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ANÁLISE DA ABORDAGEM SOBRE TOXOPLASMOSE EM LIVROS DIDÁTICOS DE BIOLOGIA (PNLEM )

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ANÁLISE DA ABORDAGEM SOBRE TOXOPLASMOSE EM LIVROS DIDÁTICOS DE BIOLOGIA (PNLEM 2012-2014)

Glenda Jacqueline Pisetta Hosomi (Rede São Paulo de Formação Docente – REDEFOR/USP) Kelly Dhayane Abrantes Lima (Rede São Paulo de Formação Docente – REDEFOR/USP)

RESUMO

A toxoplasmose é uma parasitose de alta prevalência causada pelo protozoário Toxoplasma gondii. Embora a maioria dos casos em humanos seja benigna, a forma congênita da doença e a infecção em pacientes imunodeprimidos são particularmente graves. Considerando a importância da Educação Básica para a formação do cidadão, a relevância do livro didático de Biologia como fonte de conhecimento e os investimentos públicos em livros didáticos, foram investigados saberes acerca da toxoplasmose nas coleções aprovadas pelo PNLEM. A análise foi realizada sob a luz da transposição didática. Os resultados obtidos atestaram a relevância dos saberes acerca da toxoplasmose, embora tenham sido encontrados erros conceituais e omissões importantes a respeito do ciclo de vida do parasito nas obras analisadas.

Palavras-chave: transposição didática, PNLEM, parasitose, Toxoplasma gondii 1 INTRODUÇÃO

De acordo com Brasil (2002), o ensino de Biologia tem sido organizado tradicionalmente em torno das diversas áreas da ciência da vida – Citologia, Genética, Zoologia, Botânica, Evolução, Fisiologia – e as situações de aprendizagem privilegiam apenas a compreensão de conceitos relacionados a essas ciências. Na tentativa de sanar esse problema e de promover a utilização da ciência como instrumento de interpretação da realidade e intervenção no meio, os Parâmetros Curriculares Nacionais para o Ensino Médio (PCNEM) propõem a organização curricular baseada em competências e habilidades.

Com o objetivo de adequar o ensino paulista às diretrizes propostas nos PCNEM e de unificar temas de estudo e sequências didáticas nas diversas disciplinas curriculares do Ensino Fundamental II e Médio, foi implantada em 2008 uma nova proposta curricular no Estado de São Paulo. Nela, os conteúdos de ensino apareciam estruturados em situações com o objetivo de promover a aprendizagem através de competências e habilidades seguindo as recomendações dos PCNEM. A partir de 2010 a Proposta se tornou efetivamente o Currículo Oficial do Estado de São Paulo, contemplado em quatro volumes de Cadernos do Aluno e Cadernos do Professor por série, onde são propostas as situações de aprendizagem para cada disciplina (SÃO PAULO, 2010). Esses conjuntos didáticos, nos quais se baseia o currículo paulista, não contemplam (e nem pretendem contemplar) todo o conteúdo tradicionalmente trabalhado no Ensino Médio. Ao contrário, permitem que o professor

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conduza as atividades adequando seu desenvolvimento à realidade da comunidade em que está trabalhando e ao Projeto Político Pedagógico da escola.

Nesse contexto, os livros didáticos disponibilizados pelo Programa Nacional do Livro para o Ensino Médio (PNLEM) constituem o principal referencial teórico disponível para professores e alunos nas salas de aula paulistas. Apesar de o Ministério da Educação ter dado início ao Programa Nacional do Livro Didático (PNLD) em 1985, foi apenas a partir de 2004 que os alunos de Ensino Médio passaram a ser beneficiados por essa política nacional (BRASIL, 2003).

Dessa forma, considerando o investimento do Ministério da Educação no PNLEM, a importância do livro didático no contexto escolar e a importância do trabalho do professor de Biologia como um agente de promoção da saúde, pretende-se analisar, sob a luz da transposição didática, alguns conceitos relacionados à toxoplasmose nas oito coleções de livros de Biologia aprovadas pelo PNLEM para o triênio 2012-2014.

