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A afetividade e seu caráter instrumental na adoção intuitu personae

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Academic year: 2018

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UNIVERSIDADE FEDERAL DO CEARÁ FACULDADE DE DIREITO

TAÍS RAMALHO DANTAS ARAÚJO

A AFETIVIDADE E SEU CARÁTER INSTRUMENTAL NA ADOÇÃO INTUITU PERSONAE

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TAÍS RAMALHO DANTAS ARAÚJO

A AFETIVIDADE E SEU CARÁTER INSTRUMENTAL NA ADOÇÃO INTUITU PERSONAE

Monografia apresentada ao Programa de Graduação em Direito da Universidade Federal do Ceará, como requisito parcial à obtenção do título de Bacharel em Direito.

Orientador: Prof. Msc. William Paiva Marques Júnior.

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Dados Internacionais de Catalogação na Publicação Universidade Federal do Ceará

Biblioteca Setorial da Faculdade de Direito

A658a Araújo, Taís Ramalho Dantas.

A afetividade e seu caráter instrumental na adoção intuitu personae / Taís Ramalho Dantas Araújo. – 2015.

54 f. ; 30 cm.

Monografia (graduação) – Universidade Federal do Ceará, Faculdade de Direito, Curso de Direito, Fortaleza, 2015.

Área de Concentração: Direito das Famílias.

Orientação: Prof. Me. William Paiva Marques Júnior.

1. Adoção - Brasil. 2. Pais e filhos (Direito) - Brasil. 3. Direito de família - Brasil. I. Marques Júnior, William Paiva (orient.). II. Universidade Federal do Ceará – Graduação em Direito. III. Título.

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TAÍS RAMALHO DANTAS ARAÚJO

A AFETIVIDADE E SEU CARÁTER INSTRUMENTAL NA ADOÇÃO INTUITU PERSONAE

Monografia apresentada ao Programa de Graduação em Direito da Universidade Federal do Ceará, como requisito parcial à obtenção do título de Bacharel em Direito.

Aprovada em: ___/___/______.

BANCA EXAMINADORA

________________________________________ Professor Msc.William Paiva Marques Júnior (Orientador)

Universidade Federal do Ceará (UFC)

_________________________________________ Professor Msc. Álisson José Maia Melo

Universidade Federal do Ceará (UFC)

_________________________________________ Mestrando Francisco Tarcísio Rocha Gomes Júnior

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AGRADECIMENTOS

Utilizarei a palavra agradecer com um novo sentido, não apenas na sua definição presente nos dicionários de “manifestar gratidão” ou “mostra-se grato por benefício

recebido”. Desculpem-me, Aurélio e Michaelis, mas, para mim, nos meus agradecimentos, agradecer significará muito mais, terá a acepção de reconhecer a importância de pessoas em minha vida, de demonstrar-lhes que minha personalidade, meu caráter e minhas memórias não seriam as mesmas se elas não tivessem influenciado a minha história de alguma maneira, e que sou eternamente grata por isso. Dizem, sabiamente, que cada pessoa que passa em nossas vidas deixa um pouco de si e leva um poquinho de nós, e tenho sorte e gratidão a Deus por ter tantas pessoas passando, correndo, ficando por mim, deixando exemplos, momentos, sorrisos e lembranças. Esforço-me para que elas também só levem coisas boas em troca. Meus sinceros agradecimentos:

A meus pais, Airton e Suelda, por todo amor e por me mostrarem os valores certos da vida.

Aos meus irmãos, Daniel e Vinícius, vocês são meu exemplo, meu orgulho e a parte mais linda de mim.

Aos meus primos, que, na verdade, são meus irmãos de afeto, “prirmãos”, Danilo, por toda cumplicidade, Lucas, por sua alegria, Gustavo, por ter crescido ao meu lado, Márcia, Andrêzza e Marcela, por serem as irmãs que não tive e à princesinha Letícia, por ter vindo iluminar nossas vidas. E aos meus tantos outros primos, incluindo as primas queridas Camila, Cíntia, Lara, Sabrina, Aline e Carlinha.

Aos meus avós, Osmar e Zuila, Airton e Lourdinha, por terem me ensinado que a família é o nosso bem mais precioso.

A todos os meus estimados tios, em especial, Ilana e Hamilton, Márcio e Sílvia, França e Bão, Marcelo e Valdésia, Lice, Lana, Leuda e Mica, pelo carinho e atenção dados a mim, bem como aos meus tios Renato e Guido, que deixaram tantas saudades.

Ao meu bem-querer Camilo, quem me apresentou a um novo tipo de amor, que deixa minha vida mais colorida, fácil, leve e sorridente.

Aos meus amigos do Colégio Christus, os de infância, Mariana, Nayara, Felipe e Ana Paula, e os que tive a sorte de conhecer, os amados Vicente, Thales, Olavo, Cássia e Rebecca, além dos do Grupo C.Y.

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tantos anos e por ter me dado a oportunidade de conhecer as nossas “piabas”, em especial Brenda, a minha eterna e amada dueta; Nica, com quem vivi momentos inesquecíveis; Nina e Frida, a alegria e o carinho em pessoas, além das queridas Suelen, Carol e Bruna.

Aos amigos que a dança me deu, que completam meu dia a dia há anos, não me vejo sem vocês. Obrigada Mika, Marcella, Fofis, Jéssica, Marília(s), Thati, Carol, Camila, Júlia, Thamyres, Adilton, Veríssimo e tantos outros.

Aos meus amores, Claryssa, Felipe e Priscila, meus presentes da FD, não há como lembrar da faculdade e não pensar em vocês, que deixaram esses cinco anos mais cheios de sorrisos, abraços e amor. Saber que tenho a amizade de vocês deixa tudo mais fácil. Obrigada por sempre me prestigiarem e compartilharem as angústias e vitórias da vida. Amo vocês.

Aos queridos amigos da nossa querida Salamanca, Isa, Aline, Euclides, Pedrinho, Euler, Joel, Davi, Carlos, Ricardo, Léo, Renata, Claudiane, Dante, Pedro, Dudu e os demais da Turma Direito UFC 2015.1, quero levá-los sempre comigo.

Ao Escritório Matias&Campelo, onde tive os primeiros contatos com a prática forense, sendo de grande relavância para minha formação, em especial à Dra. Ismênia Campelo e ao Dr. Rutson Castro.

Aos colegas da 14ª Vara do Trabalho, local onde adquiri relevente experiência, mas, sobretudo, conheci pessoas maravilhosas. Jorge, Tércio, Cris, Jeane, Luzia, Denise, Gilberto, Renan, Paulo(s), Sarinha, muito obrigada.

Ao Gabinete do Des. Paulo Ponte, ambiente que me acolheu e me proporciona conhecimento e amizade diária. Obrigada, Des. Paulo Ponte, Fernando, Daniel, Matheus, Ronald, Germano, Michelle, Valdiane, Luciana, Natália, Rayssa e Florence.

Ao admirado e querido Prof. William Marques, exemplo de professor, coordenador, orientador e pessoa, quem exala eficiência, caráter e alegria, serei sempre grata.

Ao mestrando Tarcísio Rocha Jr. e ao Prof. Álisson Melo, obrigada pela disponibilidade e interesse em participar de minha banca.

A todos que não foram citados, mas que me tocaram de alguma forma.

Por fim, a ela, que merece não só outro, mas infinitos agadecimentos, obrigada, mãe, por fazer tudo ser possível em minha vida de um jeito simples e repleto de amor.

Uma vez me disseram que sou aquela que mais ama e a mais amada. Será? Não sei, mas, por acaso ou não, é assim que me sinto ao agradecer tantas pessoas especiais.

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“Que a gente possa ser mais irmão, mais amigo, mais filho e mais pai ou mãe, mais humano, mais simples, mais desejoso de ser e fazer feliz.”

