expositivo tem claras desvantagens: a falta de retroinformação, a passividade dos ouvintes, a tendência a esquecer rapidamente as informações recebidas em exposições orais; a desconsideração das diferenças individuais e o facto de a duração das aulas expositivas e o interesse dos ouvintes serem inversamente proporcionais.

Notou-se que, nesta turma, a interacção se faz exclusivamente do professor para o aluno ou de aluno para professor, neste ultimo caso apenas quando há uma interpelação directa. A interacção aluno-aluno está vedada, nem tampouco são promovidas tarefas que a suscitem. Além disso, os alunos não têm autorização para partilhar as suas experiências pessoais, mesmo quando relacionadas com os temas, nem para responder sem lhes ser perguntado algo, inclusive quando colocam o dedo no ar. Esta abordagem desvaloriza a vantagem de trazer à aula a própria experiência dos alunos para promover a motivação e a aquisição de conhecimentos com significado real. Ignora ainda os benefícios da relação aluno-aluno na maximização dos conhecimentos transmitidos em aula, bem como na potenciação de novos conhecimentos, e que podem ser enumerados da seguinte forma:

Aspectos como el proceso de socialización, la adquisición de competencias y destrezas, el control de los impulsos agresivos, el grado de adaptación a las normas establecidas, la superación del egocentrismo, la relativización progresiva del punto de vista, el nivel de aspiración, el rendimiento escolar son, entre otros, factores que van a incidir de forma decisiva en las relaciones de los alumnos con sus compañeros de clase. (Coll, 1984, p. 119-120)

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44 escolas portuguesas, o comportamento deste grupo é muito positivo, principalmente tendo em conta o método utilizado, que poderia gerar desmotivação. Assim, pela observação das aulas foi possível reflectir criticamente sobre as práticas pedagógicas aplicadas e reconhecer a diversidade dentro do grupo-turma, adequando-se as metodologias da unidade didática aqui proposta. Por se crer que as aulas devem, sempre que possível, decorrer num ambiente de empatia, ser centradas no aluno e assentar numa abordagem comunicativa e de realização de tarefas, procurou-se oferecer aos alunos uma tipologia de aula completamente diferente daquela que habitualmente recebem, neste contexto.

Na planificação desta unidade optou-se por não utilizar o manual, o que obrigou à concepção e ao ajustamento dos materiais à realidade e idade dos alunos, uma vez que se defende que os alunos se sentem motivados quando conseguem relacionar o conteúdo das aulas com a sua experiência. Embora se considere o manual uma ferramenta pedagógica útil, crê-se que deve ser complementado e adaptado a cada grupo-turma, uma vez que a aplicação de uma mesma metodologia, concebida por uma editora sem a experiência in loco, limita a aprendizagem, por não fomentar a criatividade e não deixar espaço para que o aluno contribua para a construção da aula com o seu próprio contexto. Na elaboração dos materiais pedagógicos houve uma reflexão sobre os objectivos, a sequenciação das actividades, os tipos de interacção e as estratégias a adoptar.

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45 culturas superiores. Todos os alunos consideram que os imigrantes devem ter os mesmos direitos dos restantes cidadãos e mostram ainda ter consciência de que a discriminação se pode reproduzir devido à cor da pele, à língua ou mesmo à roupa que se usa. Realça-se que nenhum sofreu qualquer forma de discriminação na sua vida.12

Como facilmente se verifica através dos materiais pedagógicos escolhidos para esta unidade didática, a literatura chicana encontra a sua aplicabilidade, nomeadamente na desconstrução das crenças dos alunos sobre o tema escolhido, crenças baseadas em noções de superioridade ou pureza cultural.13 No entanto, tal como se expôs na primeira parte deste trabalho, defende-se que a literatura deve ser enquadrada numa sequência de actividades, organizadas de modo a conduzir os alunos ao objectivo proposto, não devendo constituir a aula per se, ou seja, entende-se a exploração do texto literário como um meio e não como um fim si mesmo. Com esta premissa, a primeira aula iniciou-se com um vídeo de uma campanha, elaborada pelo governo mexicano em 2011, que mostra como as crianças são afectadas pela forma como o racismo se reproduz na sociedade. Pretendeu-se, pois, motivar os alunos para a leitura do texto literário e, simultaneamente, criar uma aproximação entre os conteúdos a abordar e a realidade deste século, muitas vezes vivenciada na primeira pessoa. Os alunos responderam as questões baseadas na sua opinião pessoal sobre a mensagem da campanha, sendo ainda compelidos a transporem a experiência mexicana visionada para a realidade portuguesa.

Depois da pré-actividade, propôs-se aos alunos a leitura de um conto, explicando-se sucintamente a diferença entre um conto tradicional e um conto literário, conteúdos estipulados no programa curricular do 1º ESO. O texto literário Amigos del otro lado (1993), da escritora chicana Gloria Anzaldúa, foi o escolhido, uma vez que

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46 representa duas personagens da mesma faixa etária dos alunos, com os quais facilmente se conseguem identificar. O conto incide sobre questões socioculturais pertinentes no novo século, nomeadamente os vários problemas que decorrem da imigração: o racismo ou a xenofobia, a falta de trabalho dos imigrantes no país de acolhimento e as dificuldades que encontram no seu quotidiano. Expõe ainda uma situação de bullying, que, ao ser trabalhada em aula, conduz os alunos à desobjectificação das vítimas, uma vez que percebem quer a irracionalidade do opressor, quer o modo como afecta o oprimido. Assim, a literatura chicana será utilizada na aula de LE, como meio de veicular valores socioculturais ao grupo-turma, tal como foi defendido no enquadramento teórico.

Imagem

Figura 1.  Figura 2.  Masculino; 10 Feminino; 9 Género   12 anos; 16 13 anos; 4 Idade
Figura 1.   Figura 2.  Não existe; 9 Existe; 7  Discriminação em Portugal  Existe; 12 Não existe; 4
Figura 1.  Figura 2.  Figura 3.  masculino; 5 feminino; 2 Género  12 anos; 4 13 anos; 3 Idade  0 1 2 3 4 5 6 7 8
Figura 1  Figura 2  0,0% 20,0% 40,0% 60,0% 80,0% 100,0%  Sim  Não 100,0%  0,0%

Referências

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