Analisar um conteúdo de ensino sob a ótica da transposição didática significa compreender o processo de transformação que um conhecimento produzido na esfera acadêmica sofre até se transformar em conteúdo ensinado em sala de aula. Esse conceito, desenvolvido por Michel Verret em 1975, foi largamente ampliado e divulgado a partir dos trabalhos de Yves Chevellard e Marie-Albert Joshua (apud BELOTTO-BATISTETI et al., 2010). De acordo com Brockington e Pietrocola (2005), os saberes envolvidos nesse processo são três: o “saber sábio”, produzido pelos cientistas e intelectuais, o “saber a ensinar”, que consta nos programas e materiais didáticos, e o “saber ensinado”, que ocorre efetivamente no espaço da sala de aula.

A transposição didática externa, ferramenta de análise do presente trabalho, ocorre fora do ambiente escolar, através da mediação da noosfera. Esta, por sua vez, é o centro operacional do processo, onde são discutidos os interesses dos diferentes sujeitos sociais para legitimar o “saber a ensinar” (OLIVEIRA, 2010). Para Chevallard, a noosfera se constitui num espaço de discussão entre o sistema de ensino strictu sensu (representantes do sistema de ensino como editoras e autores de livros didáticos) e o seu entorno (representantes de órgãos governamentais, pais de alunos e cientistas). Essa discussão tem por objetivo chegar a um denominador comum, mediando as necessidades da sociedade e do sistema escolar e legitimando o “saber a ensinar” (CHEVALLARD, 1991 apud OLIVEIRA, 2010).

Diante da complexidade do processo de transposição didática, que evidentemente não se restringe a uma mera simplificação do saber, “é importante que o professor, em meio às transformações que o conteúdo sofre ao ser ensinado em sala de aula,

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tenha como referência o saber sábio, exercendo assim uma constante vigilância epistemológica” (BELOTTO-BATISTETI et al., 2010). Dessa forma, o presente trabalho constitui um exercício de vigilância epistemológica, buscando analisar, com referência à toxoplasmose, alguns atributos da transposição didática externa em livros didáticos de Biologia do Ensino Médio.

A toxoplasmose é uma zoonose causada exclusivamente pelo protozoário Toxoplasma gondii, pertencente ao Filo Apicomplexa e à classe Sporozoa. Infectando o gato e numerosas outras espécies de vertebrados, o parasito possui ampla distribuição na natureza e provoca uma das infecções humanas mais comuns no mundo inteiro, embora na maioria dos casos ocorra numa forma subclínica e assintomática (REY, 2008).

Apesar de poder causar um quadro febril e enfartamento ganglionar cervical em pacientes imunocompetentes, o grande risco associado à infecção por T. gondii ocorre em pacientes imunodeprimidos e em fetos infectados pela via transplacentária durante a gestação - forma congênita (NEVES et al., 2009). Existem três formas distintas de T. gondii em seu complexo ciclo de vida: os trofozoítos, mais recentemente denominados endozoítos ou taquizoítos, que ocorrem na fase aguda da infecção e constituem a forma proliferativa que invade as células; os esporozoítos, que se encontram dentro dos oocistos; e os bradizoítos, presentes em cistos teciduais na forma latente da infecção (VARELLA, 2007).

A infecção em seres humanos pode se dar por três principais vias: pela ingestão acidental dos oocistos liberados nas fezes dos felinos, que podem ser veiculados por animais e pelo vento; pela ingestão de carne mal passada de hospedeiros intermediários que desenvolveram cistozoítos na fase crônica da doença; e pela transmissão transplacentária, que ocorre quando a gestante desenvolve a fase aguda da doença ou numa rara reagudização na fase crônica durante a gestação.

Considerando tais vias de transmissão, é possível planejar e executar ações preventivas de modo a evitar as graves sequelas que a infecção pode trazer para pacientes imunocomprometidos e para fetos que sofrem transmissão vertical durante a gestação. De acordo com Saadatnia e Golkar (2012), apesar do consumo de carne mal passada ser a via prioritária de infecção na maior parte do mundo, em regiões carentes de saneamento básico a ingestão de oocistos tem um papel mais relevante do que o considerado anteriormente. Como a vacinação ainda não é uma opção para a prevenção da referida doença, pode-se considerar que a educação sanitária e os cuidados com a exposição pessoal ao parasita constituem os melhores mecanismos profiláticos contra a toxoplasmose e suas sequelas. Nesse contexto, considerando o privilégio do espaço escolar para a promoção da saúde, a importância das

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aulas de Biologia para a educação sanitária e a relevante função do livro didático na prática pedagógica desenvolvida nas salas de aula brasileiras, o livro didático de Biologia assume um papel de destaque como agente de divulgação sobre saúde para a população, já que é através desse instrumento da educação formal que a maioria dos estudantes tem acesso às informações sobre dezenas de parasitoses que acometem os seres humanos.