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RESUMO

Aborda-se o instituto da adoção intuitu personae, também conhecida como “adoção dirigida”,

modalidade adotiva em que o consentimento dos pais biológicos ou do representante legal para a colocação do criança ou do adolescente em adoção ocorre vinculado à indicação da família substituta do menor, independentemente da disposição do art. 50 do Estatuto da Criança e do Adolescente, introduzida pela Lei nº 12.010/09, que impõe o cadastro de interessados em adotar. Procura-se evidenciar, sob perspectivas social, doutrinária e jurisprudencial, a sua legitimidade no ordenamento jurídico brasileiro, por assegurar o melhor interesse do menor, verificado, sobretudo, pela presença de socioafetividade. Para tanto, aborda-se a aplicabilidade, os entraves para emprego e a utilidade da adoção intuitu personae.

Ademais, precedentes do Tribunais Superiores são apreciados, como forma de sustentar a aplicabilidade da adoção intuitu personae, a importância da socioafetividade e a viabilidade

da inobservância do cadastro de adotantes.

Palavras-chave: Adoção intuitu personae. Cadastro de interessados em adotar. Melhor

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ABSTRACT

It analyses the institute of intuitu personae adoption, also known as “direct adoption”, a type

of adoption in which the biological parents, or the child’s legal guardian, indicates, concomitantly with their manifestation of giving the minor to adoption, the substitutive family, independently of the legal rule of Child and Adolescent Statute (ECA), that imposes, by Law nº 12.010/2009, the adoption cadastre. It purposes to defend, from social, doctrinal and jurisprudencial perspetives, the legitimacy of that institute in Brazilian legal system, mainly because it achieves the best interests of the minor, demonstrated, especially, by the presence of socioaffectivity. It studies, therefore, the applicability, the obstacles and the benefitis of the intuitu personae adoption. Moreover, decisions of the Brazilian Courts are

analyzed to demonstrate the application of this type of adoption, the importance of socioaffectivity in the relationship and the possibility of the adoption cadaster violation.

Keywords: Intuitu personae adption. Adoption Cadastre. Best interests of the minor.

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SUMÁRIO

1. INTRODUÇÃO ... 12

2. INSTITUTO JURÍDICO DA ADOÇÃO ... 14

2.1 CONSTRUÇÃO HISTÓRICA ... 14

2.1.1 Evolução Legislativa no Brasil ... 16

2.2 ANÁLISE CONCEITUAL E NATUREZA JURÍDICA ... 19

2.3 PRINCÍPIOS HERMENÊUTICOS APLICADOS À ADOÇÃO ... 21

2.3.1 Princípio da Dignidade da pessoa humana ... 22

2.3.2 Princípio da proteção integral e prioritária ... 23

2.3.3 Princípio do superior interesse do menor ... 25

2.3.4 Princípio da afetividade ... 26

3. ADOÇÃO INTUITU PERSONAE ... 28

3.1 DIREITO À CONVIVÊNCIA FAMILIAR ... 28

3.2 PROCEDIMENTO ADOTIVO ... 30

3.3 ADOÇÃO INTUITU PERSONAE: ASPECTOS GERAIS ... 33

3.4 VIABILIDADE DE APLICAÇÃO ... 35

3.5 ÓBICE À UTILIZAÇÃO ... 37

3.6 UTILIDADE DO INSTITUTO ... 41

4. ANÁLISES DE CASOS DOS TRIBUNAIS SUPERIORES ... 44

4.1 STJ–RESP Nº 1.172.067MG ... 44

4.2 STJ-RESP Nº 1.308.689RN ... 47

4.3 STF-AI Nº 746096MG ... 48

5. CONSIDERAÇÕES FINAIS ... 51

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1. INTRODUÇÃO

A adoção é um instituto do Direito das Famílias, que vem se modificando com relevantes alterações, não só em sua regulamentação, mas também em seus fins e efeitos no ordenamento jurídico brasileiro. Na vigência da legislação atual, a criança e o adolescente são vistos como sujeitos de direitos em constante desenvolvimento, predominando a doutrina da proteção integral e prioritária infanto-juvenil, a vedação de referências discriminatórias e a prevalência da socioafetividade. Assim, a adoção passa a ter a pespectiva de privilegiar os interesses dos menores com o intuito de efetivar o direito constitucional à convivência familiar, pautada no afeto, indispensável para o desenvolvimento pleno das crianças e dos adolescentes e para a consagração dos demais direitos fundamentais.

Diante desse cenário, o presente trabalho se propõe a estudar a aplicabilidade e a utilidade da modalidade adotiva intuitu persone, em que os pais biológicos ou o representante

legal da criança ou do adolescente escolhem a família substituta de seus filhos ou representandos previamente ao pedido de adoção judicial, independente da disposição do art. 50 do Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), com novo teor dado pela Lei nº 12.010/09, que impõe o cadastro de interessados em adotar. Tal temática torna-se relevente, sobretudo, tendo em vista que esse tipo de adoção, embora represente uma forma de efetivar o melhor interesse do menor, principalmente quando presente o vínculo afetivo entre os adotantes e o menor, tem sua legalidade contestada por muitos aplicadores do direito. Dessa forma, será utilizado o método descritivo analítico, desenvolvido através de análise social, doutrinária e jurisprudencial sobre o tema para analisar a legitimidade e utilidade da adoção

intuitu personae no ordenamento jurídico vigente.

Na seção 2, como forma introdutória, aborda-se a construção histórica do instituto da adoção, desde sua utilização nas civilizações antigas até sua aplicação na sociedade contemporânea, incluindo a evolução legislativa brasileira. São feitas também análises do conceito e da natureza jurídica da adoção, bem como ponderações sobre relevantes princípios hermenêuticos aplicados ao instituto, como proteção integral e prioritária infanto-juvenil, superior interesse do menor e afetividade.

Na seção 3, adentra-se à temática do presente estudo, a adoção intuitu personae,

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aplicação no ordenamento jurídico pátrio. Empós, a utilidade desse instituto para a sociedade brasileira é contemplada, como forma de expor os benefícios que a aplicabilidade da adoção

intuitu personae acarreta e a necessidade de regulamentação expressa para assegurar sua

legitimação.

Por fim, na seção 4, foram apreciados julgados dos Tribunais Superiores, os quais servem de precedentes para a aplicabilidade da adoção intuitu personae e para a viabilidade

(14)

2. INSTITUTO JURÍDICO DA ADOÇÃO

A adoção, no ordenamento jurídico brasileiro, representa uma modalidade de colocação permanente do infante em lar substituto, tendo como características peculiares, que a diferenciam das outras formas de inserção em família substituta, guarda e tutela, a irrevogabilidade e o estabelecimento do parentesco civil definitivo entre o adotante e o adotado, extinguindo os vínculos da família de origem, o que garante a inserção plena na nova família.

Toda criança tem o direito de ser criada e desenvolver-se no seio de sua família, devendo, sempre que possível, manter os vínculos com os parentes naturais, conforme dispõe o art. 19 do Estatuto da Criança e do Adolescente1. Entretanto, há situações em que a inserção de menores em lar substituto é medida que se impõe, geralmente quando a permanência no seio da família natural seja inviável ou traga alguma situação de risco para o infante.

Assim, a adoção, após modificações teóricas e legislativas, apresenta-se como meio alternativo e excepcional de criação de grau de parentesco equivalente ao natural, estabelecendo os mesmos efeitos da filiação natural e garantindo a efetivação do direito fundamental à convivência familiar.

Nessa seção, serão abordados alguns aspectos gerais referentes à adoção, analisando-se sua evolução histórica, conceito, natureza jurídica e relevantes princípios hermenêuticos aplicados, objetivando introduzir a temática adoção intuitu personae.

2.1 Construção histórica

O instituto da adoção já se fazia presente nos sistemas jurídicos das civilizações antigas, sendo mencionada, por exemplo, nos Códigos de Hamurabi e Manu, na Mesopotâmia e na sociedade Hindu, no Deuteronômio, na Grécia Antiga e em Roma. Embora com fundamentos e regras distintos, fora instituído, basicamente, com a finalidade de dar filhos a quem não podia tê-los para, sobretudo, perpetuar a linhagem familiar e manter os cultos

1Art. 19. Toda criança ou adolescente tem direito a ser criado e educado no seio da sua família e,

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religiosos e domésticos dos ancestrais. Para demonstrar a importância desse instituto na Antiguidade, relevante o que leciona Foustel de Coulanges2:

O dever de perpetuar o culto doméstico foi o princípio do direito de adoção entre os antigos. A mesma religião que obrigava o homem a casar, que determina o divórcio em caso de esterilidade, que, em caso de impotência ou morte prematura, substituía ao marido um parente, oferecia ainda à família um último recurso para escapar à desgraça tão temida de extinção: esse recurso era o direito de adotar.Adotar um filho era, pois, olhar pela perpetuidade das oferendas fúnebres, pelo repouso dos nomes dos antepassados.