2 OBJETIVOS

- Verificar a existência de consenso nos principais conceitos relacionados à toxoplasmose.

- Analisar a atualidade moral e biológica de aspectos ligados à toxoplasmose em livros didáticos.

- Examinar a operacionalidade do saber acerca da toxoplasmose através da verificação e caracterização de atividades propostas no livro didático em relação ao tema.

- Averiguar a criatividade didática e a terapêutica do saber ligado à toxoplasmose no conjunto das obras de Biologia aprovadas pelo Programa Nacional do Livro Didático, versão 2012.

3 MATERIAL E MÉTODOS

Para analisar a abordagem da toxoplasmose nos livros didáticos de Biologia utilizados nas escolas públicas brasileiras, foram avaliadas as coleções aprovadas pela comissão integrante do Programa Nacional do Livro Didático, divulgadas no Guia de Livros Didáticos PNLEM – 2012, destinadas ao uso no triênio 2012-2013 (MEC, 2011). Todas são compostas por três volumes, e doravante a referência a elas será feita através das letras que as precedem na Tabela 1.

Tabela 1 – Identificação, em ordem alfabética de autoria, das coleções didáticas aprovadas pelo Programa Nacional do Livro Didático (MEC, 2011).

Identificação Obra

A AMABIS, J. M. & MARTHO, G. R. Biologia. Editora Moderna, São Paulo, 2010.

B BIZZO, N. Novas bases da Biologia. Editora Ática, São Paulo, 2011.

C LINHARES, S. V. & GEWANDSNAJDER, F. Biologia Hoje. Editora Ática, São Paulo, 2010.

D LOPES, S. & ROSSO, S. Bio. Editora Saraiva, São Paulo, 2010.

E MENDONÇA, V. & LAURENCE, J. Biologia para a nova geração. Editora Nova Geração, São Paulo, 2010.

F PEZZI, A.; GOWDAK, D. O. & MATTOS, N. S. Coleção Biologia. Editora FTD, São Paulo, 2010.

G SANTOS, F. S.; AGUILAR, J. B. V.; OLIVEIRA, M. M. A. Ser Protagonista – Biologia.

Edições SM, São Paulo, 2010.

H SILVA JÚNIOR, C.; SASSON, S. & CALDINI JÚNIOR, N. Biologia. Editora Saraiva, São Paulo, 2010.

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De acordo com a teoria da transposição didática, a sobrevivência de um saber como objeto de ensino depende de uma série de atributos, que devem ser considerados em conjunto: sua atualidade, operacionalidade, criatividade e terapêutica. Para investigar as obras selecionadas frente a tais questões, foram criadas quatro categorias de análise distintas, descritas a seguir.

Em relação à atualidade moral, verificou-se nas obras analisadas a presença de conceitos relacionados à toxoplasmose e estabeleceu-se uma comparação com a frequência com que outras protozooses são abordadas nos livros didáticos (categoria 1). Já em relação à atualidade biológica, procedeu-se a uma análise dos principais conceitos associados à toxoplasmose – agente etiológico e sua classificação, transmissão, manifestações clínicas e prevenção – que constituíram subcategorias comparadas com os conhecimentos acadêmicos de referência utilizados na revisão bibliográfica apresentada na introdução deste trabalho (categoria 2). Foram analisadas também a presença e a qualidade das informações disponibilizadas nas ilustrações referentes à parasitose (categoria 3), .tendo em mente o aspecto facilitador que elas conferem à aprendizagem e sua importância nos livros didáticos, em relação à atualidade biológica, Já a operacionalidade do saber referente à toxoplasmose, isto é, a capacidade de gerar atividades didáticas e exercícios, foi analisada nas obras através do levantamento e caracterização das questões propostas para o aluno – múltipla escolha, dissertativa, atividade de pesquisa – nas unidades de ensino em que o conceito estava inserido (categoria 4).

4 RESULTADOS E DISCUSSÃO

A análise preliminar das coleções didáticas revelou que a toxoplasmose é mencionada em todas as coleções aprovadas pelo PNLEM 2012. Como se pode verificar na Tabela 2, a doença é abordada na unidade de ensino destinada ao estudo do Reino Protista ou Protoctista, inserida no volume 2 de todas as coleções, exceto na coleção D, que a aborda no volume 3. A coleção H, no entanto, se diferencia das demais por tratar do tema também em outra unidade de ensino, denominada Saúde Humana (inserida no volume 3), na qual são abordadas mais detalhadamente algumas doenças parasitárias que acometem o ser humano, bem como outros aspectos relacionados à saúde, tais como acidentes causados por animais e qualidade de vida.

Tabela 2 – Localização da abordagem sobre toxoplasmose nas coleções didáticas aprovadas pelo PNLEM-2012.

Coleção Localização

A Volume 2, Unidade B – Vírus, bactérias, algas, protozoários e fungos

Capítulo 3 – Algas, protozoários e fungos - Seção 3.2 – Protozoários (p. 87 a 97)

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B Volume 2, Unidade 2 – Biodiversidade: vírus, procariotos e eucariotos

Capítulo 3 – Seres vivos muito pequenos - Seção 4 – Os protozoários: eucariotos unicelulares (p. 119 a 130)

C Volume 2, Unidade II – Vírus e seres de organização mais simples

Capítulo 4 – Protozoários e algas - Seção 1 – Protozoários (p. 61 a 64); Seção 2 – Doenças causadas por protozoários (p. 64 a 68)

D Volume 3, Unidade 1 – Classificação dos seres vivos e estudo dos vírus procariontes e protistas

Capítulo 4 – Protistas - Seções 1 a 9 (p. 100 a 116)

E Volume 2, Unidade 1 – Introdução ao estudo dos seres vivos e Diversidade biológica I

Capítulo 4 – Protistas - Seção 2 – Os protozoários (p. 70 a 76); Seção 3 – Os protozoários e a saúde humana (p. 77 a 80)

F Volume 2, Unidade 2 – Super-reinoEukaya: Reinos Protista e Fungi Capítulo 4 – Reino Protista (p. 58 a 68);

Capítulo 5 – Protozoários parasitas (p. 69 a 81)

G Volume 2, Unidade II – Vírus, seres procarióticos, protoctistas e fungos Capítulo 4 – Protoctistas (p. 58 a 77)

H Volume 2, Unidade 1 – Seres vivos: classificação e estudo dos reinos Capítulo 3 – O Reino Protoctista (Protista) (p. 37 a 48)

Volume 3, Unidade 4 – Saúde Humana

Capítulo 21 – O parasitismo e os microrganismos parasitas do ser humano - Seção: As protozooses (p. 273 a 278)

A análise preliminar, que permitiu verificar a abordagem da toxoplasmose nas obras e o contexto em que ela ocorre, mostrou três aspectos relevantes: todas as obras tratam, de alguma forma, da infecção causada por T. gondii, a discussão se insere no mesmo contexto em que se discute a classificação dos protozoários em seis coleções, e nesse mesmo número de obras os autores citam a existência de controvérsias na sistemática do grupo entre os acadêmicos. Tais resultados revelam que a abordagem de aspectos relacionados à saúde ainda continua seguindo a organização tradicional na maioria das obras, isto é, está inserida no contexto da taxonomia. Por outro lado, os livros didáticos caminham em direção à atualidade biológica, como se percebe nas controvérsias taxonômicas citadas pelos autores.

Para verificar a atualidade moral dos conceitos relacionados à toxoplasmose, isto é, o fato de os diferentes atores da sociedade julgarem-na como um saber relevante na composição dos programas de ensino, comparou-se a frequência com que diferentes protozooses figuram nas obras analisadas, o que constituiu a primeira categoria de análise. O resultado encontra-se na Tabela 3, onde as protozooses são listadas em ordem alfabética.