No direito romano, salienta-se que a adoção, além da incumbência familiar e religiosa de evitar a extinção da linhagem familiar e manter os cultos aos antepassados quando não se pudesse deixar descendentes, passou a ter outras finalidades e efeitos, como o viés político ao permitir que o adotado obtivesse a cidadania romana, transformando-o de plebeu em patrício, se fosse o caso, uma vez que adquiria os direitos políticos do pai adotivo, existindo inclusive imperadores romanos adotados. A adoção era utilizada ainda para deslocar de uma família para outra a mão de obra excedente, o que lhe dava também um viés econômico. 3

Em relação à legislação de Roma, ressalta-se que, no Direito Romano Clássico, existia uma modalidade de adoção que extinguia todos os vínculos do adotado com a família de origem, chamada de adoptio, regra recorrente nos ordenamentos jurídicos atuais.

Durante a Idade Média, ocorreu um retrocesso na utilização do instituto da adoção em decorrência, em suma, dos títulos nobiliárquicos serem transmitidos apenas jure sanguinis

e em virtude de concessão real. Tal fato condizia ainda com os interesses econômicos da época, já que os senhores feudais e a Igreja recebiam os bens das pessoas que morriam sem descendentes. Ademais, a ascendência do cristianismo impôs o culto ao matrimônio e ao batismo, o que desestimulava a adoção. Nessa época, aos adotados não era garantido quase nenhum direito.

Somente com o advento do Código de Napoleão, na França, em 1804, é que a adoção voltou a ser vista como ato jurídico de grande relevância, influenciando vários diplomas legais ocidentais. O instituto tinha natureza essencialmente contratual, submetido a estritos requisitos para que pudesse adquirir validade plena, pois era exigido não só o

2COULANGES, Numa Denis Fustel de. A cidade antiga. Trad. Fernando de Aguiar. 5. ed. Lisboa: Clássica,

1941, p. 77-78.

3BORDALLO, Galdino Augusto Coelho. Adoção. In: MACIEL, Kátia Regina Ferreira Lobo Andrade (Coord.).

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consentimento das partes para seu aperfeiçoamento, mas também se requeria rigoroso trâmite processual subsequente, além de conferir amplos direitos ao adotado. 4

Assim, a adoção consagrou-se como instituto do Direito Civil e passou a ter grande relevância nos ordenamentos jurídicos, passando por recorrentes alterações. Atualmente, é vista sob a ótica da primazia dos direitos humanos e da proteção integral e prioritária do menor, sendo seu principal intuito efetivar o direito de convívio familiar das crianças e dos adolescentes, estando estas, e não as famílias sem descendentes ou os pais sem filhos, em primeiro plano. Nesse diapasão, a visão de Galdino Bardallo5:

Com seu retorno aos textos legais, a adoção transformou-se em mecanismo para dar filhos a quem não podia tê-los. Com o passar dos tempos, seu sentido se alterou, passando, nos dias de hoje, a significar o dar uma família a quem não a possui. Podemos efetivamente afirmar que a adoção evoluiu de um caráter potestativo para um caráter assistencialista.

Com essa nova visão, hodiernamente, as legislações sobre adoção vem passando por modificações, consagrando, por exemplo, a socioafetividade e permitindo adoções por casais homoafetivos, com o escopo de concretizar, sobretudo, o melhor interesse do menor.

2.1.1Evolução legislativa no Brasil

Como colônia de Portugal, a adoção, no Brasil, foi regulamentada pelas Ordenações do Reino, segundo a legislação portuguesa, até o advento do Código Civil de 1916, entretanto, durante essa época, sua ocorrência era ínfima.

O Código Civil de 1916 passou a regular a chamada adoção simples, realizada por escritura pública e que, entre seus efeitos, limitava o vínculo de parentesco ao adotante e ao adotado, mantendo, portanto, ainda os laços naturais com a família de origem. Trazia também requisitos para sua utilização, como o limite mínimo de idade para o adotante, em sua redação original, de 50 (cinquenta) anos e, posteriormente, com as alterações da Lei nº 3.133/57, de 30 (trinta) anos, além da necessidade de pelo menos 5 (cinco) anos de casado, entre outras exigências.

4 PALHEIRO, Renata Di Magi. Adoção intuiutu personae. 2011. 64 f. Monografia (Pós-graduação em Direito).

Escola de Magistratura do Estado do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro. Disponível em: <www.emerj.rj.gov.br>. Acesso em: 05 dez 2014.

5 BORDALLO, Galdino Augusto Coelho. Adoção. In: MACIEL, Kátia Regina Ferreira Lobo Andrade (Coord.).

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Pela análise de seus dispositivos, percebe-se que o instituto tinha um caráter meramente contratual, não existindo uma preocupação com os interesses dos menores, admitindo a desigualdade entre os filhos adotivos e os legítimos, além de possibilitar posterior extinção do vínculo de filiação, o que representava grandes entraves para a prática adotiva.

Diante desse cenário, a Lei nº 4.655/65 inovou com uma nova modalidade de adoção, a legitimação adotiva, a qual dependia de decisão judicial, era irrevogável e fazia cessar o vínculo de parentesco com a família natural. Entretanto, sua aplicação era limitada à adoção de crianças de até 7 (sete) anos, salvo se a criança já convivesse com os adotantes.

Domingos Abreu6 ressalta outra importante inovação de tal lei ao possibilitar a adoção de crianças em situação irregular (fora da alçada da família biológica), visto que anteriormente só era possível adotar crianças em situações regulares, ou seja, aquelas que se encontravam sob o pátrio poder dos pais biológicos.

O Código de Menores, Lei nº 6.697/79, instituiu a chamada adoção plena, que veio a substituir a legitimação adotiva, sem grandes alterações. Assim, passou a existir duas modalidades de adoção: a adoção simples, aplicada aos menores de 18 (dezoito) anos por meio de escritura pública precedida de autorização judicial, regulada pelo Código Civil, no que coubesse, e a adoção plena, aplicada aos menores de 7 (sete) anos em situação irregular, mediante procedimento judicial e regulada pelo Código de Menores. Ressalta-se que esta modalidade de adoção passou a conferir efeitos relevantes como a irrevogabilidade e o rompimento de todos os vínculos com a família biológica.

Antes da promulgação da Constituição de 1988, vigorava o modelo de família matrimonial, tutelando-se, basicamente, apenas as entidades familiares constituidas pelo casamento civil. Em decorrência, havia clara distinção entre filhos legítimos e ilegítimos, naturais e adotivos, existindo, portanto, um único modelo de família e diferentes espécies de filiação, o que representava verdadeiro retrocesso incondizente com a realidade social. Com a atual Carta Magna, ampliou-se o conceito de família, que, em conformidade com o artigo 266, passou a ser, independente da sua constituição, comunidade fundada na igualdade e no afeto recíproco, passando-se a tutelar as diversas formas de entidades familiares, como a união estável, a família monoparental, a família homoafetiva e a família substituta, além de abolir qualquer distinção entre seus membros.

6 ABREU, Domingos. No Bico da Cegonha: histórias da adoção e da adoção internacional. 1. ed. Rio de

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Em relação à filiação, a igualdade entre filhos biológicos e adotivos foi consagrada ao ser determinado, no art. 227, § 6º, da Constituição Federal, que os filhos, havidos ou não da relação do casamento, ou por adoção, terão os mesmos direitos e qualificações, vedando qualquer tipo de discriminação. Assim, a paridade entre filiação biológica e adotiva passa a ser imperativo constitucional, garantindo aos filhos por adoção todos os direitos dos filhos biológicos, como nome, parentesco, sucessão, alimentos, educação, assistência, entre outros.