Tabela 3 – Diferentes protozooses abordadas nas coleções didáticas aprovadas pelo PNLEM-2012. O sinal (+) indica a presença e o sinal (-) indica a ausência da parasitose no conteúdo contemplado na obra.

COLEÇÃO Amease Balantidiose Doença de Chagas Doença do sono Giardíase Leishmaniose tegumentar Leishmaniose visceral Maria Toxoplasmose Tricomoníase

A + + + - - + + + + +

B - - + - - + + + + -

C + - + + + + + + + +

D + + + + - + + + + -

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E + - + - + + - + + +

F + + + + + + + + + +

G + - + - + + + + + -

H + - + - + + + + + -

É possível perceber que entre as dez diferentes protozooses contempladas nas diferentes coleções, apenas quatro aparecem em todas as obras: doença de Chagas, leishmaniose tegumentar, malária e toxoplasmose. Não por acaso, doença de Chagas, leishmaniose tegumentar, leishmaniose visceral e malária são as únicas protozooses que integram a última edição brasileira da Lista de Notificação Compulsória de doenças (LNC), que contempla eventos de importância para a saúde pública de abrangência nacional (BRASIL, 2011).

Em relação à toxoplasmose, apesar de ela ocorrer de modo subclínico e assintomático na grande maioria das vezes, sua presença na totalidade das obras analisadas pode ser atribuída à sua distribuição cosmopolita e ao fato de ser a infecção mais comum no mundo todo, acometendo uma numerosa quantidade de espécies animais (NEVES et al., 2009). Além disso, devido à importância de suas sequelas para bebês contaminados durante a gestação, em agosto de 2010 a Portaria MS/GM n° 2.472, estabeleceu a vigilância da ocorrência da toxoplasmose congênita e neonatal no país (BRASIL, 2012).

Com relação à atualidade biológica dos saberes referentes à toxoplasmose, a investigação foi realizada em subcategorias, que abordaram os seguintes itens (a) identificação e classificação do agente etiológico, (b) formas de transmissão da doença, (c) sintomatologia e (d) prevenção. Os resultados da análise revelaram que todas as obras identificam e classificam corretamente o agente etiológico da toxoplasmose: um protozoário flagelado da espécie Toxoplasma gondii, sendo o filo Apicomplexa (ou Sporozoa) citado em sete das oito coleções. Entretanto, em relação às formas de transmissão, a análise mostrou certa heterogeneidade de resultados, conforme se pode verificar na Tabela 4.

Tabela 4 – Principais formas de transmissão da toxoplasmose para seres humanos citadas nas obras analisadas. O sinal (+) indica a presença e o sinal (-) indica a ausência da forma de transmissão no conteúdo contemplado na obra.

Obra Formas infectantes presentes nas fezes

de felinos

Ingestão de carne contaminada crua ou

mal cozida

Congênita ou transplacentária

A - - -

B + + +

C + + +

D + + +

E + - +

F + - +

G - + +

H + - -

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A coleção A é a única que não aborda a transmissão da doença, pois trata da toxoplasmose superficialmente, fora da seção dedicada às principais protozooses. Na coleção G, a abordagem também se dá em contexto diferente daquele destinado às principais doenças causadas por protozoários; no entanto são citadas as possibilidades de transmissão materno- fetal e via água e carnes contaminadas. Nas coleções C e D, os autores abordam as três principais vias de contágio consideradas no panorama atual: contato com formas contaminantes presentes em fezes de felinos, carne contaminada crua ou mal cozida e transplacentária. Já as coleções E e F não consideram o contágio através da ingestão de alimento contaminado, e a coleção H cita apenas as fezes do gato como fonte de contaminação. Na coleção B cita-se ainda, além das três formas de contágio consideradas na Tabela 4, a possibilidade de transmissão da toxoplasmose via transfusão de sangue e transplante de órgãos contaminados. O vasto conhecimento atual sobre diferentes doenças que podem ser transmitidas pelo sangue permite a padronização de cuidados laboratoriais e hospitalares que evitam essa forma de contágio, que no panorama atual tem pouca relevância, o que explica a omissão dessa forma de contágio nas outras obras analisadas.

Sendo assim, a análise mostrou que apenas três obras abordam adequadamente as principais fontes de infecção por T. gondii. Todavia, neste ponto da análise cabe uma importante ressalva: detectou-se certa confusão em relação à nomenclatura das formas infectantes presentes nas diferentes etapas do ciclo de vida do parasito. De acordo com a revisão bibliográfica, inclusa no presente trabalho, a forma infectante do protozoário encontrada nas fezes do gato denomina-se oocisto; aquela encontrada na carne dos animais contaminados constitui o cisto (ou cistozoíto), que contém bradizoítos; e na transmissão congênita são os taquizoítos que passam da mãe para o feto através da placenta. Segundo Neves et al., (2009), os taquizoítos podem ser adquiridos também através da ingestão de leite (principalmente o caprino, e o humano); e através da saliva de animais mediante lambedura.

Essas formas de transmissão são secundárias e de menor importância epidemiológica. Nas obras D, F e H verificou-se que o termo cisto é erroneamente utilizado para os oocistos liberados nas fezes de felinos. No corpo do texto da obra D ocorre o mesmo tipo de erro; no entanto, na legenda da figura que ilustra o ciclo de vida do parasito, há uma correção parcial, pois há referência à existência de dois tipos de cistos. Já na obra C, utiliza-se o termo cisto tanto para oocistos quanto para cistozoítos, como se fossem o mesmo tipo de estrutura.

Compreende-se que a diferenciação entre os termos pode dar ao texto do livro didático um caráter excessivamente tecnicista, distante daquele almejado pelos PCNEM e pelo Currículo do Estado de São Paulo. Por outro lado, a simplificação excessiva pode levar a erros

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conceituais, como é o caso, distanciando demasiadamente o “saber a ensinar” do “saber sábio”. Nesse sentido, a coleção B tem o mérito de resolver o problema ao utilizar o termo genérico forma infectante para se referir às outras formas de T. gondii que não os cistos presentes na carne de animais contaminados.

A Tabela 5, referente à abordagem da sintomatologia, mostra que o assunto aparece em sete das oito coleções analisadas, e em todas elas faz-se referência às possíveis deformidades fetais oriundas da infecção da gestante durante a gravidez. Já a possibilidade de problemas oculares é omitida apenas na coleção G, enquanto a coleção H é a única que não comenta o fato de a infecção ser assintomática na grande maioria dos pacientes imunocompetentes. As obras B, D e F fazem referência à gravidade da doença quando ela acomete pacientes imunodeprimidos, e apenas as coleções C e F citam a febre e o aumento dos linfonodos como sinais de infecção, o que mostra heterogeneidade também na abordagem dos sintomas.

Tabela 5 – Principais sintomas da toxoplasmose presentes nas obras analisadas. O sinal (+) indica a presença e o sinal (-) indica a ausência do sintoma no conteúdo contemplado na obra.

Obra Ausentes em pacientes imuno-

competentes

Grave em pacientes imuno-

deprimidos

Febre/aumen to de linfonodos

Problemas oculares

Deformidades no feto

A - - - - -

B + + - + +

C + - + + +

D + + - + +

E + - - + +

F + + + + +

G + - - - +

H - - - + +

Em relação à profilaxia da infecção por T. gondii, o resultado da análise das obras se encontra na Tabela 6. Três coleções, B, C e E, abordam as medidas profiláticas, e as três citam, os cuidados específicos com gatos e suas fezes. Já o cozimento adequado de carnes aparece em C e E, e a realização de exames pré-natais é indicada apenas em B e C.

Tabela 6 – Principais formas de prevenção contra a toxoplasmose presentes nas obras analisadas O sinal (+) indica a presença e o sinal (-) indica a ausência da medida profilática no conteúdo contemplado na obra.

Obra Cuidados específicos com gatos e suas fezes

Ingestão de carnes bem cozidas

Exames pré-natal em gestantes

A - - -

B + - +

C + + +

D - - -

E + + -

F - - -

G - - -

H - - -

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É interessante notar que das sete obras que tratam dos diferentes modos de transmissão da toxoplasmose, quatro delas (D, F, G e H) não abordam nenhuma medida profilática, deixando a cargo do aluno e/ou do professor fazer as devidas correlações. Ora, se por um lado tal tarefa parece até banal, às vezes a correlação pode não ser tão simples.