Ademais, o texto constitucional consagrou como princípios fundamentais a dignidade da pessoa humana e a proteção integral da criança e do adolescente, o que impõe a primazia do melhor interesse do menor em todo o procedimento adotivo. Doravante, a adoção passa a ter como norte a busca de uma família para uma criança, colocando o menor, possuidor do direito à convivência familiar, no centro da atuação estatal, quebrando o paradigma de enfocar os interesses dos adotantes, como na vigência da legislação anterior. 7

Nesse contexto, a Lei nº 8069/90 instituiu o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), revogando o Código de Menores e extinguindo a figura da adoção simples, além de reiterar a igualdade entre filiação biológica e adotiva e a proteção integral da criança e do adolescente. A adoção, independentemente da idade do adotado, passa a ter como efeito a extinção do vínculo com a família biológica do menor (exceto os impedimentos para o matrimônio) e a criação de vínculos com toda a família do adotante, impondo ainda todos os direitos e obrigações inerentes à filiação, o que propicia a real inserção de forma total e definitiva do filho por adoção na nova família, passando a ter, assim, a adoção um único efeito de plenitude. Dessa forma, a adoção de crianças e adolescentes ficou sendo regulada pelo ECA, precedida de procedimento judicial, enquanto a adoção de maiores pelo Código Civil, mediante escritura pública.

O Código Civil de 2002 determinou novos regramentos em relação à adoção, como a imposição de idade mínima para adotar de 18 (dezoito) anos e a exigência do procedimento judicial para qualquer tipo de adoção, seja de menores ou maiores. Ocorre que a Lei nº 12.010/09, conhecida como Lei Nacional da Adoção, revogou o capítulo sobre adoção do codex, passando este, atualmente, a ter apenas dois dispositivos, os quais determinam

basicamente que a adoção de crianças e adolescentes será regida pelo ECA e que a adoção de maiores deverá ocorrer mediante procedimento judicial, sendo aplicadas, no que couberem, as

7 DIAS. Maria Berenice. Manual de Direito das Famílias. 8. ed. rev. atual. e ampl. São Paulo:Revista dos

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regras do estatuto. Dessa forma, o ECA passou a compilar praticamente todos os dispositivos sobre a adoção, unificando, assim, sua regulamentação.

A lei nº 12.010/09 trouxe outras modificações e inovações ao ECA em relação à adoção com o intuito, segundo as razões legislativas, de realizar uma adequação ao instituto, atualizando-o e tentando melhorar, não só os dispositivos sobre adoção, mas as políticas públicas realizadas com a finalidade de garantir a convivência familiar. 8 Entretanto, embora, no geral, tenha representado um grande avanço, algumas dessas alterações representam, na verdade, entraves para se alcançar o melhor interesse do menor.

Foram mais de 200 (duzentos) dispositivos modificados, dentre eles, um de grande relevância foi a determinação do § 1º do art. 39 do ECA9 de que a adoção deve ser medida excepcional, só sendo utilizada quando esgotados os esforços para manutenção da criança na família natural ou extensa, definida como sendo a família constituída pelos parentes próximos do menor. Embora seja um mandamento louvável por evitar a institucionalização dos menores e por mantê-los no seio de sua família de origem, faz-se necessário trazer as colocações de Paulo Lôbo10 no sentido de que condicionar a adoção ao interesse prévio de parentes pode impedir ou limitar a criança de inserir-se em ambiente familiar completo, pois, em vez de contar com pai e mãe adotivos, acolhido pelo desejo e pelo amor, será apenas um parente acolhido por outro, sem constituir relação filial.

Outras importantes inovações foram a consagração do direto da criança e do adolescente ao conhecimento de sua origem biológica e a imposição do cadastro prévio de interessados em adotar no procedimento adotivo. Tais dispositivos serão abordadas posteriormente por serem relevantes à temática do presente trabalho.

2.2 Análise conceitual e natureza jurídica

O instituto da adoção passou por mudanças significativas tanto na sua finalidade como na sua regulamentação, ocasionando certa dificuldade em conceituá-lo.

O termo adoção, etimologicamente, tem origem do latim adoptio, significando a

expressão em português “tomar alguém como filho”, assim, a ideia de ser a adoção uma forma

8 BORDALLO, Galdino Augusto Coelho. Adoção. In: MACIEL, Kátia Regina Ferreira Lobo Andrade (Coord.).

Curso de direito da criança e do adolescente: aspectos teóricos e práticos. 5. ed. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2011, p. 202.

9 Art. 39. A adoção de criança e de adolescente reger-se-á segundo o disposto nesta Lei. § 1º A adoção é medida

excepcional e irrevogável, à qual se deve recorrer apenas quando esgotados os recursos de manutenção da criança ou adolescente na família natural ou extensa, na forma do parágrafo único do art. 25 desta Lei.

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de criação de uma relação de filiação, a qual confere a alguém o estado de filho, sempre foi corrente, mas com efeitos específicos de cada época e as peculiaridades dos ordenamentos jurídicos vigentes.

Quando o Código Civil Brasileiro de 1916 estava em vigor, a adoção era considerada como um ato solene, bilateral com um viés contratual, podendo ser registrada por escritura pública. Clóvis Beviláqua11, autor do projeto de lei do codex, define o instituto da adoção como ato civil pelo qual alguém aceita um estranho na qualidade de filho. No mesmo sentido, Silvio Rodrigues12 entende a adoção como o ato do adotante, pelo qual traz ele, para a sua família e na condição de filho, pessoa que lhe é estranha.

Percebe-se que as definições retromencionadas colocam o adotante no centro da adoção, significando, na essência, a busca de uma criança para uma família. Com a doutrina da proteção integral infanto-juvenil e a vedação das referências discriminatórias instituída pela Constituição de 1988, a adoção passou a ter uma nova perspectiva, como já abordado, invertendo o enfoque anteriormente dado, passando a privilegiar o interesse dos menores, significando muito mais, de acordo com Maria Berenice Dias13, a busca de uma família para uma criança.

Assim, com o advento da Carta Magna de 1988, passou a ser instituto de ordem pública, exigindo sentença judicial para se constituir e produzir seus efeitos, e por consequência passou a ser considerado ato complexo por depender de procedimento judicial assistido pelo Poder Público. 14

Orlando Gomes15 conceitua adoção como ato jurídico pelo qual se estabelece, independentemente de procriação, o vínculo da filiação, afirmando que se trata de ficção legal, que permite a constituição, entre duas pessoas, do laço de parentesco do primeiro grau na linha reta.

Da mesma forma, Caio Mário da Silva Pereira16 a define como sendo o ato jurídico pelo qual uma pessoa recebe outra como filho, independentemente de existir entre elas qualquer relação de parentesco consanguíneo ou afim.

11 BEVILÁQUA, Clóvis. Direito de Família. Edição histórica. Rio de Janeiro: Rio, 1976, p. 473. 12 RODRIGUES, Silvio. Direito civil. 27. ed. São Paulo: Saraiva, 2002, p. 380.

13 DIAS. Maria Berenice. Manual de Direito das Famílias. 8. ed. rev. atual. e ampl. São Paulo: Editora Revista

dos Tribunais, 2011, p. 483-484.

14 GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito Civil Brasileiro: Direito de Família. São Paulo: Saraiva, 2009, p.

342.

15 GOMES, Orlando. Direito de família. 14. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2001, p. 369.

16 PEREIRA, Caio Mário da Silva. Instituições de direito civil. Atualização de Tânia Pereira da Silva. 14. ed.

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A adoção é definida ainda por Arnoldo Wald17 como uma ficção jurídica que cria o parentesco civil, através de um ato jurídico bilateral que gera laços de paternidade e filiação entre pessoas para as quais tal relação inexiste naturalmente.

Por fim, na concepção de Pontes de Miranda18, a adoção é o ato solene pelo qual se cria entre o adotante e o adotado relação fictícia de paternidade e filiação.

Pelos aspectos analisados, pode-se afirmar que a adoção significa ato complexo que, após sentença judicial, cria, no mundo jurídico, um vínculo de filiação civil de igual valor à filiação biológica de forma irrevogável e plena, mas mais que isso é (deve ser) um ato repleto de amor e responsabilidade pelo fato de o adotante assumir as obrigações e deveres da paternidade por opção, além de ter que propiciar um ambiente familiar pautado na afetividade, onde a criança possa desenvolver-se de forma adequada.

2.3 Princípios hermenêuticos aplicados à adoção

O ordenamento jurídico brasileiro consagrou aos princípios certo grau de normatividade, dando-os caráter de norma jurídica potencializada e predominante, uma vez que se apresentam como diretrizes que incorporam os valores fundamentais do Estado e auxiliam na interpretacão e na aplicação das normas jurídicas diante da evolução social. Eles são considerados o alicerce do ordenamento, dando identidade ideológica e ética ao sistema jurídico, além de unidade e coerência.

Sobre a importância dos princípios, Celso de Mello19 aduz que violá-los é muito mais grave que transgredir uma norma, visto que a desatenção ao princípio implica ofensa não apenas a um específico mandamento obrigatório, mas a todo o sistema de comando. Acrescenta ainda que a violação principiológica é a mais grave forma de ilegalidade ou inconstitucionalidade, conforme o escalão do princípio atingido, porque representa insurgência contra todo o sistema, subversão de seus valores.

Pelos aspectos analisados, necessário se faz abordar os princípios hermenêuticos aplicados à adoção, já que eles devem nortear tanto a interpretação como a aplicação das normas jurídicas sobre o tema. Ressalta-se que todos estão expressos na Constituição Federal

17 WALD, Arnoldo. Curso de direito civil brasileiro: o novo direito de família, 14. ed. São Paulo: Saraiva,

2002, p. 269.

18 MIRANDA, Pontes de. Tratado de Direito de Família. v. III. Atualizado por Vilson Rodrigues Alves.

Campinas: Bookseller, 2001, p. 217.

19 MELLO, Celso Antônio Bandeira de. Curso de Direito Administrativo. 12. ed. São Paulo, Malheiros, 2000,

(22)

ou são decorrência lógica das disposições constitucionais, como o princípio da afetividade, o que os tornam ainda mais relevantes.

2.3.1 Princípio da Dignidade da pessoa humana

A Carta Magna consagrou a dignidade da pessoa humana como princípio fundamental do Estado Democrático de Direito e da ordem jurídica no seu art. 1°, inc. III, enquadrando-a entre os fundamentos da República Federativa do Brasil. Outrossim, diante de sua relevância, é considerada também como a base axiológica da constituição e de todos os direitos fundamentais, colocando a pessoa humana no centro protetor de todo o ordenamento jurídico. Ressalta-se que representa não apenas um limite à atuação do Estado, mas um norte para sua atuação positiva, impondo uma atuação estatal voltada para sua efetivação. 20

Em relação aos menores, a Constituição Federal, no art. 227, caput, estendeu a

responsabilidade pela efetivação da dignidade das crianças e adolescentes, além do Estado, à sociedade e a todos os membros da família, já que esses últimos exercem uma grande influência para a existência digna dos infantes, por ser a família o centro do desenvolvimento infanto-juvenil.

Art. 227. É dever da família, da sociedade e do Estado assegurar à criança, ao adolescente e ao jovem, com absoluta prioridade, o direito à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária, além de colocá-los a salvo de toda forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão.

O ECA ressalta ainda, no art. 1821, como dever de todos o zelo pela dignidade da criança e do adolescente, pondo-os a salvo de qualquer tratamento desumano, violento, aterrorizante, vexatório e constrangedor, ou seja, o combate aos abusos cometidos contra menores é um dever da sociedade.

Pelo exposto, as crianças e os adolescentes são vistos como sujeitos de direitos e pessoas em processo de desenvolvimento, sendo necessário efetivar as garantias fundamentais inerentes a eles com absoluta prioridade para lhes garantir uma vida digna, sendo dever do Estado, da sociedade e, principalmente, da família.

20 DIAS, Maria Berenice. Manual de Direito das Famílias. 8. ed. rev. atual. e ampl. São Paulo: Editora Revista

dos Tribunais, 2011, p.63.

21 Art. 18. É dever de todos velar pela dignidade da criança e do adolescente, pondo-os a salvo de qualquer

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No âmbito da adoção, a dignidade da pessoa humana deve nortear todo o procedimento adotivo, tendo em vista, a título de exemplo, que a morosidade e a institucionalização priva as crianças e os adolescentes do direito à convivência familiar e comunitária, além das instituições de abrigo, na maioria das vezes, não apresentarem condições adequadas para o desenvolvimento digno dos menores. Ademais, o Judiciário, ao julgar procedente uma ação de adoção, deve ter a convicção que a nova família do menor garantir-lhe-á uma vida digna com, sobretudo, laços de amor e afeto e condições mínimas de existência.

2.3.2 Princípio da proteção integral e prioritária

A proteção integral e prioritária das crianças e dos adolescentes passa a ser imperativo constitucional no Brasil com o advento do art. 227 da Carta Magna de 1988. Como visto anteriormente, tal dispositivo determina que o Estado, a sociedade e a família são corresponsáveis por assegurar à criança e ao adolescente, com absoluta prioridade, o direito à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária, além de colocá-los a salvo de toda forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão.

Em consonância com o texto constitucional, o ECA consagra tal princípio em toda sua estrutura e disposições, consolidando a chamada doutrina da proteção integral das crianças e dos adolescentes no sistema jurídico brasileiro.

Ressalta-se que, no âmbito internacional, a ideia da proteção integral e prioritária à infância já vinha sendo articulada há tempos. Em 1948, a Declaração Universal dos Direitos do Homem trazia, em seu art. 25, que a maternidade e a infância têm direito a cuidados especiais, sendo reafirmada na Declaração Universal dos Direitos da Criança e na Convenção das Nações Unidas sobre os Direitos da Criança.

Segundo a doutrina da proteção integral, os menores de 18 (dezoito) anos assumem o status de pessoas em desenvolvimento, diante de sua fragilidade e dependência,

sendo dever de todos garantir suas necessidades, velando por seus direitos, com o objetivo de assegurar-lhes o desenvolvimento físico, mental, moral, espiritual e social adequados, em condições de liberdade e dignidade.

(24)

lhes permitam construir suas potencialidades humanas em sua plenitude. 22 Nesse diapasão, mister trazer as seguintes considerações:

A proteção integral tem como fundamento a concepção de que crianças e adolescentes são sujeitos de direitos, frente à família, à sociedade e ao Estado. Rompe com a ideia de que sejam simples objetos de intervenção no mundo adulto, colocando-os como titulares de direitos comuns a toda e qualquer pessoa, bem como de direitos especiais decorrentes da condição peculiar de pessoas em processo de desenvolvimento. 23

Dessa forma, a criança e o adolescente devem ser tratados com prioridade tanto na atuação estatal, como no seio familiar e social, devendo existir uma verdadeira cooperação para que seus direitos fundamentais sejam efetivados, possibilitando a criação de uma conjuntura com condições de se desenvolverem de forma plena e apropriada.

Ademais, importante frisar que, como leciona José Afonso da Silva24, não basta que os direitos fundamentais, em um Estado Democrático de Direito, sejam legalmente previstos, necessário se faz que sejam efetivados de maneira eficaz.Em relação a crianças e adolescentes, a eficácia desses direitos está extremamente ligada ao tempo e modo como são realizados, uma vez que a sua não efetivação ou mesmo a demora em garantí-los pode afetar o desenvolvimento da personalidade destes, o que condiz com a necessidade da tutela integral e prioritária da infância e da juventude.

Assim, de acordo com esse princípio, os assuntos e as querelas que envolvam crianças e adolescentes devem prevalecer diante dos demais, uma vez que a morosidade em solucioná-los afeta diretamente o desenvolvimento físico, educacional, moral e espiritual do menor. Em relação à adoção, tal prioridade assume uma importância ainda maior, uma vez que a institucionalização e o procedimento adotivo por si só já os lesionam de maneira imensurável, o que torna indispensável o tratamento imediato e absoluto.

22 MACHADO, Marta de Toledo. A Proteção Constitucional de Crianças e Adolescentes e os Direitos

Humanos. 1. ed. Barueri-SP: Manole, 2003, p. 108 -109.

23 CURY, Munir; PAULA, Paulo Afonso Garrido de; MARÇURA, Jurandir Norberto. Estatuto da criança e do

adolescente anotado. 3. ed., rev. E atual. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2002, p. 21.