A Tabela 7 traz uma síntese das ilustrações acerca da toxoplasmose presentes nas obras analisadas.

Tabela 7 – Presença e identificação das ilustrações existentes nas obras analisadas. O sinal (+) indica a presença e o sinal (-) indica a ausência de ilustrações referentes à toxoplasmose na obra.

Obra Representação do ciclo de vida Micrografia do parasito Esquema do parasito

A - + -

B + + -

C - - +

D - - -

E + - +

F - - +

G - + -

H - - -

Por fim, verificou-se a existência de questões acerca da toxoplasmose entre os exercícios apresentados pelos autores no final dos capítulos correspondentes ao tema. O resultado da análise, sintetizado na Tabela 8, mostra que, apesar de em pequena quantidade, pelo menos cinco das oito obras analisadas sugerem atividades relacionadas ao tema para a reflexão do aluno.

Tabela 8 – Presença e quantidade de exercícios relacionados à toxoplasmose nas obras analisadas.

Obra Questões dissertativas Questões de múltipla escolha Questões tipo verdadeiro ou falso

A 0 0 0

B 0 1 1

C 0 0 0

D 1 2 0

E 1 0 0

F 0 0 1

G 1 0 0

H 0 0 0

Para tal constatação são propostas duas possíveis explicações: em primeiro lugar, os capítulos que abordam a toxoplasmose são muito abrangentes, e nas obras A, B, C, D, E e G, incluem o estudo das algas, além dos protozoários. Sendo assim, os exercícios propostos contemplam uma grande variedade de temas, o que dificulta a inclusão de todos os conteúdos e a diversificação das atividades relativas a cada um deles. Além disso, a análise de todas as obras mostra que, as doenças mais destacadas pelos autores são a malária e a doença de Chagas, seguidas da amebíase e das leishmanioses. Isso pode ser percebido pelo espaço dedicado a essas moléstias nos capítulos analisados, e a distribuição de conteúdos nos exercícios propostos segue a mesma tendência.

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5 CONSIDERAÇÕES FINAIS

A análise do “saber a ensinar” acerca da toxoplasmose nas coleções aprovadas pela versão 2012 do PNLEM permitiu concluir que ele tem atualidade moral: devido à sua importância epidemiológica, a toxoplasmose está presente em todas as obras consideradas. No entanto, em relação à atualidade biológica, foi possível verificar a ocorrência de graus variáveis de discordância em relação ao “saber sábio”, pois nas obras examinadas encontraram-se omissões importantes em relação às medidas profiláticas, à sintomatologia e principalmente às formas de transmissão da protozoose. Além disso, constatou-se o emprego equivocado de termos específicos na descrição do ciclo de vida do parasito, o que distancia o

“saber a ensinar” do “saber sábio”. Isso poderia ser evitado através do emprego de termos mais genéricos.

A operacionalidade do “saber a ensinar” foi certificada pela ocorrência de diferentes tipos de exercícios referentes à toxoplasmose nas coleções analisadas, apesar de o número de atividades propostas em relação ao tema ser relativamente pequeno.

A criatividade didática no processo de transposição dos saberes acerca da toxoplasmose é limitada. Dadas a importância da Educação Básica na formação do cidadão e a relevância das aulas de Ciências e Biologia para a promoção da saúde, seria recomendável que os livros proporcionassem mais exercícios e situações de reflexão no que diz respeito à prevenção de doenças e à adoção de hábitos saudáveis, em especial em relação à toxoplasmose. Isso contribuiria para aproximar os saberes escolares e de uma prática profilática mais efetiva acerca das doenças humanas.

Por fim, o conjunto de dados obtidos na análise dos livros didáticos a respeito da toxoplasmose como um “saber a ensinar” atesta a sua terapêutica, já que a doença tem sido mantida como parte do programa de ensino por todos os autores e editoras considerados.

6 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

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LOPES, S. & ROSSO, S. Bio. Editora Saraiva, São Paulo, 2010.

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