24 AFONSO DA SILVA, José. Curso de Direito Constitucional Positivo. 19. ed. São Paulo: Malheiros, 2000,

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2.3.3 Princípio do superior interesse do menor

A origem desse princípio remota ao instituto inglês parens patrie, pelo qual o Rei

poderia intervir nos interesses daqueles indivíduos juridicamente limitados, que não podiam fazê-lo por conta própria. 25

No direito brasileiro, embora previsto no Código de Menores, sua utilização se limitava a crianças em situação irregular, por isso sua real incorporação ao ordenamento jurídico apenas ocorreu com a ratificação da Convenção Internacional sobre os Direitos da

Criança de 1989, que dispõe em seu art. 3º, I, que “todas as ações relativas às crianças,

levadas a efeito por instituições públicas ou privadas de bem estar social, tribunais, autoridades administrativas ou órgãos legislativos devem considerar, primordialmente, o

maior interesse da criança”, e com a adoção da doutrina da proteção integral e prioritária com a promulgação da Constituição vigente, estendendo sua aplicação, no Brasil, a todo público infanto-juvenil.

Assim, o princípio do melhor interesse do menor deve nortear todo o sistema jurídico nacional, servindo como orientação tanto para o legislador, quando da criação de normas, tanto para o aplicador do direito, quando da utilização e da interpretação normativa. As crianças e os adolescentes, vistas como pessoas em desenvolvimento em situação de vulnerabilidade, devem ter as normas criadas, aplicadas e interpretadas em seu favor com o intuito de efetivar sua proteção integral, em prioridade, ou seja, caso exista conflitos de interesses entre uma criança e um adulto, deve prevalecer, em regra, o interesse daquela. Da mesma forma, caso exista a possibilidade de mais de uma interpretação legal, deve ser utilizada a que maximize o interesse do menor.

Tal princípio tem grande relevância, sobretudo, nos litígios de natureza familiar e, em especial, nos processos adotivos. O melhor interesse do menor deve prevalecer em todas as fases do procedimento de adoção e, principalmente, na prolação da sentença, sendo esta o fundamento utilizado por muitos juristas para aplicação do instituto da adoção intuitu

personae, tema deste trabalho.

25 PEREIRA, Tânia da Silva. O princípio do “melhor interesse da criança”: da teoria à prática. Revista

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2.3.4 Princípio da afetividade

A afetividade pode ser conceituada como sendo o mandamento axiológico fundado no sentimento protetor da ternura, da dedicação tutorial e das paixões naturais, não possuindo previsão legal expressa na legislação pátria. Ocorre que se considera o princípio da afetividade como corolário de outros princípios constitucionais, sobretudo, os princípios da dignidade da pessoa humana e da convivência familiar, recebendo também, portanto, proteção constitucional.

Paulo Lôbo 26 leciona que a Constituição vigente apresenta fundamentos

essenciais ao princípio da afetividade, qual sejam a igualdade entre os filhos, independente de sua origem, a adoção como escolha afetiva importando igualdade de direitos, a proteção dada à comunidade formada por qualquer dos pais e seus descendentes, incluindo-se os adotivos, garantindo-lhe a dignidade de família e a convivência familiar, e não a origem biológica, como prioridade absoluta assegurada à criança e ao adolescente.

Percebe-se, assim, que o princípio da afetividade está cada vez mais influente no Direito das Famílias, sendo o afeto reconhecido juridicamente, por exemplo, na igualdade entre filiação biológica e socioafetiva ou na posse do estado de filho, além de fundamentar a proteção dada à união estável. Nota-se que os laços de afeto assumem grande importância em detrimento dos aspectos biológicos e patrimoniais, anteriormente dominantes.

Nesse sentido, Maria Berenice Dias27 afirma que o afeto foi consagrado a direito fundamental com o advento da Constituição de 1988, ocorrendo, em virtude disso, a constitucionalização de um modelo de família eudemonista e igualitário, com maior espaço para o afeto e a realização individual. Assim, a ideia de família formal, cujo comprometimento mútuo decorre do casamento, vem cedendo à certeza de que é o envolvimento afetivo que garante um espaço de individualidade e assegura uma auréola de privacidade indispensável ao pleno desenvolvimento do ser humano. 28

Dessa forma, a afetividade passa a ser o centro das relações familiares, principalmente nas questões que envolvam crianças e adolescentes, por ser indispensável à estabilidade familiar, à comunhão de vida e ao desenvolvimento pessoal, passando a ter cada vez mais influência na doutrina e na jurisprudência pátria. Pode-se citar a condenação a danos

26LÔBO, Paulo. Direito Civil: Famílias. 4ª ed. São Paulo: Editora Saraiva, 2011. p. 71.

27 DIAS, Maria Berenice. Manual de Direito das Famílias. 8. ed. rev. atual. e ampl. São Paulo: Editora Revista

dos Tribunais, 2011, p. 71

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morais pelo abandono afetivo29 e a adoção realizada sob o fundamento de existir laços de afetividade entre o adotante e o menor, dispensando-se a ordem do cadastro de adotantes, temática abordada neste trabalho, como outros exemplos que demonstram a importância desse princípio.

Pelos aspectos analisados, considera-se o princípio da afetividade como norteador do Direito das Famílias contemporâneo, conduzindo a atuação tanto do Judiciário, como do Estado, da sociedade e da família. Entretanto, a aplicação desse princípio não deve ocorrer de forma absoluta e ilimitada diante do risco e prejuízos de o Direito se subordinar a juízos morais e subjetivos, devendo ser verificado em cada caso concreto.

29 CIVIL E PROCESSUAL CIVIL. FAMÍLIA. ABANDONO AFETIVO. COMPENSAÇÃO POR DANO

(28)

3. ADOÇÃO INTUITU PERSONAE

A adoção de menores, no Brasil, com as inovações da Lei nº 12.010/09 passou a ser regulada exclusivamente pelo ECA, determinando basicamente três fases para o procedimento de adoção: a habilitação e preparação psicossocial e jurídica, a inscrição no cadastro e o processo judicial. O intuito do legislador ao inserir o cadastro de interessados em adotar foi agilizar e facilitar o procedimento adotivo, além de dar mais segurança ao sistema. Ocorre que, na prática, há uma grande tendência a considerar a lista de preferência dos cadastrados como absoluta e não admitir a adoção por pessoas não inscritas ou fora da ordem, ressalvadas apenas as exceções legalmente previstas, o que, muitas vezes, impede a efetivação do direito à convivência familiar e ofende o princípio do melhor interesse do menor. Contudo, há doutrinadores e precedentes jurisprudenciais, inclusive nos Tribunais Superiores, em que, em prol do benefício do infante, sobretudo quando há laços de afetividade, relativiza-se a exigência do cadastro, admitindo-se a chamada adoção intuitu personae.

Assim, nesta seção serão estudados, primeiramente, o direito constitucional à convivência familiar e o procedimento adotivo vigente, para então abordar a viabilidade de aplicação da adoção intuitu personae, bem como os entraves para sua aplicação e a sua

utilidade ao ordenamento jurídico e à sociedade.

3.1 Direito à convivência familiar

Ao abordar a temática adoção, indispensável se torna abordar o direito fundamental infanto-juvenil à convivência familiar, positivado no art. 227 da Carta Magna e consagrado nos arts. 4º 30 e 16, inc. V31, e 19 32 do Estatuto da Criança e do Adolescente, uma

vez que é na família onde a criança e o adolescente encontram um ambiente propiciador da criação de laços afetivos e amorosos, viabilizando o desenvolvimento sadio da sua personalidade e dignidade humana, sendo ainda o centro da doutrina da proteção integral da criança e do adolescente.

30 Art. 4º. É dever da família, da comunidade, da sociedade em geral e do poder público assegurar, com absoluta

prioridade, a efetivação dos direitos referentes à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao esporte, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária.

31 Art. 16. O direito à liberdade compreende os seguintes aspectos (...)V - participar da vida familiar e

comunitária, sem discriminação.

32 Art. 19. Toda criança ou adolescente tem direito a ser criado e educado no seio da sua família e,

(29)

Ratifica-se que o conceito jurídico de família vem se modificando, deixando de se limitar à tradicional família composta de pai, mãe e filho, passando a abranger outras formas de entidades familiares, como famílias monoparentais e homoafetivas e comunidades formadas por indivíduos que são ou se consideram aparentados. Isso ocorre, sobretudo, pela importância dada à afetividade e por consequência ao convívio familiar e social, uma vez que o núcleo fundamental da família passou a ser o afeto, suporte de todo e qualquer relacionamento familiar.

Quando vigorava o antigo Código de Menores, a mera carência de recursos dos pais biológicos já era suficiente para destituir o poder familiar e institucionalizar o menor enquanto não se encontrava uma família substituta que pudesse lhe garantir uma vida com melhores condições. Entretanto, ficou demonstrado que a personalidade humana não se desenvolve, nas suas potencialidades mínimas e básicas, nas instituições de abrigo, basicamente porque a criança ou o adolescente não cresce de forma sadia e plena sem a constituição de um vínculo afetivo forte e verdadeiro, sendo indispensável o convívio familiar que possa lhe garantir a criação de laços de afeto, carinho e amor. 33

Assim, a legislação pátria passou a exaltar a necessidade da convivência em família, dando proteção especial à família natural, ao determinar, por exemplo, que a adoção seja medida excepcional, devendo ser aplicada apenas quando o melhor interesse do menor não possa ser alcançado no seio de sua família natural ou de sua família extensa, conforme o art. 25 do ECA, evitando ao máximo a institucionalização.

Ressalta-se que antes do ordenamento jurídico brasileiro versar sobre o direito à convivência familiar a Declaração Universal dos Direitos da Criança das Nações Unidas já o trazia com evidência, entre os princípios fundamentais, nos seguintes termos:

Para o desenvolvimento completo e harmonioso de sua personalidade a criança necessita de amor e compreensão. Criar-se-á, sempre que possível, aos cuidados e sob a responsabilidade dos pais e, em qualquer hipótese, em um ambiente de afeto e segurança moral e material; salvo circunstâncias excepcionais, a criança de tenra idade não será apartada da mãe. À sociedade e às autoridades públicas caberá a obrigação de propiciar cuidados especiais às crianças sem família e àquelas que carecem de meios adequados de subsistência. É desejável a prestação de ajuda social e de outra natureza em prol da manutenção dos filhos de famílias numerosas.

33 MACHADO, Martha de Toledo. A Proteção Constitucional de Criança e Adolescente e os Direitos

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Destacando a importância do convívio familiar, Tarcísio José Martins Costa assinala que o direito à convivência familiar, antes de ser um direito, é uma necessidade vital da criança, estando no mesmo patamar de importância do direito fundamental à vida. 34

Nesse diapasão, Izabel Enei ressalta que o direito primordial da pessoa em formação, criança ou adolescente, é o direito de crescer em família, base e pressuposto à aquisição de todos os demais direitos, à integridade física e psíquica, à liberdade, à educação, à proteção contra toda forma de opressão etc.35

Dessa forma, a adoção ganha grande relevância por representar uma possibilidade de a criança institucionalizada deixar de ter seu direito fundamental à convivência familiar violado, garantindo-lhe um ambiente em que poderá se desenvolver plenamente e firmar sua personalidade, além de assegurar-lhe um recinto para a efetivação dos demais direitos fundamentais.

3.2 Procedimento adotivo

O procedimento adotivo brasileiro, regulado pelo Estatuto da Criança e do Adolescente, sofreu relevantes alterações com a vigência da Lei nº 12.010/09, a Lei da Adoção. As mudanças aprimoraram o trâmite, representado grande avanço ao estabelecer, por exemplo, maior controle sobre o acolhimento institucional de crianças e adolescentes e o aperfeiçoamento da sistemática prevista para a garantia do direito à convivência familiar. Contudo, não foram solucionados muitos problemas recorrentes na legislação anterior, ainda existindo, após seis anos da vigência da lei, expressiva quantidade de crianças e adolescentes institucionalizados, aguardando um novo lar substituto, além de tal norma ter imposto certos regramentos que burocratizam o procedimento adotivo e dificultam o alcance do melhor interesse do menor. Como sustenta Maria Berenice Dias: 36

[...] a nova legislação, a qual tinha o objetivo de solucionar o problema de mais de 80 mil crianças e adolescentes institucionalizados à espera de um lar, não se presta para tal fim, porque, nada mais fez do que burocratizar e emperrar o direito à adoção de quem teve a desdita de não ser acolhido no seio de sua família biológica.

Na legislação atual, é imprescindível para qualquer modalidade de adoção a

34 COSTA, Tarcísio José Martins. Evolução histórica do direito da criança e do adolescente In MACIEL, Kátia

Regina Ferreira Lobo Andrade (coord.). Curso de direito da criança e do adolescente: aspectos teóricos e práticos. 4. ed. Rio de Janeiro: Editora Lúmen Júris, 2010, p.75.

35 ENEI, Isabel Cardoso da Cunha Lopes. Adoção intuitu personae. 2009. 95 f. Tese (Mestrado em Direito)

Universidade de São Paulo, São Paulo. Disponível em: <www.teses.usp.br>. Acesso em: 04 fev. 2015.

36 DIAS, Maria Berenice. O lar que não chegou. 2009. Disponível em: <www.ibdfam.org.br>. Acesso em: 22

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intervenção judicial, uma vez que o vínculo civil de filiação só se constitui, exclusivamente, por meio de sentença judicial. No caso de adoção de menores, via de regra, a competência é das Varas da Infância e da Juventude, salvo se existir Juízo especializado, exigindo-se, para o deferimento da demanda, fases e requisitos. Ressalta-se que o art. 141, §2º do ECA37 confere a ações judiciais da competência da Justiça da Infância e da Juventude a isenção de custas e emolumentos, salvo a hipótese de litigância de má-fé, assim, a ação de pedido de adoção é gratuita.

Dentre os requisitos, o ECA estabelece a idade mínima de 18 (dezoito) anos para os adotantes, sendo esse critério objetivo, não se admitindo a adoção por pessoas emancipadas; a estabilidade familiar, comprovada pelo estudo psicossocial realizada por equipe multidisciplinar; e a necessidade de diferença de dezesseis anos entre adotante e adotado. A disposição do art. 2938 do estatuto ainda exige que o adotante seja uma pessoa idônea, responsável e compatível com a natureza da medida, ou seja, este deve ter condições de proporcionar um ambiente familiar adequado para o menor, o que será verificado sobretudo pelos pareceres da equipe interprofissional.

A Lei da Adoção instituiu, no art. 5039, caput, do ECA, a criação de dois cadastros, um de pessoas interessadas em adotar, podendo ser definido como uma lista de pessoas com o intuito de receber, no seio de sua família, uma criança ou adolescente na condição de filho40, e outro cadastro de menores em condições de serem adotados.

Assim, o procedimento adotivo inicia-se com a chamada “habilitação”, momento em que a pessoa interessada deve requerer ao Juízo competente a habilitação no cadastro, devendo comprovar todos requisitos legais, como os retromencionados, juntando a lista de documentos previstos no art. 197-A. Somente após a verificação do preenchimento dos requisitos pessoais do requerente, do parecer técnico favorável da equipe especializada, elaborado com o intuito de verificar a capacidade e o preparo do postulante, o qual inclui uma preparação gradativa, e da manifestação positiva do Ministério Público, é que o pretenso adotante terá deferido a sua habilitação no cadastro de pessoas interessadas em adotar.

37 Art. 141. É garantido o acesso de toda criança ou adolescente à Defensoria Pública, ao Ministério Público e ao

Poder Judiciário, por qualquer de seus órgãos. § 2º As ações judiciais da competência da Justiça da Infância e da Juventude são isentas de custas e emolumentos, ressalvada a hipótese de litigância de má-fé.

38 Art. 29. Não se deferirá colocação em família substituta a pessoa que revele, por qualquer modo,

incompatibilidade com a natureza da medida ou não ofereça ambiente familiar adequado.

39 Art. 50. A autoridade judiciária manterá, em cada comarca ou foro regional, um registro de crianças e

adolescentes em condições de serem adotados e outro de pessoas interessadas na adoção.

40 HONORATO, Cássio Mattos. Adoção de crianças e adolescentes: princípios e a sentença que constitui o

(32)

Habilitado, o requerente terá que aguardar a sua convocação para a adoção, a qual será feita de acordo com a ordem cronológica de habilitação no cadastro e conforme a disponibilidade de crianças e adolescentes. Tal disposição é criticada por Eunice Granato41:

Ao estabelecer o art. 197-E que a convocação para a adoção será feita pela ordem cronológica da inscrição no cadastro dos pretendentes à adoção, retira do juiz e do corpo técnico a opção da entrega da criança ou do adolescente aos pretendentes que melhor atendam ao interesse da criança. Choca-se, também, com o direito que tem o adolescente de concordar ou não com a adoção por parte do candidato que está em primeiro lugar na fila. Poderá ele querer ser adotado por um casal que esteja em último lugar e com o qual melhor se adapta. Se os pretendentes que estão em primeiro lugar são um casal sexagenário, que aceita criança de qualquer idade, é justo que se entregue a ele o recém-nascido, que é desejado pelo casalzinho novo, que não pode ter filhos?

Após convocado e tendo interesse na criança ou no adolescente indicado, deverá ser realizado pedido de adoção por petição inicial, na qual se exige capacidade postulatória, dando, assim, início ao processo judicial propriamente dito.

Exige-se, nessa fase procedimental, o consentimento dos genitores, como previsto no art. 4542 do Estatuto, salvo apenas quando os pais sejam desconhecidos ou tenham sido destituídos do poder familiar, devendo ser expresso, de forma inequívoca, perante o juiz, em audiência, na presença do Ministério Público. Destaca-se que poderá ocorrer a retratação até a publicação da sentença constitutiva, conforme dispõe o art. 166, §5º do ECA. Entretanto, não ocorrendo o consentimento dos pais biológicos, será necessário a destituição do poder familiar, sendo deferida em casos em que a criança ou o adolescente esteja em situação de risco na companhia dos genitores ou quando estes não mais cumprirem os deveres da paternidade. Ademais, quando o adotando for maior de doze anos, é obrigatório também o seu consentimento, só podendo ser deferida a adoção com sua concordância, mesmo que haja o consentimento dos pais biológicos.

Superada a fase de consentimentos, passa-se ao estágio de convivência, o qual só ocorrerá após a realização de estudo social sobre a sua viabilidade. Essa fase deve ocorrer com o acompanhamento de equipe interdisciplinar por meio de encontros periódicos e tem como fundamentos permitir a adaptação da criança em seu novo entorno familiar e favorecer o estabelecimento das bases afetivas entre a criança e o adulto. Sua duração deve ser fixada pelo juiz competente caso a caso. Sobre a importância desse momento inaugural de convívio,

41 GRANATO, Eunice Ferreira Rodrigues. Adoção: doutrina e prática. Curitiba: Juruá, 2010. p. 87.

42 Art. 45. A adoção depende do consentimento dos pais ou do representante legal do adotando. § 1º. O

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aduz Dimas Carvalho43:

O estágio de convivência pelo prazo que o juiz fixar é fundamental para verificar se o adotando se adaptou à família e se os adotantes realmente estão preparados para assumir o filho afetivo, sendo imprescindível para demonstrar a conveniência do deferimento do vínculo, o que deve ser acompanhado por profissionais especializados e ao final apresentar relatório de estudo social, fornecendo subsídios da situação de fato para o magistrado deferir a adoção com segurança (art. 46, §4º, ECA).

Findo o prazo de duração do estágio de convivência, será feito estudo psicossocial para a verificação da adaptação ou eventual incompatibilidade entre o menor e os promoventes, podendo ser dispensado tal estudo se o adotando tiver menos de um ano de idade ou se já estiver sob a tutela ou guarda legal do adotante durante tempo suficiente para que seja possível avaliar a conveniência do vínculo, conforme o teor do art. 46, §1º do ECA.

Por fim, será dado vistas ao Ministério Público para emissão de parecer, e, em seguida, o juiz proferirá sentença de procedência ou não do pedido adotivo. Frisa-se que o art. 4344 do estatuto determina que a adoção será deferida quando apresentar real vantagem para o adotando e fundar-se em meios legítimos, estabelecendo, assim, o superior interesse do menor como requisito adotivo indispensável, o que não pode ser desconsiderado pelo julgador.

3.3 Adoção intuitu personae: aspectos gerais

A adoção intuitu personae é uma modalidade de adoção em que a escolha dos

adotantes é feita previamente pelos pais biológicos ou quem detenha o poder familiar dos menores, motivada, muitas vezes, pelos valores culturais, morais, religiosos e costumeiros daqueles, cabendo ao poder judiciário a chancela da indicação. Tal modalidade também é chamada de “adoção dirigida”, justamente em virtude de o Judiciário não ter o poder-dever de determinar a família substituta, mas tão somente o de avaliar se os indicados são aptos a adotar a criança ou o adolescente.

Galdino Bardallo45 a conceitua como modalidade de adoção em que há a intervenção dos pais biológicos na escolha da família substituta, ocorrendo a escolha em momento anterior a chegada do pedido de adoção ao conhecimento do Poder Judiciário.

43 CARVALHO, Dimas Messias de. Adoção e Guarda. Belo Horizonte: Del Rey, 2010, p. 24.

44Art. 43. A adoção será deferida quando apresentar reais vantagens para o adotando e fundar-se em motivos

legítimos.

45BORDALLO, Galdino Augusto Coelho. Adoção. In: MACIEL, Kátia Regina Ferreira Lobo Andrade (Coord.).

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Enquanto, Rolf Madaleno46 a determina como aquela em que os pais dão consentimento para a adoção em relação à determinada pessoa, identificada como pessoa certa ou para um casal específico.

Maria Berenice47 cita como circunstâncias que motivam à adoção intuitu personae a intenção de uma mãe de entregar o filho à patroa, ou à vizinha, ou à um casal de amigos, que têm certa maneira de ver a vida, ou uma retidão de caráter, que a mãe acha que seriam os pais ideais para o seu filho.

Ademais, na sociedade contemporânea, sabe-se que as informalidades das relações particulares, principalmente no interior do país e entre as pessoas com poucos recursos financeiros ou com problemas com drogas ou familiares, é frequente, sendo comum situações em que a própria mãe entrega seu filho a uma determinada pessoa de sua confiança e que sabe possuir melhores condições financeiras e socias de criar o menor.

Assim, nessa espécie de adoção, os pais biológicos entregam o filho, por sua autonomia, para quem acham que melhor os substituirão, quem lhes pareça mais confiável para cuidá-los e educá-los. Saber a procedência e os valores da pessoa escolhida muitas vezes serve de consolo e conforto para muitos pais que optam por colocar o filho em adoção, além de evitar a institucionalização e efetivar com mais eficácia o direito à convivência familiar. Ressalta-se que a escolha dos adotantes não é irreversível, o Judiciário com base em pareceres da equipe multidisciplinar, dentre outros estudos necessários, pode determinar que os interessados indicados para a adoção não possuam idoneidade para fazê-lo, indeferindo o pedido de adoção, devendo prevalecer o melhor interesse do menor.

Logo, no caso da adoção intuitu personae, o trâmite legal do procedimento

adotivo deverá ser seguido, dispensando-se apenas a fase de habilitação e cadastro no registro de interessados em adotar, uma vez que, nessa modalidade, a escolha dos adotantes é feita previamente, sem intervenção judicial, pelos pais biológicos, mas todos as demais fases devem ser respeitadas para a verificação se a indicação trará reais benefícios à criança ou ao adolescente.

Atualmente, ela não é expressamente prevista pelo ECA entre as exceções de exigência do cadastro, mas, também não é vedada, sendo considerada uma espécie legal de adoção por ser uma possibilidade de garantir o máximo benefício ao menor, uma vez que

46 MADELENO, Rolf. Curso de direito de família. 2. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2008, p. 485.

47 DIAS. Maria Berenice. Manual de Direito das Famílias. 8.ed. rev. atual. e ampl. São Paulo: Editora Revista

Referências

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